O governo que está aí tem um lado barata tonta, um lado avestruz e um lado de cachorro chato.
Como cachorro chato, late demais. A cada dia tem um discurso ou uma entrevista da presidente ou de alguém da equipe econômica falando, falando, falando, prometendo, garantindo que está tudo bem e vai ficar melhor ainda, apresentando novos projetos, planos disso, planos daquilo, Bolsa disso, Bolsa daquilo.
É como cão que ladra mas não morde. As palavras não têm qualquer lastro, estão a anos-luz de qualquer realidade. É outro mundo, um mundo paralelo, de ficção científica.
Como avestruz, enfia a cabeça na areia e se recusa a ver o que acontece de fato.
O poste eleito em 2011 entrou em curto-circuito, como escreveu com brilho Roberto Pompeu de Toledo na Veja, e, assim como o governo que dirige, anda de um lado para outro feito barata tonta, inteiramente zonzo, como boxeador nocauteado nos segundos que antecedem a queda na lona.
Nos últimos sete dias, entre muitas outras más notícias, o país ficou sabendo que:
* No acumulado de 12 meses, as vendas do comércio tiveram o pior resultado desde 2009;
* O indicador de atividade econômica do Banco Central teve em maio maior queda desde 2008;
* O nível de confiança da indústria chegou ao ponto mais baixo desde abril de 2009, logo após a grande crise financeira mundial;
* A Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB) reviu estimativas e passou a prever déficit de US$ 2 bilhões na balança comercial. Seria a primeira vez desde 2000 que o país teria déficit.
Mas, na quarta-feira, dia 18, a presidente fez um discurso dizendo que está tudo bem, que é “desrespeito aos dados, à lógica” dizer que há “descontrole da inflação ou das despesas do governo.”
As despesas do governo, mostrou reportagem de Lu Aiko Otta no Estadão de segunda, dia 15, superaram pela primeira vez a marca de R$ 1 trilhão no primeiro semestre. Entre 2009 e 2013, as despesas da União no primeiro trimestre tiveram aumento de 27%.
Quanto à inflação, Dilma afirmou: “Temos certeza de que vamos fechar o ano com a inflação dentro da meta”.
Ou ela mente, ou não sabe o que diz, ou acha que os quase 200 milhões de brasileiros são imbecis. A meta de inflação do governo é 4,5% do IPCA, “com intervalo de tolerância” de dois pontos.
Segundo todas as projeções mais otimistas, o IPCA do ano deverá ficar em torno de 5,80%. Isso não é dentro da meta, que é de 4,5%. É perto do “intervalo de tolerância”, ou seja, perto do teto máximo admitido.
Como escreveu Carlos Alberto Sardenberg no Globo de quinta, dia 18: torturaram a regra da meta e a deixaram meio grogue.
***
Há 108 semanas publico aqui essas compilações, meu murro semanal em ponta de faca.
A charge que Chico Caruso publicou no Globo desta quinta, dia 18 – maravilhosa, inspiradíssima, genial – fala mais que mais que as compilações todas juntas.
Parabéns, Chico!
Aí vai meu 108º murro em ponta de faca, a 108ª compilação de notícias e análises que comprovam a incompetência do lulo-petismo como um todo e do governo Dilma Rousseff em especial. Foram publicadas entre os dias 12 e 18 de julho.
“O poste em curto-circuito”
* Dilma hoje “é a gerente que não gerencia uma equipe balofa e incoerente”
“A crise da presidente Dilma Rousseff expõe os limites da teoria do poste. (…) Nenhum poste gosta de ser chamado de poste, e a cortesia manda que os fazedores de postes não os chamem pelo desprestigioso apelido. No entanto, na euforia da vitória do prefeito Fernando Haddad em São Paulo, o ex-presidente disse que ‘de poste em poste’ o Brasil se iluminaria. No caso da presente crise da presidente — porque a crise que começou nas ruas evoluiu, sim, para uma crise da presidente —, os efeitos perversos da eleição de um poste revelam-se nas seguintes evidências:
“1 – O governo está sem rumo. Não é de hoje que a condução errática da economia, a demora em atacar os gargalos na infraestrutura, a nomeação e desnomeação de ministros e a dubiedade no combate à corrupção traem inexperiência que resulta em insegurança e indecisão. Nas duas últimas semanas, tais sintomas viraram febre com as sucessivas trapalhadas da Constituinte exclusiva e do plebiscito. A desconhecida Dilma foi-nos apresentada como ‘gerentona’. Hoje é a gerente que não gerencia uma equipe balofa e incoerente. A dureza na cobrança e a minudência no acompanhamento do trabalho dos auxiliares eram exaltadas como qualidades. Revelaram-se defeitos. O reflexo condicionado é encobrir as insuficiências pondo a culpa na ‘articulação política’. A ‘articulação’ e sua irmã gêmea, a ‘comunicação’, são dois gastos bodes expiatórios. Não há articulação nem comunicação que funcionem se a outra ponta não funciona. A outra ponta é o gabinete presidencial.
“2 – Desaba o respeito ao governo. As vaias são o de menos. Pior é o misto de cinismo e traição que rodeia a presidente. A chamada ‘base aliada’ esfarelou-se. Ao vácuo de liderança sucede-se a balbúrdia no Congresso. Com a esperteza de sempre, deputados investem contra o chamado ‘foro privilegiado’ como se fosse medida moralizadora. quando o mensalão provou que o suposto ‘privilégio’ na verdade lhes rouba o recurso às diversas instâncias e às infinitas chicanas do processo ordinário. Pior para o governo é a ameaça de se votar o tal ‘orçamento impositivo’, instituindo o escândalo da liberação obrigatória das já de si escandalosas emendas parlamentares. O desrespeito à presidente propicia a abertura da temporada de caça ao Erário.
“3 – O poste foi feito refém. Outros postes, na política brasileira, tiveram melhor sorte. A este não se permite desligar-se do criador. Dilma já se entregou ao obrigatório ritual de encontrar-se com Lula duas vezes desde o início dos protestos. A relação ameaça assumir caráter patológico, se é quê já não assumiu. O ex-presidente não sossega de impor-se como patrono, mestre, guia e protetor. A sucessora se rende à sorte de patrocinada, discípula, guiada e protegida. É quase uma versão da ‘síndrome de Estocolmo’, pela qual o sequestrado acaba cativado pelo sequestrador. ‘Cativado’ quer dizer enamorado, mas também prisioneiro. Tem-se urna presidente obrigada à reverência a uma instância superior.
“O resultado é a perda da reverência que deveria inspirar.” (Roberto Pompeu de Toledo, Veja, 17/7/2013.)
Governo incompetente, obras empacadas
* Governo patina nas grandes obras do PAC: entre 42 empreendimentos, só 21 foram entregues
“Na campanha de 2010, a então candidata Dilma Rousseff apareceu em um de seus primeiros programas na televisão rodando o país para mostrar realizações do governo do presidente Lula e fazer novas promessas. Para tratar da infraestrutura, escolheu a cidade de Ouro Verde de Goiás, onde, sobre os trilhos da Ferrovia Norte-Sul, bradou: ‘Para o Brasil seguir mudando, vamos seguir investindo em infraestrutura, com novas ferrovias, estradas, portos e aeroportos. E apoiar fortemente o setor produtivo nacional’. Ao fundo, trabalhadores soldavam os trilhos da obra. Três anos após a visita de Dilma, os trilhos de Ouro Verde estão sem utilização, cobertos por uma camada de ferrugem, e o mato cresce ao redor. A situação da Norte-Sul serve como metonímia daquilo em que se transformou boa parte do PAC, que alavancou a candidatura da gestora Dilma em 2010 e pode ter efeito oposto, em 2014. Das 42 maiores obras apresentadas no primeiro balanço do PAC, em abril de 2007, apenas metade entrou em operação até hoje.
“A presidente ligou o sinal de alerta em relação à possibilidade de chegar às eleições sem nenhuma obra marcante que possa ser atribuída a seu governo. Por isso, segundo interlocutores, será definido um conjunto reduzido de obras de grande impacto que possam ser entregues até outubro do próximo ano. A ideia é, sem dizer que as outras serão abandonadas, concentrar esforços e dinheiro sobre as escolhidas.
“No Planalto, prospera a avaliação de que a Copa das Confederações foi interpretada pelo eleitor como uma prova de que é possível entregar grandes empreendimentos quando há vontade política. Assim, a população terá dificuldades para aceitar a falta de licenciamento ambiental e disputas judiciais como justificativa para atrasos.
“O Globo fez um levantamento de todas as 42 obras com investimentos de mais de meio bilhão de reais anunciadas no primeiro balanço do programa. Delas, 21 ainda não foram entregues. Pela previsão inicial, a esta altura, era para que 40 delas estivessem em funcionamento. Se os projetos de energia, que têm uma dinâmica própria, forem retirados da conta, restam 14 grandes projetos de infraestrutura (rodovias, ferrovias, hidrovias e infraestrutura hídrica), anunciados em 2007. Destes, só quatro foram inaugurados. Dos dez restantes, nove estão com seu cronograma atrasado em pelo menos três anos. Em alguns casos, como no do Arco Rodoviário do Rio de Janeiro, o atraso deve chegar a seis anos. Segundo o primeiro relatório do PAC de 2007, a obra deveria estar pronta desde 2010, mas a previsão mais recente do governo é que ela só seja concluída em 2016.
“Analisando caso a caso, a situação é ainda mais desalentadora quando o assunto é preço da obra. Os custos estimados dos 42 projetos já aumentaram R$ 100 bilhões de 2007 para cá, duas vezes o valor que a presidente anunciou semanas atrás para obras de mobilidade urbana nas grandes cidades. Os estouros orçamentários mais alarmantes são os da refinaria de Abreu e Lima (PE) e do Complexo Petroquímico do Rio (Comperj), protagonistas em todas as últimas listas do Tribunal de Contas da União sobre obras com irregularidades graves.
“Em abril de 2007, a primeira tinha custo estimado em R$ 5,6 bilhões e deveria entrar em operação em janeiro de 2011. Hoje, a estimativa é que saia por R$ 35,8 bilhões. Só deve ficar pronta em maio de 2015. Em 2007, o governo dizia que o Comperj sairia por R$ 8,2 bi e seria entregue em março de 2012. Hoje, diz que esta obra custará 26,6 bi e ficará pronta em agosto de 2016. Apesar dos quatro anos de atraso, em cada, e da disparada de custos, o último balanço do PAC diz que o ritmo da obra é ‘adequado’, e o mesmo ocorre em outras ações atrasadas.
“O governo também considera adequado o ritmo das obras nas rodovias BR-163, entre Guarantã e Santarém, e na BR-101, entre Palhoça (SC) e a divisa com o Rio Grande do Sul. Em 2007, a pavimentação da primeira rodovia e a duplicação da segunda tinham o mesmo custo estimado e data de entrega: sairiam por R$ 1,5 bilhão, cada, e seriam inauguradas em 2010. A previsão hoje é que o trecho da BR-163 fique pronto em dezembro de 2015 e não saia por menos que R$ 2,2 bilhões.
“Já a duplicação do trecho da BR-101 SC/RS deve custar R$ 2,4 bilhões e, segundo o governo, fica pronta em dezembro. O Planalto sustenta que o carimbo de ‘adequado’ significa que não há contratempos a serem resolvidos e, por isso, obras atrasadas, mas que tiveram seus problemas resolvidos, enquadram-se nessa categoria.
“Nas últimas semanas, duas das grandes obras desse bloco pesquisado pelo Globo foram concluídas: a linha de transmissão Tucuruí-Manaus e um prolongamento de 260 quilômetros da Ferrovia Ferronorte (MT). Mas, enquanto a primeira já entrou em operação, a segunda aguarda licença para tal. A inauguração da nova linha da Ferronorte deve contar inclusive com a presença de Dilma .
“Para o governo, a situação do setor ferroviário é uma das mais delicadas. Das obras de trens previstas no primeiro balanço do PAC, só o trecho de Araguaína (TO) e Palmas (TO) foi entregue. O visitado por Dilma na campanha, entre Anápolis (GO) e Uruaçu (GO), deveria estar operando desde 2010. A previsão do governo é que ele só fique pronto em abril de 2014, a tempo da próxima campanha.
“Outro projeto cujo prazo de conclusão deixou de existir foi o de Irrigação do Baixio do Irecê (BA). A promessa era que a área total irrigável seria de 58 mil hectares. Até agora, apenas a primeira de nove etapas foi concluída, com 4,3 mil hectares irrigáveis. Novela que só perde para a da Transposição do Rio São Francisco. Anunciada em 2003, a obra já teve sua conclusão adiada inúmeras vezes. Em 2007, o Eixo Leste ficaria pronto em 2010, e o Eixo Norte, em 2012, a um custo de R$ 5 bilhões. Hoje, Dilma já sabe que não terá chance de inaugurar nenhum dos dois até o fim deste mandato. A estimativa mais recente do governo é que os dois eixos sejam entregues em 2015, a um custo de R$ 8,2 bi.” (Paulo Celso Pereira, O Globo, 14/7/2013.)
* A um ano da Copa do Mundo, investimento em infra-estrutura cai
“A expectativa de que os investimentos em infraestrutura decolem em 2013 no País não deve se confirmar. Nos primeiros três meses do ano, R$ 14,8 bilhões foram destinados ao setor, um recuo de 4,5% frente ao mesmo período do ano passado, segundo levantamento feito pela Inter. B Consultoria.
