Sim, houve boas notícias, nos últimos sete dias. Não dá para não reconhecer: as eleições trouxeram esperança. E a primeira rodada de pesquisas do segundo turno, divulgadas na noite da quinta, 9 de outubro, aumentou ainda mais a esperança de que dias melhores virão, depois de 12 anos de PT privatizando para si o Estado brasileiro, aparelhando e dilapidando empresas e instituições – Petrobrás, Eletrobrás, Correios, BNDES, Ipea…
Mas não é porque nos últimos sete dias houve o primeiro turno das eleições que as más notícias pararam de acontecer. Como ocorre desde bem o início do governo Dilma Rousseff, todo dia tem má notícia neste país.
Eis algumas delas:
* A inflação oficial no País mais que dobrou na passagem de agosto para setembro. O Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) saltou de 0,25% para 0,57%. A taxa acumulada em 12 meses disparou para 6,75%, a mais alta desde outubro de 2011.
* Esta foi a 13ª vez, no governo Dilma, que o IPCA fica acima do teto máximo da meta.
* O salto da inflação registrado em setembro veio acompanhado de outra má notícia: no mês passado, 61,1% dos itens, entre produtos e serviços que compõem o IPCA, tiveram aumento médio nos preços. Isso mostra que as pressões inflacionárias são generalizadas e preocupantes e não se trata de um fator pontual e isolado que fez com que o IPCA de setembro atingisse 0,57%, segundo o economista-chefe da SulAmérica Investimentos, Newton Rosa.
* Os economistas do mercado financeiro reduziram pela 19ª semana seguida a previsão de crescimento do país neste ano. De acordo com a pesquisa Focus, do Banco Central (BC), a estimativa caiu de 0,29% para 0,24%.
* Com crescimento de 0,3% neste ano e 1,4% no próximo, bem inferior ao da média dos emergentes e de outros sul-americanos, o Brasil aparece como um dos países de pior desempenho no cenário divulgado pelo Fundo Monetário Internacional (FMI). Em julho, o Fundo previa crescimento de 1,3% este ano e de 2% em 2015.
* Fabricantes de motocicletas já demitiram mil trabalhadores este ano.
A queda superior a 10% nas vendas de motocicletas em 2014 sobre 2013 levou montadoras do setor a um processo de ‘demissões silenciosas’, segundo o presidente da Associação Brasileira dos Fabricantes de Motocicletas, Ciclomotores, Motonetas, Bicicletas e Similares (Abraciclo), Marcos Fermanian.
* A perspectiva de consumo de bens duráveis no último trimestre é a pior em oito anos, o que indica um Natal fraco. Entre outubro e dezembro. É o menor resultado de intenção de consumo para o último trimestre do ano desde 2006
É como escreveu Rolf Kuntz no Estadão: “É preciso acreditar em milagres. Só uma incompetência milagrosa poderia produzir estragos tão prodigiosos na indústria brasileira, no comércio exterior e nos fundamentos econômicos do País em tão pouco tempo.”
Também no Estadão, Celso Ming sintetizou: “O governo Dilma chega ao final deste último ano do seu mandato com um rosário de metas não cumpridas.” Em uma tabela – que vai publicada aí abaixo –, mostrou que foi prometido um crescimento do PIB de 3,8%, e na realidade ele deve ser entre 0,29% e 0,7%; foi prometido um superávit primário (economia para pagamento dos juros da dívida) de 2,1% do PIB, e na realidade ele deve ficar próximo a zero; foi prometido um saldo comercial de US$ 10 bilhões, e na realidade ele deve ficar em torno de US$ 2,5 bilhões.
E ainda houve as novas revelações o chocante, apavorante, inimaginável escândalo do propinoduto instalado na Petrobrás.
Ai vai a 157ª compilação semanal de notícias e análises que comprovam os malefícios e a incompetência do lulo-petismo como um todo e do governo Dilma Rousseff em especial. Elas foram publicadas entre os dias 3 e 9 de outubro.
Este compilador já decidiu: a última compilação sairá daqui a 11 sextas-feiras, no final de dezembro – para o bem ou para o mal. Na hipótese de o povo brasileiro reeleger Dilma Rousseff, vou desistir, exausto, de dar meu murro semanal em ponta de faca. Vou tentar parar de ler o noticiário sobre política e economia, passar a ler só os segundos cadernos. Virar um absoluto alienado. Tais informações, melhor é deixar pra lá, como diria o Gil – e pensar só nas coisas boas: minhas meninas, bons filmes, bons livros.
Mas essa hipótese, felizmente, felicissimamente, começa a ficar improvável.
Brasileiro, profissão esperança!
Uma campanha de mentiras e baixarias
* Episódio dos Correios mostra que o PT tomou de assalto o Estado brasileiro sem pudor e sem escrúpulos
“Os Correios já foram uma das estatais mais admiradas, pela qualidade e capilaridade dos seus serviços. Era um símbolo inequívoco da unidade do País, aproximando a sua população, do Oiapoque ao Chuí. Mas o aparelhamento promovido pelo PT na última década desfez esse símbolo e a cada dia reescreve a história da estatal, transformando-a num mero cabo eleitoral. O episódio mais recente dessa triste história é um vídeo obtido com exclusividade pelo Estado, no qual o deputado estadual mineiro Durval Ângelo (PT) expressa satisfação e orgulho pelos bons serviços prestados pelos Correios à campanha petista em Minas Gerais, pelo apoio tanto à candidata à reeleição Dilma Rousseff como ao candidato a governador Fernando Pimentel.
“O conhecido aparelhamento da administração pública promovido pelo PT recebeu nova prova – histórica -, agora em vídeo. Uma prova que não pode ser negada nem contestada. O vídeo em questão é similar aos vídeos – infelizmente, bastante conhecidos dos brasileiros – que flagram um corrupto recebendo, por exemplo, uma mala de dinheiro. No caso dos Correios, é a prova incontestável do uso de uma empresa estatal – que deveria servir ao público – em benefício de um partido.
“Na reunião gravada, tudo é dito abertamente, sem qualquer escrúpulo, sem qualquer pudor. Diz o deputado petista: ‘Se hoje nós temos a capilaridade da campanha do (Fernando) Pimentel e da Dilma em toda Minas Gerais, isso é graças a essa equipe dos Correios’.
“Para que não pairasse dúvida do grau de importância da reunião, o próprio presidente dos Correios, Wagner Pinheiro, está lá presente, como testemunha do aparelhamento. Da mesma forma que um presidente de uma empresa privada ouve dos seus gerentes os bons resultados operacionais da empresa, Wagner Pinheiro ouve de Durval Ângelo os bons resultados da ação dos Correios em prol das campanhas de Dilma e de Fernando Pimentel no Estado de Minas Gerais. ‘Se hoje nós estamos com 40% em Minas Gerais, tem dedo forte dos petistas dos Correios’, diz Durval, acintosamente.
“Diante da revelação feita pelo Estado, o presidente dos Correios emitiu uma nota na qual afirma que ‘os Correios não estão contribuindo com a campanha de qualquer candidato’. Justifica-se dizendo que ‘a reunião não ocorreu durante o expediente e a empresa não custeou despesas relacionadas a ela’. É como dizer que um deputado não recebeu propina como deputado porque não era no seu horário de trabalho.
“No vídeo, o deputado pede a Pinheiro que faça a direção nacional do PT saber dos bons serviços prestados pela estatal. ‘Queremos que você leve à direção nacional do PT, que eu também faço parte do diretório, mas também à direção nacional da campanha da Dilma a grande contribuição que os Correios estão fazendo’. O vídeo explicita assim não apenas o aparelhamento, mas como é feita a coordenação do aparelhamento e como o PT não brinca no poder. Instala-se e cobra resultados – e os camaradas têm grande zelo em mostrar os resultados obtidos. Que não fique nas sombras o empenho deles no aparelhamento.
“Durval não podia ser mais explícito: ‘No dia da reunião que tivemos no hotel (da qual participou Pimentel), o Helvécio Magalhães (coordenador da campanha do petista) falou: vou me reunir com a equipe ainda esta semana e liberar a infra-estrutura. E se hoje nós temos a capilaridade da campanha do Pimentel e da Dilma em toda Minas Gerais, isso é graças a essa equipe dos Correios’. Diante da repercussão do caso, Durval explicou que ‘liberar a infra-estrutura’ era uma referência a funcionários petistas dos Correios que pediam férias para fazer campanha. O vídeo mostra o contrário: o uso da máquina pública, e não do tempo livre privado, para fazer campanha.
“O que se vê no vídeo é uma espécie de sentimento do dever cumprido. Mas o parlamentar petista alerta: aquilo ainda não era uma prestação de contas completa. Esta virá após a eleição de Dilma e Pimentel, na qual – pelas suas palavras – a estatal está fortemente empenhada. É o aparelhamento sem pudor e sem escrúpulos.” (Editorial, Estadão, 3/10/2014.)
* Sindicato denuncia uso eleitoral dos Correios no Mato Grosso
“O sindicato dos funcionários dos Correios de Mato Grosso protocolou ontem (3/10) no Tribunal Regional Eleitoral (TRE-MT) um pedido para que seja investigado o uso da estrutura da estatal em favor da candidatura da presidente Dilma Rousseff (PT). Na semana passada, o diretor regional dos Correios em Mato Grosso, Nilton do Nascimento, enviou cartas aos funcionários pedindo votos para Dilma e para candidatos do PT e do PR no estado.
“‘Pedi seu voto em 2010 e conquistamos muito com isso, por isso volto a pedir seu voto’, escreveu Nascimento na carta endereçada aos funcionários. ‘Agora o Brasil precisa avançar mais e somente o governo Dilma (…) poderá ampliar os programas sociais e econômicos e fazer o melhor para sua gente’.
“Segundo o sindicato, as cartas foram encaminhadas aos trabalhadores nas agências onde eles estão lotados, com preço de postagem abaixo do previsto para esse tipo de correspondência.
“— Ele usou o banco de dados dos Correios para saber onde cada funcionário atua. Além disso, uma correspondência deste tipo custa R$ 1,30 e ele pagou R$ 0,60 — disse o presidente do sindicato, Edmar Leite.
“Segundo ele, algumas correspondências chegaram um dia depois da postagem:
“— Mais rápido que o Sedex!
“Esta semana, a oposição denunciou o uso dos Correios na campanha de Dilma e do candidato a governador Fernando Pimentel (PT) em Minas Gerais. Um vídeo divulgado terça-feira (30/9) pelo jornal O Estado de S. Paulo mostrou uma reunião em que o deputado estadual Durval Ângelo (PT-MG) reconhece que o bom desempenho da presidente em Minas tem ‘o dedo forte dos petistas dos Correios’.
“Em nota, a assessoria de imprensa dos Correios em Mato Grosso negou que tenha havido uso de infra-estrutura pública para envio das cartas.
“‘Foram enviadas apenas 670 malas diretas locais e estaduais, para pessoas conhecidas de Nilton do Nascimento’, diz a nota. A assessoria informou ainda que o diretor regional enviou as cartas ‘na condição de cidadão’, com a postagem paga com dinheiro próprio. ‘O preço de cada unidade variou de R$ 0,77 (estadual) e R$ 0,72 (local)’.” (Anselmo Carvalho Pinto, O Globo, 4/10/2014.)
* Diretor dos Correios em Santa Catarina também pediu em carta votos para Dilma; procurador dá prazo de 30 para presidente explicar uso político da estatal
“A exemplo do que ocorreu em Mato Grosso, o diretor regional da Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos em Santa Catarina, Paulo de Andrade, também enviou cartas aos funcionários da estatal pedindo votos para a presidente Dilma Rousseff e outros candidatos do PT na reta final da campanha do primeiro turno. Um panfleto colorido intitulado ‘Carta aos Ecetistas Eleições 2014’ começou a chegar aos endereços residenciais de funcionários dos Correios na quinta-feira, dia 2 de outubro, apenas um dia depois de serem postados, como mostra o registro do selo do envelope de uma das correspondências, à qual O Globo teve acesso.
“A carta pede votos para Dilma e para petistas derrotados ao governo de Santa Catarina, Claudio Vignatti, e a senador, Milton Mendes. Também são citados a candidata a deputada estadual Ana Paula (PT) e o deputado federal Décio Lima (PT), candidato à reeleição, que venceram.
“‘Os ecetistas sabem que para continuarmos avançando em novas conquistas, precisamos reafirmar nosso compromisso com o modelo de governo Dilma 13, Vignatti 13, Milton 130, Décio Lima 1313 dep.federal e Ana Paula 13313 dep.estadual’, diz o texto, que atribui supostas melhorias nas condições de trabalho e benefícios ao PT. No pé da página, uma legenda informa que o material foi doado a Décio Lima por Paulo de Andrade, que é diretor regional dos Correios em Santa Catarina desde 2013. Como manda a lei eleitoral, o material tem o número do CNPJ de Lima e informa tiragem de 2.500 exemplares.
“O verso do panfleto é ilustrado com a foto de 14 pessoas ao lado de frases de apoio ao deputado petista, embora sem os nomes dos autores. Funcionários da regional catarinense dos Correios ouvidos pelo Globo reconheceram no panfleto o rosto do diretor e de pelo menos outros dez ocupantes de cargos de confiança da diretoria regional. Eles atribuem a Décio Lima a indicação de Andrade para o posto. Na frase que aparece ao lado da foto do diretor, ele lembra o passado de Décio Lima como advogado do sindicato dos funcionários dos Correios.
