Más notícias do país de Dilma (115)

Nos últimos sete dias, não houve uma má notícia gigantesca, espetacular, como um grave apagão atingindo diversos Estados do País ou a chocante demonstração de sujeição às vontades de um governante bolivariano.

Houve, isso sim, um número imenso de más notícias como já virou usual no país de Dilma Rousseff. Por exemplo: a balança comercial teve o pior resultado em 18 anos; nos oito primeiros meses de 2013, o rombo chegou a US$ 3,76 bilhões.

É um déficit de competência, disse o Estadão, em editorial: “O buraco de US$ 3,76 bilhões na balança comercial de janeiro a agosto é sintoma de um grave desarranjo no sistema produtivo brasileiro. Não é apenas um problema conjuntural nem resulta somente do aumento das importações de petróleo e derivados, ao contrário da tese otimista apresentada pelo secretário de Comércio Exterior do Ministério do Desenvolvimento, Daniel Godinho.”

Anunciou-se também que o Brasil perdeu oito posições no ranking global de competitividade, segundo o Relatório Global de Competitividade do Fórum Econômico Mundial. Na edição de 2013 do ranking, o país aparece na 56ª posição entre 148 nações, contra a 48ª posição em 2012. O país ficou atrás, por exemplo, de México, Costa Rica, Portugal, África do Sul.

Outro recorde anunciado na semana foi a saída de dólares. O Brasil registrou em agosto o maior envio de dólares para o exterior em 2013 e o pior resultado para o mês desde 1998, último ano em que vigorou no País o sistema de câmbio fixo. Segundo o Banco Central (BC), a saída de recursos superou a entrada em US$ 4,85 bilhões no mês passado.

Com as despesas crescendo em ritmo bem mais acelerado que as receitas, o governo central – que reúne Tesouro Nacional, Previdência Social e Banco Central – registrou uma queda de 26,7% no superávit fiscal primário nos sete primeiros meses do ano, na comparação com o mesmo período de 2012. A economia realizada para o pagamento dos juros da dívida pública caiu de R$ 51,97 bilhões para R$ 38,10 bilhões no período.

Mas tudo bem. A cada nova notícia ruim, o ministro Guido Mantega, da Fazenda, diz que as coisas vão melhorar. Como escreveu Rolf Kuntz no Estadão, com uma ironia de cortar aço:

“O juízo final vai criar um grave problema para os ministros da área econômica. Por falta de futuro, eles ficarão impedidos de prever – ou de prometer – resultados melhores para o ano seguinte, como fez ontem (30/8) o ministro da Fazenda, Guido Mantega. Por enquanto eles têm essa rota de fuga, especialmente valiosa quando o cenário de curto prazo parece muito inseguro. Mesmo diante do resultado aparentemente bom do segundo trimestre, o ministro evitou projeções para 2013 e anunciou 2014 como um ano ‘mais promissor’. Que significa promissor? A resposta será especialmente importante para o trabalho do ministro número 40, principal ajudante da presidente Dilma Rousseff, seu marqueteiro eleitoral e grande planejador de ações políticas de impacto.”

Aí vai a 115ª compilação de notícias e análises que comprovam os malefícios e a incompetência do lulo-petismo como um todo e do governo Dilma Rousseff em especial. Foram publicadas entre os dias 30 de agosto e 5 de setembro.

Os recordes negativos da semana

* Balança comercial tem o pior resultado em 18 anos: em oito meses, o rombo foi de US$ 3,8 bilhões

“A economia brasileira entra na fase final de 2013 com um fardo pesado: a balança comercial registrou, nos primeiros oito meses do ano, o pior resultado em 18 anos. O rombo de US$ 3,8 bilhões verificado neste período so não foi pior porque as exportações superaram as importações em US$ 1,2 bilhão em agosto. Mas nem o pequeno superávit do mês passado pode ser comemorado trata-se do resultado mais fraco para meses de agosto desde 2002.

“O mau desempenho da balança comercial neste ano, no entanto, deve ficar para tras, avalia o governo. Segundo o secretário de Comércio Exterior do Ministério do Desenvolvimento, Daniel Godinho, o déficit acumulado entre janeiro e agosto é ‘conjuntural’, porque é ‘praticamente todo explicado’ pela trajetória do Petróleo. Nos primeiros oito meses do ano passado, as importações do produto foram US$ 2,5 bilhões superiores às exportações, enquanto que 110 mesmo período deste ano, a diferença foi muito maior, de US$ 16,3 bilhões.

“O governo Dilma Rousseff aposta que entre setembro e dezembro a situação que perdura desde o início do ano vai mudar completamente. Sem antecipar números, o secretário afirmou que a balança comercial deve terminar o ano com um peque no superávit.

“Segundo Godinho, a equipe econômica prevê um aumento da produção da Petrobrás neste fim de ano, o que deve diminuir a importação de Petróleo. Ao mesmo tempo, a recente desvalorização do real em relação ao dólar também deve barrar um salto das importações no fim do ano. ‘Se o câmbio permanecer no atual patamar, as compras do exterior devem perder força no curto prazo, e, no médio prazo, o novo nível da moeda também deve estimular as exportações’, disse Godinho, para quem o resultado de agosto ainda não refletiu o câmbio desvalorizado.

“Mas o otimismo dos técnicos pode ser abalado pelo próprio governo federal, caso o Ministério da Fazenda cumpra a promessa do ministro Guído Mantega de não renovar a lista de produtos que tiveram a alíquota de importação elevada para proteger a indústria nacional Somente a indústria química, segundo dados da associação de empresários, a Abiquim, deve ampliar as importações em US$3 bilhões caso a lista seja revogada.” (João Villaverde, Estadão, 3/9/2013.)

* Um déficit de competência

“O buraco de US$ 3,76 bilhões na balança comercial de janeiro a agosto é sintoma de um grave desarranjo no sistema produtivo brasileiro. Não é apenas um problema conjuntural nem resulta somente do aumento das importações de petróleo e derivados, ao contrário da tese otimista apresentada pelo secretário de Comércio Exterior do Ministério do Desenvolvimento, Daniel Godinho. Enquanto as exportações, no valor de US$ 156,65 bilhões, diminuíram 1,3% na conta oficial, as compras totais no exterior, de US$ 160,60 bilhões, cresceram 10,1%, com aumento de US$ 12,97 bilhões. É necessário examinar os dois lados da balança para decifrar o problema. Para começar, basta decompor o aumento do valor importado. A maior parcela, de US$ 4,87 bilhões, corresponde a matérias-primas e bens intermediários. Combustíveis e lubrificantes aparecem no segundo lugar, com US$ 4,75 bilhões. A lista se completa com bens de capital (US$ 2,25 bilhões) e bens de consumo (US$ 1,1 bilhão).

“A expansão das compras de matérias-primas e bens intermediários dá uma primeira pista: para atender à demanda crescente do mercado interno as empresas precisaram importar insumos. A indústria brasileira foi incapaz de responder à procura, embora dispusesse de alguma ociosidade. Não dispunha de preço adequado, no entanto, para ocupar ou mesmo para manter sua parcela de mercado, como já haviam indicado pesquisas da Confederação Nacional da Indústria (CNI) sobre a participação estrangeira no atendimento ao consumo de bens industriais. O problema poderá ser atenuado pela desvalorização cambial, dizem empresários e também o secretário de Comércio Exterior, mas o câmbio, como já foi demonstrado, é só parte do problema.

“Quanto às compras de combustíveis e lubrificantes, é preciso ressalvar, mais uma vez, a forma peculiar de contabilização: parte das importações realizadas em 2012 pela Petrobrás só foi registrada este ano. Mas, se tivesse entrado nas contas no momento certo, o saldo comercial do ano passado teria sido melhor. O atraso pode ter atrapalhado o balanço de 2013, mas os dados, de toda forma, indicam operações realizadas.

“Mas, para maior realismo, seria preciso eliminar também as exportações, meramente contábeis, de plataformas de extração de petróleo, outra bizarrice brasileira. De fato, nenhuma dessas plataformas foi embarcada e a sua inclusão entre as exportações serve apenas para justificar um benefício tributário à Petrobrás. Mas o valor, de US$ 2,81 bilhões entre janeiro e agosto, foi o segundo mais alto no período, abaixo somente da receita (real) das vendas de automóveis de passageiros (US$ 3,54 bilhões). Sem o valor das plataformas, o déficit comercial chegaria a US$ 6,57 bilhões, ou pouco menos, se fosse descontada parte das compras de combustíveis e lubrificantes.

“Como as exportações fictícias de plataformas totalizaram US$ 405 milhões em 2012, um rearranjo da receita dos dois anos resultaria nos valores de US$ 160,19 bilhões para 2012 e US$ 153,84 bilhões para 2013. A redução, nesse caso, chegaria a 3,96%, o triplo da registrada oficialmente.

“A bagunça implantada nas contas pelas estranhas práticas do governo pode complicar a análise dos números, mas, ainda assim, é possível resumir em termos simples e claros a situação: o comércio exterior brasileiro continua sendo afetado – e isso ocorre há pelo menos seis anos – pela dificuldade crescente de concorrer no mercado internacional.

“A crise global pode ter ocasionado problemas adicionais, por causa da recessão no mundo avançado e, depois, da perda de impulso da China. Mas o Brasil foi apenas um dos países afetados pelo menor dinamismo dos mercados. Outros foram prejudicados, mas conseguiram desempenho melhor que o brasileiro. A principal resposta do governo à crise global foi o aumento das barreiras comerciais. Mas os resultados da proteção foram tão pífios quanto os das outras ações anunciadas, a começar pelos atrasadíssimos investimentos em infra-estrutura e logística.” (Editorial, Estadão, 4/9/2013.)

* Brasil cai oito posições em ranking de competitividade e fica atrás de México, Costa Rica, Portugal, África do Sul

“O Brasil perdeu oito posições no ranking global de competitividade, segundo o Relatório Global de Competitividade do Fórum Econômico Mundial, divulgado ontem (3/9). Na edição de 2013 do ranking, o país aparece na 56ª posição entre 148 nações, contra a 48ª posição em 2012. Na prática, o país voltou para a colocação que exibia em 2009 e foi ultrapassado por países como México (55º agora, contra 53º em 2012), Costa Rica (57º, contra 54º antes), África do Sul (53º, contra 52º antes) e Portugal, que, apesar da crise européia, caiu menos que o Brasil, da 49ª para a 51ª posição.

De acordo com Carlos Arruda, professor da Fundação Dom Cabral, que coordena a pesquisa no Brasil, feita em parceria com o Movimento Brasil Competitivo (MBC), o resultado brasileiro é decorrente da deterioração das condições macroeconômicas — com aumento da inflação, baixo crescimento, alta do endividamento bruto e déficit externo, falta de avanços significativos nos investimentos em infra-estrutura e na simplificação dos marcos regulatórios e tributários.

Segundo ele, o desempenho do país não está condizente com o esperado de uma grande nação emergente: ‘O Brasil ainda tem potenciai de um Brics (grupo formado por Brasil, Rússia, China, índia e África do Sul), mas se comporta muito mais como uma nação do Mercosul’, afirmou o professor, lembrando que todos os demais parceiros do bloco do continente caíram no ranking neste ano: Uruguai (de 74° para 85º), Argentina (de 94º para 104º), Paraguai (de 116º para 119°) e Venezuela (de 126º para 134º).

O professor diz que a situação do Brasil não é animadora. Ele acredita que a tendência é o país continuar perdendo posições no próximo ano, ainda mais porque, lembra, 2014 é um ano eleitoral, o que dificulta reformas estruturais.

Pelo quinto ano consecutivo, a Suíça lidera a lista dos mais competitivos, seguida por Cingapura, Finlândia, Alemanha e Estados Unidos. Todos os dez países que estão liderando o ranking deste ano já estavam entre os dez primeiros em 2012, com algumas trocas de posições, como os EUA pulando da sétima para a quinta posição e a Alemanha saindo da sexta para a quarta. Entre os países que mais subiram está a Indonésia, que passou da 50º para a 38º, e o Equador, da 86ª para a 71ª. (Henrique Gomes Batista, O Globo, 4/9/2013.)

* Dólar tem saída recorde: saldo negativo de US$ 5,8 bilhões em agosto é o pior desde 1998

“O Brasil registrou em agosto o maior envio de dólares para o exterior em 2013 e o pior resultado para o mês desde 1998, último ano em que vigorou no País o sistema de câmbio fixo. Segundo o Banco Central (BC), a saída de recursos superou a entrada em US$ 4,85 bilhões no mês passado. Ao mesmo tempo o governo promoveu a maior intervenção no mercado este ano, para tentar reduzir a oscilação nas cotações.

“O dólar comercial acumula alta de 15,2% em 2013 e de 3,4% nos últimos 30 dias. Em setembro, está em queda. Ontem, a moeda recuou para R$ 2,356 (-0,1796). O dólar turismo fechou a R$ 2,48 (-0,52%).

“De acordo com fontes do governo o que se viu em agosto não foi uma fuga de capital do País. A maior parte da saída de dinheiro esteve relacionada ao vencimento de dívidas de instituições financeiras no exterior. Os. bancos, segundo o governo, quitaram empréstimos tomados em 2011, quando precisaram de doláres para se ajustar a uma norma do BC que reduziu a , especulação com a moeda, em queda na época.

“Como havia cobrança de imposto de 6% sobre dívidas externas de até dois anos, os bancos fizeram operações superiores a esse prazo, sendo que a maior parte’ venceu e foi paga no mês passado.

“Mais da metade do resultado negativo no mês se deve à movimentação de dinheiro na semana passada, quando a saída líquida foi de USS 3,1 bilhões, concentrada, principalmente, em operações financeiras. O valor inclui remessas de lucro, movimento com ações e títulos públicos e, principalmente, pagamentos de dívidas externas.” (Eduardo Cucolo e Célia Froufe, Estadão, 5/9/2013.)

Oficialmente protecionista

* Brasil se une à Argentina para barrar a renovação do compromisso de não criar novas barreiras ao comércio internacional

“O Brasil é protagonista quando o assunto é comércio na reunião de cúpula de chefes de Estado e de governo do G-20 em São Petersburgo, na Rússia. E a razão não é apenas a posse do novo diretor-geral da Organização Mundial de Comércio (OMC), Roberto Azevêdo. Delegados brasileiros e argentinos vetaram no G-20 o compromisso de não criar novas barreiras ao comércio mundial.

“Além disso, o Brasil também foi incluído pela União Europeia (UE) em uma lista de nações que mais vêm implementando medidas de protecionismo nos últimos cinco anos.

“O veto brasileiro e argentino diz respeito à inclusão na declaração final da reunião de cúpula, que será aberta oficialmente hoje, de um item sobre a resistência ao protecionismo. O acordo, chamado de Stand Still, foi adotado na reunião do G-20 de 2008, realizada em Washington, e vinha sendo renovado em todas as reuniões.