Apesar da aproximação da Copa do Mundo, a concentração de leilões de concessão de rodovias, ferrovias e aeroportos no fim do ano adiará para 2014 os desembolsos mais significativos para a área. ‘Se alguém esperava que 2013 fosse o ano da arrancada, pode esquecer’, diz o economista Cláudio Frischtak, sócio da consultoria e um dos responsáveis pelo estudo que cruza dados públicos de investimento federal, de empresas estatais, estaduais, autarquias e empresas privadas na área de infraestrutura. Isso inclui segmentos em energia elétrica, telecomunicações, rodovias, ferrovias, metrô, aeroportos, portos, hidrovias e saneamento.
“Em nota, o Ministério do Planejamento contestou o estudo sob alegação de que o investimento público no setor alcançou R$ 54,7 bilhões até maio, cifra que representa um crescimento de 4,5% sobre o ano passado. O governo alega que o investimento do setor privado cresceu quatro vezes mais do que o Produto Interno Bruto (PIB) desde 2007.
‘Para a Inter.B Consultoria, a diferença se deve, principalmente, ao fato do estudo não contabilizar investimentos no setor de óleo e gás.
‘Só no primeiro trimestre, o orçamento da Petrobrás foi de R$ 19,8 bilhões. Além disso, o dado do governo incluiu mais dois meses na contagem.
“Os dados fechados pela equipe da Inter.B mostram que o investimento em infraestrutura atingiu 2,29% do PIB nominal em 2012 – ou R$ 100,6 bilhões em números absolutos. O resultado foi um avanço de 0,20 ponto porcentual em comparação a 2011, mas ainda está longe dos 2,46% do PIB de 2008, ano de maior investimento relativo no setor desde o início do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). A julgar pelos dados de janeiro a março, em 2013 não haverá aumento da fatia do PIB destinada ao setor.
“As obras da Copa e o fraco crescimento do PIB tiveram efeitos importantes na recuperação dos números de 2012. O programa de concessões do governo Dilma Rousseff também ajudou, com o início dos aportes privados e da Empresa Brasileira de Infraestrutura Aeroportuária (Infraero) nos aeroportos de Guarulhos, Viracopos e Brasília.
“Apesar de admitir que os investimentos costumam se acelerar ao longo do ano, Frischtak alerta que o segundo semestre reserva apenas uma corrida administrativa do governo para acelerar os leilões de rodovias, ferrovias e aeroportos. ‘Vai ser apenas uma preparação para os investimentos em 2014’, diz o economista.
“Outro ponto que pode conter a expansão dos aportes em infraestrutura é o desempenho da Eletrobrás. A companhia investiu R$ 9,9 bilhões no ano passado, o equivalente a 10% dos recursos destinados ao setor. Os desembolsos da companhia elétrica em projetos como a usina de Belo Monte garantiram um significativo avanço da contribuição das estatais federais para o setor de infraestrutura em 2012: de 0,18% para 0,28% do PIB, ou R$ 12,3 bilhões.
“A estatal de energia elétrica projeta investir R$ 13,8 bilhões em 2013, mas até março atingiu apenas R$ 1,9 bilhão desse total.
“Historicamente, a Eletrobrás não tem executado 100% do seu orçamento, e o ano passado foi fora da curva em termos de investimentos – a média anual de 2007 a 2011 foi de R$ 4,6 bilhões ao ano.
“A preocupação é que o impulso da Eletrobrás não se repita, já que o mercado espera que sua capacidade de investimento seja reduzida após os termos desfavoráveis da antecipação da renovação das concessões do setor elétrico definidos no ano passado. ‘É preciso saber se a Eletrobrás vai sustentar esse nível de investimentos. O número até agora não é consistente com a previsão’, diz Frischtak.
“O levantamento mostra que as limitações para que o setor de infraestrutura deslanche continuam concentradas na esfera pública, apesar do PAC. Somados, os dados de governo federal, empresas federais, estaduais e autarquias responderam por menos da metade (46,5%) dos recursos destinados à área em 2012. O quadro mostra uma ligeira alteração nos primeiros meses deste ano. Até março, os entes públicos investiram R$ 8,4 bilhões em infraestrutura – com destaque para o governo federal -, contra R$ 6,3 bi das empresas privadas.
“O setor de telecomunicações foi o que teve o pior desempenho, com investimentos de R$ 3,44 bilhões, queda de 35% sobre o primeiro trimestre de 2012. O resultado pode refletir uma desaceleração após aportes mais robustos em 2012 para acelerar a implantação da tecnologia 4G e diante das cobranças da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel). O maior destaque continua sendo o setor de energia elétrica, com uma injeção de R$ 5,34 bi de janeiro a março, na esteira de grandes projetos como as hidrelétricas de Belo Monte, Jirau e Santo Antonio.” (Mariana Durão e Mônica Ciarelli, Estadão, 14/7/2013.)
Um governo que fala fino com quem humilha o País
* Aviões da FAB foram revistados abusivamente na Bolívia. Mas tudo bem: Evo é companheiro
“Chico Buarque, ao apoiar a candidatura de Dilma Rousseff em 2010, disse uma frase sobre o governo brasileiro que ficou famosa: ‘Ele não fala fino com Washington, nem fala grosso com a Bolívia’. O que parecia uma qualidade de nossa política externa mostrou-se, no entanto, um defeito, pelo menos em relação a nossos vizinhos bolivarianos.
“De fato, não falamos grosso com a Bolívia, nem com o Paraguai, nem com a Venezuela, mas deveríamos fazê-lo em algumas situações. Se antes tínhamos um ‘complexo de vira-latas’ nas relações internacionais, segundo diagnóstico do ex-presidente Lula, hoje temos um ‘complexo de gorila’.
“Temos receio de sermos vistos como imperialistas na América do Sul, e nos submetemos a vários vexames desnecessários e inaceitáveis. Agora mesmo ficamos sabendo que aviões da FAB usados por autoridades brasileiras, inclusive o ministro da Defesa Celso Amorim, foram revistados abusivamente por agentes antidrogas do governo da Bolívia.
“O acinte aconteceu não uma única vez, mas três, e somente então o governo brasileiro fez um protesto formal, que só se tornou público dois anos depois, quando o fato foi revelado pela imprensa.
“A Bolívia já expropriou uma refinaria da Petrobrás e ficou por isso mesmo. Agora, se recusa a permitir que o senador oposicionista Roger Pinto Molina, asilado há mais de um ano na embaixada em La Paz, embarque para o asilo político em Brasília. E nós, no nosso ‘complexo de gorila’, vamos falando fino com nossos vizinhos.” (Merval Pereira, O Globo, 18/7/2013.)
* O governo brasileiro se ajoelha diante da Bolívia. Uma vez, duas vezes, três vezes…
“A diplomacia companheira trata a Bolívia como aquele irmão menor que, por mais inconveniente que seja, deve sempre ser perdoado por suas traquinagens. Resultado: Evo Morales, o menino travesso, sente-se cada vez mais à vontade para afrontar o Brasil. Em sua última pirraça, o governo boliviano mandou seus agentes vistoriarem três aviões da Força Aérea Brasileira que estavam no aeroporto de La Paz – uma das aeronaves estava a serviço do ministro da Defesa, Celso Amorim, em viagem oficial.
“Todos os casos ocorreram em 2011 – dois em outubro e um em novembro – e só agora vieram a público. Em nenhum desses episódios os agentes bolivianos pediram autorização a representantes do governo brasileiro. Simplesmente invadiram os aviões, em busca sabe-se lá de quê – os agentes eram da divisão antinarcóticos, mas há suspeitas de que as autoridades bolivianas estivessem à procura do senador Roger Pinto Molina, opositor que há mais de um ano está refugiado na Embaixada do Brasil em La Paz.
“Tais atos de violência teriam tido uma resposta à altura se o país ofendido fosse governado por dirigentes cientes de suas atribuições primárias. Mas o Brasil sob o lulopetismo é um país prisioneiro da fantasia ideológica bolivariana, que manda fechar os olhos para o comportamento irresponsável, autoritário e errático de governantes como Evo Morales e o venezuelano Nicolás Maduro, para ficar somente nos personagens latino-americanos que mais amiúde frequentam o noticiário por seus atentados contra a democracia e as boas relações internacionais.
“A diplomacia nacional limitou-se a advertir a Bolívia, em dezembro de 2011, de que poderia adotar o ‘princípio da reciprocidade’ caso houvesse nova vistoria em aviões brasileiros. Foram necessárias nada menos que três violações de soberania – porque é disso que se trata – para que o Brasil governado por Dilma Rousseff afinal se abalasse a reagir.
“Quando o fez, porém, usou o mesmo tom complacente adotado nas crises anteriores, nas quais Evo Morales, de peito estufado, bradou que suas decisões, mesmo as flagrantemente ilegais, só diziam respeito à Bolívia.
“Os exemplos dessa assimetria se multiplicam. Em 2006, pouco tempo depois de ter assistido à ocupação militar boliviana de uma instalação da Petrobrás, e ainda ouvir Evo acusar a empresa de ‘atividades ilegais’, sendo esta apenas uma entre tantas bravatas antibrasileiras na ocasião, o então presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em vez de reagir com firmeza à humilhação pública, pediu orações à Bolívia, ‘um país muito pobre, que precisa de ajuda’.
“A genuflexão do Brasil não comoveu Evo. Ao contrário: estimulou-o a acreditar que teria sempre o respaldo do ‘irmão mais velho’. No caso do senador Molina, o presidente Evo Morales negou permissão para que o opositor saia do país e ainda acusou o embaixador brasileiro, Marcel Biato, de trabalhar para a oposição boliviana.
“Em vez de reagir, o governo brasileiro trocou de embaixador, segundo informa o jornal Valor. Além disso, o mesmo Evo que não pede permissão de ninguém para inspecionar aviões oficiais brasileiros foi objeto de ruidosa solidariedade do Mercosul por ter tido seu avião oficial retido na Europa, por suspeita de que estivesse transportando Edward Snowden, procurado nos Estados Unidos após vazar informações confidenciais.
“A imagem altiva da diplomacia lulo-petista – aquela que vive a dizer que seus diplomatas não se submetem a revistas nos aeroportos dos Estados Unidos – não condiz com a humilhação de ver cães farejadores bolivianos fuçando num avião oficial do governo brasileiro.
“Agora que a imprensa revelou o caso, Amorim disse que foi um procedimento ‘lamentável’, mas o entrevero estava sendo mantido em sigilo certamente para não expor em público mais um exemplo do mau comportamento do presidente boliviano, aquele que é um dos símbolos da chamada ‘revolução bolivariana’.” (Editorial, Estadão, 18/7/2013.)
A inflação
* “A gastança e o desperdício têm constituído o padrão dominante da gestão do dinheiro público”
‘Para derrubar a inflação e mantê-la em declínio em 2014, o Banco Central (BC) deverá elevar os juros pelo menos mais duas vezes nos próximos meses, segundo avaliação corrente no mercado financeiro. Não se sabe até onde irá o aperto, mas sobre um ponto há hoje um amplo acordo: depois de quase dois anos de política frouxa, o BC voltou a cuidar de sua missão principal, que é a defesa do poder de compra da moeda.
“A dúvida sobre a intensidade final do arrocho é facilmente explicável. A economia continua mal, a recuperação é lenta e os membros do Comitê de Política Monetária (Copom), responsáveis pela definição dos juros, poderão calibrar suas decisões pelo nível de atividade. Para o fim do ano, especialistas projetam juros básicos entre 9,25% e 9,75%.
“A Selic, a taxa básica, poderá continuar longe dos 12,5% em vigor em julho de 2011, mas o jogo perigoso mantido entre agosto de 2011 e abril deste ano parece estar encerrado de forma definitiva.
“Durante esse longo período, a autoridade monetária, perfeitamente afinada com as ideias da presidente Dilma Rousseff, agiu como se a inflação elevada e persistente fosse um risco desprezível e a redução dos juros fosse um objetivo independente da situação dos preços. Em abril, finalmente, a Selic foi elevada de 7,25% para 7,5%, como se tivesse havido um surto de sensatez. Em maio a taxa passou para 8%.
“O terceiro aumento consecutivo, anunciado na quarta-feira passada, confirmou as expectativas da maior parte dos especialistas. A taxa básica passou de 8% para 8,5% ao ano. Essa decisão foi tomada apesar de alguns sinais de acomodação dos preços dos alimentos e dos índices gerais de preços ao consumidor. Mas teria sido uma imprudência renunciar ao novo aperto ou diminuir sua intensidade, nesta altura, quando nada permite prever uma redução duradoura das pressões inflacionárias. Ao persistir na política adotada em abril e acentuada em maio, os membros do Copom mostraram firmeza e deram mais um passo para reconstruir a credibilidade da política monetária.
“A restauração da imagem do Copom e, portanto, da confiança em seus critérios é fundamental para a administração das expectativas, uma das tarefas mais importantes e mais difíceis de quem deve regular a moeda. A evolução dos preços é determinada em boa parte pelas expectativas de empresários, consumidores e agentes do mercado financeiro. Quando há fortes motivos para apostar no aumento da inflação, os juros e outros meios de controle da oferta monetária tendem a tornar-se menos eficazes.
“Nesse caso, a autoridade tem de recorrer a um arrocho mais forte do que seria necessário em outra circunstância. Como resultado, eleva-se o custo da política anti-inflacionária.
“Nas condições brasileiras, a confiança na seriedade do Copom é especialmente importante, porque há poucos motivos para levar a sério as promessas de uma administração cuidadosa das finanças públicas. A presidente Dilma Rousseff propôs a governadores e prefeitos um pacto de responsabilidade fiscal, como resposta aos protestos nas ruas. Para levar a sério essa proposta, no entanto, seria preciso acreditar, antes de mais nada, nos bons propósitos e na firmeza do governo central. A experiência de nenhum modo autoriza essa crença.