“A partir de representação do PSDB, o procurador da República Frederick Lustosa de Mello deu ontem (7/10) prazo de 30 dias para que a presidente Dilma Rousseff apresente explicações sobre denúncias de uso político dos Correios em favor de sua campanha de reeleição. Em Minas, a denúncia de que os Correios teriam privilegiado a entrega de panfletos de Dilma foi acompanhada pela divulgação de um vídeo em que o deputado estadual Durval Ângelo (PT-MG) atribui a subida da presidente nas pesquisas a um ‘dedo forte dos petistas dos Correios’. Na semana passada, o sindicato dos funcionários dos Correios de Mato Grosso também protocolou um pedido de investigação no Tribunal Regional Eleitoral sobre o envio de cartas aos funcionários nas agências pelo diretor regional Nilton do Nascimento pedindo votos para Dilma.
“No caso de Santa Catarina, a correspondência foi envida para a casa dos empregados, o que levantou a suspeita de uso do cadastro da estatal.
“— Todo mundo sabe que eles fazem campanha para o PT, mas não poderiam usar na carta o nome da empresa. O que mais me espanta é como tiveram acesso aos endereços. Ou usaram a estrutura dos recursos humanos ou do fundo de pensão, o Postalis, que também é aparelhado — disse um funcionário que recebeu a carta na sexta-feira e pediu para não ser identificado.
“Ao Globo, Paulo de Andrade negou ser afilhado político de Décio Lima, mas confirmou o envio das cartas. Ele explicou que elas foram produzidas pelo grupo de funcionários petistas da estatal do qual participa, e que apareceu como doador na condição de ‘cidadão’. Filiado ao PT, ele afirmou que só tem feito campanha fora do horário de expediente. Negou o uso do cadastro dos Correios para endereçar as cartas, mas não soube precisar de onde veio a lista de endereços.
“— Outros integrantes do grupo cuidaram disso. Pode ter vindo das associações ou do sindicato, que fazem eventos em que funcionários se cadastram. Não usamos o cadastro dos Correios, tanto que não mandamos para todos os funcionários, que são 4 mil em Santa Catarina — disse Andrade.
“Procurado, Décio Lima não respondeu. Em nota, a direção dos Correios informou que não identificou qualquer irregularidade nos episódios de Mato Grosso e Santa Catarina, já que as malas diretas foram pagas com recursos particulares e enviadas pelos diretores ‘na condição de cidadão’. A estatal afirmou que a nomeação de dirigentes nos Correios segue critérios técnicos e não políticos e reafirmou que não há uso eleitoral da estrutura da estatal.
“Maria Inês Capelli, presidente da Associação dos Profissionais dos Correios (Adcap), diz que há casos parecidos em vários estados, fruto do aparelhamento. Segundo ela, das 27 regionais, 18 têm diretores filiados ao PT. A maioria é ex-sindicalista.
“— Não é apenas usar a estrutura, mas o cargo para se dirigir aos funcionários para pedir voto. Para os mais simples, como os carteiros, ou os 50 mil que têm cargos comissionados, é um peso forte. Isso é abuso de poder — disse.” (Alexandre Rodrigues, O Globo, 8/10/2014.)
* Dilma disse que um diretor do Ibama foi afastado por corrupção. É mentira
“Num dos momentos mais tensos do debate entre os presidenciáveis, na quinta-feira (2/10) na TV Globo, a presidente Dilma Rousseff (PT) citou um caso de demissão na área ambiental do governo para rebater críticas da candidata Marina Silva (PSB) à demissão do ex-diretor da Petrobrás Paulo Roberto Costa.
“Dilma disse que um dos diretores de Fiscalização do Ibama indicado por Marina foi afastado do cargo por desvio de dinheiro, e nem por isso ela acusou a exministra do Meio Ambiente de fazer vistas grossas à corrupção. No histórico recente do Ibama não há registro de demissão de diretor de Fiscalização por corrupção. Nos dois primeiros mandatos do ex-presidente Lula, a PF fez grandes operações de combate à corrupção no Ibama. As investigações resultaram em aproximadamente 70 demissões. Mas nesta lista não consta diretor de Fiscalização. Em 2005, a PF chegou a prender o então diretor de Floresta Antônio Carlos Hummel após investigações sobre contrabando de madeira no Mato Grosso. Mas ele foi solto e inocentado quatro dias depois. Teria sido acusado por um engano do procurador Mário Lúcio Avelar.
“Ontem (3/10), um integrante da campanha da presidente disse que Dilma estaria se referindo ao ex-diretor Flávio Montiel. Só que o ex-diretor deixou o governo no início de 2010, antes de ser denunciado pelo Ministério Publico Federal por desvios no Ibama. Montiel foi diretor de Proteção Ambiental. Depois de deixar o Ibama ele chegou a ser assessor especial do Ministério do Meio Ambiente. A assessoria da campanha de Marina disse que ela não comentaria o tema até que a presidente esclareça do que estava falando.” (O Globo, 4/10/2014.)
Dilma e a corrupção
* Dilma alega que a PF investiga porque ela dá liberdade. É mentira: a PF investiga porque é seu dever segundo a Constituição
“Para tentar impedir que o escândalo do mensalão e as denúncias de corrupção contra o governo respinguem sobre sua campanha pela reeleição, a presidente Dilma Rousseff vem alegando que concedeu à Polícia Federal (PF) total liberdade para investigar as denúncias de corrupção na Petrobrás, inclusive orientando-a a instaurar inquéritos criminais e a adotar medidas para acabar com o uso de caixa 2 pelos partidos políticos e esquemas de lavagem de dinheiro para financiar campanhas eleitorais.
“O argumento foi usado por ela em um dos últimos debates entre os presidenciáveis. ‘Eu dei autonomia à PF para prender o senhor Paulo Roberto e os doleiros todos’, afirmou na ocasião. O mesmo argumento também foi repetido nos programas do PT durante o horário eleitoral, que deram a entender ter sido Dilma a primeira inquilina do Palácio do Planalto a ter colocado a PF a serviço do combate à corrupção e dos ilícitos cometidos em empresas estatais.
“A propaganda do PT é enganosa e a fala de Dilma carece de consistência técnico-jurídica, deixando claro o quanto ela desconhece a Constituição que há quatro anos jurou cumprir. Em palestra para cerca de 200 estudantes e professores de direito de uma universidade de Brasília, quando discorreu por mais de uma hora sobre reforma política, financiamento de campanha eleitoral, compra de votos, corrupção e fortalecimento do regime democrático, o ex-presidente do Supremo Tribunal Federal Joaquim Barbosa enfatizou esse ponto.
“‘Não é a presidente da República que manda prender. Ela tem, no máximo, poderes para não interferir na atuação do órgão’, disse Joaquim Barbosa, confessando-se ‘surpreso’ com o desconhecimento generalizado de direito constitucional por parte dos políticos – inclusive Dilma.
“Essa foi uma crítica sutil às afirmações não só da presidente da República, mas também a recentes declarações do vice-presidente, Michel Temer, e do presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL). Eles haviam protestado contra a vistoria, por agentes da PF, de um avião da campanha do senador Edison Lobão Filho, candidato ao governo do Maranhão e filho do ministro de Minas e Energia, Edison Lobão, acusando a corporação de ter sido ‘instrumentalizada para atingir candidaturas legitimamente constituídas’.
“Na ocasião, Dilma – que hoje elogia as ações da PF – criticou a corporação. ‘Qualquer órgão integrado por pessoas pode cometer um erro. Mas autonomia não significa autonomia para cometer coisas incorretas. Uma das coisas que a gente tem que garantir, principalmente em processos eleitorais, é que órgãos governamentais não sejam usados em proveito de um ou outro candidato’, afirmou Dilma, com sua maneira tortuosa de se expressar, e de certo modo endossando a tese de que a ação de busca e apreensão executada pela PF teria tido o objetivo de ‘constranger’ e ‘intimidar’ políticos peemedebistas maranhenses.
“Na realidade, como afirma o ex-ministro Joaquim Barbosa, a Polícia Federal é um órgão de Estado e não precisa de qualquer autorização presidencial para exercer suas atribuições funcionais. Pela Constituição, ela tem competência para promover investigações independentes, mesmo quando os investigados sejam políticos da base do governo ou mesmo integrantes da administração direta e indireta. Em outras palavras, a autonomia da Polícia Federal não é administrativa nem financeira. É uma autonomia funcional. E se seus delegados e agentes deixarem de agir, em casos de denúncias de algum ilícito, incorrem em crime de responsabilidade.
“Por isso, quando a presidente da República alegou no debate entre os presidenciáveis que estimulou a PF a investigar as denúncias de corrupção na Petrobrás, ‘o que não acontecia nos governos anteriores’, ela contrariou a verdade.
“Seu comitê eleitoral ainda tentou refutar as críticas de Barbosa, distribuindo uma nota em que alega que as palavras de Dilma acerca dos ‘atos de atuação legal da PF’ estariam sofrendo ‘interpretações maliciosas e inverídicas’. Maliciosa é, mais uma vez, a insistência da assessoria de Dilma em desmentir as bobagens que ela fala.” (Editorial, Estadão, 3/10/2014.)
* Os fundos de pensão das estatais são usados em altas negociatas, mas as vítimas não reclamam – talvez por uma estranha solidariedade ideológica
“Prestes a completar 12 anos de Planalto, o PT, ou facções dele, vê-se envolvido em alguns casos emblemáticos de uma característica relevante desse longo período no poder, a montagem de aparelhos do partido na máquina pública.
“A invejável disciplina e empenho petistas na defesa da visão de mundo do partido se reflete no exercício do perigoso princípio de que ‘os fins justificam os meios’. Com este pano de fundo é que foi engendrado o mensalão, abastecido com dinheiro público desviado sem pudores para comprar apoio político-parlamentar ao primeiro governo Lula.
“Os últimos meses têm sido férteis em casos nada abonadores derivados da atuação de aparelhos petistas. O que operou desde o primeiro governo Lula na Petrobrás, num conluio entre sindicalistas, políticos e empreiteiros, apenas começa a ser conhecido com vazamentos de partes de longos depoimentos prestados sob acordo de delação premiada pelo ex-diretor da empresa Paulo Roberto Costa.
“O doleiro desse e outros esquemas, Alberto Youssef, fez o mesmo acordo com a Justiça e deve contribuir com informações também esclarecedoras deste que talvez seja o maior escândalo, em cifras, dos últimos tempos.
“Soube-se há pouco da atuação enviesada dos Correios, em Minas, para privilegiar as candidaturas de Dilma e de Fernando Pimentel, esta ao governo do estado, na distribuição de peças de propaganda eleitoral.
“Desvendada pelo jornal O Estado de S.Paulo, a história também é exemplar da atuação de aparelhos petistas, cujo resultado é a ‘privatização’ dessas estatais por interesses partidários. E como a eleição presidencial tem sido a mais dura enfrentada pelo PT desde a vitória de Lula em 2002, todo este aparato de militantes instalados dentro da máquina do Estado — funcionários concursados ou não — trabalha nestes dias com empenho extra. Há muita coisa em jogo nas urnas — além do poder em si, empregos e dinheiro.
“Na mesma linha dos golpes dados na Petrobrás, há o uso criminoso de fundos de pensão de funcionários de empresas públicas, em altas negociatas, diante do silêncio do braço sindical petista e, por tabela, dos funcionários.
“O próprio Youssef e o tesoureiro do PT, João Vaccari Neto, são citados em investigações sobre malfeitos com dinheiro da Petros, fundo dos empregados da Petrobrás, e Postalis, não por acaso o fundo dos Correios. Há várias operações de que resultam prejuízos para os fundos e, claro, lucros para os operadores.
“Pouco ou nada se sabe de reclamações contra esses virtuais assaltos aos fundos. Talvez o silêncio se explique por alguma estranha solidariedade ideológica. Na Petrobrás, há quem não critique a gestão no mínimo temerária de José Sérgio Gabrielli, em cuja administração Paulo Roberto fez a festa, por considerá-lo um ‘nacionalista’. Mais uma vez, fins justificam meios.” (Editorial, O Globo, 3/10/2014.)
Os escândalos na Petrobrás
* Irmão de ex-ministro carregava malas de dinheiro para o doleiro Youssef
“O doleiro Alberto Youssef, alvo principal da Operação Lava Jato, usava o irmão de um ex-ministro, um agente da Polícia Federal e um condenado da Justiça por crimes financeiros e citado no escândalo do Mensalão para fazer o transporte dos valores em espécie dentro de malas, maletas e no próprio corpo para agilizar e dissuadir a lavagem de dinheiro e manter um ‘eficiente’ sistema de ‘delivery’ do caixa 2.
“É o que afirmam o Ministério Público Federal e a Polícia Federal ao descrever o papel dos ‘mulas’ da lavanderia criada por Youssef. Eles utilizavam voos comerciais, jatos particulares e carros blindados para transportar parte dos bilhões de reais que a organização criminosa denunciada movimentou entre 2009 e 2014, em associação com o ex-diretor da Petrobrás Paulo Roberto Costa – que virou delator no processo e decidiu contar o que sabe em troca de redução de pena.
“‘Youssef é líder de uma organização criminosa (…) especializada em operações à margem do sistema financeiro nacional formada por subordinados diretos, parceiros de confiança, ‘laranjas’ e ‘mulas’ que carregam os numerários’, informa em ação penal em que o doleiro é réu, na Justiça Federal do Paraná. Youssef também decidiu colaborar com a Justiça em troca de benefícios.