“A idéia do acordo é ‘evitar o surgimento de novas barreiras ao investimento ou ao comércio de bens e serviços, impondo novas restrições à importação, ou implementando medidas de estímulo às exportações inconsistentes (com as normas da OMG)’. Quando o compromisso foi firmado, em meio à turbulência da crise global, era valide i até 2010, sendo posteriormente reiterado até 2013.

“Em São Petersburgo, porém delegados do Brasil e da Argentina teriam vetado a renovação do compromisso até 2016. A justificativa do Itamaraty é que no Brasil, por exemplo, ainda terk espaço, se quisesse, para aumentar suas tarifas dentro das regras estabelecidas pela OMG. Outros países do grupo, no entanto, que teriam subsídios e barreiras já consideradas ilegais, não mudam por estarem : protegidas pelo acordo do G-20.

“A delegação brasileira alega, ainda, que há perspectiva de uma retomada da Rodada Doha, que discute a liberalização do comércio global, e que esse assunto então deveria ser tratado na Rodada, não fazendo sentido manter a situação desigual existente.” (Andrei Netto e Lisandra Paraguassu, Estadão, 5/9/2013.)

As contas públicas desarranjadas

* Gastos crescem mais rapidamente que as receitas, e superávit primário do governo cai 26,7%

“Com as despesas crescendo em ritmo bem mais acelerado que as receitas, o governo central – que reúne Tesouro Nacional, Previdência Social e Banco Central – registrou uma queda de 26,7% no superávit fiscal primário nos sete primeiros meses do ano, na comparação com o mesmo período de 2012. A economia realizada para o pagamento dos juros da dívida pública caiu de R$ 51,97 bilhões para R$ 38,10 bilhões no período. Considerando só o mês de julho, o superávit primário foi de R$ 3,73 bilhões. O resultado representa uma redução de 7,1% ante o mesmo período do ano passado e foi o pior para o mês desde julho de 2010.

“Embora as despesas estejam crescendo, os investimentos não refletem esse movimento. O gasto efetivo – incluindo o programa Minha Casa, Minha Vida – somou R$ 38,8 bilhões de janeiro a julho, alta marginal de 0,1% frente ao mesmo período do ano passado. No acumulado até junho, havia uma elevação de 1%. Já nos cinco primeiros meses, a alta era de 2,3%.

O secretário do Tesouro Nacional, Arno Augustin, admitiu que os gastos com investimentos estão abaixo do esperado pela equipe econômica e atribuiu o desempenho a entraves para tirar as obras do papel, entre eles, a greve dos servidores do Departamento Nacional de Infra-estrutura de Transportes (Dnit), o alto nível de exigência da legislação brasileira e a falta de profissionais qualificados no governo. ‘São gargalos. E é isso que estamos buscando enfrentar diariamente, no caso das obras públicas, e também por meio do processo de concessões.’

“Augustin destacou que, no acumulado de 12 meses até julho, o governo economizou R$ 74,4 bilhões e observou que o valor está bem próximo da meta para o fim do ano. Até dezembro, o governo central precisa realizar uma economia de R$ 73 bilhões e, para isso, conta com dividendos das estatais. Somente em agosto, o Tesouro Nacional deverá receber R$ 5,4 bilhões como parte do lucro dessas empresas. Desse total, R$ 1,724 bilhão será do BNDES e R$ 1,280 bilhão da Caixa. ‘Agosto tem receita baixa e despesa mais forte, pois há pagamento da Previdência, abono, seguro-desemprego.’” (Cristiane Bonfanti, O Globo, 30/8/2013.)

* Governo reduz meta de economia para pagamento dos juros da dívida pública

“O governo cortou sua projeção de resultado das contas públicas no ano que vem, dos atuais 2,3% para 2,1% do Produto Interno Bruto (PIB), O dado consta da proposta para o Orçamento de 2014 enviada ontem ao Congresso. Ela também contempla uma projeção de crescimento econômico de 4%, bem acima dos 2,4% previstos pelo mercado financeiro na pesquisa Focus, do Banco Central.

“O governo anunciou ainda que o salário mínimo será de R$ 722,90.0 reajuste de 6,6% terá impacto de R$ 29,2 bilhões nas despesas. Os dados, porém, são todos provisórios, segundo o ministro da Fazenda, Guido Mantega. ‘Ele prometeu uma revisão em janeiro, acom mais realismo, porque estaremos mais próximos dos fatos’.

“As incertezas do cenário, por causa da perspectiva da mudança na política monetária dos EUA, que poderá afetar todo o mundo, tomam qualquer previsão muito difícil, ponderou.

“O superávit primário, que é a economia feita pelo governo para o pagamento dos juros da dívida pública, foi fixado em 3,2% do PIB, ou R$ 167,4 bilhões, para todo o setor público. Porém, o governo prevê um desconto de até R$ 58 bilhões, o que reduz o saldo a R$ 109,4 bilhões, ou 2,1% do PIB. Essa é a meta a ser efetivamente perseguida pelo governo. ‘Eles podiam ter caprichado mais, porque interessa o sinal’, comentou o economista-chefe da corretora Tullétt Prebon, Fernando Montero. Ou seja: se os números vão todos mudar, o governo podia ter se poupado de indicar um afrouxamento de sua política fiscal A queda decorreu de uma estimativa mais mservadorapara o crescimento das receitas.

“Ocorre, porém, que no Orçamento nada é o que parece. O resultado primário de 2014 só será menor do que o deste ano se o governo alcançar os 2,3% do PIB que constam do Orçamento de 2013. ‘Mas o primário vai fechar em 1,5% do PIB’, aposta o economista. Assim, os 2,1% de 2014 serão um aperto, não o contrário.

“Montero diz que os dados de 2013 estão distorcidos. Por exemplo, para que a previsão de receitas de R$ 1 trilhão se confirme, será necessário que a arrecadação aumente 19,6% no resto do ano (15,6%, descontadas as receitas com a concessão de Liora). Assim, o Orçamento de D14, projetado em cima do deste ano, tampouco reflete a realidade. Ele batizou a peça de ‘orçaminto’.

“As críticas que Montero e outros economistas fizeram à falta de transparência nas contas públicas parecem ter surtido efeito. Ontem, o governo explicitou a previsão de gastos em 2014 com dois itens cujos números não são conhecidos este ano.

“No ano que vem, o Tesouro vai repassar à Previdência R$ 17 bilhões para cobrir a perda de arrecadação com a desoneração da folha. Mantega reiterou, ainda, que não haverá novas desonerações em 2014.

Outra despesa tornada transparente é o repasse do Tesouro para a Conta de Desenvolvimento Energético (GDE), que banca o corte da conta de luz e cobre o gasto com térmicas. Em 2014, será de até R$ 9 bilhões. Não há previsão para 2013, mas Mantega anunciou que o repasse foi de RS 500 milhões em julho e R$ 1,5 bilhão em agosto.” (Lu Aiko Otta, Estadão, 30/8/2013.)

* Orçamento é peça de ficção; governo trabalha com variáveis destituídas de senso de realismo

“O governo federal divulgou ontem (29/8) a peça de ficção que tem-se repetido: o Orçamento-Geral da União. É ficção não porque contenha erros de avaliação, tanto de arrecadação quanto de despesa, mas porque trabalha propositalmente com variáveis destituídas de senso de realismo.

“Lá estão previstos para 2014 um avanço do PIB de 4,0%; uma inflação de 5,0%; e uma cotação do dólar (taxa de câmbio) de R$ 2,19. Qualquer administrador de patrimônio que precisa trabalhar com parâmetros macroeconômicos confiáveis sabe que esses números não têm consistência.

“Não muda as coisas quando o ministro da Fazenda, Guido Mantega, adverte, como ontem (29/8) fez, que ‘esses números não devem ser tomados como previsões porque o governo não pode adivinhar’ e, por isso, começa de alguma base para depois ir ajustando. Mas, se eles são inconsistentes, que valor podem ter? O governo não quer apontar suas verdadeiras estimativas provavelmente porque ainda imagina que é melhor esbanjar otimismo, para talvez com isso influenciar o estado de espírito dos formadores de opinião. Infelizmente, o resultado vai na direção oposta.

“As projeções com que lidam cerca de 100 consultorias, departamentos econômicos de empresas e bancos auscultados semanalmente pelo Banco Central para a Pesquisa Focus, são bem diferentes: crescimento econômico de 2,9%, inflação de 5,8% e cotação do dólar (em fim de 2014) de R$ 2,35.

“Desde 2011 é a mesma coisa: o ministro Mantega começa projetando o avanço do PIB em 4,0% ou 4,5% e termina entregando uma fração disso. Foi de 0,9% em 2012 e o próprio Mantega já não espera mais de 2,5% em 2013.

“Como de tantas outras vezes, também agora o ministro condiciona o bom desempenho da atividade econômica brasileira à melhora do cenário mundial. No entanto, as principais limitações estão aqui dentro: distorções na economia, rombo progressivo nas contas externas, inflação alta, investimento baixo, mercado de trabalho aquecido demais, altos custos de produção e um desânimo crônico, que é, ao mesmo tempo, resultado e causa de tudo isso.

“Para dar alguma racionalidade a uma inflação em 2014 de apenas 5,0% (acima da meta de 4,5%, mas, ainda assim, abaixo de todas as projeções que estão por aí), o governo se compromete a deixar uma sobra de arrecadação para pagamento da dívida (superávit primário) equivalente a 2,1% do PIB. Mas 2014 é um ano de eleições. Se a administração das contas públicas não passa confiança em anos comuns, como acreditar que em 2014 seja tudo diferente?

“Mais uma vez, vai sobrar para o Banco Central a tarefa de segurar a inflação hoje pressionada pela esticada do câmbio e pelo represamento dos preços administrados, especialmente o das tarifas dos combustíveis.

“Se repetir nas duas próximas reuniões do Copom (outubro e novembro) a mesma dose de alta dos juros básicos (Selic) definida quarta-feira, ainda neste ano poderemos ter de volta os dois dígitos (de 10% para cima), até agora tabu no governo Dilma. E, mesmo se a opção for por um último ajuste na Selic (no ano) de apenas 0,25 ponto porcentual, os dois dígitos podem perfeitamente acontecer de janeiro em diante, principalmente se o Banco Central continuar perseguindo a convergência da inflação à meta.” (Celso Ming, Estadão, 30/8/2013.)

* A contabilidade federal é feita na base da marreta

“A marreta será de novo o grande instrumento da contabilidade federal, em 2014, a julgar pela proposta de lei orçamentária apresentada na quinta-feira pelos ministros da Fazenda, Guido Mantega, e do Planejamento, Míriam Belchior. Os resultados finais serão mais uma vez, como neste ano e nos anos anteriores, ajustados a pancadas para se ajustar à promessa de seriedade no manejo das contas públicas.

“O governo definiu para o próximo ano um superávit primário de R$ 167,4 bilhões, soma equivalente a 3,2% do Produto Interno Bruto (PIB) estimado. Mas o resultado efetivo poderá ficar em apenas R$ 109,4 bilhões e tudo estará muito certo e dentro dos conformes, segundo os números divulgados e comentados em entrevista coletiva em Brasília.

“O ministro Mantega ainda ensaiou uma ressalva, com a promessa de tentar o melhor resultado possível, se a economia mundial for mais favorável, mas a experiência e o bom senso proíbem levar a sério esse comentário. O cálculo do resultado primário inclui receitas e despesas normais da administração e desconsidera os custos da dívida pública. O superávit primário é normalmente usado, no Brasil, para o pagamento de juros devidos pelo Tesouro.

“O roteiro para encolher a meta primária como se tudo estivesse normal é resumido num quadrinho muito simples e um tanto incompleto. Para produzir o resultado maior, o governo central deve contribuir com uma economia de R$ 116,1 bilhões (2,2% do PIB) e os governos estaduais e municipais, juntamente com suas empresas, devem participar com R$ 51,3 bilhões (1% do PIB). Nesse esquema, a contribuição das empresas federais é nula. Mas o projeto já prevê para o governo central um abatimento, por conta de investimentos, de R$ 58 bilhões, metade do valor fixado originalmente.

“Com isso, a parcela federal fica reduzida a 1,1% do PIB. Refeita a soma – R$ 58,1 bilhões mais R$ 51,3 bilhões – chega-se ao compromisso final, R$ 109,4 bilhões, 2,1% do PIB.

“A marretagem fica ainda mais notável quando se examinam alguns detalhes incluídos em outros quadros. Está prevista para o próximo ano uma receita de R$ 21 bilhões (0,5% do PIB), correspondente a dividendos pagos ao Tesouro por estatais. Isso representará 36% do resultado primário de R$ 58,1 bilhões programado, depois do desconto, para o poder central. Esses pagamentos poderão ser pouco menores que os estimados para este ano (R$ 22 bilhões), mas seu peso no resultado final continuará muito importante. Na prática, espera-se, portanto, uma ajuda considerável de empresas controladas pela União.

“Dividendos já entraram muitas vezes na composição do saldo primário, mas nunca foram importantes como têm sido para o atual governo. Royalties e participações especiais também facilitarão o fechamento das contas, como em 2013.

“Além de reduzir a meta, o governo tem recorrido cada vez mais a essas receitas para acertar seu balanço. Isso o dispensa de um controle efetivo do custeio, de uma programação eficiente de investimentos e de um esforço para aperfeiçoar a administração.

“Além disso, é imprudência usar receitas extraordinárias, mais instáveis que as de impostos e contribuições, para custear gastos permanentes.

“Como sinais de boa administração, o ministro mencionou a redução, proporcionalmente ao PIB, dos gastos com juros e a estabilidade da folha de pessoal. Mas os juros voltaram a subir, por causa da inflação, e a dívida bruta continua crescendo. Depois, a expansão da folha superou a inflação durante vários anos, sem melhora correspondente dos serviços públicos.

“Para montar a proposta de orçamento, o governo tomou como hipóteses uma inflação de 5% e um crescimento de 4% para o PIB. Mas uma expansão de 4% ainda é um objetivo ambicioso, segundo Mantega, diante de um quadro internacional ainda complicado.

“Ele insiste em atribuir a estagnação brasileira a fatores externos. Mas o Brasil poderia exibir um dinamismo bem maior, como outros emergentes, se o governo errasse menos. Este é um dado reconhecido no País e no exterior.” (Editorial, Estadão, 31/8/2013.)

* As contas públicos vão rumo ao desequilíbrio crescente; recompô-las parece improvável

“O aumento de 1,5% do Produto Interno Bruto (PIB), no segundo trimestre, ofuscou um pouco a divulgação dos dados de julho sobre as contas públicas consolidadas, que incluem o Tesouro, Estados, municípios e empresas estatais. Elas registraram déficit nominal de R$ 21,1 bilhões, 77,8% maior que o de julho de 2012; e superávit primário de R$ 2,2 bilhões, 58,9% menor que o de igual mês de 2012.