“A gastança e o desperdício têm constituído o padrão dominante da gestão do dinheiro público. Com isso, e com a multiplicação de incentivos tributários sem o mínimo planejamento, as metas fiscais têm sido inalcançáveis. O problema é evidente, mas, em vez de tomar outro rumo, o governo prefere recorrer a truques contábeis para disfarçar o descalabro das contas.
“O combate à inflação seria mais fácil e menos penoso, se o Executivo federal cuidasse com mais seriedade e mais competência de suas contas. Para isso, a presidente Dilma Rousseff teria de pensar um pouco menos na reeleição e um pouco mais na saúde da economia nacional. Sem essa mudança, a responsabilidade pelo controle da inflação continuará pesando exclusivamente sobre o BC. Continuará dependendo, portanto, principalmente da política de juros.” (Editorial, Estadão, 12/7/2013.)
* “Já passou da hora de se buscar o caminho da racionalidade na política econômica”
“Como esperado pelo próprio mercado financeiro, o Comitê de Política Monetária (Copom) decidiu elevar as taxas básicas de juros em meio ponto percentual, que, assim, atingiram o patamar de 8,5% ao ano. A taxa real de juros estimada é de 2,9%, considerando-se a expectativa de inflação para os próximos doze meses. O Brasil passa a figurar novamente, e agora junto com a China, no topo dos juros reais mais altos entre as principais economias do planeta.
“Em um momento que a economia brasileira se apresenta com um ritmo de atividade aquém do que havia sido projetado, parece contraditório que o Banco Central, por decisão unânime de seus diretores, tenha resolvido apertar ainda mais a política monetária. O problema é que a inflação se afastou há tempos do centro da meta (4,5%) e se mostra resistente à queda. Diante dos mecanismos remanescentes de indexação automática, baseada na inflação passada, mesmo que a alta de preços seja contida no limite de 6,5%, que é o teto da meta, trata-se de um nível perigoso, com risco de perda de controle. E em função da valorização do dólar no exterior, o câmbio deixou de ser um moderador dos preços no mercado interno e passou a ser um acelerador, pelo encarecimento das importações, e o fato de a exportação de produtos brasileiros (que antes poderiam ser oferecidos para os consumidores domésticos) se tornar mais atraente. O esforço para se retomar as rédeas do controle da inflação seria certamente bem mais doloroso para o país do que um aperto da política monetária nos moldes que está sendo adotado agora. Com a inflação se aproximando mais do centro da meta, a economia terá condições de recuperar a confiança dos investidores e ganhará novo impulso, aproveitando fatores favoráveis ao crescimento, como a Copa do Mundo de 2014, os Jogos Olímpicos de 2016 e as oportunidades na indústria do petróleo a partir da exploração da camada do pré-sal. A elevação nas taxas básicas de juros poderá ser também temporária, se a política econômica, em seu conjunto, vier a contribuir mais efetivamente para o combate à inflação. Em face da crise internacional, o governo fez um diagnóstico equivocado e acreditou que a economia brasileira poderia ficar imune a essa turbulência com medidas de estímulo ao consumo. O resultado foi pífio em termos de crescimento econômico e ainda fomentou pressões inflacionárias latentes.
“A sensação de volta da inflação é um dos combustíveis das manifestações que têm se repetido desde junho. Se o governo esperava tirar dividendos políticos da política de estímulo ao consumo, o tiro saiu pela culatra.
“Já passou da hora, então, de se buscar o caminho da racionalidade na política econômica. O ajuste nas finanças públicas é novamente necessário. O que não pode é o Banco Central continuar sozinho na luta contra a inflação, sem a contribuição de efetivos cortes de gastos, pois isso o obrigará a recorrer a juros que já deveriam servir apenas como referência histórica.” (Editorial, O Globo, 12/7/2013.)
* Mas qual meta de inflação? Torturaram a regra da meta e a deixaram meio grogue
“Disse ontem (17/7) a presidente Dilma: ‘Temos certeza que vamos fechar o ano com a inflação dentro da meta’.
“Diz o Conselho Monetário Nacional : a meta de inflação é de 4,5%, considerando-se o índice do IBGE (o IPCA).
“Logo, o Brasil chega a dezembro de 2013 com a inflação em 4,5%, certo?
“Errado. Quer dizer, não é bem assim. Começa que ninguém, nem mesmo no governo, acredita que o IPCA termine o ano naquele nível. O próprio Banco Central, justamente o encarregado de acertar a meta, se compromete com um objetivo mais folgado: alcançar uma inflação menor que a do ano passado, que foi de 5,84%. Estará feliz com uns 5,80%, que é consenso entre analistas fora do governo.
“Isso significa que a presidente, digamos, faltou com a verdade?
“Bem, quer dizer, tem aqui um joguinho de palavras ou de conceitos. A mesma resolução do CMN que fixa a meta de 4,5% acrescenta: ‘com intervalo de tolerância’ de dois pontos para mais ou para menos.
“Quem for ao site do BC, encontrará informação com o mesmo conteúdo. Meta: 4,5%; banda, 2 pontos.
“A regra, portanto, é clara. Os dois pontos são extra-meta, uma margem para acomodar momentos excepcionais em que ocorram eventos inesperados, fora do alcance dos controles do BC.
“Pode ser desde uma guerra entre países do petróleo ou uma escassez de alimentos, eventos que provocam altas de preços. Nesses casos, em vez de agir imediatamente elevando juros, o BC topa conviver algum tempo com a inflação elevada.
“Mas, pela lógica do sistema e pela prática mundial, inclusive brasileira, isso é necessariamente provisório. O BC deve organizar suas políticas para logo buscar de novo a meta.
“Ocorre que a inflação no governo Dilma foi de 6,5% em 2011 e de 5,84% em 2012. Pela regra, comenta-se assim: a inflação esteve acima da meta mas dentro do intervalo ou banda de tolerância.
“Mas aqui entra o jogo oficial de palavras: da presidente aos ministros e ao BC, passou-se a dizer que os 4,5% são o ‘valor central’ de uma meta que vai até 6,5%. Torturaram a regra e a deixaram meio grogue.
“Por isso que a presidente Dilma não dá o número. Ela diz que vamos ficar ‘dentro da meta’. Só pela linguagem governamental passada e presente, pode-se concluir que é qualquer coisa abaixo de 6,51% – e esse é o novo objetivo oficial.
“Mas por que estamos discutindo esses quase detalhes? Na verdade, a presidente tenta passar a conclusão de que a inflação está sob controle e em níveis aceitáveis.
“Não está. Começa que os 4,5% já constituem uma meta elevada. Nos países emergentes, em geral, não passa de 3% – e vem sendo cumprida na maior parte dos casos. Aqui na vizinhança da América Latina, o nível mais alto depois do Brasil é do México, com 4% ao ano. (Claro, Argentina e Venezuela não contam, pela desorganização, assim como outras nações, como a Índia, pelo histórico de inflação elevada).
“Além disso, uma inflação rodando a 6%, por tanto tempo, é danosa para a economia brasileira. Querem saber por que? Basta dar uma lida nos documentos recentes do BC, nos quais a instituição explica por que resolveu iniciar um processo de alta de juros. Se a inflação estivesse confortável e sob controle, o BC não precisaria elevar juros, não é mesmo?
“No mesmo discurso de ontem, a presidente Dilma reclamou do ‘ambiente de pessimismo’, criado a partir de suposta exploração de informações parciais e em ‘desrespeito aos dados, à lógica’.
“Pois em nome da clareza também seria bom para o debate que a presidente explicitasse a que meta de inflação se refere. Isso faz muita diferença. Por exemplo: se 6% ou 6,5% ao ano estão dentro da meta, então o BC está errado em aumentar os juros.
“Por outro lado, se a meta é mesmo 4,5%, a taxa de juros precisa subir mais forte – e isso afetaria consumo e produção.
“É exatamente a crítica que se tem feito ao governo: a falta de clareza na definição dos objetivos e na execução de política econômica.
“E por falar em ambiente: todos os recentes índices de confiança, baseados em pesquisas junto ao consumidores e empresas, mostraram um aumento do pessimismo em relação à situação atual e futura da economia.
“Estarão todos equivocados? Seriam todos vítimas dos críticos parciais? Ou seria melhor admitir que as pessoas sabem de si e de sua situação?” (Carlos Alberto Sardenberg, O Globo, 18/7/2013.)
Tudo de mal a pior na Economia
* Sem metas, sem propostas de longo prazo, país vive apagão de planejamento
“Em resposta aos protestos nas ruas contra a má qualidade dos serviços públicos, o governo anunciou um pacote de medidas emergenciais. No entanto, o problema de fundo — que é a falta de políticas consistentes — não foi atacado. Ficou evidente na crise atual a falta de planejamento de longo prazo, que afeta todas as áreas e é um entrave ao crescimento sustentando. Nunca houve tantos recursos para investimentos, mas o abandono do planejamento acabou com os projetos e criou um nó nos serviços públicos.
“O Ministério do Planejamento, comandado por Miriam Belchior, é criticado, ironicamente, por deixar de planejar e se tornar apenas gerente do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). Para o economista Luiz Gonzaga Belluzzo, um dos gurus da presidente Dilma Rousseff, essa situação agravou-se nos anos 90, quando a pasta abandonou projetos de longo prazo para cuidar do orçamento. A partir daí, tornou-se rotina o anúncio de medidas conjunturais a cada necessidade em vez de mudanças estruturais: ‘O governo brasileiro tem tentado criar alguns instrumentos nessa área, mas isso está muito mal articulado, sobretudo na fase de execução.’
“Na área de transportes, a responsabilidade é dividida com os municípios. Mas em vários setores da administração federal, técnicos reclamam que ações importantes tomadas no passado foram abandonadas. Não se fala mais no Conselho de Desenvolvimento Econômico-Social, fórum criado no governo Lula, que perdeu suas atribuições. O Ministério da Fazenda anuncia medidas pontuais para estimular o crescimento a cada solavanco da crise econômica, enquanto a reforma tributária não acontece.
“A antecipação da campanha eleitoral atrapalhou ainda mais o planejamento. No Ministério da Agricultura, por exemplo, há uma alta rotatividade de ministros nos últimos meses. Isso impede a elaboração de políticas de médio e longo prazo, de acordo com um técnico da pasta.
“Já o comércio exterior está à deriva. A política de macrometas do Ministério do Desenvolvimento (Mdic), elaborada na gestão de Luiz Fernando Furlan, está totalmente parada. Os fóruns de competitividade não se reúnem mais e o ministro atual, Fernando Pimentel, embora seja da cota pessoal da presidente Dilma Rousseff, não está conseguindo o aval do Palácio do Planalto para ações importantes da sua área. Um exemplo é a proposta de decreto que aperfeiçoa o uso de medidas antidumping, enviada ao gabinete de Dilma em novembro do ano passado. ‘É terrível para a imagem do Brasil esse tipo de coisa. Tenho clientes americanos que estão quase desistindo de investir aqui’, revelou um consultor de mercado, que pediu para não ser identificado.
“O economista Júlio Sérgio Gomes de Almeida, professor da Unicamp e ex-secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda, lembra que a crise de 2008 sepultou a política industrial brasileira. Ele lembrou que o assunto ficou bastante tempo parado nos anos 90 e só retornou à pauta em meados dos anos 2000. Um dos exemplos foi o programa Brasil-Maior. No entanto, agora, ele estacionou. ‘A realidade mudou e precisamos nos integrar com o importante movimento mundial que é a formação de cadeias globais de valor. Para isso, é preciso planejamento’, disse.
“O Globo procurou o Ministério do Planejamento para comentar as críticas à falta de planejamento de longo prazo no governo. Encaminhou por e-mail um conjunto de perguntas, mas até o fechamento desta edição não teve retorno.
“O Mdic negou que a política industrial esteja parada. Citou medidas em resposta à crise, como a desoneração da folha de pagamento; a diminuição dos prazos de devolução de créditos do IPI e PIS/Cofins; a liberação de recursos do BNDES para projetos de inovação; e a redução do IPI sobre máquinas e equipamentos. Já a Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência da República (SAE) informou que tem projetos nas áreas de agricultura, meio ambiente, desenvolvimento econômico na Amazônia e estímulo da entrada de mão de obra estrangeira no país.” (Gabriela Valente e Eliane Oliveira, O Globo, 14/7/2013.)
* “Os erros que estão cobrando seu preço são erros velhos. A história ensina que deveriam ter sido evitados”
“Como foi mesmo que o Brasil chegou nesta situação? A inflação está alta; o crescimento, baixo; os empresários estão suspendendo emissões e captações; os juros, subindo; a expectativa, piorando; o real, perdendo valor. Na economia, há um preço a pagar pelos erros, e o governo errou demais. Não é o fim do mundo, não há uma crise iminente, mas as escolhas equivocadas não ficaram impunes.
“Há incertezas no mundo, mas o pior passou e não é a crise externa que explica o quadro que os economistas já começam a definir como de estagflação, essa palavra feia e pesada que na vida real é o que estamos vendo: o país cresce pouco, e a inflação permanece alta. Os Estados Unidos discutem o ritmo da recuperação econômica já em curso, e a projeção para a Europa é de crescer, ainda que pouco, no ano que vem.
“As agências de risco colocaram o Brasil em perspectiva negativa, o que significa um risco de, no médio prazo, o país ser rebaixado. A balança comercial deteriorou-se rapidamente e teve déficit na primeira metade do ano. O saldo comercial será positivo, mas pequeno. O déficit em transações correntes se aprofundou.