“Segundo a ação na Justiça Federal do Paraná, ‘apurou-se, nas ligações telefônicas, que Youssef (chamado de Beto) fala sobre transações e pagamentos que envolvem significativos valores monetários’. Só na conta da MO Consultoria, uma das empresas de fachada do doleiro, foram sacados em espécie R$ 322 mil de 2009 a 2013, descreve o MPF. ‘Vale reforçar que a MO Consultoria, com a finalidade única e exclusiva de dissimular a origem de recursos públicos desviados da obra da refinaria de Abreu e Lima’.
“São quatro ‘mulas’: Rafael Ângulo Lopez (condenado na Operação Curaçao e investigado no Mensalão), Jayme Alves de Oliveira Filho (agente da PF lotado no Rio de Janeiro), Adarico Negromonte Filho (irmão do ex-ministro Mário Negromonte) e Carlos Rocha (doleiro ligado a outro grupo alvo da Lava Jato).
“Do ponto de vista hierárquico, Rafael Ângulo Lopez, de 61 anos, identificado como Veio, é figura central desse departamento da lavanderia. Era ele quem controlava o cofre de Youssef quando ele não estava em São Paulo. Na sua sala, no escritório do doleiro, a PF apreendeu uma maleta com cerca de R$ 500 mil, mais R$ 1,3 milhão e US$ 20 mil no cofre.
“‘Esses valores em espécie eram transportados pelo denunciado, em voos domésticos, ocultados no corpo ou em alguma valise, pela utilização de aviões particulares ou, ainda, valendo-se de veículos blindados, de transporte de valores’, informa o processo.
O Ministério Público Federal chamou atenção para o fato de o réu ter cidadania espanhola e ser idoso como facilitadores para ele viajar com dinheiro à Europa em voos convencionais. A PF identificou ainda nos grampos da Lava Jato que Lopez e Youssef conversaram ou trocaram mensagem 160 vezes no período em que eram monitorados.
“No dia 10 de setembro de 2013, por exemplo, o doleiro liga para Veio, às 13h38, e avisa que acabou de chegar a São Luiz (MA). O grupo negociava com o governo Roseana Sarney (PMDB) o pagamento adiantado de uma divida judicial (precatório) para a empresa Constran – alvo da Lava Jato. Youssef diz que irá passar para ele uma conta para depositar ‘7.000″ e que precisa ser entregue em espécie ‘1.000″ para ‘o mesmo cara de ontem, o Carlos’,
registra a PF. ‘Lopez pergunta então se deve reservar ‘300″ para amanhã, provavelmente referindo-se à R$ 300.000,00″, registram os agentes que consideram que 7 mil e 1 mil são R$ 7 milhões e R$ 1 milhão.
“Lopez é reincidente dos crimes de colarinho branco e diretamente ligado ao escândalo do mensalão. Ele foi condenado em 2010 pela Operação Curaçao por gerir uma conta (Tremazul Cell Co) que movimentou entre maio de 2005 e julho de 2006 um total de US$ 2,7 milhões, em 175 operações.
“No caso do Mensalão, seu nome apareceu ligado aos negócios do deputado federal José Janene (PP-PR), que morreu em 2010 e era réu do processo e suposto sócio de Youssef. Lopez também é cunhado de Enivaldo Quadrado, que no Mensalão foi condenado como proprietário da corretora Bônus-Banval, usada por Marcos Valério, operador da lavagem no caso de compra de apoio do Congresso.
“Segundo anotam os agentes da PF na Lava Jato, desde essa época ‘Lopez já deveria trabalhar para Youssef’. Os agentes afirmam acreditar que a Bônus-Banval era do doleiro, não de Quadrado, agora qualificado como seu funcionário na Lava Jato.
“Outro homem ligado indiretamente ao governo federal e suposto ‘mula’ de Youssef é Adarico Negromente Filho, o Maringá, irmão do ex-ministro de Cidades Mário Negromonte. Seu nome está registrado em um dos 32 telefones apreendidos com o doleiro, em março deste ano. São ao todo 34 trocas de ligação e mensagem com Youssef, alvo dos grampos.
“Uma das qualificações dos ‘mulas’ tem a foto do irmão do ex-ministro, sobre a alcunha Maringá e ladeada pela observação: ‘transporte de dinheiro em espécie. Obs: irmão do ex-ministro Mário Negromonte’.
“Em documentos apreendidos na sede de uma das empresas de Youssef, a GFD Investimentos – escritório de negócios do grupo em São Paulo – foi encontrada uma tabela de contabilidade com referências a ‘transferências’ com o nome Maringá à frente. Para a PF, são os valores movimentados pelos transportadores e suas participações nos negócios.
“Um agente federal usava seu cargo para facilitar o transporte de dinheiro de Youssef. É Jayme Alves de Oliveira Filho, conhecido como Careca. Ele está lotado no Aeroporto Internacional do Galeão, no Rio de Janeiro, e há suspeitas de que atuava também como informante do grupo.
“A análise dos grampos apontou 66 conversas entre o doleiro e Careca. Numa delas, o policial teria levado dinheiro em espécie para um endereço em Belo Horizonte, onde funciona uma unidade da empresa UTC. A construtora incorporou a Constran – beneficiada no precatório do Maranhão – e é investigada na Lava Jato por ser sócia do doleiro em negócios na Bahia. O grupo UTC/Constran é também sócio da concessionária vencedora do leilão do Aeroporto Internacional de Viracopos, em Campinas, em fevereiro de 2012. O grupo nega ilegalidades e diz não ser sócio do doleiro.
“Careca foi citado também no depoimento da doleira Nelma Kodama, presa na Lava Jato e ex-namorada de Youssef e do doleiro Raul Srour – outro detido da operação – por ter sido o policial indicado pelo doleiro para vender informações privilegiadas da PF. Ela disse ter pago R$ 40 mil ao agente, que ela chama de Careca, para receber antecipadamente as perguntas de outra investigação em que ela seria inquirida no Rio.
“Além dos ‘mulas’ usados para agilizar as entregas e dissuadir a polícia, a denúncia da Lava Jato afirma que Youssef montou um ‘eficiente e rápido sistema de entrega à domicílio’ de dinheiro do câmbio negro. ‘Em que os valores eram levados por portadores de confiança na residência do cliente. Para tanto, os transportadores da moeda inclusive viajavam de avião, para que a ‘entrega’ chegasse mais rápida. ‘
“E que era esse um dos principais papeis de Lopez, o Veio, cunhado de Quadrado.
“‘Além de pessoa idosa (tem 61 anos), o que diminuía a suspeita sobre ele pelas autoridades, era pessoa de confiança com que Youssef possuía relacionamento de longa data’, registra a denúncia.
“Outro fato destacado é que Youssef é piloto também e tinha comprado um helicóptero – apreendido na operação, na Bahia – e estava negociando a compra de um jato. Em uma das conversas interceptadas, ele comunica o interlocutor que está chegando em São Paulo em um jato particular. A PF registra que os materiais indicam que ele mesmo também fazia transporte de altos valores em espécie nesses voos.” (Ricardo Brandt e Mateus Coutinho, Estadão, 4/10/2014.)
* Com as delações do ex-diretor da Petrobrás e do doleiro Youssef, vai haver nova fase no combate à corrupção no Brasil, dizem juristas
“A Polícia Federal prepara nova etapa de buscas da Operação Lava Jato para provar aquilo que revelou o ex-diretor da Petrobrás Paulo Roberto Costa e que começou a revelar o doleiro Alberto Youssef em suas delações premiadas. As confissões e informações prestadas marcarão uma nova fase de combate aos crimes de colarinho branco no Brasil, afirmam juristas, delegados, procuradores e magistrados ouvidos pelo Estado.
“A confirmação de nomes e esquemas citados – uma exigência da lei para que a delação seja validada, dando benefício ao réu – transformará a Lava Jato num escândalo de proporções maiores do que o do mensalão, atingindo não só políticos de partidos aliados, como membros do próprio governo e empresários de grandes construtoras envolvidos na lavanderia montada pelo doleiro sob suspeita de movimentar cerca de R$ 10 bilhões entre 2009 e 2014.
“O instrumento jurídico não é novo. É um benefício previsto no processo criminal brasileiro desde 1990 que estipula que o réu traga novas informações ao processo ou ao inquérito sobre cúmplices e o esquema, em troca de redução de pena.
“‘A colaboração premiada é um método de investigação moderno e especialmente valioso para elucidar crimes complexos, nos quais, por vezes, somente quem tem conhecimento dos detalhes da atividade criminal são os próprios agentes’, afirma o juiz federal Sérgio Fernando Moro, que conduz as ações da Lava Jato.
“As delações que Moro homologa seguem o modelo de um contrato, minuciosamente elaborado com cláusulas. Moro alerta que ‘as informações prestadas pelo colaborador ficam sempre sujeitas à verificação e à corroboração’.
“!Para o juiz Nelson Bernardes, da 2.ª Vara de Campinas (SP), ‘a delação vai ser utilizada cada vez mais’.
“O instrumento surgiu como arma de combate ao crime organizado nos EUA e na Itália. No Brasil, ela vinha sendo usada sem regulamentação. No caso do mensalão, foram assinados termos de delação com os envolvidos, entre eles os donos da Garanhuns Empreendimentos, Lúcio Bolonha Funaro e José Carlos Batista. Eles ajudaram a comprovar os crimes cometidos pelo ex-deputado Valdemar Costa Neto (então líder do PL), entre 2002 e 2003.
“‘A organização criminosa é sofisticada, não pratica aquele crime que todos veem, usa o sistema bancário, laranjas, offshores, instrumentos difíceis de serem investigados. Portanto, quando é possível chegar a um membro de organização através de um instrumento investigativo legítimo, é possível revelar esquemas que juiz, promotor, delegado jamais ficariam sabendo. É um instrumento para se apurar o crime de forma profunda, como funciona, recuperar os bens, quem são os laranjas’, afirma Bernardes.
“Para os críticos, porém, trata-se de sistema de coação. ‘Vai ser usado largamente na polícia e no Ministério Público como forma de pressão e coação. Vai se tornar tortura legitimada. Porque você vai deixar o sujeito preso, como foi o caso do Paulo Roberto, e diz para ele: ‘quer sair? tá bom, colabora’, afirma o presidente da Comissão Nacional do Direito Penal da Ordem dos Advogados do Brasil,Pedro Paulo Guerra de Medeiros. ‘O Estado não vai mais investigar, não vai mais sair para a rua, vai prender para o sujeito colaborar.’
“Para a criminalista Beatriz Catta Preta, advogada pioneira em ações com delação premiada, ‘realmente existe forte resistência dos advogados, de uma forma geral, em atuar nos casos de colaborações premiadas’. Ela conduziu o acordo de Paulo Roberto Costa, mas renunciou, alegando que sua missão estava cumprida.’A delação é uma forma legal e eficaz de defesa’, avalia Catta Preta. ‘Não vejo porque me eximir de atuar em casos dessa natureza. Há situações em que o réu se vê absolutamente sem saída.’” (Ricardo Brandt e Fausto Macedo, Estadão, 5/10/2014.)
* Ex-diretor da Petrobrás diz que campanhas de PT, PMDB e PP foram irrigadas com dinheiro de propina
“No primeiro depoimento desde que obteve o direito de cumprir pena em casa, após acordo de delação premiada, o ex-diretor de Abastecimento da Petrobrás Paulo Roberto Costa disse ontem (8/10) que parte do dinheiro do esquema de corrupção na Petrobrás teria abastecido campanhas do PT, do PMDB e do PP em 2010. Ao responder a uma pergunta de um dos advogados do doleiro Alberto Youssef, Costa confirmou que havia desvio de recursos na Diretoria de Abastecimento, chefiada por ele. O ex-diretor disse ainda que recebia das empreiteiras 3% dos valores dos contratos. O dinheiro era repartido entre ele, Youssef e o PP. Cada parte ficaria com 1%. Costa afirmou ainda que também havia irregularidades nas diretorias de Serviço e Internacional, vinculadas ao PT e ao PMDB.
“- O Paulo deixou bem claro que esse esquema beneficiou a campanha de partidos em 2010. Três partidos grandes foram citados, e eles dividiam efetivamente o bolo da propina – disse Antônio Figueiredo Basto, advogado de Yousseff, que depôs com Costa ao juiz federal Sérgio Moro.
“O advogado não revelou, porém, quais os ‘três grandes partidos’ citados pelos presos na Operação Lava-Jato. A informação de que PT, PMDB e PP foram acusados é de investigadores da PF que participaram da força-tarefa.
“- Eles (Costa e Yousseff) declinaram a versão deles sobre um grande esquema dentro da Petrobrás com participação de pessoas jurídicas, agentes públicos e, principalmente, de agentes políticos – disse Basto.
“De acordo com o advogado, os acusados não citaram nomes, mas deixaram claro a participação de políticos no esquema:
“-Ficou muito claro a fortíssima influência de agentes públicos dentro desse sistema’ – disse.
“Perguntado quais seriam os partidos, Basto informou que um está disputando o segundo turno da eleição presidencial. Costa acusou cinco diretores da empresa de participação no desvio de recursos. Disse à Justiça que o presidente da Transpetro, Sérgio Machado, entregou-lhe R$ 500 mil, quantia também desviada do esquema.
“Em quase quatro horas de depoimento, o ex-diretor da Petrobrás ainda acusou José Eduardo Dutra, atual diretor Corporativo e de Serviços da empresa, de participar do grupo responsável pelas fraudes. Não detalhou o que teria sido feito por Dutra. E ainda denunciou mais três ex-diretores. Segundo ele, fizeram parte do esquema: Nestor Cerveró e Jorge Zelada (ambos da área Internacional) e Jorge Renato Duque (Serviços).