“Resultados fiscais melhores dependerão tanto de uma retomada da economia como da queda da percepção de risco cambial. Mas ambos os fatores contrastam com o baixo grau de confiança de consumidores e empresários quanto ao futuro.

“Comparando os primeiros sete meses de 2012 e 2013, o déficit nominal aumentou quase R$ 30 bilhões, passando de 2,29% do PIB para 3,21% do PIB, enquanto o superávit primário caía quase R$ 17 bilhões, de 2,85% do PIB para 2,01% do PIB. Pior, há pressões novas sobre as contas públicas.

“Entre os primeiros sete meses de 2012 e 2013, o déficit primário da Previdência Social aumentou R$ 7 bilhões (30%), chegando a R$ 30,1 bilhões – foi de 0,93% do PIB para 1,11% do PIB. O Tesouro é um dos responsáveis, pois demora a compensar o INSS pela perda de receita em razão da desoneração da folha.

“A situação das estatais federais e estaduais piorou em julho: de um superávit nominal de R$ 451 milhões, em julho de 2012, elas passaram a um déficit nominal de R$ 304 milhões. Mas a maior pressão veio dos juros, de R$ 23,4 bilhões, recordistas da série histórica dos meses de julho.

“As contas pioraram com os leilões de swap cambial, em que o governo vende dólares a futuro e paga (ou recebe) a diferença em relação às cotações presentes. Essas operações evoluíram de apenas R$ 4,2 bilhões, em dezembro de 2012, para R$ 40,4 bilhões, em junho, e R$ 60,9 bilhões, em julho (hoje são bem mais elevadas). A desvalorização do real em relação ao dólar já resultou num custo de R$ 1,7 bilhão para o Banco Central, até julho, e voltou a crescer em agosto, com o real com perda de mais 4,36% em relação ao dólar.

“A recomposição das contas públicas parece improvável, pois as receitas do Tesouro, da Previdência e do Banco Central nos primeiros sete meses do ano têm crescido menos do que as despesas. Sem falar no aumento do desequilíbrio de Estados e municípios. A rigor, a situação só não se agravará se o programa de concessões for muito bem-sucedido. E isso, até agora, não parece muito provável.” (Editorial, Estadão, 3/9/2013.)

Os erros na política econômica

* “O problema de falta de credibilidade da política econômica é de solução bem mais difícil do que em geral se pensa”

“Em seis meses, o governo passou do triunfalismo de fevereiro à indisfarçável apreensão, que agora se vê em Brasília, com a longa e problemática travessia dos 13 meses que ainda faltam para as eleições de 2014.

“No início do ano, embalado pela comemoração de uma década de conquista da Presidência, o PT pretendia estender os festejos por todo o ano de 2013, com a realização de dez grandes eventos nas maiores cidades do País. Há cerca de um mês, contudo, foi discretamente anunciado pelo partido que o último evento seria o de Salvador, no fim de julho. Os demais seriam cancelados. Interrupção tão abrupta das comemorações bem ilustra a rapidez da mudança de clima por que vem passando o governo.

“Em fevereiro, o Planalto ainda alimentava a fantasia de que, após dois anos de crescimento econômico pífio, 2013 poderia ser o ano da virada. A idéia era assegurar a retomada da economia, a qualquer custo, e, na medida do possível, manter a inflação sob controle, com a adoção de medidas casuísticas de desoneração. Mas essas esperanças esvaíram-se ao longo dos últimos meses.

“Em abril, com a inflação já no teto da meta, o governo se viu obrigado a conter a gritante perda de credibilidade do Banco Central e dar sinal verde para novo ciclo de alta da taxa de juros. No fim do primeiro semestre, as perspectivas de recuperação da economia tornaram-se ainda menos promissoras, na esteira do aumento de incerteza que adveio da onda de protestos de junho e da crescente perda de confiança na condução da política econômica.

“Nos últimos dois meses, o que parecia ser apenas um quadro macroeconômico pouco promissor vem evoluindo para uma situação bem mais difícil, marcada por preocupante redução de espaço de manobra na condução da política econômica. Em grande medida, o estreitamento de possibilidades decorre do vigor da depreciação cambial que tem sido induzida pela perspectiva de mudança da política monetária americana e agravada pela perda de credibilidade da política econômica no Brasil.

“Se não puder ser revertida, a depreciação do câmbio deverá impor ao governo escolhas muito mais duras na condução da política de metas para inflação. E é bem provável que, ao fim e ao cabo, o governo, com uma eleição pela frente, se veja obrigado a conviver com uma combinação de taxa de juros, crescimento e inflação bem mais desfavorável do que imaginava possível há alguns meses.

“As escolhas poderiam ser menos adversas se o governo estivesse de fato disposto a restaurar a credibilidade da política fiscal. Mas tudo indica que lhe falta um requisito básico para fazer um movimento crível nesse sentido: convicção de que isso é efetivamente necessário.

“O máximo que o governo se dispõe a fazer nessa linha é prometer, de pés juntos, que não voltará a recorrer à lamentável alquimia contábil que tem conspurcado o registro das contas públicas nos últimos anos. Mas nem mesmo isso é crível. Basta constatar, por exemplo, que, poucas semanas depois de ter ensaiado esse tipo de promessa, o governo já aventou a possibilidade de excluir gastos com projetos de mobilidade urbana da contabilidade da dívida dos governos subnacionais.

“A esta altura, qualquer esforço sério de restauração da credibilidade da política fiscal exigiria mudança da equipe econômica. Algo que o governo obviamente não está disposto a fazer. Não obstante o lamentável desempenho da economia e a extensão do descrédito da política fiscal, a presidente não parece ter intenção de fazer qualquer alteração maior na equipe econômica, seja na Fazenda, seja no Tesouro, seja no BNDES.

“Isso sugere que o problema de falta de credibilidade da política econômica é de solução bem mais difícil do que em geral se pensa. É preciso levar mais a sério o que diz a presidente Dilma, quando se dá ao trabalho de esclarecer, com todas as letras, que, na verdade, a central de formulação e condução da política econômica está instalada no terceiro andar do Palácio do Planalto. Só não entende quem não quer.” (Rogério Furquim Werneck, Estadão e O Globo, 30/8/2013.)

* A solução de problemas da economia brasileira vai muito além do marketing eleitoral

“O juízo final vai criar um grave problema para os ministros da área econômica. Por falta de futuro, eles ficarão impedidos de prever – ou de prometer – resultados melhores para o ano seguinte, como fez ontem (30/8) o ministro da Fazenda, Guido Mantega. Por enquanto eles têm essa rota de fuga, especialmente valiosa quando o cenário de curto prazo parece muito inseguro. Mesmo diante do resultado aparentemente bom do segundo trimestre, o ministro evitou projeções para 2013 e anunciou 2014 como um ano ‘mais promissor’. Que significa promissor? A resposta será especialmente importante para o trabalho do ministro número 40, principal ajudante da presidente Dilma Rousseff, seu marqueteiro eleitoral e grande planejador de ações políticas de impacto.

“O ministro da Fazenda recusou indicar números, mas talvez possam servir como referência de um ano ‘promissor’ as estimativas incluídas na proposta de lei orçamentária para 2014:4% de expansão para o produto interno bruto (PIB) e inflação de 5%, medida pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), usado na política de metas do Banco Central (BC).

“Não são de fato previsões, disse Mantega ao apresentar o projeto, na quinta-feira (29/8), como se os técnicos tivessem tomado quaisquer hipóteses mais ou menos críveis para calcular a receita e a despesa do próximo exercício. Pode parecer meio estranho, mas só um pouco. Afinal, nenhuma esquisitice deste governo causa mais muita estranheza. Para o marqueteiro presidencial, no entanto, esses números poderão ser muito relevantes.

“Só para um exercício muito simples, admita-se para este ano um crescimento econômico de 3% – por enquanto, uma hipótese otimista. Se o PIB aumentar 4% em 2014, a expansão acumulada nos quatro anos de mandato da presidente Dilma Rousseff será de apenas 11%. A produção de bens e serviços terá crescido a uma taxa média inferior a 3% ao ano. Se a perspectiva de um desempenho ainda medíocre neste ano e no próximo se confirmar, o mercado de emprego ficará provavelmente mais fraco. A expansão do salário real, já menor em 2013, será prejudicada. Os empresários estarão menos dispostos a contratar e será mais difícil compensar com aumentos a perda salarial causada pela inflação.

“Para estimular a produção o governo poderá usar novas doses de benefícios fiscais, cortando tributos de setores selecionados. Nesse caso, insistirá numa linha de ação fracassada. Incentivos desse tipo custam caro ao governo e só produzem efeitos localizados. Nem a médio prazo o aumento da produção compensa os buracos abertos na arrecadação. Mas o governo parece ainda acreditar nas virtudes da política adotada nos últimos anos. Os fatos desmentem essa crença, mas a teimosia tem sido muito mais forte que os fatos.

“Dois outros fatores ainda poderão impulsionar o crescimento e, mais que isso, criar condições para uma expansão sustentável. Em primeiro lugar, novas concessões para infra-estrutura poderão movimentar o setor da construção e produzir bons efeitos a curto e a médio prazos, a começar pela multiplicação de empregos. Os ganhos de eficiência econômica serão benefícios mais duradouros e de maior alcance. O governo tem apostado nessas possibilidades, mas foi incapaz, até agora, de iniciar a execução do programa, anunciado festivamente há um ano.

‘Se quiser tratar seriamente do assunto, a administração federal deverá ser mais pragmático na elaboração dos editais, pôr de lado preconceitos e abandonar a idéia mal concebida do trem-bala, um projeto caríssimo e nada prioritário neste momento. Muitíssimo mais importante, nesta altura, é cuidar das condições do transporte de carga, pensar nos sistemas multimodais e dar um jeito nos aeroportos ineficientes e congestionados.

“O reajuste cambial poderá ser outro fator positivo. Ninguém sabe qual será o novo patamar do câmbio, depois de superada a atual instabilidade, mas o produtor nacional certamente ganhará algum poder de competição com o real mais barato. Será um erro enorme, no entanto, fazer do câmbio o fator decisivo de competitividade, como já ocorreu em outras épocas. Quem entra nesse jogo é condenado ao fracasso, até porque o estímulo cambial tende a tornar-se um vício. Os brasileiros deveriam conhecer muito bem a desastrosa sequência formada pela depreciação cambial e pela inflação.

“Não há competitividade real e duradoura sem muito investimento. No segundo trimestre, o valor investido em máquinas, equipamentos, construção civil e obras de infra-estrutura foi 3,6% maior que o dos primeiros três meses do ano e 9% superior ao de igual período de 2012. Mas esse crescimento ocorreu sobre uma base muito baixa. No trimestre, a relação entre investimento e PIB ficou em 18,6%. Um ano antes estava em 17,9%. Será preciso um esforço muito grande e muito sério para se chegar a uns 24% ou 25%, nível já superado, até com folga, por vários latino-americanos.

“Além de investir mais em ativos físicos, o País precisará cuidar muito mais seriamente da formação de pessoal e da inovação tecnológica. Sem isso seu potencial de crescimento continuará muito limitado. Esse potencial é hoje estimado na faixa de 2% a 3% por economistas de muito boa reputação. É difícil uma estimativa precisa, mas os limites brasileiros, como tem mostrado a experiência, são muito estreitos, especialmente no setor industrial. Diante da baixa capacidade de oferta, qualquer aumento importante da demanda pode resultar em mais inflação e em deterioração das contas externas – fenômenos muito visíveis hoje, mesmo com modesto crescimento econômico. A solução de problemas desse tipo vai muito além do marketing eleitoral.” (Rolf Kuntz, Estadão, 31/8/2013.)

* Há sinais de que o governo já percebeu que tem mudar de rumo. Mas prefere deixar tudo como está até as eleições de outubro de 2014

“Os sinais que vêm de Brasília são de que o governo Dilma parece convencido de que a política econômica dos últimos dois anos e meio já deu o que tinha de dar e que, se é para garantir melhor desempenho, é preciso mudar muita coisa.

‘Nesta segunda-feira (2/9) e na última sexta (30/8), o presidente do BNDES, Luciano Coutinho, advertiu para a necessidade de dar mais ênfase ao investimento. É uma afirmação de dentro do governo que embute uma crítica: a de que foi um equívoco ter puxado demais pelo consumo sem, ao mesmo tempo, ter aumentado a capacidade de oferta (produção) da economia.

“Um dos grandes limitadores da oferta é a precariedade da infra-estrutura. O agronegócio, por exemplo, apesar de enfrentar, como acontece também com a indústria, altos custos e impostos asfixiantes, continua dando show de produtividade. No entanto, isso acontece da porteira para dentro. Quando precisa transportar a safra esbarra no desespero logístico: condições precárias de armazenagem, estradas ruins, quilômetros e quilômetros de caminhões carregados à espera de liberação aos acessos dos portos – enfim, não é preciso alongar essa lista.

“Finalmente, o governo parece ter entendido que os gargalos não estão no consumo insatisfatório, mas no baixo nível do investimento. O problema começa a ser atacado com mais leilões de concessões. Ainda é pouco, mas já é mais do que havia.

“Há muitas distorções mais a desfazer. As desonerações, por exemplo, ficaram no meio do caminho e não podem prosseguir, pelo esgotamento do Tesouro. A administração das despesas públicas, por sua vez, flácida demais, não ajuda a combater a inflação, fato que sobrecarrega a política monetária (política de juros) do Banco Central. Juros altos, por sua vez, inibem os investimentos.

“As manifestações de junho mostraram que as prioridades da política econômica estão erradas, porque deram pouca atenção à saúde e aos transportes públicos. A carga de populismo tarifário, na energia elétrica e nos combustíveis, sabotou a capacidade de investimento das concessionárias de energia e da Petrobrás. Por mais que a presidente Dilma e os ministros da área econômica façam apelos para que o empresário desengavete seus projetos de investimento, prevalece o desânimo.

“Enfim, a ‘Nova Matriz Macroeconômica’ deu mais errado do que deu certo e toda a economia precisa ser repensada. Mas a decisão do governo é deixar as correções de rumo para depois das eleições.

“Há três pressupostos nessa escolha. O primeiro é que, apesar dos fracassos e dos descontentamentos provocados pela política econômica, nem a inflação nem o desemprego piorarão a ponto de colocar em risco a reeleição.

“Segundo pressuposto: a economia mundial vai começar a jogar mais a favor do que contra. A idéia aí é que o pior está na espera das turbulências a serem desencadeadas pela virada da política monetária do Federal Reserve (Fed, o banco central dos Estados Unidos) e não nos seus efeitos propriamente ditos. Quando a operação desmonte começar, ver-se-á que o leão é mais manso do que se supõe, como tem dito o ministro Guido Mantega.