“O governo reagiu à crise de 2008 plantando os problemas que o país está colhendo agora. A crise chegou aqui como uma onda forte, derrubando o crescimento e ameaçando inúmeras empresas com operações de derivativos cambiais. O primeiro movimento foi para salvar essas empresas, induzindo fusões das maiores que atuavam no mesmo setor. O Banco Central aumentou muito a oferta de liquidez para evitar que aquele evento se transformasse numa crise de crédito. Bancos foram resgatados através do Fundo Garantidor de Crédito em operações muito controversas. Tudo foi justificado como a forma de contornar os efeitos aqui da eclosão da pior crise da história recente.
“Mas a reação seguinte foi pior. Era natural que o governo incentivasse a economia, que entrou em recessão em 2009. Mas o problema foi a escolha e a permanência dos instrumentos de estímulo que foram equivocados e continuam em uso.
“O governo adotou uma coleção interminável de pacotes setoriais que ampliaram os gastos e criaram subsídios para estimular o consumo. Uma das formas de injetar incentivos à economia foi através dos bancos públicos. Foi recriado o pior do chamado ‘desenvolvimentismo’ e da expansão monetária através da relação incestuosa entre bancos públicos e Tesouro. Tudo isso esteve em voga no governo militar e produziu a crise que a democracia debelou.
“A partir de 2008, aumentou-se a estatização da economia, retomou-se o deletério processo de escolha de campeãs nacionais, foi reinstalado o balcão de favores para distribuir desonerações aos setores escolhidos. A inflação passou a ser escamoteada por truques e subsídios como o que zerou a Cide e manteve o preço da gasolina congelado por vários anos. A indústria automobilística foi a grande beneficiária dos incentivos fiscais. O uso de estatais para controlar a inflação está descapitalizando as empresas, principalmente a Petrobras. Isso apequena os investimentos e pode afugentar o investidor privado das concessões.
“Num primeiro momento, o estímulo ao consumo funcionou, produzindo a bolha de crescimento de 2010 que elegeu a presidente Dilma Rousseff. Desde então, a inflação mudou de patamar, ficando mais perto do teto da meta. Os pacotes foram perdendo a capacidade de gerar crescimento. Os ciclos de recuperação ficaram mais fracos e mais curtos.
“Para esconder o estrago, feito nas bases da política fiscal, o governo escolheu o pior caminho: usar truques contábeis para adulterar os indicadores das contas públicas. Todos juntos produziram o seguinte estrago: ninguém mais acredita em alguns dos números fiscais brasileiros, como superávit primário e dívida pública líquida.
“Intervenções excessivas na regulação e a ocupação política das agências reguladoras aumentaram a insegurança jurídica, dificultando os investimentos. O crescimento baseado apenas no consumo alimentou a inflação e endividou as famílias. Não será impossível corrigir essas distorções, mas exigirá do país um esforço que deveria estar sendo dedicado a superar outros obstáculos. Os erros que estão cobrando seu preço são erros velhos. A história ensina que deveriam ter sido evitados.” (Míriam Leitão, O Globo, 14/7/2013.)
* Ao se negar a aceitar as verdades, o governo dificulta o diagnóstico e aumenta o desânimo
“A economia brasileira não está nos seus melhores dias, mas as coisas poderiam ficar um pouco mais fáceis se o governo admitisse a existência dos problemas.
“Insistir em que o PIB vai cavalgar acima de 3% neste e nos próximos anos; que a inflação não é esse monstro antropófago apontado por economistas obsessivos e que, ao contrário, está em reversão; que a política fiscal não é tão expansionista quanto se propala nem geradora de serviços de baixa qualidade; que os investimentos, embora um pouco atrasados, estão sendo agilizados e mudando tudo…
“Num momento de enorme déficit de confiança, essa retórica de dissimulação, que, em princípio, pretende manter elevado o moral da tropa e tudo o que consegue é esconder os problemas, dificulta o diagnóstico correto, impede a procura de soluções adequadas e aumenta o desânimo (…).
“Parece óbvio que o potencial do crescimento da economia brasileira esbarra em obstáculos estruturais. A crise externa não pode ser tomada como a principal limitação quando o consumo interno cresce a mais de 3% ao ano (descontada a inflação) e tem de ser suprido cada vez mais com importações.
“Os investimentos não fluem por diversos motivos. O principal deles é que o governo federal não sabe o que quer e sempre reluta a confiar ao setor privado os investimentos dos quais o Tesouro não consegue dar conta.
“Embora algo menos aquecida do que há meses, a situação do emprego também é um limitador da expansão da atividade econômica. Se com esse crescimento aí, provavelmente inferior a 2% ao ano, a economia vive momento próximo do pleno emprego, mais apertado estaria o mercado de trabalho se o PIB se expandisse a 3,0% ou 4,0%.
“A cada sinal de desaceleração, o governo reage com aumento do gasto público, como se o que faltasse fosse apenas combustível para as máquinas. E, no entanto, o motor vai queimando óleo porque a qualidade da despesa pública é ruim.
“Se houve uma mensagem clara das manifestações de junho foi a de que o Estado está emperrado e é ineficiente. Como pode funcionar um governo com 39 ministérios? Que empresa privada tem tantas diretorias? E, no entanto, também aí o governo quer estar sempre com a razão e se mostra avesso a autocríticas.
“Se insistir em ampliar ainda mais suas despesas, tirará eficácia à política de juros. Nessas condições, o Banco Central terá de redobrar o aperto monetário para tentar compensar com mais juros o jogo contra da política fiscal.
“A falta de sinceridade das autoridades é fator adicional que mina as expectativas. Se insiste em pintar a paisagem de rosa ou em negar a verdadeira dimensão dos fatos, não há como mobilizar a sociedade para os desafios que estão aí. As incertezas parecem ainda maiores do que são, o empresário se fecha na retranca, os investidores externos se desfazem de negócios para fazer caixa e repatriar capitais. O resultado é retração da demanda e o adiamento das soluções.
“O reconhecimento da existência desses problemas seria o melhor recomeço.” (Celso Ming, Estadão, 17/7/2013.)
As contas públicas bagunçadas pela “contabilidade criativa”
* “Com mudança contábil, Petrobrás eleva lucro e pode reforçar caixa do governo”
“Uma mudança promovida pela Petrobrás na forma de contabilizar sua dívida exposta à variação cambial deve permitir à estatal melhorar o resultado do segundo trimestre em cerca de R$ 7 bilhões, reduzir sua exposição ao câmbio em cerca de R$ 70 bilhões e aumentar seu lucro. No fim, isso deve significar uma elevação do pagamento de dividendos aos acionistas, sendo o principal deles a União.
“Para analistas, o novo cálculo inclui a empresa na ‘contabilidade criativa’ do governo no esforço de atingir a meta fiscal.
“Gustavo Gattass, do BTG Pactual, disse que a medida o fez elevar a estimativa do resultado da companhia no segundo trimestre. Mas disse acreditar que, no médio prazo, o efeito pode ser negativo. ‘Vejo esta movimentação como negativa, com uma ainda mais negativa conclusão por trás dela. Triste, porque o momento não é adequado’, disse, defendendo mais transparência na empresa.
“As novas regras permitirão à Petrobrás registrar de forma diluída, ao longo dos próximos sete anos, parte do prejuízo causado pela variação cambial na dívida. A parcela exposta ao câmbio, cerca de US$ 50 bilhões no fim de março, subiu em reais na mesma proporção em que se valorizou a moeda estrangeira.
“No último trimestre, a alta de 10% do dólar representou, portanto, um prejuízo contábil de R$ 10 bilhões (US$ 5 bilhões). Procurada, a Petrobrás informou que não falaria sobre o assunto.
“A manobra contábil é legal e não é inédita. Grandes empresas, como Usiminas e BRF, também adotam o modelo. Mas a decisão da Petrobrás ganha maior repercussão por ocorrer em um momento de forte valorização do dólar. No segundo trimestre de 2012, quando o dólar se valorizou 10,93%, a Petrobrás registrou prejuízo de R$ 1,346 bilhão, o primeiro resultado trimestral negativo desde a maxidesvalorização do real, em 1999.
“Com a perspectiva de um balanço melhor, as ações ordinárias (ON) da companhia, que pagam dividendos ao governo, subiram ontem 7,25%, a maior alta do Ibovespa. Mas, para analistas, o movimento seria especulativo, não teria trazido novos acionistas para a empresa, e pode inverter posição no médio prazo. A adoção da contabilidade de hedge reduz a volatilidade das ações no curto prazo, mas é insuficiente para alterar a visão do investidor de longo prazo sobre a companhia. ‘O que a gente espera hoje para ficar mais positivo com a Petrobrás não é uma mudança de contabilidade, mas de resultado’, diz Will Landers, gestor na América Latina de fundos da BlackRock, uma das maiores gestoras de investimentos do mundo. Para ele, a mudança depende do que a presidente da estatal, Graça Foster, conseguirá entregar em termos operacionais. A BlackRock mantém, nos fundos geridos pelo executivo, a classificação da Petrobrás como ‘underweight’ – abaixo da performance do índice de mercados emergentes da América Latina.” (Sandra Valle, Mariana Durão e André Magnabosco, Estadão, 12/7/2013.)
* Em mais um malabarismo fiscal, governo recorre cada vez mais aos dividendos das estatais para garantir meta
“O forte impacto das desonerações e do baixo crescimento da economia na arrecadação de impostos, de um lado; e o aumento dos gastos, de outro, estão tornando o governo cada vez mais dependente de dividendos pagos por estatais para fechar suas contas. De 2007 a 2012, o montante dessas receitas quadruplicou, subindo de R$ 6,9 bilhões, ou 0,26% do Produto Interno Bruto (PIB, conjunto de bens e serviços produzidos) para nada menos que R$ 28 bilhões (0,64% do PIB). Com isso, a participação dos dividendos no superávit primário (economia para o pagamento de juros da dívida pública) do governo central (que reúne Tesouro Nacional, Previdência Social e Banco Central) saltou de 11,74% para 32,6% no período.
“A estratégia da equipe econômica tem sido retirar o máximo possível das estatais, especialmente do BNDES. De 2007 a 2012, o banco elevou seu pagamento de dividendos de R$ 923,6 milhões para R$ 12,9 bilhões. O problema é que, quando quase todo o lucro de um banco público é convertido em receitas primárias, existe o risco de faltar dinheiro para outras áreas, como, por exemplo, um futuro aumento de capital.
“No caso do BNDES, o Tesouro vem contornando o problema por meio de sucessivas capitalizações da instituição. De 2009 até agora, foram colocados no banco R$ 295 bilhões. No entanto, especialistas ouvidos pelo Globo afirmam que essa forma de conduzir a política fiscal é arriscada. Ao emitir títulos para fazer aportes em bancos públicos em troca de mais dividendos na outa ponta, o governo pressiona a dívida bruta, um dos indicadores mais observados pelo mercado na hora de avaliar um país. A dívida brasileira está próxima de 60% do PIB, um patamar bem acima de outros emergentes.
“A prática comum nos estatutos sociais de empresas, inclusive estatais como o BNDES, é destinar um mínimo de 25% do lucro líquido ajustado ao pagamento de dividendos a cada ano. No entanto, os acionistas podem decidir que o percentual será maior. É exatamente isso o que vem ocorrendo com as estatais.
“Levantamento feito a pedido do Globo pela Consultoria de Orçamento da Câmara dos Deputados mostra o impacto do pagamento de dividendos da Caixa e do BNDES no superávit pelo critério atual e como seria se essas instituições tivessem adotado o critério do valor mínimo.
“No caso do BNDES, por exemplo, o lucro líquido registrado em 2012 somou R$ 8,1 bilhões. Considerando o critério de 25%, os dividendos do exercício ficariam em R$ 2,045 bilhões. No entanto, já foram desembolsados R$ 12,9 bilhões. Os técnicos responsáveis pelo trabalho explicam que os dividendos ficaram acima do lucro registrado no exercício, porque o valor pago também inclui lucros de exercícios anteriores que estavam nas reservas do banco e só foram pagos no ano passado. O objetivo é sempre engordar o caixa do governo.
“Eles ressaltam que essa é uma prova de que o governo está tirando tudo o que pode dos bancos para obter receitas primárias (para pagamento de juros da dívida). No caso da Caixa Econômica Federal, os dividendos do ano passado também ficaram acima do lucro, que foi de R$ 6,4 bilhões. O pagamento mínimo seria de R$ 1,6 bilhão, mas chegou a R$ 7,7 bilhões.
“O ex-presidente do BNDES José Pio Borges afirma que é a favor de o banco pagar o maior volume possível de dividendos à União, desde que isso não obrigue o Tesouro a capitalizar a instituição em outra ponta. ‘Se o BNDES pudesse pagar tudo o que foi pago nos últimos anos, ele não precisaria de recursos do Tesouro (para aumentar seu capital)’, afirma Pio Borges.
“Ele destaca que a atual estratégia cria receitas fictícias e alerta que essa prática prejudica a imagem do Brasil: ‘Todo mundo vê o que está acontecendo.’” (Martha Beck, O Globo, 14/7/2013.)
* Despesa do governo supera inflação e passa de R$ 1 trilhão pela primeira vez
“As despesas do governo apresentaram aumento real de 6,6% no primeiro semestre, em relação ao mesmo período de 2012. Os desembolsos romperam a barreira do trilhão, atingindo R$ 1,01 trilhão. É o que mostra levantamento realizado pela organização não-governamental Contas Abertas com dados do Sistema Integrado de Administração Financeira (Siafi).