“- O depoimento do Paulo foi mais detalhado por ser uma pessoa dentro da empresa. Ficou muito claro que o meu cliente não era o chefe dessa quadrilha, não era chefe de nada, era o operador, uma peça da engrenagem. Ele não disse o nome do chefe porque o juiz não permitiu (que citasse os nomes dos políticos). Não haveria a possibilidade de isso funcionar não fossem os agentes políticos – disse Basto.
“Costa disse que empreiteiras eram beneficiadas. Segundo Basto, ele teria afirmado que recebeu dinheiro da Odebrecht. Márcio Farias, executivo da empresa, seria o contato do ex-diretor da Petrobrás . Costa confirmou que recebeu US$ 23 milhões. O dinheiro estaria depositado na Suíça. A empreiteira Camargo Corrêa, que nega participação, também teria sido citada, através do Consórcio Nacional Camargo Corrêa, formado pela empreiteira e Cnec. A empresa constrói a refinaria Abreu e Lima (PE). Orçada em R$ 2,5 bilhões, já custa R$ 20 bilhões.
“- As empresas eram submetidas a isso. Quem não participasse disso, estava sujeita até a quebra de contrato – disse Basto.
“A presidência do PMDB informou que ‘não tinha nada a declarar’. Os presidentes do PT, Rui Falcão, e do PP, Ciro Nogueira, não foram localizados para comentar a acusação. A Transpetro negou ‘com veemência’ as acusações contra Machado. Dutra não retornou aos recados do Globo. O advogado de Nestor Cerveró disse que as informações foram apresentadas sem provas. O Consórcio CNCC informou ‘que não teve acesso ao depoimento e repudia qualquer acusação de atuação irregular’. A Odebrecht nega veementemente as alegações caluniosas feitas pelo ex-diretor da Petrobrás. E o advogado de Duque disse que Costa será processado civil e criminalmente por suas acusações.” (Jailton de Carvalho, Letícia Paris e Germano Oliveira, O Globo, 9/10/2014.)
* Contadora diz que PT deu dinheiro para mensaleiro quitar multa do STF
“Pela primeira vez desde a sua instalação, em maio, um depoimento na Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) mista da Petrobrás acrescentou informações relevantes e inéditas para as investigações. A contadora que atuou para o doleiro Alberto Youssef e que já colaborou com a Polícia Federal (PF), Meire Pôza, depôs ontem (8/10) por cerca de quatro horas e detalhou a suposta participação de políticos em esquemas do doleiro, entre eles o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL).
“Meire também revelou que o PT repassou dinheiro para Enivaldo Quadrado pagar a multa imposta pelo Supremo Tribunal Federal (STF) na condenação do esquema do mensalão. Quadrado, que era dono da corretora Bônus-Banval, foi condenado por lavagem de dinheiro no julgamento do mensalão, com aplicação de pena alternativa e de multa de R$ 28,6 mil (valor da época, que foi atualizado). Ele também agia para o doleiro, conforme as investigações da PF.
“A contadora disse ter ido à casa do jornalista Breno Altman para receber R$ 15 mil mensais, por três meses, dinheiro repassado a Quadrado para o pagamento da multa, segundo ela. O total, portanto, teria sido de R$ 45 mil.
“- O PT pagava os R$ 15 mil para a multa do mensalão (aplicada a Quadrado). Não tenho conhecimento de que isso estava relacionado a chantagem – disse Meire à CPI.
“Segundo ela, os repasses foram em maio, junho e julho deste ano. Os pagamentos teriam continuado em agosto, mas diretamente a Quadrado.
“Ela começou a atuar como contadora para os empreendimentos de Youssef em 2011. Passou a emitir notas fiscais frias a empreiteiras que simulavam a contratação de serviços. Meire admitiu ter emitido notas no valor de R$ 7 milhões e disse que sabia da ilegalidade do ato. Questionada por que continuou com o doleiro, mesmo sabendo dos esquemas, disse:
“- O Alberto me perguntou uma vez se eu já tinha assistido ao filme ‘O Poderoso Chefão’ e disse: ‘Aqui é igual, aqui é a máfia, quem entra não sai’ A minha conta eu tenho condições para pagar, mas não pagarei pela conta dos outros.
“A contadora disse que Youssef se reuniu com Renan para acertar investimentos do fundo Postalis, dos Correios, em uma empresa de Youssef. A reunião ocorreu em 12 de março deste ano, cinco dias antes da prisão do doleiro, segundo Meire. O montante envolvido é de R$ 25 milhões, referente à metade de uma de-bênture lançada no mercado para arrecadar dinheiro a um empreendimento do doleiro na área de turismo. Outros R$ 25 milhões seriam aportados pelo Funcef, da Caixa Econômica Federal.
“- Eu estive com Youssef no café da manhã no dia 14. Ele afirmou ter vindo a Brasília dois dias antes e ter resolvido com o PT a aprovação da operação. Também disse ter conversado com Renan para acertar a ponta que era do PMDB e que, até o fim do mês, a operação com o Postalis iria sair. Não saiu porque Youssef foi preso – afirmou.
“O Globo revelou a história em 12 de setembro e detalhou que Meire mencionou à PF a existência de um ‘acordo verbal’ para que fundos de pensão investissem em ações de uma das empresas do doleiro. ‘Corretores’ – intermediários que fariam o dinheiro chegar aos partidos -ficariam com 10%.
“Em nota, Renan afirmou que ‘não conhece a pessoa mencionada no noticiário como ‘doleiro’ Alberto Youssef e que só soube da existência do mesmo após as informações publicadas pelos jornais’. Ainda segundo a nota, Renan ‘nunca esteve, agendou conversas e nunca ouviu falar de Alberto Youssef e de sua contadora’
“A contadora citou uma suposta participação da governadora do Maranhão, Roseana Sarney (PMDB), no recebimento de propina por conta do pagamento de precatórios do governo do estado à Constran. Meire disse ter se reunido com Youssef e o então secretário da Casa Civil do Maranhão, João Guilherme Abreu. O interesse da Constran era receber R$ 123 milhões em precatórios. Segundo Meire, foi acertado pagamento de propina de R$ 6 milhões, por conta de um acerto para parcelamento dos precatórios em 24 vezes. O Globo tentou contato com os assessores da governadora. Não houve retorno.” (Vinicius Sassine, O Globo, 9/10/2014.)
O mau uso das estatais
* Gerdau, amigo do governo Dilma, critica uso das estatais nas políticas
“Um dos empresários mais próximos ao governo Dilma Rousseff, à frente da Câmara de Políticas de Gestão, Desempenho e Competitividade, Jorge Gerdau Johannpeter criticou publicamente ontem o uso de companhias estatais de capital aberto como instrumento de implementação de políticas de governo.
“Ao tratar do tema governança corporativa em palestra na 39.ª Conferência Anual da Iosco, organização que reúne comissões de valores no mundo, no Rio, Gerdau mencionou que há hoje interesses distintos de acionistas minoritários e controladores nas estatais do País.
“Segundo ele, o conflito entre políticas de governo e os interesses das empresas traz ‘consequências terríveis sobre o mercado de capitais’.
“O acionista, avalia, deve ser esclarecido sobre os propósitos dessas empresas. ‘Deveria ser exigência quando uma empresa estatal vai ao mercado de capitais (dizer) se vai seguir regras de mercado ou vai se subordinar aos interesses do controlador que impõe as suas regras, aos interesses de políticas de governo’, disse, mencionando as companhias do setor elétrico como exemplo. Ele pediu a atenção da Comissão de Valores Mobiliários sobre o tema.
“Gerdau também atacou a falta de governança no setor público. Para o empresário existe um avanço na implementação da governança no setor privado brasileiro, mas não existe nem sequer o debate sobre o tema no médio e longo prazos na esfera governamental, responsável por gerir 40% do Produto Interno Bruto (PIB). Para o executivo o tema preocupa porque a eficiência do setor privado depende da governança pública.
“‘A governança é peça-chave. Mas onde há a maior carência de governança hoje? Na área governamental. O temor da morte faz a gente olhar para a frente porque a empresa morre se não tiver planejamento estratégico. O temor da morte no governo não existe’, afirmou.
“Segundo reportagem publicada pelo Estado em setembro, desde o fim do ano passado o governo excluiu do debate de temas estratégicos a Câmara de Políticas de Gestão, formada por empresários e presidida por Jorge Gerdau. Criada em 2011, seu objetivo era levar para o setor público uma gestão nos moldes do setor privado, mas não vingou, esbarrando na burocracia e na falta de apoio político.
“Questionado sobre a queda livre dos preços do minério de ferro em 2014, após os últimos anos do chamado superciclo – quando bateram a casa dos US$ 180 -, ele disse que a mudança de patamar é fato consumado. Porém, o alcance da queda da cotação dependerá de fatores como o crescimento chinês e também da atuação das grandes mineradoras.
“‘Já aconteceu (o fim do ciclo de alta). Só o mercado sabe (até que ponto a queda vai continuar). O mercado é muito influenciado por meia dúzia de empresas, ou menos. Vai depender se essas empresas terão uma política de guerra total pelo mercado ou não’, disse.
“Para Gerdau, algumas empresas vão se beneficiar do preço mais barato do minério. ‘A Gerdau em parte sim, em parte não. A flutuação do mercado é normal e as empresas têm de saber se beneficiar disso.’
“Nos últimos anos, a Gerdau apostou no setor de mineração dentro do processo de verticalização da produção siderúrgica. A companhia tem hoje um plano de elevar sua capacidade produtiva de minério de ferro das atuais 11,5 milhões de toneladas anuais para 24 milhões de toneladas em 2020. Até maio deste ano a divisão de mineração recebeu aportes de R$ 1 bilhão.” (Mariana Durão, Estadão, 3/101/2014.)
* O uso das empresas estatais pelo governo prejudica toda a economia brasileira
“O Brasil tem suportado um custo muito alto pelo uso político das estatais – quando são loteadas para acomodar companheiros e aliados e quando são desviadas de seus fins para servir, às vezes de forma desastrosa, às conveniências da política econômica. É muito raro, no entanto, grandes empresários, especialmente quando próximos do governo, apontarem o dedo para condenar esse abuso. Por isso tem particular importância o pronunciamento público do industrial Jorge Gerdau Johannpeter a respeito do assunto. Ele centrou sua crítica no conflito de interesses entre o governo, representante do controlador, o Estado, e os acionistas minoritários. Proposta do empresário: obrigar a estatal a deixar claro, quando busca recursos de investidores, se vai seguir regras de mercado ou subordinar-se aos interesses governamentais.
“O problema apontado pelo empresário Gerdau, membro da Câmara de Políticas de Gestão, Desempenho e Competitividade, órgão de assessoria do Planalto, é importante, de fato, mas é só um aspecto de uma distorção muito maior. A interferência do governo afetou perigosamente, em todos os casos, um universo bem mais amplo que o mercado de capitais.
“O desarranjo imposto ao mercado é o mais evidente. Interesses de minoritários foram atropelados, por exemplo, quando a presidente Dilma Rousseff resolveu antecipar a renovação de concessões do setor elétrico.
“Houve protestos contra a redução de tarifas e também contra a mudança no esquema de amortização dos investimentos anteriores. A compensação foi considerada insuficiente e o assunto foi discutido publicamente pelos minoritários da Eletrobrás. Mas prevaleceu o peso do governo.
“Acionistas foram também prejudicados pelo controle, imposto à Petrobrás, dos preços dos combustíveis. As duas grandes estatais perderam boa parte do valor de mercado, em pouco tempo, mas as decisões das autoridades foram mantidas. A correção das tarifas de eletricidade começou neste ano. Há poucos dias, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, prometeu iniciar em breve o ajuste dos combustíveis. Mas nenhuma dessas providências anulará os estragos já causados.
“Os danos mais amplos afetam toda a economia nacional. A política de preços imposta à Petrobrás distorceu, por exemplo, a relação entre os valores da gasolina e do etanol. Isso prejudicou os planos de produção e de expansão do setor sucroalcooleiro. O Brasil poderia ser um grande exportador de etanol, mas até a oferta interna de álcool foi prejudicada pela política oficial imediatista, imprudente e mistificadora.
“A interferência na formação das tarifas de eletricidade e dos preços de combustíveis fracassou como política anti-inflacionária. A inflação permanece há anos muito acima de 4,5%, meta oficial, e assim permanecerá enquanto persistirem suas causas, incluída a gastança federal.
“Mas o uso político das estatais envolve muito mais que a inepta mistificação dos preços. Envolve prejuízos para o fluxo de caixa das empresas e, portanto, para sua capacidade de investir. Isso limita a produtividade geral da economia e seu potencial de crescimento. As perdas vão muito além do mercado de capitais e afetam a vida e as perspectivas de todos os brasileiros.
“O uso político das empresas controladas pelo Estado tem assumido formas variadas, todas perigosas. Para começar, o loteamento de cargos compromete a qualidade administrativa e multiplica as possibilidades de corrupção. A pilhagem da Petrobrás, dia a dia mais exposta à visão do público, ilustra com assustadora clareza esse ponto. Mas a interferência pode produzir danos de outras maneiras.
“Forçar empresas do Estado a comprar equipamentos e componentes nacionais, mesmo quando mais caros, é impor a essas companhias custos adicionais e um desvio de finalidade. A distorção se torna especialmente grave quando esse desvio inclui a sujeição da empresa a objetivos ideológicos – por exemplo, o apoio a um governo bolivariano. A descrição dos desastres poderia avançar e incluir o uso de bancos estatais para fins políticos ou de mero companheirismo. Se quisesse, o empresário Gerdau poderia ter ido muito mais longe.” (Editorial, Estadão, 6/10/2014.)