“O terceiro e decisivo pressuposto é de que a oposição brasileira continuará incompetente e incapaz de propor coisa melhor, o que é difícil de desmentir.” (Celso Ming, Estadão, 3/9/2013.)

* A tática do governo é assim; vamos esperar que os problemas se resolvem sozinhos, por encanto

“Há problemas que se resolvem sozinhos, como por encanto. Essa expectativa, certamente otimista, justifica a atitude de esperar um pouco diante de uma dificuldade. Quem sabe?

“O risco é deixar muitos problemas no modo de espera, ao mesmo tempo. Em política econômica, então, é um perigo, especialmente porque as coisas aqui sempre têm verso e reverso.

“O governo Dilma teve uma boa experiência recente de um problema que está se resolvendo por encanto — o real valorizado, apontado pela equipe econômica como principal culpado da baixa competitividade da indústria nacional. A recuperação dos Estados Unidos e a mudança da política monetária deles, com a alta dos juros, fortalecem o dólar e, pois, desvalorizam as demais moedas, especialmente dos países emergentes. E, com isso, o real, acima de R$ 2,30 por dólar, chega a um nível de conforto, na definição de autoridades econômicas.

“Isso aconteceu de maio para cá e foi uma surpresa. A Petrobrás, por exemplo, quando fez seu plano de negócios, em janeiro deste ano, cravou um dólar a R$ 2,00, constante, e de R$ 1,85 no médio prazo. É isso mesmo, R$ 1,85, valor hoje sem o menor sentido.

“Ainda em abril deste ano, o chamado consenso de mercado, opinião dominante entre analistas fora do governo, previa um dólar a R$ 2,00 em dezembro/13 e de apenas R$ 2,05 em dezembro do próximo ano.

“Hoje, ainda há setores da indústria dizendo que, para exportar, precisam de um dólar acima de R$ 2,40, mas que os 2 e 30 já quebram um bom galho. E o governo não fez nada por isso, tudo presente dos EUA.

“Vai daí, parece que o governo espera outras soluções do mesmo jeito. Ainda a Petrobrás. Se o dólar mais caro favorece as exportações, também encarece as importações e a dívida de quem tomou empréstimos externos. É justamente o caso da Petrobrás, importadora líquida de gasolina e diesel — que vende por preço menor ao que paga lá fora. Duplo prejuízo.

“A solução trabalhada, não por encanto, seria permitir que a Petrobrás aumentasse o seu preço de venda, mas isso dá mais inflação, outro problema que permanece no horizonte. Aliás, o dólar caro espalha inflação por toda a economia, e não apenas nos combustíveis.

“Muita gente no governo acredita que a inflação também se irá sozinha, mas não o Banco Central, que está aumentando os juros para combatê-la. A questão é: até onde os juros precisam e podem subir?

“Sim, porque o outro problemaço é o baixo crescimento da economia — que continua no cenário mesmo depois do bom resultado do segundo trimestre. Os dados do terceiro já mostram forte desaceleração — e juros altos, ou seja, crédito mais caro para empresas e consumidores, certamente não ajudam qualquer recuperação.

“É verdade que, para esta recuperação, o governo conta com os leilões de privatização de rodovias, portos, aeroportos e ferrovias, ou concessões, na língua oficial, que provocariam uma onda de investimentos. Também é verdade que, aqui, o governo não está esperando que a solução caia do céu. Está empenhado em realizá-los.

“Mas parece que espera uma solução por encanto do maior problema que cerca esses leilões: o marco regulatório (ou a confusão regulatória) e a falta de confiança dos investidores no governo.

“O governo quer aqui uma combinação impossível: muitos investimentos privados, lucros limitados e tarifas baixas. Quando o pessoal reclama, o governo responde: confiem em nós que vai dar certo. Em termos mais práticos, o governo diz aos investidores: quem ganhar a concessão terá direito a ter o governo como sócio, via BNDES, outros bancos públicos e fundos de pensão de estatais. Mas reparem: essas associações terão que ser negociadas e fechadas depois do leilão. Ou seja, o investidor precisa acreditar que o embrulho regulatório e as confusões feitas pelo governo nas áreas de energia elétrica e combustíveis, por exemplo, serão sanados rapidamente por esse mesmo governo. E este, de sua parte, acha que os leilões vão resolver tudo.

“Tudo somado e subtraído, o governo espera que a Petrobrás se vire — e invista no pré-sal e nas refinarias — sem o reajuste dos combustíveis e sem a derrubada do dólar. Também espera que os juros altos, dos quais não gosta, contenham a inflação, sem segurar o crédito e o crescimento. Acredita ainda que o real desvalorizado ajuda a indústria e as exportações em geral, mas não gosta nem de pensar que derruba o poder aquisitivo dos salários pela alta da inflação. Acha que pode estimular e bancar investimentos em infra-estrutura, sem prejudicar o consumo e os gastos públicos.

“E assim vamos, quer dizer, esperamos.” (Carlos Alberto Sardenberg, O Globo, 5/9/2013.)

Problemas e erros na área da energia

* Com dois terços das obras em transmissão fora do prazo, país fica vulnerável a apagão

‘O apagão que afetou os nove estados do Nordeste anteontem (28/8) poderia ter sido apenas um blecaute localizado, segundo especialistas, se o governo tivesse realizado os investimentos necessários e uma gestão eficiente de transmissão de energia. Dados do próprio Comitê de Monitoramento do Setor Elétrico (CMSE, órgão que reúne os agentes públicos do setor), disponíveis em documento oficial, demonstram que 66% dos 25.595 quilômetros de linhas de transmissão em obras no país estão atrasados.

Já o valor de multas que a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) aplica às empresas de transmissão de energia por falhas na qualidade do serviço dobrou em dois anos, revelando uma piora na qualidade do setor. ‘Se os investimentos em transmissão fossem feitos e houvesse uma gestão eficiente, um incêndio no Piauí provocaria um problema localizado, não um apagão em todos os estados do Nordeste’, afirma Paulo Pedrosa, presidente da Associação Brasileira de Grandes Consumidores Industriais de Energia e de Consumidores Livres (Abrace).

“ O problema da transmissão foi confirmado em reunião realizada em julho pelo CMSE – com 41 autoridades de Eletrobras, Ministério de Minas e Energia (MME), Aneel, Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS), da Agência Nacional de Petróleo (ANP), entre outros órgãos. Segundo a ata do encontro, apenas 33% das obras de linhas de transmissão estavam em dia. No geral, o atraso médio é de um ano, segundo o documento. O comitê também apontou que 47% dos empreendimentos monitorados de subestações estavam em dia, com atraso médio de cinco meses. A ata mostra preocupação.

“‘A SEE/MME (Secretaria de Energia Elétrica do ministério) deverá apresentar ao CMSE o acompanhamento das ações que estão sendo realizadas para alcançar a meta de expansão dos empreendimentos de geração e transmissão definida no início de 2013, apontando os respectivos responsáveis’, diz o documento, que descreve também atrasos em 75% das obras de geração.

“ Paulo Pedrosa, da Abrace, diz que a transmissão é hoje um dos principais problemas energéticos do país, e cita o caso de parques eólicos prontos no Nordeste desde meados do ano passado, mas que não estão gerando energia simplesmente por falta de linhas de transmissão. A região é a que mais sofre com problemas energéticos. A previsão para o parque da Renova Energia, no sertão baiano, por exemplo, é que a interligação ao sistema ocorra em janeiro de 2014 – 18 meses depois da conclusão da geradora renovável, que têm capacidade instalada de 294 megawatts (MW).

Segundo o presidente da Abrace, grandes apagões como o do Nordeste geram ainda mais prejuízos à indústria nacional, que já não conta com energia a preços competitivos: ‘O problema na transmissão não afeta apenas a entrega da energia, ele encarece e retira competitividade de todo o sistema. O governo decidiu, por exemplo, reduzir o fluxo das linhas de transmissão de Itaipu para evitar novos problemas, e a solução para isso foi ligar termelétricas, que são mais caras.’

“Diretor do Ilumina, Roberto D’Avila ressalta que faltam investimentos tanto na transmissão quanto na geração de energia, e isso faz com que o sistema opere no limite.

“O impacto para os grandes consumidores é imenso. Um apagão na Bahia, em 2011, diz Pedrosa, causou prejuízos de R$ 200 milhões apenas no Pólo de Camaçari. Ele afirma que as grandes empresas são as mais prejudicadas, já que os consumidores residenciais podem ser indenizados em caso de prejuízos. ‘Temos que ter cuidado com as soluções que serão apresentadas. Vemos uma tentativa de ampliar investimentos que podem ser desnecessários se houver uma gestão mais eficiente da transmissão’, diz Pedrosa, lembrando que o custo, a engenharia e as dificuldades para se retomar o fornecimento de um grande apagão são maiores do que em blecautes localizados.

“Presidente do Instituto Acende Brasil, centro de pesquisas do setor elétrico, Cláudio Sales diz que é elevado o índice de atrasos nas obras, tanto de transmissão quanto de geração. Para o especialista, a opção por construir hidrelétricas cada vez mais distantes das regiões de consumo faz com que o sistema seja mais vulnerável a fenômenos da natureza.

“As multas aplicadas pela Aneel às empresas de transmissão por falta de qualidade também são um retrato do setor. As somas são calculadas com base em uma redução (Parcela Variável) ou um bônus (Adicional) no valor recebido pelas companhias, de acordo com o serviço prestado. Essa conta retirou das empresas, no período entre junho de 2012 e maio deste ano, R$ 57,8 milhões em multas, quase o dobro dos R$ 30,4 milhões entre junho de 2010 e maio de 2011. Apesar do incremento, o valor é pequeno se comparado ao faturamento do segmento, que gira em torno de R$ 12 bilhões.

“ Procurados pela reportagem, Aneel e o Ministério de Minas e Energia não comentaram os problemas na transmissão de energia elétrica no país. Segundo as assessorias desses órgãos, os técnicos estão envolvidos com o apagão de quarta-feira e não tiveram tempo para analisar as críticas.

“ Uma das razões apontadas por técnicos do setor para os atrasos nas obras de transmissão é a demora na obtenção das licenças ambientais. O prazo médio concedido para construir uma linha é de 22 meses, e o tempo médio que tem sido necessário para a obtenção da Licença de Instalação (que autoriza o início da construção), é de 19 meses.

“Em 2012, foram investidos R$ 19,3 bilhões em 2012 em geração. Em transmissão, foram R$ 6,62 bilhões. Para este ano, segundo a Eletrobras, a previsão é de investimentos de R$ 27,9 bilhões na geração, dos quais já foram realizados R$ 5,7 bilhões até abril. Na transmissão, são R$ 6,7 bilhões, dos quais R$ 1,51 bilhão já realizado. Para 2014, a projeção é de R$ 20 bilhões em geração e R$ 7 bilhões na transmissão.” (Ramona Ordoñez e Henrique Gomes Batista, O Globo, 30/8/2013.)

* Apagão provoca prejuízos de R$ 385 milhões no Nordeste

“O apagão da última quarta-feira (28/8), que deixou sem energia os nove estados nordestinos durante cinco horas, resultou em prejuízos de R$ 385 milhões, segundo estimativas de técnicos do governo. Uma das principais preocupações dos especialistas é que esse tipo de blecaute, que deveria ficar restrito a pequenas áreas, ou no máximo a um estado, tem se propagado por grandes regiões. Na avaliação desses técnicos, houve falha na coordenação do sistema, de responsabilidade do Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS).

“As linhas de transmissão que foram desligadas não são as mais importantes da região, mas a falha na coordenação teria feito com que a falta de energia se propagasse por todos os estados nordestinos. A fonte lembrou que este tipo de ocorrência vem se repetindo ao longo dos últimos anos, com problemas de pequena importância causando grandes apagões. Procurado, o ONS não quis se manifestar.

“Um dos primeiros eventos deste tipo foi em 2009, quando na noite de 10 de novembro faltou energia em 18 estados do Sudeste e do Centro-Oeste por mais de cinco horas. O ONS foi responsabilizado por falha na operação — que aumentou a demora para que o sistema fosse religado — e multado em R$ 1,1 milhão pela Agencia Nacional de Energia Elétrica (Aneel).

“Criado em 1998, o ONS tem a responsabilidade de coordenar, controlar e monitorar o setor de geração e transmissão das empresas públicas e privadas do país. Participam da gestão do Operador representantes do Ministério de Minas e Energia, das empresas (geradores e transmissores), dos conselho dos consumidores e dos comercializadores.

“O trabalho do ONS é fundamental porque o sistema nacional é interligado, o que traz vantagens e desvantagens. Quando sobra energia no Sul, por exemplo, cabe ao Operador decidir se ela pode ser enviada para outra região onde esteja faltando. Além disso, também é do ONS a responsabilidade de acompanhar, durante 24 horas por dia, se os equipamentos — usinas, linhas de transmissão, subestações — de todo o país estão funcionando.” (Mônica Tavares e Marta Beck, O Globo, 30/8/2013.)

* Nove grandes apagões em dois anos e oito meses. Não é coincidência, nem obra do acaso

“Nove grandes apagões de energia elétrica no atual governo não podem ser vistos como mera coincidência ou obra do acaso. O sistema interligado nacional de eletricidade tem muitos méritos, pelo fato de permitir a transferência de energia de uma região para outra, muito importante em um país com as dimensões continentais do Brasil, devido aos regimes hidrológicos diferenciados.

“Como a base do sistema é a geração de energia por hidrelétricas, em determinadas épocas do ano há excedente de água em alguns subsistemas enquanto falta em outros. A interligação permite, então, o uso racional dos excedentes, ainda mais que a expansão da capacidade das hidrelétricas não é mais feita com reservatórios de acumulação, mas sim com a vazão natural dos rios, por exigências ambientais.

“O sistema interligado chegou recentemente a Manaus e em futuro próximo estará em Macapá e em Boa Vista. Não haverá mais capital brasileira que dependa de um sistema isolado de eletricidade. A qualidade da eletricidade fornecida tende a melhorar nessas cidades.

“Mas, considerando-se as longas distâncias nas quais a energia é transmitida, tal sistema interligado passa a ser mais vulnerável a acidentes. Para que se possa reduzir os riscos, os subsistemas devem ter condições de se isolar por algum tempo, com apoio na geração local de energia, especialmente por usinas térmicas (até mesmo emergenciais). E dentro dos subsistemas, outros isolamentos deveriam estar também previstos.

“Tecnicamente isso é possível, e em diversas ocasiões os responsáveis pelo sistema interligado conseguiram fazer esse isolamento, quando os acidentes não foram tão relevantes para o conjunto do setor.

“No entanto, como se viu neste último apagão no Nordeste, em que praticamente todas as capitais da região ficaram sem energia por horas, basta que em um estado o subsistema se torne inoperante para que o resto entre em sobrecarga e se desligue, por precaução.