“A evolução das despesas mostra que o governo terá dificuldade em concretizar o corte de R$ 10 bilhões a R$ 15 bilhões, cujo anúncio é prometido para esta semana, da forma como foi encomendado. A ordem é preservar investimentos e programas sociais e apontar a tesoura para gastos de custeio da máquina pública. O que se vê na prática, é que os investimentos estão estagnados, enquanto as demais despesas sobem.
“Os gastos com investimento somaram R$ 20,5 bilhões no primeiro semestre deste ano, contra R$ 20,3 bilhões em igual período de 2012, um avanço de apenas 1% acima da inflação. Em comparação com 2010, o ano do ‘pibão’ de 7,5%, os investimentos estão 12,7% menores, em termos reais. ‘É um desempenho pífio’, comentou o secretário-geral da Contas Abertas, Gil Castello Branco.
“Dos R$ 90,2 bilhões disponíveis para investir, apenas R$ 19 bilhões haviam cumprido, até junho, a primeira etapa do processo de gasto, o empenho, que consiste em reservar a verba para pagar um contrato específico. Apenas R$ 3,7 bilhões foram pagos, ou seja, foram desembolsados mediante a entrega de um bem ou serviço ao governo.
“Porém, no período foram liberados outros R$ 16,8 bilhões para pagar investimentos contratados com verbas de orçamentos de anos anteriores – os chamados restos a pagar.
“Os dados do Contas Abertas são diferentes das informações do Tesouro e do Planejamento, porque não consideram os gastos com o programa Minha Casa Minha Vida como investimento, e sim como custeio. Ainda assim, a estabilidade dos investimentos foi admitida pela ministra do Planejamento, Miriam Belchior, na divulgação do balanço do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), no mês passado. Uma das causas é o atraso na aprovação do Orçamento pelo Congresso.
“O programa habitacional é um dos fatores que puxam as despesas para cima. O levantamento do Contas Abertas mostra um crescimento real de 25,3% nas despesas com inversões financeiras, que é onde ele contabiliza os subsídios à aquisição da casa própria pela população de baixa renda. Essa conta atingiu R$ 29,6 bilhões, contra R$ 23,7 bilhões na primeira metade de 2012.
“Os gastos crescem também puxados pelos efeitos do aumento do salário mínimo, aponta Castello Branco. Ele influencia os gastos com aposentadorias, pensões e benefícios assistenciais a idosos e deficientes físicos de baixa renda.
“Há, assim, um conjunto de despesas que já estão contratadas e não há como impedir seu crescimento. É por essa razão que o economista-chefe da corretora Tullett Prebon, Fernando Montero, calcula que os gastos federais vão crescer este ano, mesmo se houver um corte de R$ 25 bilhões, como chegou a defender a equipe econômica no início das discussões.
“Ele acredita que o ajuste a ser anunciado nos próximos dias será calcado na reestimativa, para baixo, de alguns itens de despesa. E, ao contrário do discurso oficial, haverá contenção de investimentos. ‘A verdade é que o governo nunca consegue fazer, nem de longe, os investimentos orçados’, comentou Montero.
“Ou seja: por dificuldades gerenciais que provocam atrasos, os ministérios invariavelmente gastam menos do que o autorizado nesses projetos. Assim, há uma contenção involuntária nos desembolsos. Bastaria, portanto, fazer o mesmo de sempre, só que dessa vez ‘por ajuste, e não por incompetência.’
“A evolução dos gastos de pessoal, que aumentaram apenas 0,3% em termos reais neste ano, mostra que há pouco espaço para cortes adicionais na rubrica. Ali, o aperto já foi feito.” (Lu Aiko Otta, Estadão, 15/7/2013.)
* Manobra atípica garante melhora no perfil da dívida pública
“O resultado das contas públicas não é o único item sob administração do Tesouro Nacional a se beneficiar de operações atípicas. Também os balanços sobre o perfil da dívida pública mobiliária federal mostram bons resultados à custa de manobras no bastidor, mostra estudo elaborado pelo economista Felipe Salto, da consultoria Tendências. ‘Só não dá para falar que é maquiagem porque dá para a gente ver o que aconteceu’, disse Salto.
“Ele sustenta que, por trás dos números que mostram um endividamento de boa qualidade e bem comportado, está o Banco Central rolando a dívida pública (uma tarefa que seria do Tesouro). ‘A consequência disso é que estamos tendo uma despesa enorme de juros em troca de nada.’ Questionado, o Banco Central, presidido por Alexandre Tombini, informou que não comentaria o estudo.
“Dizem os manuais de economia que dívida pública boa é aquela que tem prazos longos e cujos juros, além de baixos, são prefixados – ou seja, o governo sabe de antemão quanto vai pagar. O governo passou a perseguir esse perfil de dívida nos anos 1990, depois de muitos anos com a dívida fora de controle, rolada diariamente em com juros pós-fixados.
“A dívida mobiliária interna brasileira caminhou na direção dessas boas práticas, de forma que os títulos pós-fixados, as Letras Financeiras do Tesouro (LFTs), corrigidos conforme a taxa de juros básica Selic, representavam apenas 22,56% do total em maio passado. A maior parte dos papéis tem correção mais favorável ao Tesouro: ou são prefixados ou corrigidos por índices de inflação. O prazo médio do estoque estava em 4,19 anos. ‘O problema é que o mercado demanda papéis atrelados à Selic’, disse o economista. ‘E o Banco Central vem suprindo.’ Ele disse que não tem como provar isso. ‘Mas há evidências.’
“A principal delas está nas chamadas operações compromissadas. Elas são realizadas pelo Banco Central para retirar o excesso de dinheiro em circulação na economia, que poderia alimentar a inflação. Para recolher o dinheiro, a autoridade monetária oferece aos bancos títulos emitidos pelo Tesouro Nacional. E a preferência recai sobre as LFTs.
“O volume de operações compromissadas aumentou nos últimos meses: representava 3,3% do Produto Interno Bruto (PIB) em 2006 e hoje está em 15,7% do PIB. Nesse mesmo período, a dívida mobiliária federal caiu de 45,3% do PIB para 39,8% do PIB. ‘Não faz sentido’, comentou o economista. ‘Não houve redução das necessidades de financiamento para a dívida ter caído.’ Em outras palavras: se o governo ampliou os gastos e, se a arrecadação ficou abaixo do previsto nos últimos meses, era para a dívida ter aumentado, e não caído.
“Por isso, ele acredita que parte do endividamento está sendo rolado pelo Banco Central, pelas operações compromissadas. Dessa forma, o governo vem captando dinheiro no mercado, mas a um custo mais elevado e a prazos mais curtos. Ou seja, justo o contrário do que são os objetivos da administração da dívida. ‘Claramente, o BC está substituindo o Tesouro na tarefa de rolagem da dívida pública mobiliária federal.’
“Na avaliação do economista, esse desarranjo tem uma origem clara: a recusa do governo em promover uma política fiscal com credibilidade no mercado. O conjunto de receitas e despesas forma, na visão dos agentes econômicos, uma combinação que não dá suporte à taxa de juros reais de 2% perseguida como meta pelo governo.” (Lu Aiko Otta, Estadão, 15/7/2013.)
* Com o embonecamento das contas públicas, o governo joga no lixo sua credibilidade
“Qualquer sociedade desenvolvida, ou que pretenda se desenvolver, se sustenta em alguns poucos princípios serem seguidos sem concessões. Entres eles, o respeito ao direito de propriedade, segurança jurídica e estabilidade política. É fundamental, também, a credibilidade dos poderes constituídos. No que se refere ao Executivo, o requisito da credibilidade é crucial, por exemplo, na condução da economia, e, em especial, na comunicação com a sociedade. Daí, o que vem acontecendo, com a demolição da credibilidade dos números das contas nacionais, ser algo de extrema gravidade, capaz de prejudicar tomadas de decisões de investidores e, assim, sabotar a própria retomada do crescimento.
“Reportagem do Globo de domingo deu a dimensão do efeito da técnica de ‘contabilidade criativa’ aplicada para transferir a instituições financeiras estatais bilhões arrecadados no lançamento de títulos do Tesouro — dívida pública, portanto — e que retornam na forma de pagamento de ‘dividendos’, para maquiar o superávit primário, um termômetro da solvência pública. Não bastasse a receita de dividendos, por instável, não ser a ideal na composição de superávits fiscais, a maneira como eles são gerados está sob suspeição. O BNDES tem sido o banco estatal mais usado na ‘contabilidade criativa’, neste mágico vaivém de recursos que converte dívida em receita primária. Eis por que o mercado acompanha cada vez mais a evolução da dívida bruta, pois estas operações não aparecem na líquida. E ela se aproxima de elevados 70% do PIB, à razão de um ponto percentual por ano, desde 2008.
“A Caixa Econômica também é parte da ciranda. No ano passado, embora obtivesse um lucro de R$ 6,4 bilhões, remeteu R$ 7,7 bilhões em dividendos para o Tesouro — que, por sua vez, se endividou para ‘capitalizar’ a CEF. A mesma discrepância entre lucros e dividendos transferidos para Brasília ocorre no BNDES: R$ 8,1 bilhões lucrados em 2012 para dividendos de R$ 12,9 bilhões. Alega-se que lucros retidos de exercícios anteriores fazem as cifras das remessas subir. Ora, esvaziar a única fonte de financiamentos a longo prazo do país, quando a economia necessita de investimentos, é, no mínimo, um contrassenso. Estudo do Instituto Brasileiro de Economia, Ibre, da Fundação Getúlio Vargas, calcula em 38% a queda do patrimônio do BNDES, entre março de 2011 e março de 2012, segundo ‘O Estado de S. Paulo’. O banco explica a erosão pela queda da Bolsa. Então, que se paguem menos dividendos.
“O objetivo da ‘contabilidade criativa’ e da pressão em geral por mais dividendos é mostrar uma realidade de contenção fiscal que não existe na vida real. Ao contrário, até se criam futuros ‘esqueletos’ (dívidas e rombos ocultos nas contas públicas) no circuito do setor elétrico, desestabilizado pela intervenção atabalhoada do Planalto no corte da tarifa. O ex-ministro Delfim Netto tem razão na irritação crescente com as mágicas em curso no embonecamento das contas públicas.” (Editorial, O Globo, 16/7/2013.)
* O governo Dilma tem desprezo a qualquer padrão sério de gestão fiscal
“Vai mais longe do que se pensava a criatividade para tornar mais apresentáveis as contas do governo federal, segundo estudo assinado pelo economista Felipe Salto, da consultoria Tendências. As operações de antecipação de dividendos e a contabilidade criativa em operações com entidades controladas pela União, como o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), já são bem conhecidas, mesmo aquelas de concepção mais recente. A grande novidade envolve operações do Banco Central (BC) para rolar títulos do Tesouro no mercado financeiro. Uma das consequências indesejáveis é o aumento do custo. ‘Estamos tendo uma despesa enorme de juros em troca de nada’, disse ao Estado o autor do estudo.
“Consultado, o BC recusou comentar o trabalho. Essa recusa em nada melhora a imagem de um governo já conhecido internacionalmente pelas tentativas de maquiar os resultados fiscais em vez de cuidar da saúde de suas finanças.
“Segundo Salto, o BC está substituindo o Tesouro na rolagem de uma parte dos papéis federais. Essa é a explicação apontada em seu estudo para uma aparente incongruência: a redução da dívida mobiliária federal enquanto os gastos aumentam e a arrecadação fica abaixo do valor previsto. Nessas condições, a dívida mobiliária deveria ter crescido, mas, ao contrário, os dados oficiais apontam uma redução – de 45,3% para 39,5% do Produto Interno Bruto (PIB) a partir de 2006. ‘Não faz sentido’, comentou o economista.
“A resposta para o aparente mistério deve estar, de acordo com sua análise, em outros dados de operações do próprio BC. Naquele mesmo período, a partir de 2006, as operações compromissadas da autoridade monetária passaram de 3,3% do PIB para 15,7%. Essas operações, realizadas por meio da oferta de títulos federais, devem servir, em princípio, para retirar do mercado o excesso de dinheiro. Mas devem estar servindo, segundo a suspeita do economista, para algo mais amplo que a execução da política monetária.
“De acordo com o economista, o BC, para realizar essa tarefa, vem atendendo à demanda do mercado por Letras Financeiras do Tesouro (LFTs), corrigidas de acordo com a taxa básica de juros, a Selic, e, portanto, com remuneração pós-fixa-da. Essa escolha vai na contramão da política oficial de trabalhar preferencialmente com papéis prefixados ou corrigidos por índices de inflação. ‘Claramente, o BC está substituindo o Tesouro na rolagem da dívida pública mobiliária federal’, segundo declaração citada na reportagem.
“Se a autoridade monetária tem uma história diferente para contar, deveria contá-la, com urgência e com detalhamento necessário, porque o estudo elaborado pelo economista Felipe Salto parece responder de forma convincente à dúvida suscitada pelos dados oficiais.
“Além disso, o aumento da dívida bruta federal, em cinco anos, é um claro indicador do afrouxamento das condições fiscais. Representantes do governo geralmente preferem discutir a evolução da dívida líquida – um dado obviamente inadequado. A emissão de dinheiro para fortalecer o caixa do BNDES, por exemplo, aparece na dívida bruta, mas é mascarado, no cálculo do valor líquido, pela contrapartida de um ativo de liquidez muito discutível.