* Defasagem do preço da gasolina é de 19,8%
“O preço da gasolina no Brasil está 19,8% inferior ao praticado no mercado internacional, e o do óleo diesel, 10,7%, segundo levantamento do Centro Brasileiro de Infra-estrutura (CBIE). Um repasse integral da atual defasagem de preços ao consumidor elevaria em 0,46 ponto porcentual o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), taxa que serve de referência para o sistema de metas de inflação. O cálculo foi feito pelo economista Salomão Quadros, do Instituto Brasileiro de Economia, da Fundação Getúlio Vargas (Ibre/FGV).
“Quadros lembra que o aumento de preços nas refinarias, tradicionalmente, não chega integralmente ao consumidor. Mas, se a opção do governo for por alinhar os preços internos aos internacionais, a expectativa é de que apenas 60% do reajuste chegue às bombas de gasolina e, assim, ao IPCA. Além da mistura de álcool anidro ao combustível vendido nos postos (25% do volume total), em geral, a cadeia fornecedora – refinarias, distribuidoras e revendedores – absorve parte da alta dos preços por uma questão de concorrência. Com isso, o peso do aumento para o consumidor fica menor. Ou seja, um reajuste de 19,8% da gasolina na refinaria significaria um aumento de 11,8% para o consumidor.
“Em agosto, a inflação, medida pelo IPCA, foi de 0,25%, acumulando 4,02% no ano. Com um reajuste dessa magnitude, ela pularia para a casa de 4,48%. A projeção do Boletim Focus, divulgada nesta segunda-feira, aponta para um IPCA de 6,32% no fim de 2014.
No caso do óleo diesel, como não há mistura de outro ingrediente no produto entregue no posto, em vez de 60%, o porcentual que deve ser repassado ao consumidor é um pouco maior, de 70%, segundo o economista. Com isso, a perspectiva é de um reajuste para o consumidor de 7,49%. No entanto, Salomão afirma ser improvável que o governo alinhe integralmente os preços internos aos internacionais.
“Cada 1% de aumento da gasolina significa uma alta de 0,0375 ponto porcentual no IPCA, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), responsável pelo índice. No caso do óleo diesel, o peso na inflação oficial é de 0,00143 ponto porcentual. Nesse cenário, considerando uma elevação para o consumidor de 11,8% na gasolina e de 7,49% no diesel, o impacto de um repasse integral da atual defasagem dos dois produtos nas refinarias brasileiras elevaria o IPCA em 0,46 ponto porcentual.
“Na semana passada, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, sinalizou que um aumento de preços dos combustíveis poderá acontecer ainda neste ano. Presidente do conselho de administração da Petrobrás, ao qual cabe a decisão de conceder reajustes, Mantega disse que ‘nos últimos anos sempre teve aumento’. Lembrou ainda que ‘no ano passado tiveram dois aumentos. Então, este ano, não será diferente. Vai ter aumento’. Mas não foi dado qualquer indicativo do porcentual do reajuste. O último aconteceu em novembro de 2013. Foi de 4% para a gasolina e 8% para o diesel.” (Fernanda Nunes, Estadão, 7/10/2014.)
Os erros na área de energia
* A política do governo fez a venda de gasolina aumentar e a de combustível limpo cair. O país está desperdiçando a vantagem energética que tinha
“A política de combustíveis tem feito várias vítimas. A mais prejudicada é a indústria do etanol, com 70 usinas fechadas e um futuro opaco. A Petrobrás tem perdas que pioraram muito no mês de setembro pela alta do dólar. A conta petróleo é a que mais pesa na balança comercial. Em cinco anos, as vendas de etanol caíram 35% e as de gasolina subiram 68%. Perde também a qualidade do ar.
“A proposta de zerar a Cide eliminou uma fonte de financiamento do setor de infra-estrutura de transportes, outro prejudicado pela política de subsidiar o consumo da gasolina. Mas nenhum setor sofreu impacto maior do que o do etanol.
“De setembro de 2009, quando quase se igualou ao consumo de gasolina no país, até julho de 2014, último dado divulgado pela ANP, as vendas de etanol caíram 35%: de 315 mil barris/dia para 205 mil. No mesmo período, o consumo de gasolina disparou 68%, de 330 mil para 555 mil (…). E ao contrário da lógica econômica, a Petrobrás perde mais quanto mais vende. Como o Brasil não produz toda a gasolina que consome, parte tem que ser importada. A estatal paga mais caro do que pode cobrar das distribuidoras, cerca de R$ 0,20 por litro no cálculo da consultoria GO Associados.
“O setor sucroalcooleiro viveu um período de euforia quando pareceu a solução perfeita por motivos ambientais e econômicos. O Brasil produziria o combustível para as próprias necessidades e para exportar. A crise de 2008 pegou o setor no meio de investimentos para os quais havia se endividado no exterior. Com a crise, o preço do petróleo desabou e as fontes de financiamento para a energia limpa secaram. A redução do preço do barril de óleo barateou também os derivados de petróleo, e cresceu a atração pelo combustível fóssil.
“Esse é o pano de fundo internacional. O pior golpe, no entanto, foi a decisão do governo de subsidiar a gasolina, desequilibrando artificialmente a competição entre etanol e combustível fóssil.
“Segundo dados da Unica, entidade que representa o setor, desde setembro de 2008, início da crise internacional, mais de 70 usinas fecharam as portas. Somente nos últimos dois anos, houve o corte de 60 mil postos de trabalho.
“O governo, ao mesmo tempo que estimulou a venda de carros, reduziu impostos sobre a gasolina e controlou seus preços. Em 2009, a Cide recolhia R$ 0,28 por litro do combustível. Em 2012, o imposto foi zerado e permanece assim até hoje. A gasolina passou a não acompanhar os preços internacionais — a diferença ainda é de 12% — e o etanol perdeu a preferência entre os motoristas daqui. Desperdiçou-se a vantagem de o Brasil ter uma frota de carros flex e estrutura de distribuição de etanol.
“— O etanol tem rendimento 30% menor que a gasolina. Então ele precisa ter um preço inferior para ser competitivo. Por isso, o congelamento tem sido determinante — explicou a presidente da Unica, também economista, Elizabeth Farina.
“Além disso, explicou Elizabeth, com a crise, canaviais envelheceram, por falta de renovação e investimentos, e ficaram mais sensíveis às chuvas fortes e às secas.
“O setor alcooleiro se divide entre a produção de açúcar e a de etanol. A queda dos preços das commodities afetou também o açúcar. A rentabilidade caiu.
“Há apenas um alívio: a crise energética tem sido boa para as usinas que produzem energia com o bagaço da cana, cerca de 40% do parque industrial. Elas conseguem vender a eletricidade excedente para a rede e se beneficiar do alto preço da luz. Mas os estragos da atual política são muito superiores a eventuais ganhos.” (Míriam Leitão, O Globo, 3/10/2014.)
* Dilma apareceu com a ilusão da conta de luz mais barata. A brincadeira vai custar R$ 61 bilhões aos contribuintes e consumidores
“Dava para desconfiar que, por tudo que continha de ilusório, o programa de redução de 20% das tarifas de energia elétrica anunciado pela presidente Dilma Rousseff em setembro de 2012 em pouco tempo se tornaria um pesadelo financeiro para os consumidores. Só não se sabia com precisão o tamanho da conta que a pressa, a improvisação, a demagogia e, sobretudo, o desastre operacional em que se transformou o programa de redução tarifária imporiam à sociedade. O relatório da auditoria realizada pelos técnicos do Tribunal de Contas da União (TCU), e aprovado na última reunião plenária dos ministros que compõem a Corte, calcula que o custo dessa aventura alcançará R$ 61 bilhões. É uma conta altíssima, e terá de ser quitada pelos brasileiros – consumidores e contribuintes em geral – até o fim de 2015.
“Nada terá sobrado, então, dos ganhos que eventualmente os consumidores de energia elétrica do País, de todas as classes e de todas as faixas de consumo, possam ter tido desde que, já em clima de campanha eleitoral antecipada, a presidente Dilma Rousseff anunciou seu ambicioso programa para o setor elétrico, com o objetivo de reduzir os custos e assegurar o abastecimento regular.
“O relatório do TCU não deixa dúvidas quanto à má qualidade do programa e de sua implementação. A edição da Medida Provisória (MP) 579, de 11 de setembro de 2012 (depois convertida na Lei 12.783, de janeiro de 2013), foi ‘precipitada’, pois as mudanças nas regras para o setor continham ‘equívocos e fragilidades’. Houve, em seguida, falhas gritantes na gestão do novo programa. Os resultados não poderiam ser diferentes dos que foram constatados pela auditoria e estão sendo sentidos pelos consumidores.
“‘Para o biênio 2014-2015, todo o efeito da MP 579 já estará eliminado, porquanto as tarifas residenciais e industriais, ao final do período, terão valores superiores aos vigentes em 2012’, afirma o relatório.
“Alguns números apurados pelos auditores do TCU como efeito das mudanças no setor elétrico impostas pela MP 579 foram por eles considerados ‘assombrosos’ – e de fato são. Eles se referem ao impacto do novo modelo sobre a chamada Conta de Desenvolvimento Energético (CDE), cuja finalidade foi alterada pelo governo Dilma, que a transformou numa espécie de caixa central das perdas geradas por seu modelo energético.
“Criada em 2002 para assegurar tarifas módicas para consumidores de baixa renda, a CDE tornou-se um fundo de compensação dos descontos tarifários concedidos pelo governo e de cobertura das perdas que o novo modelo para o setor de energia elétrica viesse a acarretar às empresas do setor.
“Somando as transferências do Tesouro para a conta – que não têm sido regulares, o que alimenta incertezas a respeito do fluxo dos pagamentos – e o custo do empréstimo de R$ 17,8 bilhões concedido por um grupo de bancos para as empresas distribuidoras em dificuldades, o TCU calculou que as despesas da CDE alcançaram R$ 25 bilhões em 2013 e devem totalizar R$ 36 bilhões neste ano.
“Pouco depois de anunciar o novo modelo para o setor, o governo decidiu adiar o leilão de venda de energia para as distribuidoras no regime cativo, isto é, em que as partes se comprometem a cumprir as condições negociadas para volume e preço. Quando o leilão foi, afinal, realizado, as condições do mercado haviam sido drasticamente alteradas, pois, com a seca nas principais regiões produtoras, praticamente não houve ofertas de energia para o mercado cativo. Para atender seus consumidores, as distribuidoras tiveram, assim, de comprar energia no mercado livre, a preço várias vezes mais alto, sem poder repassar a diferença integralmente aos consumidores.
“‘Não são as empresas (distribuidoras) que estão devendo’, observou o ministro do TCU José Jorge, relator do processo relativo ao novo modelo energético. As distribuidoras, esclareceu, ‘são apenas intermediárias’. Ou seja, ‘serão R$ 61 bilhões a serem pagos por contribuintes e consumidores’.
“O ministro de Minas e Energia, Edison Lobão, terá de explicar isso ao TCU. E o governo Dilma, à Nação.” (Editorial, Estadão, 5/10/2014.)
Os números ruins da semana
* Economistas baixam previsão de crescimento da economia pela 19ª semana seguida
“Os economistas do mercado financeiro reduziram ontem (6/10) pela 19ª semana seguida a previsão de crescimento do país neste ano. De acordo com a pesquisa Focus, do Banco Central (BC), a estimativa caiu de 0,29% para 0,24%. Os entrevistados também apostam que a inflação deve ser um pouco maior que a estimada até a semana passada. E, por isso, o Comitê de Política Monetária (Copom) deve voltar a aumentar os juros básicos, a Selic, 110 ano que vem com mais força do que o previsto.
“No levantamento do BC, a aposta é que os juros voltarão a subir em março de 2015 dos atuais 11% ao ano para 11,5% ao ano. Chegariam a 12% em julho, mas voltaria a cair em outubro e fechariam o ano em 11,88% ao ano. Na pesquisa anterior, a previsão era que a Selic voltaria a subir apenas em julho. E chegaria a dezembro em 11,38% ao ano.
“Já a projeção para a inflação neste ano passou de 6,31% para 6,32%. A meta do governo para o índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) é de 4,5%, mas há uma margem de tolerância de dois pontos percentuais para cima e para baixo.
“Para o professor de economia da Trevisan Escola de Negócios Alcides Leite, o quadro traçado não deve mudar muito com o segundo turno das eleições presidenciais. Ele lembra que o comportamento da economia tanto este ano quanto 110 ano que vem já está dado:
“- A inflação vai continuar alta no ano que vem. As próximas decisões influenciam 2016. Não mudam as previsões para 2015.
“Segundo o Focus, o crescimento para 2015 será de 1%.” (Gabriela Valente, O Globo, 7/10/2014.)
* Fundo Monetário reduz projeção de crescimento do Brasil de 1,3% para 0,3% e aponta problemas internos
“Com crescimento de 0,3% neste ano e 1,4% no próximo, bem inferior ao da média dos emergentes e de outros sul-americanos, o Brasil aparece como um dos países de pior desempenho no cenário divulgado ontem (7/10) pelo Fundo Monetário Internacional (FMI). Em julho, o Fundo previa crescimento de 1,3% este ano e de 2% em 2015. Entre os Brics, só a Rússia está mais atolada, mas a economia russa vem sendo afetada pela crise com a Ucrânia e pelas sanções impostas pelas maiores potências ocidentais.