“O enorme transtorno e os prejuízos causados por esse tipo de apagão têm um custo bem superior aos investimentos necessários para se eliminar as vulnerabilidades do sistema interligado. Não é subtraindo esses investimentos na infra-estrutura que as autoridades governamentais, que ditam a política energética do país, vão conseguir assegurar tarifas mais baixas no fornecimento de eletricidade, como tem prometido a presidente Dilma.

“Tarifas módicas de energia elétrica não podem ser resultado de decisões que aumentem a vulnerabilidade técnica do setor ou que o impeçam de ser sustentável econômica e financeiramente com o passar do tempo, ainda mais em uma área que é preciso estar sempre com o visor voltado pra o futuro.” (Editorial, O Globo, 30/8/2013.)

* A então candidata Dilma Rousseff se vendeu como experiente ex-ministra de energia. E agora, devemos gargalhar?

“Os cerca de 20 mil habitantes de Canto do Buriti – município piauiense situado a cerca de 400 quilômetros de Teresina, a capital estadual – jamais poderiam imaginar que um evento aparentemente normal ali ocorrido fosse capaz de causar tanto estrago. Segundo as autoridades do setor elétrico, uma queimada numa fazenda de Canto do Buriti foi a causa do apagão que, na quarta-feira, deixou toda a Região Nordeste sem energia elétrica. O fornecimento começou a ser interrompido às 14h58 e só foi restabelecido para as capitais e principais municípios às 17h30. Mas cidades importantes, como Sobral, no Ceará, continuaram sem luz até a noite.

‘No fim do ano passado, período em que sucessivos apagões atingiram boa parte do País, afetando a vida de milhões de brasileiros, a presidente Dilma Rousseff, irritada com essas ocorrências, passou a exigir, com veemência ainda maior do que normalmente utiliza em suas cobranças, explicações e providências para evitar a repetição desses fatos. Entre irônica e irritada, chegou a dizer: ‘O dia em que falarem para vocês que caiu raio (e isso interrompeu a transmissão de energia), gargalhem. Raio cai todo dia nesse país, a toda hora. Raio não pode desligar o sistema’.

“Desta vez não foi raio, foi queimada. Devemos gargalhar?

“Certamente não têm motivos para rir os brasileiros que vivem nos nove Estados do Nordeste. Todas as capitais enfrentaram o caos no trânsito, por causa dos semáforos apagados; hospitais tiveram de acionar seus geradores para realizar os procedimentos de urgência; empresas industriais dispensaram seus funcionários antes do encerramento normal do expediente; lojas fecharam; escolas públicas e privadas, de todos os níveis, suspenderam as aulas. Bandidos aproveitaram a confusão para realizar arrastões.

“Faz dez meses que a região enfrentou problema semelhante. Na ocasião, o blecaute foi atribuído a um curto-circuito numa linha de transmissão entre Tocantins e Maranhão.

“Mas não são apenas os moradores do Nordeste que sofrem com interrupções do fornecimento de energia elétrica para regiões extensas. O problema ocorre em todo o País. Por isso, os brasileiros em geral não têm motivos para gargalhar. Têm, sim, para se preocupar com o estado em que se encontra o sistema elétrico brasileiro, que, no governo petista anterior, tinha como principal responsável a atual presidente da República.

“Não custa recordar que, quando candidata ao cargo que hoje ocupa, Dilma Rousseff não poucas vezes utilizou o fato de ter sido ministra de Minas e Energia no governo Lula para garantir aos eleitores que, se eleita, não haveria mais apagões como os que haviam ocorrido no governo tucano, e que ela tanto criticava. Só nos últimos quatro meses do ano passado, foram cinco grandes apagões, que retiraram do sistema mais de 800 megawatts. Desde o início de seu governo, já são pelo menos nove – sem contar interrupções menores.

“Em outubro de 2012, quando houve diversos blecautes, o então ministro de Minas e Energia, Márcio Zimmermann, hoje secretário executivo da Pasta, reconheceu que a sequência de interrupções no fornecimento de energia não era ‘normal’. É quase impossível instalar e manter um sistema inteiramente blindado e imune a acidentes que causem a interrupção na produção, transmissão e distribuição, por causa do altíssimo custo que teriam os equipamentos de proteção necessários para se alcançar esse nível de segurança. Mas o consumidor tem o direito de esperar dos responsáveis pelo setor elétrico um sistema minimamente confiável e menos vulnerável a eventos que, causem ou não gargalhadas, provocam seu colapso.

“Quatro apagões afetaram o Nordeste nos últimos 12 meses. É uma região naturalmente vulnerável. A seca e a falta de grandes rios tornam a região dependente de outras fontes ou de outras regiões produtoras. Mas a transmissão dessa energia, como mostra a frequência dos apagões, não alcançou o nível de segurança necessário. E isso não parece ser casual.” (Editorial, Estadão, 1º/9/2013.)

* “A gestão do setor elétrico brasileiro é confusa, errática, politizada e negligencia riscos”

“As térmicas terão que ser religadas, poucos meses depois do desligamento, o Tesouro Nacional autorizou a emissão de mais R$ 2 bilhões em títulos para financiar a redução da conta de luz e o secretário do Tesouro avisou que o gasto este ano será expressivo. Houve vários apagões com causas mal explicadas. O nível de água nos reservatórios continua o mais baixo dos últimos 10 anos nas principais regiões.

“A gestão do setor elétrico brasileiro é confusa, errática, politizada e negligencia riscos. No último evento que apagou parte do país, no caso o Nordeste, o governo disse que a causa foi o fogo num assentamento a 60 quilômetros da sede de Canto do Buriti, Piauí. Depois, disse que estava investigando. O que fica claro em todos os episódios é que o Brasil não tem um mecanismo de contingência para isolar o evento e impedir que o problema se espalhe. Um sistema interligado como o nosso precisa disso.

“Um ano depois da MP 579, que alterou às pressas o marco regulatório do setor elétrico e afugentou investidores, os remendos continuam. A redução da conta de luz anunciada em cadeia nacional pela presidente Dilma está sendo financiada com endividamento público. O Tesouro está emitindo títulos para cobrir o desequilíbrio deixado pela redução do preço da energia. A medida beneficia não só o consumidor doméstico. Os grandes consumidores tiveram uma redução ainda maior na conta. Mas a dívida será paga por todos.

“A redução do preço da energia foi uma boa notícia para reduzir a inflação e o custo empresarial, mas tinha que ter bases sólidas. Foi decretada quando houve um aumento do custo porque a escassez de água nos reservatórios obrigou o uso intenso das térmicas que produzem energia a um preço muito maior. Esse desequilíbrio entre preço em queda e custo em alta virou um rombo. Surgiu então a dúvida sobre quem pagaria a conta: consumidores, empresas ou governo.

“A primeira tentativa foi empurrar o custo para todas empresas do setor, o que faria até as geradoras de fontes mais limpas pagarem o custo extra de uma energia suja. As empresas foram à Justiça e o governo foi obrigado a recuar. Sobrou para o Tesouro, que agora está emitindo dívida para cobrir o rombo.

“O secretário do Tesouro Nacional, Arno Augustin, disse que o gasto com o financiamento desse rombo — que foi empurrado para dentro da CDE (Conta de Desenvolvimento Energético), que está cobrindo o uso das térmicas — será ‘expressivo’ este ano. No mercado, fala-se em R$ 9 bilhões. Em junho, já houve R$ 518 milhões em aportes, e em agosto, R$ 1,5 bilhão. O presidente do Instituto Acende Brasil, Cláudio Salles, avalia que esses déficits mensais mostram como o setor elétrico se tornou desequilibrado do ponto de vista financeiro. Há vários custos que estão sendo represados para não quebrar a promessa feita pela presidente de redução da conta de luz. ‘Esses aportes mostram que a MP do setor elétrico tomou o setor insustentável economicamente. Um ano depois, a insegurança regulatória continua alta, os investidores estão receosos. Os consumidores correm o risco de enfrentar vários aumentos daqui a alguns anos sem saber por que estarão pagando mais’, afirmou.

“Nos reservatórios, a situação ainda é de cautela. Passado o período das cheias, o nível de água já começou a cair. A região Sudeste/Centro-Oeste, que é a principal do país, chegou a atingir 63% do nível máximo dos reservatórios, em junho, mas ontem a medição da ONS apontava 54%. Desde janeiro, o nível de água é sempre o mais baixo para cada mês, nos últimos 10 anos. Isso aconteceu apesar das térmicas ligadas e do consumo atenuado pelo baixo crescimento da economia.” (Míriam Leitão, O Globo, 5/9/2013.)

A inflação

* Governo segura a laço preços administrados. A inflação vai estourar como enchente mais adiante

“Não é só a gasolina que tem seu reajuste engavetado no Ministério da Fazenda em nome do combate à inflação.

“O preço de cartas e telegramas também. O último reajuste dos Correios foi em junho de 2012.

“Estudo da economista Monica de Bolle mostra que os preços administrados cresceram apenas 1,3% nos últimos 12 meses. Já os preços livres subiram 8%.” (Ancelmo Gois, O Globo, 4/9/2013.)

* IPC da Fipe sobe 0,22% em agosto; previsão para setembro é de 0,42%

“O índice de Preços ao Consumidor (ÍPC), medido pela Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (Fipe) em São Paulo, fechou o mês de agosto com alta de 0,22%, após uma deflação de 0,13% em julho. E, para este mês, a projeção é de uma inflação ainda maior, de 0,42%,

“Segundo o coordenador do IPC, Rafael Costa Lima, a alta do índice neste mês deve ser influenciada principalmente pela pressão dos alimentos. Pelas estimativas de Costa Lima, o campo Alimentação, que teve deflação de 0,02% em agosto, deve retornar ao campo positivo nas próximas leituras e fechar setembro em 1,16%. O motivo dessa elevação, disse, devem ser as carnes, que poderão avançar no período por causa da sazonali-dade desfavorável ‘É que quanto mais os bois ficam confinados, mais o preço tende a encarecer’, disse.

“A queda apresentada no item Alimentação em agosto destoou bastante da proj eção de alta de 0,30% do economista. ‘Foi um movimento inesperado. O curioso é que a maioria das quedas está concentrada em alimentos. Alguns produtos que estavam subindo não avançaram tanto, enquanto algumas baixas surgiram’, disse. A taxa de 0,22% no IPC de agosto também ficou abaixo do esperado pela Fipe, que projetava 0,28%.

“Da lista das maiores contribuições negativas, que inclui 15 produtos, 11 são itens alimentícios, como feijão, cebola, açúcar, óleo de soja, linguiça, batata, tomate, alcatra, alface, chocolatee contrafilé. O feijão, que  teve queda de 10% em agosto,  aparece na liderança des sa lista,  com a maior variação pondera! da, de 0,04 ponto porcentual  Segundo Gosta Lima, o grupo Saúde, que subiu 0,83% em agosto, deve diminuir a intensidade  da alta e fechar setembro em  ,49%, com a redução dos repasses do reajuste dos planos de assistência médica.

“Para o fim do ano, a projeção para o IPC ainda está mantida  em 4,80%, mas Gosta Lima não  descarta alterar essa previsão para baixo. ‘A taxa acumulada em 12 meses até agosto (4,88%) está bem perto da nossa projeção. Em setembro do ano passado, tivemos uma. inflação alta (de 0,55%) por causa do choque  das commodities, o que não deve acontecer neste ano’ afirmou o economista.” (Maria Regina Silva, Estadão, 5/9/2013.)

O crescimento

* O PIB do segundo trimestre foi bem melhor do que o esperado. Mas o diagnóstico de Mantega é, no mínimo, precipitado

“A evolução do PIB no segundo trimestre deste ano foi surpreendente. Já se sabia que seria mais expressiva do que a dos trimestres anteriores, mas não que fosse tanta. O salto foi de 1,5%, quando o que estava nas projeções dos analistas não era muito mais do que 0,9%.

“Pode-se objetar que esse crescimento está prejudicado pela base achatada de comparação, que foi o baixo desempenho do PIB nos trimestres anteriores. Mas, ainda assim, foi uma recuperação forte.

“O que já se sabe é que o terceiro trimestre deste ano deverá apresentar um comportamento oposto a este. Deverá voltar a acusar um resultado medíocre ou até negativo. É um desempenho aos solavancos, que reflete as atuais distorções da economia. É por isso que o desempenho líquido do PIB de 2013 em relação ao do ano anterior não deverá ser melhor do que o projetado, coisa aí provavelmente algo em torno dos 2,2% (…).

“As Contas Nacionais podem ser vistas a partir de dois ângulos: o da oferta (produção) e o da demanda (consumo). Na área da oferta, já se esperava que a agropecuária apresentasse bom resultado. No entanto, desta vez, também foi o grande destaque: crescimento no trimestre (sobre o anterior) de 3,9%, substancialmente maior do que o crescimento do PIB (1,5%). É, no momento, o setor mais ativo da economia, embora tenha peso limitado no total produzido, pouco mais de 5%.

“O resultado da indústria de transformação não foi exuberante, como se sabe, no entanto se notabilizou por ter ido bem melhor do que estava nas estimativas, avanço de 1,7%. Desta vez, o setor de serviços, o que mais pesa na economia (68,5%), teve um comportamento mais modesto, de apenas 0,8% sobre o trimestre anterior.

“Do lado da demanda, são três os destaques, nem todos positivos. O consumo das famílias, por exemplo, repetiu no segundo trimestre os sinais de esgotamento manifestados no trimestre anterior: cresceu apenas 0,3%. Está sendo castigado pela inflação que corrói o poder aquisitivo e pelo excessivo endividamento que, por sua vez, é consequência da maior agressividade das operações de crédito pelos bancos. Mesmo assim, o alto nível da ocupação e os bons reajustes salariais garantem alta participação do consumo das famílias no PIB (62%).

“Pelo terceiro trimestre consecutivo, o investimento (Formação Bruta de Capital Fixo) vem apresentando desempenho melhor do que o PIB. Apesar disso, sua participação é baixa (apenas 18,6%) a ponto de não fazer muita diferença. As exportações, essas sim, apontaram avanço relevante na renda: 6,9%.

“O ministro da Fazenda, Guido Mantega, tem motivos para festejar, mas seu diagnóstico, de que o desempenho da economia já é bem melhor em consequência dos ajustes decididos pelo governo, é, no mínimo, precipitado. Fosse isso mesmo, os próximos trimestres também estariam fadados ao sucesso. Tanto os analistas como o governo já sabem que não é bem assim.” (Celso Ming, Estadão, 31/8/2013.)

* Produção industrial tem queda de 2% em julho

“Com queda acima da esperada pelo mercado, a produção industrial brasileira recuou 2% em julho, frente a junho, segundo o IBGE. Em relação a julho de 2012, a alta foi de 2%. Com isso, o indicador acumula crescimento de 2% no ano e 0,6% nos últimos 12 meses.