“Responsabilidade fiscal nunca foi o ponto forte do governo da presidente Dilma Rousseff. Seu antecessor encenou alguma preocupação com a solidez das contas públicas, durante algum tempo. Rejeitou, no entanto, uma proposta de seu ministro da Fazenda, Antonio Palocci, de estabelecer um plano de equilíbrio total das contas públicas em poucos anos. Essa recusa foi influenciada, segundo se noticiou na época, pela opinião da ministra-chefe de Casa Civil, Dilma Rousseff, e do presidente do BNDES, Guido Mantega, futuro ministro da Fazenda.
“O novo governo, a partir de 2011, manteve com absoluta coerência esse desprezo a qualquer padrão sério de gestão fiscal. Inflação em alta foi uma das consequências. Nenhuma política de juros baixos poderia, portanto, ter dado certo.” (Editorial, Estadão, 16/7/2013.)
* A crise maior é de confiança: como reativar a confiança dos cidadãos e das empresas, se nem o governo pode acreditar no próprio discurso?
“O governo terá de cuidar com urgência de dois problemas, se quiser comandar uma reativação econômica puxada pelo investimento. Precisará restabelecer a confiança de empresários e consumidores, fortemente reduzida depois de mais um semestre de inflação alta, baixo crescimento e muita incompetência na maior parte da administração pública.
“A onda nacional de mau humor, confirmada por uma série de sondagens, como a nova pesquisa CNT/MDA, está refletida na sensível piora de avaliação do governo e da presidente Dilma Rousseff. O outro grande problema é a baixa eficiência do próprio setor público, incapaz de cumprir a maior parte de suas promessas e, de modo especial, de destravar e pôr em movimento os programas e projetos indispensáveis a uma retomada firme do crescimento.
“Se a presidente e sua equipe exibirem mais seriedade e competência do que mostraram até agora, poderão mais facilmente fixar um rumo para a economia nacional e influenciar de forma positiva as expectativas dos agentes particulares. Nada conseguirão, no entanto, com mais bravatas e tentativas de enfeitar um cenário muito feio.
“Três sondagens divulgadas ontem (16/7) evidenciaram de novo a crise de confiança no governo e nas perspectivas da economia. Em apenas um mês, de junho para julho, a avaliação positiva da administração federal caiu de 54,2% para 31,3%, segundo a pesquisa CNT/MDA. No mesmo período, a expectativa de melhora da situação do emprego diminuiu de 39,6% para 32% e a de piora quase dobrou, passando de 11,5% para 20,4%. A esperança de aumento da renda mensal encolheu de 35,8% para 29,6%.
“Outra pesquisa importante, realizada pela Confederação Nacional da Indústria (CNI), mostrou uma nova queda do Índice de Confiança do Empresário Industrial (Icei). Com a redução de 54,8 para 49,9 pontos, o indicador chegou em julho ao nível mais baixo desde abril de 2009, quando o País ainda experimentava os efeitos da recessão iniciada no fim do ano anterior. O Icei varia de zero a 100 e valores acima de 50 indicam empresários confiantes.
“Houve piora tanto da avaliação das condições atuais da economia e da empresa, comparadas com as dos seis meses anteriores, quanto da expectativa para os seis meses seguintes.
“O indicador de confiança diminuiu nos três grandes segmentos industriais, mais acentuadamente no setor de transformação do que na construção e na mineração.
“O quadro é perfeitamente compatível com a piora dos indicadores de produção e de emprego divulgados nas últimas semanas por entidades oficiais, como o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), e por associações privadas. Também ontem a Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) apresentou os dados de emprego do mês passado.
“O nível caiu 0,23% de maio para junho, descontados os fatores sazonais, e ficou 1,05% abaixo do registrado um ano antes. No primeiro semestre, o índice foi 2,31% superior ao de um ano antes, graças, em grande parte, à expectativa de reativação dos negócios. Mas antes de junho essa expectativa já começou a se esvair.
“O resultado do semestre reflete o panorama da economia em 2013, com uma atividade industrial ‘aquém das expectativas’, comentou o diretor do Departamento de Pesquisas e Estudos Econômicos da Fiesp, Paulo Francini. Quanto à estimativa para os meses seguintes, acrescentou, é ‘nada alvissareira’.
“Até agora, a presidente e sua equipe se mostraram preocupadas principalmente com os efeitos eleitorais da piora de sua imagem. Todas as suas respostas, até agora, foram obviamente orientadas por uma visão de marketing de campanha. Nada foi feito para motivar a recuperação da confiança na evolução da economia e, de modo especial, na gestão econômica do governo a partir deste semestre.
“Ao contrário: os anúncios mais notáveis, nesse campo, foram de mais truques para maquiar as contas públicas. Como reavivar a confiança dos cidadãos, se nem o governo pode acreditar no próprio discurso?” (Editorial, Estadão, 17/7/2013.)
Favores para o bilionário amigo
* BNDES adiou cobrança de contratos de empresas de Eike Batista
“Contratos de financiamento do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) sofreram alterações para beneficiar empresas de Eike Batista. As mudanças adiaram prazos, estenderam recursos e relaxaram exigências. Documentos enviados ao Congresso e obtidos pelo ‘Estado’ mostram que foram firmados 15 contratos no valor de R$ 10,7 bilhões com empresas do grupo de janeiro de 2009 a dezembro de 2012 com juros baixos, garantias em ações das próprias companhias ou bens que ainda seriam adquiridos.
“Uma das prorrogações foi assinada a apenas quatro dias do prazo em que a empresa deveria ter feito o pagamento. Em 15 de setembro de 2012 a UTE Parnaíba, que tem a MPX como sócia, deveria ter pago ao BNDES R$ 242,7 milhões. No dia 11 de setembro de 2012, porém, um aditivo mudou o pagamento para março de 2013.
“O adiamento ocorreu também em contrato de R$ 240 milhões firmado em dezembro de 2009 com a empresa UTE Porto de Itaqui Geração de Energia S.A., que tem a MPX como sócia. O contrato original previa amortização equivalente a cinco parcelas em junho de 2012, mas um aditivo postergou a quitação em 13 meses.
“Outro acordo, com a Porto do Pecém Geração de Energia, na qual a MPX está envolvida, o BNDES prorrogou a exigência de desempenho técnico em seis meses: de dezembro de 2011 para junho de 2012.
“No entanto, as vantagens oferecidas a projetos ligados ao empresário não se resumem a adiamentos. O maior dos contratos individuais entre BNDES e empresas de Eike, de R$ 1,4 bilhão, foi firmado em julho de 2009 para a implantação de uma termoelétrica dentro do complexo industrial de Pecém, em São Gonçalo do Amarante (CE), que tem como acionista a MPX.
“A unidade está em operação e, segundo o contrato, os pagamentos do financiamento do BNDES serão realizados até junho de 2026. Os juros cobrados são de 2,77% ao ano acima da Taxa de Juros de Longo Prazo (TJLP), atualmente em 5% ao ano. A taxa é inferior à Selic, que foi elevada pelo Banco Central para 8,5% ao ano na semana passada, usada pelo Tesouro para levantar recursos no mercado.
“Há taxas de juros ainda mais favoráveis ao grupo. Em dezembro de 2009, um contrato de R$ 407,7 milhões com a LLX Sudeste para a compra de equipamentos para a construção do porto de Sepetiba, em Itaguaí (RJ), tem juros fixos de 4,5% ao ano. Na época da assinatura do contrato, a Selic era em 8,75%. O BNDES justifica que, em linhas específicas, outras empresas também receberam juros subsidiados (leia mais abaixo).
“As garantias também chamam a atenção. Penhor de ações das próprias companhias, cartas de fiança assinadas por empresas do grupo e bens que ainda seriam comprados estão entre as garantias ofertadas pelo grupo EBX.
“Num contrato que assina como pessoa física, no valor de R$ 1,344 bilhão, para a construção de um estaleiro pela OSX, Eike oferece entre as garantias dividendos uma de suas empresas, com sede na Holanda. Firmado em 2012, o contrato prevê amortizações a partir de 2016 e pagamento até 2034.
“Projetos de infraestrutura, como estaleiros, usinas e portos, geralmente são financiados no longo prazo. No caso de Eike, a maior parte dos empréstimos vence na próxima década. (Eduardo Bresciani, Estadão, 15/7/2013.)
Outras más notícias na Economia
* No acumulado de 12 meses, vendas do comércio têm o pior resultado desde 2009
“As vendas do comércio varejista ficaram estagnadas em maio, frente a abril, apesar de tradicionalmente terem melhor desempenho por causa do Dia das Mães. Os dados são da Pesquisa Mensal de Comércio (PMC), do IBGE. Na comparação com maio do ano passado, o setor avançou 4,5% e acumula alta de 3,3% nos primeiros cinco meses do ano.
“Em 12 meses, o varejo teve alta de 6,1%, o pior resultado desde dezembro de 2009. Só quatro das dez atividades pesquisadas cresceram em relação às vendas frente a abril. ‘Se não fosse o Dia das Mães, o resultado, provavelmente, teria sido pior’, diz Reinaldo Silva Pereira, economista da coordenação de serviços e comércio do IBGE. ‘Os dados de maio mostram que o comércio já deu uma segurada e indicam que está em uma situação delicada. O comércio se comporta de acordo com o movimento de crescimento da economia. A gente não está em um bom momento: o resultado do PIB (Produto Interno Bruto) decepciona, a inflação está alta e a inadimplência está forte, e tudo junto corrói a renda das famílias.’” (Sérgio Vieira, O Globo, 12/7/2013.)
* Indicador do Banco Central tem em maio maior queda desde 2008
“O índice de Atividade Econômica do Banco Central (IBC- Br) conhecido como o ‘PIB do BC’, registrou em maio uma queda de 1,4% em relação a abril, o maior recuo desde dezembro de 200% ano em que teve início a crise financeira global.
“A queda foi maior que a esperada pelo mercado, e já levou alguns economistas a projetarem para o segundo trimestre um crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) até inferior ao 0,6% registrado no primeiro trimestre. O recuo na economia também pode levar analistas a reconsiderarem as previsões para o ciclo de alta de juros promovido pelo Banco Central que esta semana elevou a Selic em 0,5 ponto, chegando a uma taxa anual de .8,5%.
“Na avaliação interna da equipe econômica do governo, a forte desaceleração da atividade econômica brasileira em maio teve efeito importante do feriado de Corpus Christi. De acordo com cálculos de técnicos em Brasília, o IBC-Br teria registrado uma queda menor, de 0,7%, caso o feriado fosse em junho, como ocorre na maioria dos anos. A expectativa do governo é de que o resultado de junho seja melhor que o de maio.” (Célia Froufe, Estadão, 13/7/2013.)
* Nível de confiança da indústria chega ao ponto mais baixo desde abril de 2009, logo após a grande crise financeira mundial
“O setor industrial brasileiro está mais pessimista em relação ao futuro, segundo pesquisa divulgada ontem pela Confederação Nacional da Indústria (CNI). O Índice de Confiança do Empresário Industrial (Icei) caiu para 49,9 pontos este mês, ante 54,8 pontos em junho. Com esse recuo de 4,9 pontos, a confiança dos industriais, este mês, é a mais baixa desde abril de 2009, alerta a CNI. A entidade lembra que, naquela época, o Brasil enfrentava os efeitos da crise internacional, cujo início foi marcado pela quebra do banco americano Lehman Brothers, em setembro de 2008.
“O Icei varia de zero a cem. Um número abaixo de 50 indica falta de confiança na economia. Ou seja, o indicador deste mês entrou, oficialmente, no terreno negativo. ‘Há dois motivos para a queda da confiança em julho. O primeiro é a retomada da política de elevação dos juros e, o segundo, os protestos da população’, avalia o gerente executivo da Unidade de Pesquisa e Competitividade da CNI, Renato da Fonseca. A pesquisa foi realizada entre 1.° e 12 de julho com 2.475 empresas, das quais 874 são pequenas, 973 são médias e 628, grandes.
“O Icei é composto por um conjunto de itens: avaliação das condições atuais sobre a economia brasileira e também sobre a empresa, considerando o horizonte dos últimos seis meses, além de expectativas para os próximos seis meses também em relação à economia brasileira e à empresa. A avaliação dos empresários em relação à situação atual da economia caiu para 34,1 pontos (em relação a 41,6 pontos em junho).
“A percepção sobre as condições da empresa recuaram para 44,7 pontos (49,4 pontos em junho). As expectativas com relação à economia marcaram 46,8 pontos este mês (52,5 pontos em junho) e as expectativas quanto à situação da empresa ficaram em 58,2 pontos (62,1 pontos, no mês anterior).” (Ayr Aliski, Estadão, 17/7/2013.)
* Associação de exportadores revê estimativas e prevê déficit de US$ 2 bilhões na balança comercial
“A queda das exportações e o crescimento das importações, principalmente de petróleo e derivados, levaram a Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB) a mudar drasticamente sua estimativa de resultado para a balança comercial brasileira em 2013. A entidade, que em dezembro de 2012 previa um superávit de US$ 14,620 bilhões para este ano, agora aposta num déficit de US$ 2,008 bilhões. O Brasil não tem déficit comercial desde o ano 2000, quando as importações superaram as exportações em US$ 732 milhões.
“Na avaliação da AEB, a redução das vendas externas se deve à aceleração da queda dos preços das commodities em geral, aliada à diminuição da quantidade embarcada de petróleo, óleos combustíveis, milho e algodão. A entidade estima que neste ano as exportações deverão ficar em US$ 230,511 bilhões, valor 5% inferior ao registrado em 2012. Já as compras do exterior atingirão US$ 232,519 bilhões, uma alta de 4,2%. ‘Sei que a previsão é ousada’, disse José Augusto de Castro, presidente da AEB, acrescentando que suas projeções são ‘até otimistas’.