“Os problemas brasileiros são primordialmente internos, segundo o chefe do Departamento Econômico do Fundo, Olivier Blanchard. Essa avaliação contraria o discurso da presidente Dilma Rousseff e do ministro Guido Mantega, habituados a culpar o resto do mundo pelos fiascos brasileiros. Mesmo com alguma recuperação nos próximos anos, em 2019 o produto interno bruto (PIB) do País ainda crescerá apenas 3%, enquanto a economia global avançará 4%, segundo as projeções da nova edição do Panorama Econômico Mundial, principal publicação periódica da instituição.
“A recuperação global continua, embora fraca e desigual, e a economia mundial deve crescer 3,3% neste ano, 0,1 ponto porcentual menos do que se previa no cenário de julho. A expansão de 3,8% estimada para 2015 é 0,2 ponto menor que a projetada há três meses. Em todo o mundo o potencial de crescimento se reduziu desde a crise de 2008, mas os desafios variam de um país para outro, assim como as soluções propostas pelo FMI. Para os Estados Unidos, a maior potência, a previsão é de crescimento de 2,2% em 2014 e 3,1% no próximo ano.
“O Brasil tem crescido pouco por insuficiência de investimento, baixo grau de confiança dos empresários e, neste ano, também por causa da incerteza política, segundo o economista Gian Maria Milesi-Ferreti, diretor adjunto do Departamento Econômico e um dos autores do Panorama. Superada a incerteza política, deverá haver alguma elevação do investimento no próximo ano. Mas a recuperação será ainda insegura, disse.
“O novo aperto da política monetária, com aumento dos juros a partir de abril do ano passado, também prejudicou o crescimento, de acordo com o economista. O impacto dessa política deve ainda permanecer por algum tempo, acrescentou, porque seus efeitos são defasados e ainda é preciso esperar o declínio da inflação. A piora do comércio exterior também afetou a economia brasileira, mas os principais problemas, repetiu, são internos.
“Mesmo repetindo o mantra das autoridades brasileiras sobre os efeitos defasados do aperto monetário, os economistas do FMI preveem pouca mudança na inflação nos próximos anos. Segundo o Panorama, os preços ao consumidor devem subir 6,2% neste ano e 6% no próximo, projeções muito parecidas com as do mercado financeiro. Esses números indicam a alta acumulada entre janeiro e dezembro. A projeção para 2019 refere-se à média do ano: 4,5%.
“Dentro de cinco anos, de acordo com essa tabela, a inflação brasileira ainda estará rodando em torno da meta de hoje. A maior parte dos sul-americanos deverá, como hoje, exibir taxas de inflação inferiores à brasileira. Projeções de prazo tão longo são em grande parte baseadas nas condições atuais da economia e da política econômica, mas embutem, com frequência, algumas apostas otimistas, como, no caso brasileiro, a superação da incerteza política e da insegurança dos empresários.
“Três países – Brasil, Argentina e Venezuela – puxaram para baixo a média de crescimento estimada para os sul-americanos, 0,7% em 2014 e 1,4% em 2015. O PIB argentino deve encolher 1,7% neste ano e 1,5% no próximo. Para a economia venezuelana foram estimadas contrações de 3% e 1%. A situação da maior parte dos demais países é muito melhor, mesmo com alguma desaceleração neste ano.
“As previsões incluem taxas de crescimento de 2% e 3,3% para o Chile, 4,8% e 4,5% para a Colômbia, 3,6% e 5,1% para o Peru, 4% e 4% para o Equador, 5,2% e 5% para a Bolívia e 4% e 4,5% para o Paraguai. Alguns fatores externos podem ter afetado os três países, mas os problemas primordiais são internos, disse Milesi-Ferreti, mencionando como exemplo os desajustes macroeconômicos na Venezuela.
“O volume do comércio global de bens e serviços deve aumentar 3,8% em 2014 e 5% em 2015, segundo o Panorama. O crescimento econômico dos EUA deve ser um dos principais fatores de dinamização do mercado internacional. Isso ampliará as oportunidades de exportação para muitas economias. Mas a recuperação americana também deverá ser o sinal para um aumento dos juros na maior economia do mundo, provavelmente no meio do próximo ano, lembrou Milesi-Ferretti.
“Para enfrentar a mudança no mercado financeiro, os países precisarão de ambiente macroeconômico estável, câmbio flexível para absorção de choques e uma política econômica com muita credibilidade, acrescentou o economista. Pelos dados e previsões do FMI, essas qualificações têm faltado ao Brasil.” (Rolf Kuntz, Estadão, 8/10/2014.)
* Fabricantes de motocicletas já demitiram mil trabalhadores este ano
“A queda superior a 10% nas vendas de motocicletas em 2014 sobre 2013 levou montadoras do setor a um processo de ‘demissões silenciosas’, segundo o presidente da Associação Brasileira dos Fabricantes de Motocicletas, Ciclomotores, Motonetas, Bicicletas e Similares (Abraciclo), Marcos Fermanian.
“‘São demissões que ocorreram ao longo do ano, com não-reposição de funcionários que deixaram as fábricas no polo de Manaus (AM)’, explicou.
“Segundo ele, o quadro de funcionários das associadas à Abraciclo caiu de 19 mil para 18 mil durante os nove primeiros meses de 2014.
“Sem a recuperação esperada para o setor após a Copa do Mundo e a manutenção das vendas diárias abaixo do limite de 6 mil unidades, fábricas de motocicletas iniciaram ainda um processo de paradas de produção em determinados dias da semana, já que as férias coletivas das montadoras foram dadas em junho. ‘Foi preciso reduzir ritmo diário e fazer esse ajuste fora de tempo’, afirmou Fermanian.
“Ontem (7/10), a Abraciclo revisou para baixo, pela segunda vez, as estimativas de produção e vendas de motocicletas em 2014 ante 2013.
“A entidade prevê uma produção de 1,55 milhão de unidades no fechamento do ano – ante uma estimativa anterior de 1,625 milhão de motocicletas, feita em junho -, queda de 7,4% ante a produção de 1,67 milhão de veículos em 2013.
“As vendas no varejo devem atingir 1,44 milhão de motocicletas, uma baixa de 5% ante o 1,5 milhão de unidades comercializadas em 2013.
“Segundo Fermanian, além do crédito ainda restrito ao financiamento de motocicletas de baixa cilindrada, o cenário conta com as condições macroeconômicas negativas e a desconfiança do consumidor.
“‘Essa desconfiança inibe até mesmo os que conseguem crédito, mas não o tomam por conta de um temor em relação ao futuro’, disse.
“Para o último trimestre do ano a expectativa é de ligeira melhora nas vendas, com a retomada do nível de vendas diárias em 6 mil unidades em outubro e novembro e um aquecimento ainda mais forte, mesmo que historicamente normal, em dezembro.” (Gustavo Porto, Estadão, 8/10/2014.)
* Intenção de compra é a menor em oito anos
“A perspectiva de consumo de bens duráveis no último trimestre é a pior em oito anos, o que indica um Natal fraco. Entre outubro e dezembro,40,4%dos consumidores pretendem ir às compras nas lojas físicas, revela pesquisa do Programa de Administração do Varejo (Provar) da Fundação Instituto de Administração( FIA)com a Felisoni Consultores Associados.
“É o menor resultado de intenção de consumo para o último trimestre do ano desde 2006, quando 36,8% planejavam ir às compras. Na comparação com o último trimestre de 2013, a retração esperada para este ano é de 6,4 pontos porcentuais.
“Nas lojas online, a perspectiva de compras também é de retração, apesar de o resultado ser relativamente melhor do que no varejo tradicional porque os consumidores doe-commerce têm renda maior e são menos afetados pela inflação. Neste ano 85,5% dos consumidores internautas informaram que vão adquirir bens duráveis no 4º trimestre, em comparação a 90,3% de 2013.
“Além de menos pessoas estarem dispostas a comprar, aquelas que pretendem adquirir bens eletrodomésticos, eletrônicos e móveis esperam gastar 24%menos,sem descontar a inflação: R$ 1.950 em 2014,em comparação a R$ 2.554 em 2013.
“‘As expectativas estão muito ruins e o Natal deste ano será pior do que o de 2013’,diz o presidente do Conselho do Provar/FIA, Claudio Felisoni de Angelo. Ele explica que a intenção de compra de bens duráveis, geralmente afetada por renda e crédito, reflete a confiança do consumidor na economia. E neste quesito houve uma deterioração do cenário.
“De cinco categorias de bens duráveis, a intenção de compra para o 4.º trimestre é menor do que no mesmo período do ano passado para todas linhas de produtos, tanto em lojas físicas como na internet.
“Felisoni diz que vários fatores estão contribuindo para o cenário negativo e para o aumento da cautela por parte do consumidor. ‘Hoje a taxa de desemprego é uma das mais baixas da história, mas quando o consumidor é questionado sobre a expectativa de desemprego constata- se um pequeno aumento.’
“Ele atribui esse cenário negativo ao baixo crescimento da economia, que fez com que tanto o emprego como a massa real de rendimentos se estabilizassem. Além disso, juros elevados e inflação alta afetam a intenção de consumo.
“A pesquisa feita com 500 consumidores na cidade de São Paulo, com renda média mensal de R$2.500, mostra que diminuiu em quase 10 pontos porcentuais a intenção de uso do crédito neste trimestre em relação ao mesmo período de 2013. Também revela que, por causa dos juros elevados e da inflação alta, caiu de 29% em 2013 para 21% este ano, a fatia dos que conseguiram poupar.
“O pé no freio colocado pelo consumidor foi sentido pelas redes varejistas. Eduardo Buzato, diretor da Vila Romana, conta que depois da Copa do Mundo as vendas voltaram para o padrão do ano passado e diz que se o desempenho do Natal repetir o de 2013 será ótimo.
“Já Chillibeans, especializada em óculos e acessórios, criou um programa de incentivos para os vendedores para impulsionar os negócios. Marinho Ponci, diretor da rede, diz que no 3.º trimestre as vendas pararam e começaram dar sinais de retomada a partir de setembro. ‘O fim do ano será aparentemente bom, mas não o suficiente para recuperar as perdas do ano.’ De acordo como Provar, as vendas do varejo ampliado (que inclui veículos, motos e peças e material de construção) devem fechar 2014 com queda de 1,39%.” (Márcia De Chiara, Estadão, 8/10/2014.)
A inflação
* Índice oficial da inflação estoura o teto da meta; em 12 meses, IPCA acumula 6,65%, a taxa mais alta desde outubro de 2011
“A inflação oficial no País mais que dobrou na passagem de agosto para setembro, diante do aumento das despesas com alimentos e passagens aéreas. O Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) saltou de 0,25% para 0,57%, informou, ontem, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). A taxa acumulada em 12 meses disparou para 6,75%, a mais alta desde outubro de 2011.
“O resultado do IPCA veio acima da expectativa do mercado financeiro. Analistas alertam que a inflação rodando muito além da meta estipulada pelo governo (de 4,5%, com dois pontos de tolerância para cima e para baixo) pode restringir o espaço para o reajuste de preços monitorados represados, como o da gasolina.
“O valor do combustível, no Brasil, está 19,8% abaixo do praticado no mercado internacional, segundo levantamento do Centro Brasileiro de Infra-estrutura (CBIE). Segundo o economista, decano da Pontifícia Universidade Católica (PUC), do Rio de Janeiro, e especialista em inflação, Luiz Roberto Cunha, um aumento de 5% na gasolina e outros 5% no óleo diesel significariam um adicional de 0,2 ponto porcentual na inflação do ano.
“Em setembro, os combustíveis ficaram 0,05% mais baratos. Em compensação, aumentaram os gastos com passagens aéreas, automóveis novos e conserto de veículos. As tarifas de energia elétrica, empregado doméstico e o gás de botijão também subiram.
“Após três meses consecutivos de queda nos preços, os alimentos voltaram a pesar no bolso das famílias, sendo responsáveis por um terço da inflação do mês. O período de entressafra encareceu itens importantes da cesta básica, como as carnes.
“Embora as carnes tenham sido os vilões da inflação, em setembro, o item que mais pesou no bolso dos consumidores até agora em 2014 foi a refeição fora de casa. O item já subiu 7,64% de janeiro a setembro, o equivalente a 0,39 ponto porcentual do IPCA de 4,61% registrado no mesmo período.
“A demanda em alta estaria por trás dos aumentos excessivos nos preços. ‘O desemprego está baixo, as pessoas estão comendo mais fora. Os alimentos estão subindo, mas esse não é o principal custo dos empreendimentos de refeição. Tem a energia elétrica, os salários vêm subindo mais que a inflação. A demanda nessa área não coloca muito limite para que os aumentos possam acontecer’, explicou Eulina Nunes dos Santos, coordenadora de Índices de Preços do IBGE. Em 12 meses, a inflação do grupo Alimentação e Bebidas alcançou 9,19% em São Paulo. No Rio de Janeiro, a alta é de 9,86%.
“Diante da resistência inflacionária, o próximo presidente da República corre o risco de começar 2015 elevando a taxa básica de juros, a Selic, alertou o economista-chefe do Banco Mizuho, Luciano Rostagno. ‘Corremos o risco de o teto da meta ser rompido neste ano e o próximo presidente, independentemente de quem for, já ter de elevar juros em janeiro’, disse.” (Daniela Amorim, Estadão, 9/10/2014.)
* Inflação se espalha e atinge 61,1% dos itens
“O salto da inflação registrado pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) de setembro, que atingiu 0,57%, veio acompanhado de outra má notícia: no mês passado, 61,1% dos itens, entre produtos e serviços que compõem o IPCA, tiveram aumento médio nos preços. Em agosto, o índice de difusão estava em 55% e no IPCA-15, tinha fechado em 56,7%.