O resultado praticamente eliminou a expansão de 2,1% de junho e confirmou o ‘ano gangorra’ do setor. Depois do resultado, consultorias reduziram projeções para produção industrial no ano e para o Produto Interno Bruto (PIB, soma dos bens e riquezas produzidos no país) em 2013.

A queda na atividade, segundo André Luiz Macedo, gerente da Coordenação da Indústria do IBGE, foi disseminada e a média móvel trimestral — usada para apontar tendências — recuou 0,7% entre maio a julho frente ao período anterior, a primeira queda nessa comparação desde dezembro. ‘A produção industrial em julho ainda está 3,6% inferior ao registrado em maio de 2011, ápice da produção. Com este resultado, estamos operando no mesmo patamar do início de 2010’, afirma Macedo.

‘O que nos parece que justifica esta queda e a alta volatilidade do ano é o baixo nível de confiança dos empresários, nível de estoque acima da média em alguns setores, a situação das famílias, seja com inadimplência, restrição ao crédito ou comprometimento da renda, incertezas internacionais e, um pouco, inflação.’

Mais uma vez, a produção industrial brasileira se comporta como uma gangorra no ano: alta em quatro meses e queda em outros três.

A queda setorial que mais afetou a indústria foi a redução de 5,4% na produção de veículos automotores em julho, frente a junho. No mês anterior, o segmento teve alta de 1,8%. O recuo na indústria, no entanto, está muito disseminado, disse Macedo, tanto por categorias de uso (bens de capital, intermediários e de consumo) quanto por setores industriais, com 15 dos 27 setores em queda e 11 em estabilidade. Somente o setor de refino de petróleo e álcool aumentou a produção.

Na comparação com junho, a produção de bens de capital (máquinas e equipamentos) recuou 3,3%, a de bens intermediários (insumos para indústria) caiu 0,7% e a de bens de consumo retraiu 2,6%. O setor de bens intermediários apresenta três meses de queda seguida frente ao mês anterior, com redução acumulada de 1,8% no período. O setor tem o maior peso no indicador e representa 55% da indústria. ‘A desaceleração de bens de capital foi maior do que se esperava. Diante dos estoques e das expectativas ruins da indústria, isso continua nos próximos meses, e teremos queda da indústria no terceiro trimestre’, afírma Thovan Tucakov, economista da LCA Consultores.

A consultoria reviu de 2,3% para 2% a estimativa de alta da produção industrial em 2013.0 quadro ruim da indústria também motivou piora da projeção do Itaú Unibanco para o PIB no terceiro trimestre, de estabilidade para queda de 0,5% frente ao segundo trimestre. Para 2013, no entanto, a estimativa subiu de 2,1% para 2,3%.

Para o Barclays, a queda confirma a desaceleração da economia no terceiro trimestre. Já a Rosenberg & Associados espera comportamento errático da indústria nos próximos meses.” (Henrique Gomes Batista, Lucianne Carneiro e Marta Beck, O Globo, 4/9/2013.)

As trapalhadas na Saúde

* Prefeituras vão demitir médicos para receber equipes do governo

“Para aliviar as contas dos municípios, médicos contratados por diferentes prefeituras no país serão trocados por profissionais do Mais Médicos, programa do governo Dilma Rousseff (PT) para levar estrangeiros e brasileiros para atendimento de saúde no interior e nas periferias.

“Na prática, a medida anunciada à Folha por prefeitos e secretários de saúde pode ameaçar a principal bandeira do plano: a redução da carência de médicos nesses lugares.

“A reportagem identificou 11 cidades, de quatro Estados, que pretendem fazer demissões para receber as equipes do governo federal. Segundo as prefeituras, essa substituição significa economia, já que a bolsa de R$ 10 mil do Mais Médicos é totalmente custeada pela União.

“O plano de Dilma foi lançado em julho e provocou polêmica na classe médica principalmente devido à vinda de estrangeiros –incluindo 4.000 cubanos, que devem ser deslocados para 701 cidades que não despertaram interesse de ninguém na primeira fase do Mais Médicos.

“Outro atrativo alegado por prefeituras para a troca de equipes é a fixação desse novo médico no município por um período mínimo de três anos. Prefeitos reclamam da alta rotatividade dos médicos, que não se adaptam à falta de estrutura nessas localidades.

“As cidades que já falam em trocar suas equipes estão no Amazonas (Coari, Lábrea e Anamã), Bahia (Sapeaçu, Jeremoabo, Nova Soure e Santa Bárbara –de acordo com a cooperativa Coofsaúde), Ceará (Barbalha, Cascavel, Canindé) e Pernambuco (Camaragibe).

“Hoje, as prefeituras recebem da União cerca de R$ 10 mil por equipe no programa Saúde da Família. Complementos de salários e encargos, porém, são pagos com recursos de cada cidade.” (Lucas Reis, Aguirre Talento, Nelson Barros Neto e Daniel Carvalho, Folha de S. Paulo, 30/8/2013.)

* Governo reage ameaçando punir prefeitura que demitir médico

“O ministro da Saúde, Alexandre Padilha, disse ontem (30/8), pelo Twitter, que as regras do Mais Médicos impedem que os municípios beneficiados troquem médicos já contratados por profissionais do programa do governo federal. Em nota, o ministério informou que a proibição consta no termo de adesão e compromisso e da portaria interministerial do programa. Ontem, a Folha de S.Paulo informou que em pelo menos onze cidades de quatro estados (Amazonas, Bahia, Ceará e Pernambuco), médicos estão sendo demitidos, para dar lugar aos profissionais do Mais Médicos.

Em Recife, o Secretário de Gestão do Trabalho e Educação na Saúde do Ministério da Saúde, Mozart Sales, informou que serão desligados do programa todos os municípios que demitirem seus profissionais para substituir pelos enviados pelo governo federal: ‘Seremos muito rigorosos. Vamos alertar sobre esse impedimento. Os que insistirem serão visitados pela coordenação estadual do programa. Se observada essa prática, os médicos serão remanejados, e os municípios, excluídos do programa’, disse. ‘A substituição pura e simples de um profissional por outro, até a título de redução de despesa, é inadmissível.

“- Regras do Mais Médicos impedem simples troca de médicos pelos municípios, mas, por outro lado, vai reforçar que todos cumpram a carga horária. Com médico, de segunda a sexta-feira, presente na Unidade de Saúde, com supervisão pela Universidade, quem ganha é o atendimento ao povo’, escreveu o ministro em seu microblog.

“Um dos demitidos foi Luccas Salomão, que trabalhava numa unidade do Programa Saúde da Família (PSF) em São Gabriel da Cachoeira (AM) e de Junice Maria Moreira, clínica geral em Sapeaçu (BA). Os salários de médicos que se dispõem a trabalhar nos rincões do país podem chegar a mais de R$ 20 mil por mês. Já um bolsista do programa Mais Médicos, que receberá R$ 10 mil mensais do governo federal, custará aos municípios apenas o valor necessário para garantir sua moradia e sua alimentação.

Com os profissionais dispensados, a chegada de novos médicos representaria uma economia para as administrações municipais . ‘Poucos dias antes de me demitir, o secretário de Saúde comentou que havia pedido 11 médicos ao governo federal. Eles precisam de médicos, só não querem pagar’, afirmou Luccas, que recebia R$ 6 mil por mês.

“Uma das cidades que demitiria os médicos de seus quadros, por causa da vinda dos funcionários pelo programa federal, é o município de Coari (AM). Segundo o secretário municipal de Saúde, Ricardo Santos, as demissões foram cogitadas . — antes de saberem que essa prática é proibida pelo governo federal — para redirecionar os recursos com os médicos para investimento em outros setores que são carentes no município. ‘Usaríamos o recurso em outras áreas, mas isso só ocorreria se viesse uma quantidade grande de médicos pelo programa. Não é o caso, devem vir dois ou um, em um universo de 50 que são funcionários do município. Quando soubemos que não poderíamos fazer o desligamento, excluímos essa opção’, afirmou o secretário.

Segundo o Ministério da Saúde, enquanto participarem do Mais Médicos, os municípios só poderão desligar médicos da Atenção Básica em situações excepcionais. Esses desligamentos precisarão ser justificadas à coordenação nacional do programa, listando-se as razões que levaram à decisão — como, por exemplo, descumprimento comprovado de carga horária e/ou outra falha ética ou profissional.” (Barbara Marcolini, Letícia Lins e Raphael Oliveira, O Globo, 31/8/2013.)

* Faltou planejamento e sobrou sofreguidão, o que é lamentável

“As últimas notícias sobre o programa Mais Médicos indicam que o que sobrou em preparo – infelizmente não no bom sentido – no que se refere à vinda dos médicos cubanos, faltou em cuidado sobre as consequências, para os profissionais brasileiros, da entrada deles no mercado de trabalho. Fica claro que houve ao mesmo tempo muita sofreguidão e pouco planejamento, o que é lamentável em programa tão ambicioso e voltado para uma das áreas mais sensíveis da administração, que é a saúde pública.

“Provavelmente já prevendo reações contrárias à sua idéia – por existirem sérias dúvidas seja com relação à real necessidade desses profissionais, seja com relação à sua qualificação, já que não passariam pelo exame de revalidação do diploma -, o governo federal tratou do caso dos médicos cubanos em surdina, omitindo informações importantes a respeito, que agora começam a vir à tona. Reportagem do Estado mostra que a vinda desses médicos estava sendo providenciada há pelo menos seis meses, bem antes, portanto, de o governo anunciar o seu plano.

“Professores brasileiros com material didático do que seria depois o Mais Médicos viajaram para Cuba, mesmo sem a existência formal de um acordo, para transmitir aos médicos noções básicas sobre o sistema público de saúde brasileiro e de língua portuguesa. É o que atestam depoimentos de médicos integrantes do primeiro grupo que aqui chegou. ‘Agora é só revisão. Boa parte do conteúdo aprendemos lá’, disse um deles, acrescentando que havia conhecido em Cuba um dos professores que estão ministrando os cursos de três semanas, que devem seguir antes de começar a clinicar.

“Três colegas seus, expressando-se em português razoável, confirmam que o preparo para a vinda ao Brasil começou há vários meses. Receberam também informações sobre as regiões em que devem trabalhar, como disse um que vai para a Amazônia.

“Tudo isso confirma que esse preparo começou antes do primeiro anúncio da intenção do governo de trazer médicos cubanos, para atuar em regiões pobres do interior e na periferia das grandes cidades, feito em maio pelo então chanceler Antônio Patriota. Inicialmente o número previsto era de 6 mil. Diante da reação negativa das entidades representativas dos médicos brasileiros, o governo prometeu fazer mudanças no plano, lançado oficialmente no início de julho, agora com a promessa de preferência para os profissionais formados no País e com um número mais reduzido de cubanos – 4 mil.

“O acordo com a Organização Pan-Americana da Saúde (Opas), que faz a intermediação entre Brasil e Cuba, foi formalizado em meados da semana passada. E, para surpresa geral, apenas três dias depois 400 dos 4 mil médicos cubanos desembarcaram no País. Surpresa que agora se explica.

“O governo não tem o direito de tratar dessa forma, com esse jogo de esconde-esconde, a população e as entidades médicas. Ele transmite assim uma desagradável impressão de esperteza. Um comportamento inaceitável em autoridades públicas. E não convence a explicação do Ministério da Saúde, segundo o qual a presença dos professores brasileiros em Cuba faz parte de projeto de intercâmbio entre os dois países – os primeiros dariam aulas sobre o funcionamento do SUS e os cubanos, em troca, repassariam seus conhecimentos sobre atenção básica.

“Como se toda essa trapalhada – para dizer o mínimo – não bastasse, o programa já começa a ter consequências negativas. Reportagem do jornal Folha de S.Paulo mostra que prefeituras das Regiões Norte e Nordeste estão trocando profissionais contratados por elas por outros do Mais Médicos, principalmente cubanos. Por uma razão muito simples: os primeiros são pagos por elas (os salários podem chegar a R$ 35 mil) e os cubanos, pelo governo federal. A vantagem da troca é muito grande.

“A única explicação para o Ministério da Saúde não ter percebido que o programa tinha esse risco evidente, e não ter tomado medidas para evitá-lo, só podem ser a pressa e a improvisação.” (Editorial, Estadão, 1º/9/2013.)

* Governo transforma o Mais Médicos em campanha eleitoral. As questões importantes da saúde continuam desatendidas

“Talvez pelo clima de campanha eleitoral antecipada, pelas implicações do tema e interesses que afeta, o programa Mais Médicos deflagra diversos tipos de reação. Há as corporativistas, diante da intenção compreensível do governo de importar médicos; existem também comportamentos inadequados de fundo ideológico e até racista, diante da imigração de cubanos, mas numa operação de fato executada de maneira no mínimo polêmica — e, enquanto isso, a questão de fundo da saúde pública tende a ficar em segundo plano.

“De algo não há dúvidas: faltam médicos no Brasil. A proporção de profissionais em relação à população é de 1,8 por grupo de mil habitantes, contra, por exemplo, 2,4 nos Estados Unidos, cujo mercado é mais aberto a estrangeiros que o do Brasil. Se o número absoluto de profissionais já é baixo, como há uma natural concentração de médicos e outros especialistas nos centros maiores, nas cidades menores e mesmo na periferia dos grandes núcleos urbanos há falta grave de atendimento a doentes e acidentados.

“Num primeiro momento, o viés intervencionista do Planalto contrabandeou para o Mais Médicos a obrigatoriedade de um período de residência no SUS, mesmo para formandos em escolas privadas. Por ser um absurdo, voltou-se atrás, e os esforços passaram a ser dirigidos ao alistamento de 10 mil médicos para as cidades inscritas no programa, em troca da remuneração de R$ 10 mil mensais, por 40 horas semanais. A adesão foi baixa — no final, pouco menos de 2 mil brasileiros e 383 estrangeiros. Deflagrou-se, então, a importação de cubanos. Na verdade, ficou evidente que a operação já transcorria há algum tempo, conduzida por meio dos canais desobstruídos que existem entre Brasília e Havana, pois os 4 mil cubanos começaram a desembarcar em pouco tempo.

“O importante é que a meta de 10 mil médicos ter ficado longe de ser atingida não pode justificar a vinda de médicos, de onde for, de qualquer jeito, sob regras que agridem o próprio entendimento de justiça social que tem o governo, por meio de contratos de trabalho leoninos. Os 4 mil profissionais não receberão diretamente os salários, pagos à Organização Pan-americana de Saúde (Opas), uma espécie de ‘gato’ dos médicos agenciados. O dinheiro, então, é transferido à ditadura cubana, que paga os médicos o que bem entender. São boias frias da medicina.