“A AEB apontou alguns fatores que justificam, pelo menos até agora, o aumento das importações. Citou a menor taxa cambial vigente no primeiro semestre, a regularização dos registros de importação de petróleo, a expectativa de expansão do consumo interno e a manutenção do elevado custo Brasil. Mas Castro acredita que as compras no exterior crescerão menos no segundo semestre, por causa da alta do dólar e de recentes sinais de freio no consumo interno. Do lado das exportações, ele defende a adoção de medidas que aumentem a competitividade das exportações brasileiras.” (Eliane Oliveira, O Globo, 18/7/2013.)
A trapalhada sobre os médicos
* “Mercadante, o articulador do caos”
“Na condição de articulador de iniciativas da doutora Dilma, o comissário Aloizio Mercadante patrocinou três lances de gênio. A saber:
“1) A convocação de uma Constituinte exclusiva para fazer uma reforma política. Durou 24 horas.
“2) A convocação de um plebiscito para que o eleitorado definisse os marcos da reforma. Durou duas semanas.
“3) Com o copatrocínio do ministro Alexandre Padilha, da Saúde, propôs a reorganização do ensino médico, aumentando-o de seis para oito anos.
“Na semana passada, informou-se aqui que as burocracias do MEC e das universidades federais faziam uma exigência maluca para médicos formados no exterior que quisessem revalidar seus diplomas.
“Caso queira trabalhar no Brasil, um doutor que se formou em Harvard e trabalha na clínica de Cleveland é obrigado a atestar que mora em Pindorama, mesmo tendo nascido aqui. Sem isso, não pode pedir a revalidação, que demora até um ano. Até lá, vive de quê?
“A exigência será eliminada, tudo bem, mas havia coisa pior. O Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais, Inep, não sabe dizer quem pôs o jabuti na forquilha do programa Revalida, muito menos por quê.
“Essa mesma condição é exigida na rotina das revalidações de universidades federais. Puro obstáculo para blindar o mercado. Produto da onipotência dos educatecas.
“Agora Mercadante e Padilha querem que os estudantes de Medicina trabalhem no SUS por dois anos. Novamente, trata-se de um exercício de onipotência.
“Ele se esconde atrás do argumento do aperfeiçoamento dos médicos. Trata-se de uma lorota, pois o Brasil tem Medicina há séculos e suas deficiências não derivam da formação dos doutores, mas do desperdício de dinheiro público e da ganância dos interesses privados, inclusive de médicos.
“Imaginem-se dois estudantes. Aloizio é filho de um banqueiro, estudou em bons colégios e entrou para uma das melhores faculdades de Medicina. Como são todas públicas, fará o curso sem desembolsar um tostão.
“Alexandre é filho de um bancário que trabalha para o pai de Aloizio. Não teve boas escolas, mas foi aprovado numa instituição privada. A família cacifou algo como R$ 300 mil, só em anuidades.
“Seria razoável que Aloizio devolvesse em serviços para o SUS os seis anos de faculdade gratuita. Essa é uma antiga proposta de médicos do setor público.
“Alexandre, contudo, precisa trabalhar para aliviar o orçamento do pai bancário. Tem 26 anos, estuda há 18 e agora querem obrigá-lo a ir para um regime de liberdade condicional trabalhando no SUS por mais dois, ganhando entre R$ 3 mil e R 8 mil (só os mandarins de Brasília acham que essas duas quantias são similares).
“Se os comissários fossem menos onipotentes, os dois anos de serviço ao SUS seriam opcionais para quem estudou Medicina em faculdade privada.
“Quem entende do assunto jura que essa iniciativa, que começaria a valer em 2015, terá o mesmo destino que a Constituinte e o plebiscito, pois é mais fácil mudar um cemitério de lugar do que alterar os currículos das faculdades de Medicina.” (Elio Gaspari, O Globo e Folha de S. Paulo, 14/7/2013.)
* A arte autoritária de passar a responsabilidade para os outros
‘Num país quase desgovernado, a notícia mais animadora do mês foi o novo aumento de juros anunciado pelo Banco Central (BC), um raro sintoma de responsabilidade no alegre mundo brasiliense. Pode-se aprovar o arrocho monetário ou abominá-lo. Mas pelo menos em uma área da administração federal, é preciso admitir, há uma resposta organizada e racional a um desafio do dia a dia. Essa resposta é formulada para um problema bem definido, uma inflação persistente e distante da meta oficial, 4,5% ao ano. Além do mais, essa estratégia contribui para a restauração da credibilidade do BC, condição essencial para uma das funções principais da autoridade monetária, a administração de expectativas. Qual deveria ser a decisão, se essa autoridade tivesse de seguir os padrões agora dominantes, por exemplo, na área da saúde?
“Como primeiro passo para se ajustar a esses padrões, o Comitê de Política Monetária (Copom) deveria jogar o problema para outro organismo, talvez para empresários e consumidores – de toda forma, para alguma entidade, grupo ou pessoa sem responsabilidade direta pela solução. O governo seguiu esse critério para cuidar – mais precisamente, para se livrar – do problema da saúde, um dos temas das manifestações de rua em todo o País. O exemplo é instrutivo.
“Prover assistência médica universal e outros serviços de saúde, como sabe qualquer pessoa medianamente informada, é responsabilidade do poder público. A presidente Dilma Rousseff decidiu, no entanto, jogar o encargo para os estudantes de Medicina. Repetiu a façanha de outro petista, ministro da Previdência no governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Com o pretexto de combater fraudes, esse ministro obrigou milhões de pessoas a um trabalhoso recadastramento. Para cumprir a tarefa, muitos aposentados e pensionistas foram obrigados a buscar agências bancárias em outras cidades. Houve casos de velhinhos em cadeiras de roda forçados a enfrentar filas.
“Houve protestos e demonstrações de indignação. Mesmo sem aquelas barbaridades, no entanto, a decisão ministerial ainda seria condenável. Nada poderia justificar a transferência de um problema gerencial, o controle de fraudes, para milhões de pessoas inocentes e sem a mínima obrigação de fazer o serviço do setor público. Mas essa foi a solução escolhida pelo ministro da Previdência, com a bênção do presidente da República. O nó da questão, a transferência arbitrária de responsabilidade, nunca foi suficientemente discutido.
“Em relação às políticas de preços, hoje é preciso buscar fora do Brasil os grandes modelos de repasse de tarefas. A arte de empurrar problemas para os outros tem sido praticada com virtuosismo pelo governo da Argentina e com menor brilho pelo da Venezuela. A presidente Cristina Kirchner tem usado o conhecido poder de persuasão de seu secretário do Comércio, Guillermo Moreno, para jogar para produtores e comerciantes a tarefa e o custo de conter a inflação.
“Com essa redivisão do trabalho, o governo pode continuar gastando e o BC fica livre da missão de usar a política monetária para conter a alta de preços. A estratégia é complementada pela publicação regular de indicadores ao gosto do governo e pelo veto à divulgação de índices calculados por economistas independentes.
“Apesar da evidente admiração da presidente Dilma Rousseff por sua colega argentina, o governo brasileiro ainda se abstém de comandar os preços do comércio varejista e de intervir no Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) para controlar seus indicadores. Nessa áreas, o jogo de empurrar custos e responsabilidades permanece quase encerrado – atenção ao quase – nos limites do setor público. Envolve, por exemplo, a contenção de preços da Petrobrás e o uso de bancos e outras empresas do Estado para ajeitar as contas fiscais. As perdas impostas à Petrobrás por meio da intervenção nos preços de combustíveis são conhecidas. Parte do custo é transferida, naturalmente, aos acionistas minoritários, convocados, contra sua vontade, para a generosa missão de conter os preços.
“A política recém-traçada para a saúde é um salto qualitativo em relação a esses padrões. Até agora os estudantes de Medicina só precisam, para conquistar o diploma, enfrentar com sucesso as tarefas e os testes acadêmicos. Terminada essa etapa, sua formação se completa com a residência – depois de mais um exame – e com a especialização. Os degraus seguintes, mestrado e doutorado, são opcionais. Mas o governo decidiu condicionar a formatura à prestação compulsória de um serviço público.
“Além de ser mais uma tentativa escandalosa de transferir responsabilidade, essa pseudo-solução é uma evidente demonstração de incompetência. Não se implanta uma política minimamente razoável de assistência à saúde sem investimentos em hospitais, postos de atendimento, transportes e serviços laboratoriais, por exemplo. É preciso pensar tanto nas condições de trabalho quanto na remuneração e na carreira dos profissionais. Se faltam médicos dispostos a entrar no serviço público, tanto nas capitais quanto no interior, o problema deve estar nas condições do próprio serviço, como apontaram nos últimos dias médicos experientes e altamente qualificados. Mesmo para um governo incompetente todos aqueles pontos deveriam ser óbvios.
“Se a transferência de responsabilidades se tornar padrão em todo o setor público, a adoção do modelo Kirchner de política de preços poderá ser uma das próximas novidades. Não faltarão patriotas dispostos a fiscalizar os supermercados e – por que não? – a apoiar pela força qualquer tentativa de controle da informação. Afinal, modelos desse tipo são essencialmente autoritários. Autoritarismo é complemento frequente da incompetência.” (Rolf Kuntz, Estadão, 13/7/2013.)
A trapalhada sobre o Bolsa Família
* Episódio mostra quais são as digitais da gestão Dilma: uma combinação perfeita de irresponsabilidade administrativa, má-fé política e impunidade
“Entre as muitas distinções duvidosas que hão de marcar o primeiro – talvez o único – mandato da presidente Dilma Rousseff, está o ato da administração federal que levou o pânico a milhões de brasileiros, como não se via desde o catastrófico anúncio do confisco da poupança, há 23 anos, sob o governo Collor. No fatídico 16 de março de 1990, o grosso da população foi induzido a acreditar que, a partir de então, teria de viver com Cr$ 50 mensais até a liberação dos recursos sequestrados, prevista para daí a 18 meses. No dia 18 de maio último, uma parcela dos cerca de 50 milhões de inscritos no Bolsa Família (ou 13,5 milhões de famílias) foi induzida a acreditar que o programa estava para ser extinto – o que provocou uma corrida aos postos de pagamento do benefício em 13 Estados, com filas enormes, tumultos e depredações.
“No caso da poupança, tratava-se, não obstante a trapalhada da comunicação, de um fato real. No caso do Bolsa Família, tratou-se de uma inverdade que se alastrou com a rapidez e o alcance característicos das comunicações em redes sociais, a partir de uma mensagem disparada por uma internauta de Cajazeiras, na Paraíba, conforme apurou a Polícia Federal (PF). O falso rumor sobre o fim próximo do Bolsa Família não surgiu do nada. Confirmando o que se veio a saber graças à imprensa – e que a cúpula da Caixa Econômica Federal, mentindo, ocultou enquanto pôde -, a PF apontou como origem da boataria as mudanças feitas pela instituição nas datas escalonadas dos pagamentos mensais do benefício e as alterações em cadastros de inscritos pelas prefeituras dos respectivos municípios. Foram os únicos mencionados no “conjunto de fatores desassociados” que alarmaram os bolsistas.
“Os federais deixaram claro que a investigação completada em 54 dias tinha por objetivo verificar se houve crime por trás da corrida aos caixas eletrônicos naquele final de semana de maio; não se técnicos da Caixa, por incompetência ou indiferença ao destino dos seus clientes compulsórios, fizeram uma barbeiragem (digamos assim) ao antecipar pagamentos programados para o fim do mês – sem avisar os seus superiores, ao que tudo indica, e, muito menos, a população interessada. Se antes não houve crime, depois foi um festival de leviandade e exploração política. A ministra da Secretaria de Direitos Humanos, Maria do Rosário, foi a primeira a dizer o que não sabia nem devia. Pavlovianamente, culpou a ‘central de notícias da oposição’ pela produção e distribuição do rumor que tirou do sério muitos milhares de famílias dependentes do programa.
“Repreendida a mando da presidente, Rosário recuou. Mas, no dia seguinte, o seu colega da Justiça, o petista José Eduardo Cardozo, recorreu à sua coleção de advérbios para insinuar que houve, sim, uma conspirata. ‘Evidentemente’, entoou, ‘houve uma ação de muita sintonia em muitos pontos do território nacional, o que pode ensejar a avaliação de que alguém quis fazer isso deliberadamente, planejadamente, articuladamente.’ Dilma guardou-se de chegar a tanto, mas afirmou que ‘o autor’ do boato é alguém ‘absurdamente desumano’ e ‘criminoso também’. O seu preceptor Luiz Inácio Lula da Silva preferiu um tom mais filosófico. ‘O Brasil tem milhões de pessoas boas, decentes, e tem gente assim. Gente que veio ao mundo para fazer o mal.’ Enquanto isso, corria a maldade deliberada, planejada e articulada, como diria o ministro Cardozo, de que uma empresa de telemarketing do Rio de Janeiro teria sido contratada – decerto pelos inimigos do governo – para injetar em quantas linhas telefônicas pudesse a mensagem apocalíptica sobre o Bolsa Família.
“Nada mais natural que, divulgado o relatório da PF, nenhum dos personagens referidos tenha tido a decência elementar de vir a público reconhecer o seu ‘erro’, para repetir o eufemismo a que Lula recorreu quando os companheiros foram flagrados pagando o mensalão, o Bolsa Família dos aliados corruptos. Tampouco a direção da Caixa quis se manifestar sobre essa combinação perfeita de irresponsabilidade administrativa, má-fé política e, afinal, impunidade – as inconfundíveis digitais deste governo.” (Editorial, Estadão, 16/7/2013.)