“‘Isso mostra que as pressões inflacionárias são generalizadas e preocupantes e não se trata de um fator pontual e isolado que fez com que o IPCA de setembro atingisse 0,57%’, afirma o economista-chefe da SulAmérica Investimentos, Newton Rosa, que calculou o indicador de difusão.
“Ele observa também que os núcleos da inflação, que são um espécie de indicador de tendência, vieram pressionados em setembro, o que sinaliza um cenário preocupante. Em termos anualizados, a média dos núcleos calculados pelas três metodologias usadas pelo Banco Central ficou no mês passado em 6,72%, ressalta o economista.
“Na análise do economista do Instituto Brasileiro de Economia (Ibre), André Braz, o espalhamento da inflação ocorreu porque o grupo alimentação foi pressionado e ele abrange um número maior de itens.
“Mas essa não é a avaliação de Rosa, da SulAmérica Investimentos. Ele observa, por exemplo, que a difusão aumentou em setembro não só por causa do grupo alimentação, mas também porque houve aumento de preços administrados, como a energia elétrica, além da manutenção da inflação de serviços em níveis elevados.
“Já para o professor da Faculdade de Economia e Administração da Universidade de São Paulo (FEA-USP), Heron do Carmo, a alta do índice de difusão acrescenta pouco à analise do IPCA. ‘Sempre que a inflação sobe, a tendência é que ela se espalhe por um número maior de itens’, afirma ele.
“Apesar das divergências em relação à avaliação da difusão da inflação, os três economistas concordam que, depois do resultado de setembro, ficou mais apertado se manter abaixo do teto da meta de 6,5% este ano. Em 12 meses até setembro, o IPCA acumula aumento de 6,75%.
“‘Como temos muitos preços reprimidos e o governo disse que vai aumentar o combustível, se reajustar, a perspectiva é que estoure a meta. Mas se estourar será por pouco’, prevê Heron.
“Na opinião de Braz, o cenário para ficar dentro da meta ‘complicou’, levando em conta que a projeção do mercado de inflação de 6,4% não considera o reajuste da gasolina. Mesmo que a alimentação perca fôlego, Rosa acha que os preços administrados e o câmbio vão pressionar.” (Márcia De Chiara, Estadão, 9/10/2014.)
* A inflação de setembro ficou acima do esperado – e ainda está para vir aí o inevitável aumento dos combustíveis
“A inflação de setembro ficou acima do esperado, puxou o avanço em 12 meses para 6,75% e tende a se tornar fator relevante para a definição do jogo eleitoral.
“Nenhum analista esperava o 0,57% apontado nesta quarta-feira pelo IBGE. A expectativa do mercado, indicada pela Pesquisa Focus, do Banco Central (BC), era de que não passaria do 0,44%. E até mesmo as cinco instituições que mais acertam os prognósticos, os Top 5, ficaram no 0,40%.
Desta vez, contribuiu mais para esse avanço a esticada dos preços dos alimentos, justamente o item que vinha colaborando para a inflação mais baixa em julho e agosto. Também foi relevante o salto dos preços no setor de serviços, no qual a concorrência dos importados é bem mais baixa.
“A inflação de setembro veio mais espalhada. O índice de difusão (número de itens em alta) alcançou 61,4% da cesta de consumo, mais do que em agosto, quando foi de 55,3%.
“Se a evolução do IPCA de outubro vier superior a 0,57%, a inflação em 12 meses também subirá para acima dos 6,75%. Mas há razoável probabilidade de que, em todo o ano de 2014, fique abaixo do teto da meta, de 6,5%, porque a evolução do IPCA em dezembro de 2013 foi de 0,92%, relativamente alto para ser superado em dezembro deste ano.
“Há, no entanto, uma variável cujo impacto é de difícil avaliação. Trata-se do reajuste dos preços dos combustíveis. O ministro Guido Mantega afirmou inúmeras vezes que esse reajuste virá ainda este ano, supostamente logo após as eleições. A inflação de 2014 vai depender do tamanho desse reajuste. O economista Salomão Quadros, da Fundação Getúlio Vargas, para o Centro Brasileiro de Infra-estrutura (CBIE), avalia que o atraso dos preços da gasolina é de 19,8% e o do óleo diesel, de 10,7%. Se os preços forem reajustados nessa proporção, o impacto sobre a inflação seria de 0,46 ponto porcentual.
“Outra variável capaz de puxar a inflação para cima é o ajuste do câmbio que, por sua vez, também terá influência no desalinhamento dos preços dos combustíveis, porque o petróleo está cotado em dólares. Por enquanto, o BC vem despejando munição pesada para conter a alta do dólar. No entanto, passadas as eleições, o câmbio deve atuar bem mais solto, mesmo se o candidato da oposição sair vencedor.
“De todo modo, é provável que 2015 comece com uma inflação anual mais alta, próxima dos 7,0%. Isso significa que, seja qual for a composição do próximo governo, será inevitável um aperto contra a inflação, não só por meio da alta dos juros básicos (Selic), mas, também, por meio de maior aperto da política fiscal. Em outras palavras, a batalha contra a inflação deverá ser parte importante do novo mix de políticas a ser adotado.
“É bem mais complicado avaliar até que ponto a inflação mais alta será fator relevante no voto do segundo turno das eleições, no dia 26 de outubro. O clamor por mudanças tem sido apontado como determinante na definição da opinião do eleitorado. O reconhecimento pela presidente Dilma de que não teve voto em São Paulo demonstra que a operação de cooptação do eleitor de baixa renda com a distribuição de Bolsas Família não é suficiente para garantir a reeleição.” (Celso Ming, Estadão, 9/10/2014.)
* Esta é a 13ª vez, no governo Dilma, que o IPCA fica acima do teto máximo da meta
“A inflação permanece rondando a economia brasileira. Alta demais, por tempo demais. No governo Dilma esta é a 13ª vez que o IPCA fica acima do teto da meta. A alta de setembro, de 0,57%, foi puxada por alimentos que, depois de três meses de tranquilidade, voltaram a pressionar. Reduzem-se as chances de que o ano termine com a inflação abaixo do limite máximo da meta.
“As previsões de bancos e consultorias eram de um número menor para setembro. O professor Luiz Roberto Cunha, da PUC-Rio, esperava alta de 0,48%, em linha com projeções de outros especialistas, mas sabia, de véspera, que os vilões seriam as categorias ‘Alimentação e Bebidas’ e ‘Transportes’. Esta última acelerou de 0,33% em agosto para 0,63% em setembro, com as passagens aéreas decolando 17,85%. O primeiro grupo, de alimentos e bebidas, subiu 0,78% principalmente pelo aumento da carne, que apenas em setembro encareceu 3,17%. Vai acumular alta de 20% no ano, de acordo com Cunha.
“O próximo presidente do Brasil, não importando quem vença, vai receber o IPCA no teto. Em outubro, a taxa deve ficar, segundo Cunha, em 0,50%, um pouquinho menos do que o mesmo mês do ano passado. Mas em novembro, após as eleições, o governo deve reajustar a gasolina. O ministro Guido Mantega já disse que o combustível subirá. Isso pode fazer com que o índice de novembro supere 0,80%, levando a novo estouro da meta. Em dezembro, a taxa mensal vai ficar menor do que a do ano passado, que foi de 0,92%. Mesmo assim, o risco de não terminar o ano em 6,5% ou menos é grande.
“Há um simbolismo no sistema de metas de inflação: acima de 6,5%, o Banco Central tem que escrever uma carta pública justificando o resultado. Mas, com carta ou sem carta, o fato é que o índice tem estado muito acima do que deveria estar sem que haja qualquer crise que explique o desempenho. O Brasil não está crescendo, não há um choque em área alguma. Mesmo alimentos, que subiram agora, não repetiram este ano a disparada do começo de 2013, quando o acumulado em 12 meses neste item ficou todo o primeiro semestre em torno de 14%, o que para muitos analistas foi um dos estopins dos movimentos de rua de junho.
“Este ano, as grandes safras americanas de milho, trigo e soja reduziram a cotação de vários alimentos. Cereais e feijões vão ficar negativos, ou seja, ajudam o índice. Óleo de soja também terá queda. Água e esgoto — com a decisão estranha do governo de São Paulo de dar desconto para quem consome menos, mas não punir quem consumiu mais —, vai entrar também ajudando a reduzir a taxa.
“Com toda essa ajuda e a economia estagnada, se o índice tiver resultados próximos de 0,65% nos dois últimos meses de 2014, calcula Luiz Roberto Cunha, o ano termina com a inflação no teto.
“— Ou seja, o próximo governo vai ter muito trabalho com a inflação —, avisa o professor.
“Alguns preços estão com alta forte em 2014 ou há vários anos. No setor de serviços, a carestia fica sempre em 8% ou mais. Energia teve queda de 15% em 2013 e vai fechar 2014 com alta de 15%. A carne bovina terminará o ano com um aumento de 20%. Um dos componentes do IPCA que tende a ficar sempre elevado é o salário de empregados domésticos. Desde 2005, sobe acima de 10%. Este ano a alta será de 11%, mas isso faz parte da valorização do trabalhador. Não terá reversão.
“Sempre haverá aumentos por razões estruturais ou conjunturais de alguns grupos de preços. Por isso a taxa precisa ficar perto do centro da meta para acomodar as maiores variações. Quando o governo deixa a inflação próxima ao teto, qualquer evento, como foi a alta da carne em setembro, faz o índice estourar o limite.” (Míriam Leitão, O Globo, 9/10/2014.)
A economia estagnada
* Ainda está longe o movimento de modernização do parque produtivo da indústria, que está envelhecido
“Agosto foi melhor do que julho para a atividade da indústria. Cresceu 0,7%, com ajustes que levam em conta as variações sazonais. É um resultado um tanto inesperado, que merece atenção pelo simples fato de que se trata do segundo avanço mensal consecutivo – embora ainda pequeno – depois de cinco meses seguidos de queda.
Mas, decididamente, não dá para comemorar. Não há nenhuma indicação de que esteja em curso uma recuperação sustentável da produção industrial. Toda a economia fraqueja e o nível de confiança do empresário segue despencando, o que também é prenúncio de que a fase ruim tende a continuar. Nos oito primeiros meses de 2014, os resultados do setor são ruins: queda de 3,1% sobre igual período de 2013.
“A disposição de investir por parte da indústria quase não existe, como vai sendo mostrado pelo desempenho do setor de bens de capital (máquinas e equipamentos). Nos oito primeiros meses deste ano, esse subsetor ostenta queda de produção de 8,8%. O número ruim é reforçado pelas estatísticas de importação de bens de capital que, em 2014, até setembro, mostram recuo de 5,7% quando comparado com igual período do ano passado.
“Isso reforça a impressão de que ainda está longe o movimento de modernização do parque produtivo da indústria, hoje envelhecido. Seu maquinário tem, em média, 17 anos, contra 7 a 8 anos nos países que concorrem mais diretamente com o Brasil (dados do Ministério do Desenvolvimento). E, se não há a perspectiva de modernização do parque produtivo, também não há a de ganhos de competitividade. Ou seja, a indústria brasileira não terá condições de reagir para conquistar mais fatias do mercado externo e deve continuar perdendo mercado aqui dentro para o produto importado.
“As autoridades do governo Dilma vêm repisando que o comportamento da produção no segundo semestre será melhor do que o do primeiro. Esse resultado melhor não pode ser descartado, mas se ele se confirmar, não deverá indicar uma virada firme do setor. Seria construído sobre uma base muito fraca, sem arranque para os meses seguintes. É como comparar o desempenho de uma mesma tartaruga medido na subida com o produzido no terreno plano. É muito difícil que, ao longo de todo 2014, a contribuição da indústria para o PIB deixe de ser negativa.
“Enquanto não ficarem mais claras as diretrizes de política econômica que prevalecerão a partir de 2015, o empresário brasileiro permanecerá na defensiva, adiará decisões mais importantes e tenderá a perder ainda mais confiança na recuperação. Mas do ponto de vista de quem tem responsabilidade pela administração de um patrimônio – e não só de uma indústria – essa atitude de esperar e ficar olhando pode ser ruim.
“Como a Coluna desta quinta-feira procurou mostrar, mesmo se a presidente Dilma vencer as eleições, parece bem mais provável uma virada na política econômica do que a manutenção pura e simples das atuais condições fortemente desfavoráveis. Se isso se confirmar, o administrador que tiver permanecido parado, poderá reagir tardiamente e perder oportunidades de sair na frente.” (Celso Ming, Estadão, 3/10/2014.)
* “Só uma incompetência milagrosa poderia produzir estragos tão prodigiosos na indústria brasileira, no comércio exterior e nos fundamentos econômicos do País em tão pouco tempo”
“É preciso acreditar em milagres. Só uma incompetência milagrosa poderia produzir estragos tão prodigiosos na indústria brasileira, no comércio exterior e nos fundamentos econômicos do País em tão pouco tempo.
“A soma de exportações e importações ficou em US$ 347,96 bilhões entre janeiro e setembro, valor 2% menor que o de um ano antes, pela média dos dias úteis. Diminuíram tanto as vendas quanto as compras internacionais e mais uma vez o Brasil mostrou ao mundo uma perversa originalidade. Recessão, em outros países, tem normalmente um efeito corretivo. No país da presidente Dilma Rousseff, a inflação anual continua acima de 6%. A balança de mercadorias acumula um déficit de US$ 690 milhões em nove meses. O governo central, segundo os números do Tesouro, só conseguiu de janeiro a agosto um superávit primário de R$ 4,67 bilhões, 87,8% menor que o de igual período de 2013. Para atingir a meta, R$ 80,8 bilhões, a administração central terá de obter em quatro meses um saldo superior a R$ 76 bilhões, 16 vezes o alcançado no dobro desse tempo.