“Resultado: com o álibi da falta de médicos, aceitou-se um esquema para transferir dinheiro a Fidel, com a exploração vil de profissionais cubanos, cujo conhecimento será testado de maneira não muito clara. Em cidades — e são centenas — em que não existe sequer um médico, contar com um profissional convocado pelo programa oficial pode ser algum avanço. Mas não resolve a questão mais ampla da saúde pública.

“A imigração de médicos faz sentido. Mas precisa ser feita de forma séria. Também não basta soltar profissionais no meio do mapa sem qualquer apoio especial do SUS.” (Editorial, O Globo, 4/9/2013.)

Irregularidades (para dizer o menos)

* Licitação sob suspeita: TCU suspende compra de cisternas que pode ter favorecido empresa em cidade do ministro da Integração Nacional

“O Tribunal de Contas da União (TCU) investiga suspeita de irregularidades em licitação para a compra de 187,5 mil cisternas de plástico a um custo de quase R$ 600 milhões — uma das maiores em curso no governo federal. De acordo com a suspeita do TCU, a concorrência pode ter favorecido uma multinacional que acaba de abrir fábrica em Petrolina (PE), cidade do ministro da Integração Nacional, Fernando Bezerra Coelho.

O pregão para a escolha das empresas que vão fornecer as cisternas em seis estados é conduzido pela Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba (Codevasf), empresa vinculada ao Ministério da Integração Nacional. No mês passado, uma medida cautelar do TCU mandou suspender o pregão e apontou o risco de ‘grave lesão ao Erário’ se as empresas vencedoras fossem contratadas pela Codevasf.

Entre os participantes está o grupo mexicano Rotoplas, cuja razão social em território nacional é Dalka do Brasil (o nome fantasia é Acqualimp). A empresa já é a maior fornecedora do Água para Todos, programa-chave da gestão do ministro Bezerra e que pretende universalizar o acesso à água no semiárido.

Assim que começou a ganhar os principais contratos para fabricar cisternas, a Acqualimp abriu unidade em Petrolina. A medida cautelar do TCU não impediu que a empresa começasse a fornecer as primeiras cisternas ao Ministério da Integração, como parte da licitação posta sob suspeita.

A Codevasf já foi presidida por Clementino de Souza Coelho, que é irmão do ministro e chegou ao posto poucos dias após a posse de Bezerra, em janeiro de 2011. A presidente Dilma Rousseff demitiu Clementino um ano depois, por suspeita de direcionamento de políticas do órgão para a base eleitoral da família.

Um edital para o fornecimento de cisternas de plástico pela mesma Acqualimp, assinado por Clementino, direcionou a maior parte dos equipa- mentos para a região de Petrolina, apesar de Pernambuco ser apenas o terceiro estado em demanda por cisternas, conforme diagnóstico do próprio governo. O deputado federal Fernando Coelho Filho (PSB-PE), filho do ministro, disputou e perdeu a eleição para prefeito de Petrolina em 2012.

Para se ter uma idéia do tamanho dessa nova licitação, o número de cisternas a serem fomecidas é o triplo da quantidade já instalada pelo ministério desde 2011, ano em que Bezerra chegou ao cargo. Até agora, a Codevasf instalou 62, 1 mil equipamentos, a maioria em Pernambuco. Nos três novos lotes, as outras 187,5 mil cisternas devem ser distribuídas por Alagoas, Minas Gerais, Bahia, Piauí, Ceará e Goiás.

O custo individual do equipamento é de R$ 5,9 mil, o que Inclui cisterna de polietileno de 16 mil litros para captar água da chuva; bomba d’água manual; e obras de instalação. O custo dos reservatórios de plástico chega a ser duas vezes o de cistemas de cimento, construídas pelas comunidades locais.” (Vinicius Sassine, O Globo, 31/8/2013.)

* PT omitiu repasses de Marcos Valério, o operador do mensalão, a Freud Godoy, que era segurança de Lula

“O cheque de R$ 98,5 mil não foi o único repasse feito com a ajuda de Marcos Valério a Freud Godoy, ex-segurança do ex-presidente Lula, em 2003. Pelo menos outros R$ 39,3 mil, que tiveram como origem o empréstimo do banco BMG ao PT, foram depositados na conta da Copes Serviços de Vigilância, empresa de Freud Godoy, numa agência do banco Santander em São Bernardo do Campo (SP). O repasse consta de laudo da Polícia Federal e foi omitido pelo PT na prestação de contas de 2003 apresentada ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE).

“Na prestação de contas entregue à Justiça, constam 19 pagamentos que somam R$ 238.709,50 a outras duas empresas de Freud, a Caso Comércio Ltda e a Caso Sistemas de Segurança Ltda. No entanto, os repasses feitos à Copes, terceira empresa do ex-segurança de Lula, não foram declarados pelo partido. Em depoimento à Procuradoria Geral da República, em setembro do ano passado, Marcos Valério, operador do esquema do mensalão, atribuiu a Freud o papel de intermediar o recebimento de valores que tinham como objetivo pagar contas pessoais de Lula. O ex-presidente e o ex-segurança negam esta versão.

“O repasse de R$ 98,5 mil, mencionado por Valério em depoimento, foi feito em cheque nominal à Caso Comércio, em janeiro de 2003. No entanto, o cheque foi endossado pela mulher e sócia de Freud, Simone Godoy, e depositado em conta na antiga agência do Banespa, atualmente Santander, em São Bernardo do Campo, que O Globo apurou pertencer à Copes. O pagamento é investigado em inquérito da Polícia Federal que tramita em Brasília.

“Em 6 de março de 2003, a mesma conta recebeu um repasse de R$ 29.388. Vinte dias depois, um segundo pagamento foi realizado, no valor de R$ 10 mil. Segundo o Laudo 1450/2007 da Polícia Federal, que consta dos autos da Ação Penal 470, do mensalão, os dois pagamentos foram feitos em cheque e tiveram como origem o empréstimo de R$ 2,4 milhões do BMG ao PT, que teve Marcos Valério como avalista.

“Como a análise da PF ficou restrita ao destino dos recursos emprestados pelo BMG, não foi verificado se outras contas do partido abasteceram a empresa Copes.

“Freud Godoy registrou a Copes em novembro de 1993 no 3º Cartório de Registro Civil de Pessoas Jurídicas de São Paulo, com o objetivo de prestar ‘serviços de vigilância não armada em prédios de apartamentos, residências, escritórios, empresas em geral e sindicatos’.

“Três anos depois, a mulher de Freud, Simone, passou a figurar como sócia. Atualmente, a empresa está cadastrada na Receita Federal como especializada em ‘atividades de investigação particular’. Na última alteração contratual em cartório, ocorrida em 2010, no entanto, consta o registro da empresa como prestadora de ‘serviços em geral de vigia de portaria’.

“Desde a sua criação, a Copes mantém o mesmo endereço de funcionamento, uma casa na Avenida Edgar Ruzzant 155, no Bairro Jardim Brasil, em São Paulo. No endereço mora a irmã de Freud, Andréa Godoy Herrera, de 47 anos, e o marido dela. Um homem, que não quis se identificar, atendeu O Globo na última quinta-feira (29/8). Ao ser perguntado se, naquele endereço, funcionava uma empresa de segurança, não quis responder e fechou a porta.

“A Copes é citada por Freud em depoimento prestado em junho de 2010 à CPI da Bancoop, na Assembleia de São Paulo (Alesp). Na ocasião, o petista afirmou que a empresa servia ao Sindicato dos Bancários e a campanhas do PT desde o início dos anos 1990, mesmo sem estar regulamentada para prestar serviços de segurança privada. ‘Está inativa há mais de dez anos’, disse Freud à CPI, ignorando os pagamentos recebidos em 2003, sete anos antes da sessão na Alesp.

“Na última sexta-feira (30/8), O Globo perguntou a Freud que serviços a Copes prestara ao partido. Por escrito, ele respondeu: ‘A Copes nunca prestou serviços ao PT, está desativada desde 1996’. Indagado por que a empresa recebera sem ter prestado os serviços, disse: ‘Eu não lembro, para mim tinha sido depositado na conta de minha mulher’. Freud acrescentou que apenas usara a conta da Copes para receber recursos destinados a suas outras empresas, e que não prestou serviços por meio dela. Ele negou que dinheiro depositado na conta tenha sido usado para pagar despesas de Lula.” (Thiago Herdy, O Globo, 1º/9/2013.)

* Grupo desviou R$ 18 milhões do Ministério do Trabalho, diz Polícia Federal

“A Polícia Federal prendeu ontem (3/9) sete gestores da ONG Centro de Atendimento ao Trabalhador (Ceat) – inclusive um padre e a presidente da entidade, Jorgette Maria Oliveira – e um assessor do Ministério do Trabalho, Gleide Santos Costa, lotado na Secretaria de Políticas Públicas de Emprego da pasta, capturado em flagrante por corrupção. Em poder de Costa, os federais encontraram R$ 30 mil em dinheiro que ele teria recebido de propina para facilitar aditamento a um convênio com o ministério. Nas contas da PF, o convênio garantiu ao Ceat, desde 2009, um repasse total de R$ 47,5 milhões – dos quais pelo menos R$ 18 milhões teriam sido desviados.

“A manobra era feita por meio de contratos fraudulentos com oito empresas prestadoras de serviços cujos sócios fazem parte do quadro de gestores da ONG.

“A Operação Pronto Emprego da PF mobilizou 150 agentes federais e auditores do Tribunal de Contas da União, que fizeram buscas em 38 endereços em São Paulo, Rio e Brasília – até nos gabinetes de Costa e de um outro assessor na sede do ministério. Foram apreendidos documentos, arquivos de computador e cópias de contratos e convênios com entidades.

“Costa foi detido às 6 horas em um hotel na Avenida São Luís, centro da capital paulista. A PF vasculhou o quarto do assessor. O dinheiro estava distribuído, parte no bolso interno do paletó preto, outra na carteira, mais um tanto em um estojo, outra quantia enrolada em elástico. Os federais o seguiram desde que desembarcou na tarde de segunda-feira em Congonhas, procedente de Brasília – a viagem foi paga com recursos do ministério, segundo a PF, sob alegação de que ele estaria em missão oficial.

“Costa chegou a São Paulo e, em um carro que a ONG colocou à sua disposição, dirigiu-se à sede do Ceat, um sobrado na Vila Mariana, onde encontrou-se com os executivos da entidade, sob coordenação de Jorgette, que foi filiada ao PDT por 13 anos, até 2009.

“O Ministério do Trabalho é reduto histórico do PDT desde o governo Lula. O atual ministro, Manoel Dias, é secretário-geral do PDT. A pasta foi dirigido por Carlos Lupi que, para assumir o cargo, deixou a presidência do partido, em 2007. Caiu 4 anos depois, em dezembro de 2011, já no governo Dilma Rousseff, em meio a denúncias, inclusive sobre esquema de propinas de ONGs e também sobre uso de avião alugado por dirigente de uma entidade.

“A PF afirma que não encontrou elos do Ceat com partidos políticos. A investigação, iniciada em janeiro, aponta para enriquecimento ilícito de Jorgette e seus parceiros. Com o dinheiro do Tesouro eles estavam concluindo a instalação de lojas de produtos importados da China na Rua 25 de Março, maior reduto do comércio popular do País.

“Sob comando dos delegados Rodrigo Sanfurgo e Alberto Ferreira Neto, da Delegacia de Combate a Ilícitos Financeiros da PF em São Paulo, a investigação mostra que o dinheiro transitava por um longo ciclo de lavagem de dinheiro – desde a concessão do ministério, passando pelo direcionamento de contratações de empresas de áreas diversas, como limpeza, segurança e até publicidade, inexecução de contratos e simulações de prestação de serviços. A etapa final da fraude consistia na reinserção dos valores no sistema econômico.” (Fausto Macedo, Estadão, 4/9/2013.)

O escabroso empréstimo ao ministro

* Assessoria não detalha ganhos do ministro do STF; para pagar prestações do empréstimo, Toffoli compromete 92% do salário

“O ministro José Antonio Dias Toffoli não detalhou ontem (29/8) seus ganhos extra-salário do Supremo Tribunal Federal que seriam usados, segundo ele, para pagar prestações de dois empréstimos com o Banco Mercantil do Brasil que, juntos, somam R$ 1,4 milhão.

“Em resposta a uma nova consulta feita pelo Estado, a assessoria de Toffoli disse, em nota oficial, que ‘os rendimentos, recursos e o patrimônio do ministro são aqueles anualmente declarados à Receita Federal, em seu Imposto de Renda’.

“As parcelas mensais dos empréstimos, de R$ 16,7 mil, comprometem cerca de 92% dos ganhos líquidos de Toffoli no STF, de R$ 18,2 mil em julho.

“Segundo o gabinete do ministro, seus rendimentos ‘não se resumem aos vencimentos no STF’. O gabinete não diz quais são os outras fontes de renda.

“Toffoli é relator no Supremo de processos do Mercantil, que lhe concedeu os dois empréstimos em 2011. O primeiro, de R$ 931 mil, previa inicialmente pagamento em 180 parcelas de R$ 13,8 mil mensais; já o segundo, de R$ 463,1 mil, em 204 prestações de R$ 6,6 mil.

“Na época em que as operações foram contratadas, a soma das parcelas superava o salário líquido de Toffoli (cerca de R$ 17,5 mil). Em abril deste ano, após decisões do ministro nos processos, o banco reduziu os juros dos empréstimos de 1,35% ao mês 1% ao mês, o que reduziu as prestações para R$ 16,7 mil mensais.

“O corte das taxas, considerado atípico até por um dos representantes do Mercantil, assegurou uma economia de R$ 636 mil no total a ser pago. A soma das prestações alcança R$ 3,21 milhões.

“Segundo o Código do Processo Civil e o Regimento do Supremo, cabe arguir a suspeição do magistrado, por parcialidade, quando alguma das partes do processo seja sua credora.

“O ministro relata casos do banco desde 2009, mas, mesmo com os empréstimos, não viu motivos para se afastar. Nesta quinta-feira, ele deixou o Supremo sem dar entrevistas. ‘Não sei se é conflito de interesse na prática. Se existe isso, não existe maldade’, afirmou ontem (29/8) o diretor executivo do Mercantil, Paulo Henrique Brant de Araújo.

“Segundo ele, os empréstimos ‘não têm nada a ver’ com os interesses do banco no Supremo, tampouco a redução das taxas. ‘Não é a primeira pessoa para a qual o banco poderia emprestar e que tem um cargo público. Não existe esse tipo de restrição. Se houvesse, o próprio ministro deveria se manifestar.’

“O diretor não quis analisar o caso específico de Toffoli, devido ao sigilo bancário da operação, mas observou que um ‘bom pagador’, com garantia segura, merece ‘condições boas, não atípicas’. ‘Não necessariamente, o banco tem a obrigação de cobrar 4% ao mês.’