O fracasso do protesto a favor
* O governo esperava mostrar força no Dia Nacional de Lutas. O balanço foi melancólico para Dilma e o PT
“A idéia inicial do governo era, no Dia Nacional de Lutas, mostrar que ainda tem controle sobre as ruas, através das centrais sindicais que, direta ou indiretamente, estão ligadas a ele. Mas o balanço é melancólico. Houve confusão, mas não adesão popular. Não foi uma demonstração de força do trabalhismo oficial, e vários lemas foram até hostis ao governo.
“O governo pensou que estrelas seriam lustradas, bandeiras, sacudidas, e o PT e os partidos da coalizão governamental exibiriam controle majoritário no movimento social organizado. Mas foi uma manifestação bem mais vazia do que imaginaram, e os interesses defendidos foram diversificados. Os médicos que protestaram mostraram sua discordância em relação às últimas propostas para o setor, como a contratação de médicos estrangeiros e os dois anos obrigatórios de serviço ao SUS. Os professores querem mais dinheiro para educação. Os portuários querem aumento salarial e reivindicam pontos que não foram contemplados na Lei dos Portos.
“Houve bandeiras diversas, nenhuma defendendo o governo da posição enfraquecida em que se encontra. Não foi o que Brasília sonhou que fosse, no primeiro momento.
“As próprias centrais sindicais, mesmo todas juntas, como CUT, CGT, Força Sindical, entre outras menos votadas e representativas, mostraram que não conseguiram fazer sombra à força da participação espontânea, quando ela irrompeu em junho. O movimento, quando aconteceu, deixou as centrais confusas. Achavam que tinham o monopólio de levar manifestantes para as ruas e foram surpreendidas. O movimento de ontem foi convocado para mostrar que elas ainda sabem como encher avenidas com seus seguidores.
“O que mais impressionou no Dia Nacional de Lutas foi o uso abusivo do que é cada vez mais comum nos últimos tempos: bloqueio de rodovia como ato de protesto. Isso, seja qual for o motivo da reivindicação, cria uma série de problemas para o país, limita o direito de ir e vir, afeta o escoamento do abastecimento de produtos, que é majoritariamente rodoviário. E, como se viu ontem, virou a forma mais comum de protesto.
“Várias categorias têm antigas reivindicações e ontem foram falar dessas lutas específicas, algumas com maior ou menor grau de viabilidade. As Centrais apresentaram o que as tem unido há muito tempo: fim do fator previdenciário e a redução da jornada sem redução do salário, fim da terceirização.
“Ficando em apenas uma dessas bandeiras: o fator previdenciário foi uma solução temporária, enquanto o governo não conseguia fazer uma reforma da previdência que torne toda essa questão mais racional. Os brasileiros têm uma expectativa de vida maior, mas relutam em seguir o que acontece em outros países do mundo, que é adiar a aposentadoria e estabelecer a idade mínima. O fator previdenciário foi uma gambiarra feita para contornar essa incapacidade. Deveria terminar, desde que o país, antes, mudasse a previdência. Mas até uma pequena e justa mudança que foi defendida tempos atrás já está arquivada: a de que viúvas jovens não herdem o valor integral da aposentadoria, principalmente na Previdência Pública. Nos outros países, isso é diferenciado: o percentual do que herdam depende da idade, de ter ou não filhos pequenos, do nível de renda. Do jeito que é no Brasil, tem se multiplicado o caso de idosos que deixam sua aposentadoria para pessoas mais jovens através de vários estratagemas. O déficit previdenciário já é alto demais, a população está envelhecendo. Nos outros países, já foram abolidas regras que aprofundam o déficit no Brasil.
“Até a mais governista das centrais, a CUT, tinha críticas a fazer. As críticas foram ao Banco Central e à elevação dos juros, que definiram como uma ‘excrescência’.
“O Dia Nacional de Lutas acabou sendo um mosaico de reivindicações — algumas justas, outras inviáveis, algumas corporativas, outras ideológicas — mas não foi demonstração de força do governo sobre o movimento social organizado. Não foi sequer demonstração de força das centrais sindicais sobre os trabalhadores.
“Houve adesão, o dia esteve longe de ser normal, trabalhadores foram para as ruas, muitas categorias se manifestaram, mas a mobilização esteve abaixo do que os próprios sindicatos tinham imaginado. Enquanto isso, o governo continua enrolado na sua incapacidade de dar uma resposta à insatisfação que espontaneamente apareceu nas ruas de junho.” (Míriam Leitão, O Globo, 12/7/2013.)
* Ah, fala sério!
“Parece brincadeira, mas não é. Depois de o presidente do PT, deputado Rui Falcão, ter tido o cinismo de dizer que não havia militantes petistas nas manifestações dos últimos dias porque todos estão empregados, trabalhando, agora foi a vez de o ex-presidente Lula escrever no artigo distribuído ontem (16/7) pelo New York Times que os protestos que ocorreram pelo país são reflexos dos sucessos de seu governo nos campos econômico, político e social.
“Como se não bastasse a contabilidade criativa com que o governo tenta esconder os fracassos de sua política econômica, temos agora a interpretação criativa para tentar esconder o que o povo foi às ruas exigir: menos corrupção, maior transparência no uso do dinheiro público, prioridades para transportes públicos, saúde e educação, e não para estádios de futebol ‘padrão Fifa’.
“Trazer a Copa do Mundo para o Brasil, aliás, foi uma das grandes vitórias do governo Lula, e desde o primeiro momento houve o compromisso de que não se gastaria dinheiro público nas obras necessárias, como a construção dos estádios.
“O que se viu, no entanto, foi um gasto muito superior ao estimado — os gastos com estádios representam R$ 7,5 bilhões dos R$ 28,1 bilhões previstos nas obras da Matriz de Responsabilidades da Copa — com financiamentos pelo BNDES, incluindo aí o estádio do Corinthians, que teve o apadrinhamento decisivo de Lula, corintiano doente.” (Merval Pereira, O Globo, 17/7/2013.)
19 de julho de 2013
Outras compilações de provas da incompetência de Dilma e do governo:
Volume 90 – Notícias de 8 a 14/3.
Volume 91 – Notícias de 15 a 21/3
Volume 92 – Notícias de 22 a 28/3.
Volume 93 – Notícias de 29/3 e 4/4.
Volume 94 – Notícias de 5 a 11/4.
Volume 95 – Notícias de 12 a 18/4.
Volume 96 – Notícias de 19 a 25/4.
Volume 97 – Notícias de 26/4 a 2/5.
Volume 98 – Notícias de 3 a 9/5.
Volume 99 – Notícias de 10 a 16/5.
Volume 100: Notícias de 17 a 23/5.
Volume 101: Notícias de 24 a 30/5.
Volume 102: Notícias de 31/5 a 6/6.
Volume 103: Notícias de 7 a 13/6.
Volume 104: Notícias de 14 a 20/6.
Volume 105: Notícias de 21 a 27/6.
Volume 106 (Parte Um): Notícias de 28/6 a 4/7.
As jornadas de junho trouxeram como contribuição no campo do jornalismo o fortalecimento e a grande exposição da “Mídia Ninja”, um jornalismo militante e alternativo, não muito diferente da imprensa alternativa surgida durante a resistência à ditadura militar. Combinando as novas tecnologias ao compromisso com a transparência, os Ninja não se preocupam com a qualidade formal, não selecionam, nem editam, mostram ao vivo, em tempo real, o que suas câmeras estão captando. Junho acabou, também as jornadas, o Congresso não abriu mão do recesso, muita coisa ficou esquecida. A verdade é que a Mídia Ninja está fazendo falta. Pelo menos para criar novos paradigmas para um jornalismo acomodado e burocrático.
MARINAS NELES!
Ao pintar um retrato artificial do eleitorado, a imprensa oferece oportunidade para manifestações triunfais de representantes da oposição, mas acaba prestando um desserviço aos interesses oposicionistas ao criar a ilusão de que uma porcentagem importante da sociedade repudia o governo petista.
A rigor, entre os candidatos que supostamente representariam uma mudança na orientação do governo, somente Marina Silva aparece com chance de competir no segundo turno – e o discurso de Marina não é propriamente conservador.
‘A imprensa não é opinião pública’
“Qualquer pessoa que defende a democracia é radicalmente contrária a qualquer tipo de cerceamento à liberdade de imprensa. É inaceitável o que alguns governos tentam fazer para coibir a exposição pública de suas fragilidades e descompromissos programáticos, ou impedir que surjam tribunas para críticos a suas iniciativas políticas.”
“Por outro lado, também é justo condenar aqueles que deliberadamente manipulam informações para criar situações de dificuldades para quem não é alinhado com seus interesses ou com suas orientações políticas. A imprensa não é opinião pública. Ela procura expressar opinião pública.”
MARINAS NELES!
É a conjuntura, estúpido Merdal Pereira!
O diagnóstico é feito pelo ex-presidente Luís Inácio Lula da Silva, em artigo de sua autoria, publicado no jornal estadunidense The New York Times , em 16 de julho. Lula está certo. Os jovens que tomaram as ruas querem mais do que aquilo que já têm.
O desejo se reflete na palavra de ordem “queremos escolas (e hospitais, postos de saúde, serviços públicos) com padrão Fifa”. A alusão à Fifa não é um aspecto secundário das manifestações.
Em 1970 embalados pelos inestimáveis serviços prestados ao regime pela Rede Globo, os brasileiros cantavam o hino oficioso “90 milhões em ação / pra frente Brasil / do meu coração”, enquanto agentes da ditadura torturavam e assassinavam nos presídios oficiais e nas masmorras clandestinas.
Já não é assim. “Fifa”, hoje, virou sinônimo de imperialismo, e “Copa do Mundo” de corrupção, mamata e desperdício do dinheiro público.Não por acaso, as sedes da Globo em São Paulo e no Rio foram objeto de repúdio dos manifestantes.
Os tempos, pois, são outros. Um claro sinal disso é dado pela seguinte comparação: em 1995, a heroica greve dos trabalhadores brasileiros do petróleo, iniciada em 3 de maio, morreu melancolicamente, 32 dias depois, sem ter logrado atrair a solidariedade ativa do movimento sindical e da sociedade, abrindo o caminho para Fernando Henrique “Thatcher” Cardoso impor todas as reformas que pretendia ao mundo do trabalho; quase exatos 18 anos depois, no início de junho, um pequeno grupo intitulado Movimento pelo Passe Livre, convoca atos para protestar contra o aumento de 20 centavos no preço do transporte urbano, em algumas das principais cidades do país, para detonar um movimento que acabaria levando pelo menos 2 milhões às ruas. É isso que deve ser explicado: porque, em 1995, o movimento iniciado por uma das mais poderosas e organizadas categorias do país foi incapaz de atrair as simpatias da população, ao passo que, em 2013, o MPL incendiou o Brasil.
A resposta está na conjuntura. Não está na vontade dos dirigentes partidários, sindicais, dos movimentos sociais e nem mesmo do MPL – que foram tão pegos de surpresa quanto qualquer outro cidadão. Não está em manobras e articulações palacianas, nem da “direita” nem da “esquerda”.
Está no conjunto complexo, contraditório, profundo e extremamente poderoso que constitui o tecido das relações econômicas, sociais, políticas, ideológicas, sociais e morais de uma determinada época.
Novamente: o que faz com que uma greve espontânea, numa região tão secundaria, do ponto de vista econômico, acabe sendo o motor de uma das mais importantes revoluções da história, enquanto movimentos operários organizados num país central para a economia capitalista não surta grandes efeitos?
Rosa Luxemburgo explica: a resposta está na conjuntura.
Milhões e milhões de brasileiros, antes relegados às margens do sistema econômico, agora aprenderam, com os mais variados graus de consciência ou intuição, que não têm que se conformar com a precariedade do sistema público de educação e saúde; que a corrupção pode e deve ser punida; que o sistema de transporte público é entregue a empresas privadas, embora fartamente subsidiado pelos impostos que todos pagam; que não há dinheiro para a segurança, para as escolas e para a saúde, mas há para imensos estádios de futebol.
O que Lula não diz em seu artigo é que boa parte dos problemas que hoje afligem a população brasileira também é resultado das políticas adotadas pelo seu governo e mantidas por aquela que preenche os contornos de seu espectro refratado no Planalto, a senhora Dilma Rousseff.
O Brasil chegou a um ponto de basta. Esse “ponto de basta” apenas aparentemente se apresenta como que do nada, uma espécie de raio em céu azul.
Ninguém aguenta mais o inferno em que se transformou a vida nas grandes cidades, o espetáculo perdulário dos gastos públicos com a Copa, o descaso das autoridades com as pessoas que, diariamente, morrem ou padecem nas filas do SUS.
Trata-se de uma situação conjuntural em que os “de cima” – a burguesia e os seus representantes – já não conseguem governar como sempre governaram, ao passo que os “de baixo” – os trabalhadores, a juventude, a maioria da nação – já não suportam mais viver como sempre viveram.
Potencialmente, o Brasil vive hoje uma situação conjuntural que pode desembocar numa crise revolucionária.
MARINAS NELES!
MARINAS NELES!
Ibope confirma queda de Dilma
Numa disputa com Marina Silva, Aécio Neves e Eduardo Campos, a presidenta perdeu 28 pontos percentuais, mas ainda lidera.
No segundo turno, empate técnico
Na simulação de segundo turno realizada pelo Ibope, há um empate técnico entre Dilma e Marina Silva. A atual presidenta tem 35% das intenções de voto, contra 34% de Marina.
Neste cenário, 19% dizem que anulariam ou votariam em branco.
Acordem tucanos!