“O Estado consultou dois gerentes da agência do Mercantil em Brasília, que ofereceram, para cliente VIP do banco, nas mesmas condições financeiras do ministro, empréstimos de no máximo quatro anos e taxas entre 3% e 4% ao mês.” (Fábio Fabrini e Andreza Matais, Estadão, 30/8/2013.)

* Em obediência à lei, Dias Toffoli deveria ter-se anunciado suspeito para atuar nas ações do banco que emprestou a ele R$ 1,4 milhão

“Durante os 12 meses em que a Ação Penal 470 tramita em fase final no Supremo Tribunal Federal (STF), não faltou quem suspeitasse que as notórias ligações do ministro José Antonio Dias Toffoli com o Partido dos Trabalhadores (PT) e com o réu José Dirceu, de quem foi subordinado na Casa Civil da Presidência, estariam em alguma medida influenciando seus votos que frequentemente beneficiaram os envolvidos no escândalo do mensalão. Essa é uma suposição que qualquer um tem o direito de fazer e vale apenas como tal: uma suposição.

“Agora, porém, Dias Toffoli se vê envolvido em uma encrenca que pode dar margem a novas suposições, mas desta vez caracterizando clara e concretamente infração ética e legal. O ministro é devedor do Banco Mercantil do Brasil (BMB), que lhe concedeu dois empréstimos vultosos em condições, no mínimo, generosas. Simultaneamente, Dias Toffoli, como magistrado, é relator de duas ações judiciais de interesse da mesma instituição financeira.

“O Código de Processo Civil, o Código de Processo Penal e o Regimento Interno do STF dispõem com todas as letras que o juiz deve se dar por impedido de julgar causas em que alguma das partes seja sua credora. Não se trata, portanto, de imaginar que Dias Toffoli, por qualquer razão, não deveria relatar ações judiciais de interesse do Banco do qual é devedor. Mas de constatar que está claramente impedido de fazê-lo. Mas Dias Toffoli, da mesma maneira que se declarou livre de qualquer impedimento para julgar o mensalão, sente-se perfeitamente à vontade para relatar processos de interesse do BMB.

“O ministro assumiu seu posto no STF em 2009, por nomeação do então presidente Lula. Pouco depois se tornou relator de uma primeira ação de interesse do BMB. Em junho de 2011, três meses antes de tomar o primeiro empréstimo, Toffoli negou recurso por meio do qual o banco pleiteava compensação por contribuições que afirmava ter feito em porcentual maior que o realmente devido ao Instituto Nacional do Seguro Social (INSS). Em janeiro de 2012, depois de ter recebido dois empréstimos do BMB, o ministro teria eventualmente beneficiado o banco, ao suspender provisoriamente o julgamento de outro processo.

“Não se trata, no entanto, de saber se as decisões do ministro nesses casos atenderam ou não a interesses de seu credor. O fato é que, em obediência à lei, da qual é guardião supremo, Dias Toffoli deveria ter-se anunciado suspeito para atuar nessas ações.

“Não faltam razões objetivas para que o comportamento do ministro seja considerado escandaloso, como revela reportagem de Fabio Fabrini e Andreza Matais publicada na edição de ontem (29/8) do Estado. O BMB repassou a Dias Toffoli um total de R$ 1,4 milhão, em dois empréstimos. O primeiro, em setembro de 2011, no valor de R$ 931 mil, a serem pagos, até 2026, em 180 parcelas fixas de R$ 13,8 mil. Três meses depois, foi concedido um segundo crédito, de R$ 463,1 mil, a ser pago em 204 prestações fixas de R$ 6,7 mil, até 2028. A soma das duas prestações, R$ 20,5 mil, é superior aos vencimentos que eram auferidos na época pelo ministro no STF. Para os dois empréstimos Toffoli ofereceu a mesma garantia: a casa em que reside no Lago Norte.

“Chamam a atenção os juros cobrados pelo BMB de seu cliente. Eram originalmente de 1,35% ao mês, mas foram repactuados, em abril deste ano, em 1% ao mês. Dois gerentes do banco em Brasília revelaram que as taxas habituais em casos da mesma natureza que atendem clientes importantes variam de 3% a 4%. A generosidade do BMB proporcionou a Toffoli uma economia de R$ 636 mil no total das prestações a serem pagas. O superintendente do banco em Brasília, José Alencar da Cunha Neto, admitiu estranhar tanta generosidade: ‘Confesso que não é muito usual’.

“Em nota oficial Toffoli informou, sem fornecer detalhes, que sua renda não se limita ao salário de ministro. E negou ‘qualquer relação’ entre os empréstimos e os processos dos quais é relator. O fato é que há, sim, uma relação entre ele, o banco e os processos.” (Editorial, Estadão, 30/8/2013.)

6 de setembro de 2013

Outras compilações de provas da incompetência de Dilma e do governo:

Volume 90 – Notícias de 8 a 14/3.

Volume 91 – Notícias de 15 a 21/3

Volume 92 – Notícias de 22 a 28/3.

Volume 93 – Notícias de 29/3 e 4/4.

Volume 94 – Notícias de 5 a 11/4.

Volume 95 – Notícias de 12 a 18/4.

Volume 96 – Notícias de 19 a 25/4.

Volume 97 – Notícias de 26/4 a 2/5.

Volume 98 – Notícias de 3 a 9/5.

Volume 99 – Notícias de 10 a 16/5.

Volume 100: Notícias de 17 a 23/5.

Volume 101: Notícias de 24 a 30/5.

Volume 102: Notícias de 31/5 a 6/6.

Volume 103: Notícias de 7 a 13/6.

Volume 104: Notícias de 14 a 20/6.

Volume 105: Notícias de 21 a 27/6.

Volume 106 (Parte Um): Notícias de 28/6 a 4/7.

Volume 106 (Parte Dois): Notícias de 28/6 a 4/7.

Volume 107: Notícias de 5 a 11/7. 

Volume 108: Notícias de 12 a 18/7.

Volume 109: Notícias de 19 a 25/7.

Volume 110: Notícias de 26/7 a 1º/8.

Volume 111: Notícias de 2 a 8/8.

Volume 112: Notícias de 9 a 15/8.

Volume 113: Notícias de 16 a 22/8.

Volume 114: Notícias de 23 a 29/8.

7 Comentários para “Más notícias do país de Dilma (115)”

  1. Faltou planejamento e sobrou sofreguidão, o que é lamentável.

    Na contramão do senso comum, que colocou na pauta das manifestações de junho a emergência de ações na saúde pública, a imprensa dá a entender que torce contra o sucesso do plano. Insiste que o projeto foi feito atabalhoadamente, quando registros dos próprios jornais informam sobre reuniões de planejamento ocorridas anos atrás, inclusive com a participação de entidades dos profissionais de saúde.
    O resultado pode ser um tiro pela culatra, com o efeito colateral de provocar maiores danos na imagem dos médicos brasileiros, que nas redes sociais ganharam um apelido tão genérico quanto injusto: são chamados de “coxinhas”, aqueles seres mimados que não toleram uma contrariedade.

  2. ANTIPETISMO DE ‘VEJA’
    Estranha tara senil
    Por Mauro Malin

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     Sexta-feira, 06 de Setembro de 2013 | ISSN 1519-7670 – Ano 17 – nº 762
    Imprensa em Questão ANTIPETISMO DE ‘VEJA’
    Estranha tara senil
    Por Mauro Malin em 03/09/2013 na edição 762

    Tarado petista ou petista tarado? A Veja, em período de vacas magras que confere um ar melancólico à edição 2.337, datada de 4/9/2013 (veja abaixo “Dias de penúria”), escolhe a segunda opção para tratar do caso de Eduardo André Gaievski, acusado de “estupro de vulneráveis” – jargão jurídico para designar sexo com crianças menores de 14 anos – e crimes similares.

    Em bom português, o cidadão é acusado de ser aquilo que se convencionou chamar de tarado. Um entre milhares, provavelmente centenas de milhares, talvez milhões de casos no Brasil. O diferencial é que Gaievski, ex-prefeito da cidade paranaense de Realeza, era funcionário da Casa Civil da Presidência da República. E petista.

    Então, ele é apresentado como petista tarado, embora, caso verdadeiras as acusações de que é alvo, não passe de um tarado que vem a ser petista.

    A Veja mostra o homem sorrindo com uma estrela do PT ao fundo. Pura apelação.

    Sem nexo

    Na verdade, a apelação começa com a transformação de um caso de polícia em noticiário de política. Não tem rigorosamente nada de política na história. Prefeitos envolvidos em pedofilia não faltam no Brasil, infelizmente. Alguns já foram julgados e condenados. Tempos atrás, numa cidade do interior paulista, o prefeito e meia-dúzia de vereadores foram acusados de manter uma rede de prostituição de adolescentes. Também não faltam nesse pelotão da espécie humana funcionários públicos de diferentes escalões. Nem empresários, padres, pastores, jornalistas, feirantes, you name it.

    Subjaz na matéria uma insinuação nauseante: o PT é tão nefasto que abriga em suas fileiras gente assim. Roma decadente.

    Veja já foi melhor. Muito melhor. Sob a ditadura, por exemplo, não costumava dar aos militares motivo de contentamento. É, Veja publicou naquela época algumas das matérias mais sérias de denúncia contra a violência do regime. Quem não acreditar pode consultar o Acervo digital da revista.

    Pode-se supor que a compulsão de agredir e insultar o PT nasce de duas vertentes. A primeira é dos dias de hoje: a revista se enxerga e se comporta como ala direita da fracativa, trôpega oposição (PSDB e DEM) ao PT. Decorre, em parte, numa visão simplificada, da incompetência da putativa oposição, algo que estimula a imprensa a ir além de seus tamancos jornalísticos e panfletar.

    A segunda é remota, quase subconsciente: o PT se apresentou, durante a maior parte de sua trajetória (mais precisamente, até a entrevista pós-mensalão de Lula ao Fantástico, realizada em Paris por uma jornalista que surgiu e desapareceu num átimo; a entrevista do “todo mundo faz”, dada em 2005), como encarnação incontaminada da virtude na relação com outras forças políticas e com a mídia.

    Em 1989, praticamente recusou apoio de outras forças no segundo turno de Lula contra Fernando Collor. Ouvi de um querido e saudoso amigo, ao sugerir a possibilidade de Ulysses Guimarães reforçar o palanque lulista: “Não queremos. Chegamos até aqui sozinhos e vamos continuar sozinhos”.

    Agitprop canhestra

    O PT fez sucesso botando banca. A prepotência, péssima conselheira em política, durou pouco tempo após a primeira eleição de Lula. Deu no mensalão. Um pouco como a história da recatada moça de sociedade que um dia vai parar no bordel: assusta, pelo desvario, até as profissionais do sexo.

    A bem da verdade, o PT do mensalão já nada tinha de “moça da sociedade”. Vide denúncias de Paulo de Tarso Venceslau em 1994 a respeito da empresa Cpem (Consultoria para Empresas e Municípios), de Roberto Teixeira, fraternal amigo de Lula. Vide assassinatos dos prefeitos de Campinas, Toninho do PT (setembro de 2001) e de Santo André, Celso Daniel (janeiro de 2001).

    A Veja, na tentativa de ter uma opinião forte (posição defendida por Roberto Civita – 1936-2013 – em entrevista ao Valor), e encharcada de má vontade em face da empáfia petista, embolou tudo e começou a praticar um jornalismo raivoso, como o que levaria Carlos Lacerda a criar, em 1953, o Clube da Lanterna. Ficou caricata, praticante de uma agitprop canhestra. Cada vez mais tendente à irrelevância.

    Dias de penúria

    A Veja, hoje, do ponto de vista de sua sobrevivência empresarial, inspira consternação. A edição em que se estampa a matéria sobre o funcionário da Casa Civil tem esquálidas 112 páginas. Até aí, nada. Na mesma época do ano, primeira semana de setembro, o número de páginas da revista sofreu oscilações desde 2003.

    Mais reportagem, menos gogó

    Mais uma volta no parafuso e constata-se que o problema da Veja nem é de natureza essencialmente comercial, mas sim jornalística. A edição correspondente da Época (797, datada de 2/9) tem menos páginas ainda do que a da Veja: 108. O número de páginas ocupadas por anúncios é bem maior, 41, mas seis são “da casa”: a proporção de 32,4% não chega a ser comercialmente brilhante. E há algo de bizarro, porque um anúncio do frigorífico Friboi, com o simpático Tony Ramos, saiu duas vezes (páginas 13 e 91), mas dificilmente terá sido vendido e será pago duas vezes.

    A sensação tátil não é melhor. Mas o leitor encontra na Época duas excelentes reportagens sobre a questão da saúde pública, tema que vai encerrando sua passagem pelo picadeiro do circo e logo cederá lugar para alguma outra atração. A primeira matéria fala sobre as deficiências do ensino médico (“As faculdades na UTI”). Seus autores são Flavia Tavares, Graziele Oliveira, Murilo Ramos, Hudson Corrêa, Marcelo Rocha, Ana Luísa Cardoso e Leandro Loyola.

    A segunda, “Ideologia faz mal à saúde”, assinada por Vinicius Gorczeski e Leopoldo Mateus, fez algo elementar, meu caro Watson: checou o resultado da atuação de médicos cubanos na Venezuela.

    O resultado é ambíguo. Foram muito bem no que dependeu menos das estruturas locais de saúde pública. Por exemplo: caiu a mortalidade infantil. O médico, aí, salvo casos excepcionais, se apoia menos em recursos materiais. E os cubanos sabem fazer o que os brasileiros desaprenderam: diagnosticar e tratar sem recorrer a exames caros, prestados por serviços congestionados. Por outro lado, fracassaram em reduzir a mortalidade materna e em aumentar a expectativa de vida ao nascer da população.

    Saúde da Família

    Conclusão que corrobora artigo de Adib Jatene (ex-ministro da Saúde) e José da Silva Guedes (ex-secretário de Saúde do estado de São Paulo), ambos grandes incentivadores do programa de Saúde da Família, no Estado de S. Paulo (“Medicina tumultuada“, 20/8). Depois de dissecar com a esperada propriedade problemas gravíssimos da formação médica, os autores focam problemas de estrutura:

    “Temos hoje perto de 30 mil equipes de Saúde da Família e cerca de 200 mil agentes comunitários. Precisamos do dobro. E não temos equipes de especialistas em condições de receber referência e fazer a contrarreferência, bem como os hospitais relacionados com as equipes”.

    A reportagem da Época mostra honestamente como no estado de Tocantins médicos cubanos obtiveram ótimos resultados, porque o governo estadual (de Siqueira Campos – dinossauro da política goiana, então no PFL, hoje no PSDB, novamente governador) garantiu a estrutura (foi no início da década passada; depois, o programa morreu).

    O título da matéria da Época bem serviria para diagnosticar um dos males da Veja: ideologia (pior ainda, de pacotilha) faz mal ao jornalismo. Reportagem honesta faz bem.

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