“Em outros países, governados de acordo com padrões mais normais, políticas de austeridade, às vezes com efeito recessivo, são usadas para corrigir desajustes. O caso brasileiro é muito diferente. Não houve nenhum esforço de ajuste. A recessão foi apenas mais um produto de uma incompetência de raras proporções, assim como o fiasco econômico dos três anos anteriores.
“A condição precária do comércio exterior é um espelho dos erros cometidos pela administração petista a partir de 2003. A política industrial nunca foi mais que um arremedo, com tinturas nacionalistas e desenvolvimentistas, de estratégias típicas de outras eras. Nunca se cuidou de fato da eficiência econômica e do poder de competição. A política foi sempre, nos últimos 12 anos, muito mais voltada para o protecionismo do que para a inovação e a produtividade. A isso se acrescentaram estímulos ao consumo bem maiores que os incentivos ao investimento.
“No primeiro trimestre deste ano, o coeficiente de exportação da indústria – proporção entre o valor exportado e o produzido – ficou em 19,8%. Nos primeiros três meses de 2007 ainda estava em 22%. Ao mesmo tempo, a participação dos importados no consumo de bens industriais passou de 17% para 22,5%, embora o Brasil tenha permanecido uma das economias mais fechadas do mundo. Os dados são da Confederação Nacional da Indústria (CNI).
“Na virada do século os manufaturados ainda representavam mais de 50% do valor exportado. A proporção caiu pouco a pouco e de janeiro a setembro deste ano ficou em 34,8%. No mesmo período de 2013 estava em 36,9%, com peso um pouco maior, mas também muito baixo para uma economia com a base industrial do Brasil,
“O governo tem uma desculpa também para isso, como para uma porção de outros problemas. A explicação, agora, é a crise da Argentina, principal mercado de exportação para os produtores brasileiros de manufaturados. Essa versão foi amplamente reproduzida, quando a imprensa divulgou, na quinta-feira, os números do comércio exterior de setembro. Mas ninguém deveria levar muito a sério essa conversa. A crise argentina até serve para esclarecer uma pequena parte da história – só uma pequena parte.
“A indústria brasileira vem perdendo capacidade de exportação há muitos anos. As vendas cresceram durante alguns anos, nesse período, mas os produtores tiveram dificuldades crescentes até para preservar sua participação nos mercados. A valorização do real atrapalhou as vendas. Mas uma parte do desajuste cambial é atribuível à inflação, quase sempre maior que a dos concorrentes.
“Empresários sempre reclamaram do câmbio valorizado, mas nunca, ou quase nunca, pediram medidas mais sérias para a estabilização dos preços e, portanto, dos custos internos. Acumulada em três anos, uma diferença anual de três pontos porcentuais de inflação pode virar um desastre cambial. A maior parte das pessoas parece desprezar esse detalhe.
“Além disso, há o velho e nunca resolvido problema do custo Brasil, formado por uma enorme coleção de ineficiências de origem estritamente nacional. Não dá para culpar o mundo malvado, nem a perversidade das grandes potências, pelo péssimo sistema tributário, pela escassez de mão de obra eficiente, pelas más condições de transporte ou pela incapacidade gerencial do governo – para citar só um pedaço da lista.
“Mas pode-se culpar o governo tanto pela incompetência administrativa quanto por erros graves de estratégia. Durante anos, a administração petista aproveitou a onda internacional de crescimento – e especialmente a expansão chinesa – para aproveitar sem trabalho as vantagens do crescimento econômico e do aumento das exportações. Internamente, a transferência de renda alimentou a expansão do mercado consumidor, mas os formuladores da política se esqueceram de cuidar também do aumento da capacidade de oferta.
“Sem atenção a outras oportunidades, o governo aceitou também a transformação do Brasil em fornecedor de matérias-primas para a China e de manufaturados para economias em desenvolvimento, especialmente da vizinhança sul-americana. Foi uma escolha ideológica, apresentada como estratégia inovadora pelos formuladores da diplomacia petista.
“Isso explica a vulnerabilidade do País à crise argentina. Ao renegar a política de inserção nos mercados desenvolvidos, o governo deixou à indústria brasileira, até por falta de uma estratégia modernizadora, poucas opções além de jogar na segunda divisão. Mas potências mais competitivas, como a China, podem invadir esse mercado e atropelar os competidores menos eficientes. A indústria brasileira tem perdido espaço também na vizinhança. De milagre em milagre, o Brasil recua à condição de colônia dependente de uma metrópole importadora de matérias-primas.” (Rolf Kuntz, Estadão, 4/10/2014.)
* O governo chega ao fim com um rosário de metas não cumpridas
“O governo Dilma chega ao final deste último ano do seu mandato com um rosário de metas não cumpridas.
“O crescimento do PIB começou o ano projetado em 3,8%, mas vai terminá-lo com alguma coisa entre 0,29% (projeção do mercado aferida pela Pesquisa Focus, do Banco Central) e 0,7% (como prefere o próprio Banco Central). Se for isso, a média destes quatro anos (incluindo este) é de um avanço do PIB em torno de 1,6%.
“Esse crescimento econômico medíocre, por sua vez, frustra a receita do setor público, porque não há nem produção, nem vendas, nem rendas em volume suficiente para gerar mais arrecadação de impostos.
“O fracasso das metas fiscais não é menor. O superávit primário (sobra de arrecadação para controle da dívida) estava programado para ser de 2,1% do PIB, tal como estava na proposta para o Orçamento de 2014, enviada ao Congresso no ano passado. Apesar dos truques contábeis, das pedaladas que, a partir de julho, adiaram execuções de despesas; e apesar das receitas extraordinárias, essa poupança foi minguando até que o governo jurou que ao menos entregaria 1,9% do PIB. Hoje se vê que o resultado final ficará perto de zero, se não for negativo. É o descumprimento que mais poderá pesar na eventual perda do grau de investimento para a qualidade dos títulos brasileiros. Se confirmado, esse rebaixamento provocará aumento das despesas com juros.
“Outra meta frustrada é a da inflação. As promessas eram de convergência para a meta. Apesar dos juros básicos (Selic) na altura dos 11% ao ano, apesar do atraso dos reajustes dos preços administrados (25% da cesta de consumo) para segurar a inflação na marra; e apesar do câmbio represado, também com o mesmo objetivo, o desfecho é a inflação no teto da meta (6,5%), com risco de ultrapassá-la nas semanas finais deste ano.
“O investimento deveria ter pelo menos crescido alguma coisa em relação ao mau resultado de 2013. Está em queda livre. As obras do PAC estão atrasadas e com orçamentos estourados. Os leilões de concessão e de serviços de infra-estrutura, do trem-bala, dos portos, aeroportos, rodovias, ferrovias, etc. vão sendo sucessivamente adiados.
O Banco Central começou o ano projetando US$ 10 bilhões de superávit comercial (exportações menos importações). Ficará abaixo de US$ 2,5 bilhões.
“Pelo menos na área do emprego, os resultados nunca foram tão bons. Em parte. O desemprego de 5,0% da força de trabalho é de causar inveja a governos de qualquer país de Primeiro Mundo. No entanto, no segmento mais importante, o do trabalho formal (registro em carteira), as metas também estão sendo frustradas. Deveria ser criado 1,5 milhão de empregos. Não devem passar de 1 milhão.
“Paradoxalmente, nenhuma dessas frustrações nem algum conjunto delas está sendo decisivo para exigir do governo uma virada na política econômica. As pesquisas apontam que 39% dos brasileiros consideraram seu governo ótimo e bom. A presidente Dilma deve repetir para si mesma e para seus auxiliares mais diretos que essa avaliação indica que a economia vai bem e que não precisa mais do que de alguns ajustes…” (Celso Ming, Estadão, 5/10/2014.)
* A situação econômica do Brasil é um samba do crioulo doido que o próximo presidente vai enfrentar para botar as coisas no lugar
“Samba do crioulo doido foi uma paródia criada em 1968 pelo talentoso jornalista Sérgio Porto (pseudônimo Stanislaw Ponte Preta) que descreve personagens da nossa história em situações fora do lugar, sem nexo. Com hilariante humor político, a música imaginava a escrava Chica da Silva obrigando a princesa Leopoldina a se casar com Tiradentes, que, eleito Pedro Segundo, se aliou ao vigário dos índios Padre Anchieta e os dois proclamaram a escravidão. O samba fez tanto sucesso na época que, na anedota popular, seu título passou a designar situações mirabolantes, sem sentido, desconexas, confusas, bagunça geral, quando ninguém se entende.
“Se vivo fosse, Stanislaw Ponte Preta estaria hoje inventando paródia parecida para descrever a situação econômica do Brasil depois de quatro anos da gestão Dilma Rousseff. É um verdadeiro samba do crioulo doido o que o vitorioso desta eleição vai enfrentar para recolocar as coisas no lugar. E, se as urnas confirmarem as pesquisas eleitorais, caberá à própria Dilma desfazer a desordem de seu primeiro mandato e construir e aplicar um plano de governo racional e coerente, se quiser produzir resultados satisfatórios nos quatro anos do segundo.
“Faz tempo que a economia entrou em parafuso. Se a presidente não mudar o rumo e insistir na improvisação, na estúpida política de apagar incêndio, não vai construir nada e ainda arrisca destruir os ganhos sociais conquistados no primeiro mandato.
“Dilma avisou que mudará o ministro da Fazenda, mas não revelou quem vai substituí-lo. Não vai ser fácil. Se ela buscar um candidato dócil e domesticado, como foi Guido Mantega, que não questione seus erros, ou procurá-lo nos quadros do PT, é melhor esquecer: a economia vai continuar estagnada, inflação e dólar em alta, investimentos em queda, falta de confiança de empresários e de consumidores agravada e o País pode mergulhar na recessão, aumentar o desemprego e reduzir dinheiro para saúde, educação, segurança e programas sociais.
“E, se ela buscar outro perfil de candidato, bom formulador de políticas, nome sério, reconhecido e respeitado em ambientes econômicos, tecnicamente capacitado e com enorme desejo de acertar, com toda certeza ela terá de abrir mão do concentrado poder de interferir em tudo e dar a palavra final em tudo, como fez no primeiro mandato. Há profissionais com esse perfil, sim, e dispostos a enfrentar o desafio, mas com certeza não se sujeitarão a abençoar escolhas erradas da presidente. Só aceitarão o cargo se tiverem carta branca para fazer o que for preciso para recolocar a economia nos trilhos.
“Mas não basta trazer para a Fazenda o melhor e mais competente ministro. Dilma precisa convencer-se de que fez tudo errado no primeiro mandato (derrubou o PIB; represou tarifas públicas e, mesmo assim, a inflação não baixou; desmoralizou as contas públicas; desarrumou as empresas elétricas; enfraqueceu a Petrobrás; distribuiu favores fiscais para indústrias que continuam desempregando; o BNDES fez empréstimos bilionários para empresas falidas que ficaram devendo ao banco; até hoje não acertou nas privatizações; no setor externo o Brasil tem o terceiro maior déficit de transações correntes do mundo; e até a balança comercial, que há décadas produz gordos superávits, este ano será deficitária).
“Reordenar a bagunça vai exigir de Dilma humildade para reconhecer erros, coragem e determinação para corrigi-los e confiança no futuro, além de construir um programa de governo competente, consistente e seguro, capaz de atrair investidores e recuperar a confiança de consumidores e empresários em seu governo. E será preciso persistir nesse programa – não mudá-lo a todo instante, como fez nestes quatro anos – e controlar e acompanhar seus resultados. Não se trata de uma questão ideológica, mas de uma questão da lógica do capitalismo. É assim que funciona. Ou ela prefere seguir os fracassos da Venezuela e da Argentina?
“No texto da música, com toda a sua maluquice, o crioulo doido conseguiu produzir algo: ‘A Leopoldina virou trem, Dom Pedro é uma estação também’. E Dilma?” (Suely Caldas, Estadão, 5/10/2014.)
* O que se vê pelos números é um desempenho muito perto do desastre
“A ficha que o Fundo Monetário Internacional (FMI) preencheu sobre o desempenho da economia do Brasil é desalentadora. Crescerá este ano apenas 0,3% e, em 2015, não mais que 1,4%. Essas magnitudes são o resultado de revisões seguidas, todas para baixo. (Veja a tabela abaixo.) Mais ainda, ao contrário do que vêm afirmando a presidente Dilma e o ministro da Fazenda, Guido Mantega, esse fiasco se deve às escolhas equivocadas de política econômica: ‘A fraqueza primordial (da economia brasileira) vem de fatores domésticos’ – afirmou, nesta terça-feira, o vice-diretor do Departamento Econômico do FMI, Gian Maria Milesi-Ferretti.
“Como das outras vezes, o governo Dilma preferiu desclassificar as projeções dos economistas do Fundo como irrealistas ou influenciadas pelos pessimistas dos seus próprios quadros e também os daqui, como fez o ministro Guido Mantega nesta terça-feira.
“O Banco Central do Brasil vem trabalhando com um avanço do PIB de 0,7%. É mais do que o dobro das previsões do FMI, mas, ainda assim, muito baixa. O mercado financeiro, ouvido semanalmente pelo Banco Central por meio da Pesquisa Focus, apontou, na semana passada, a média de crescimento do PIB para este ano de apenas 0,24%.
“Do ponto de vista macroeconômico é um desempenho muito perto do desastre. Baixíssima atividade econômica, como a de agora, predispõe o organismo econômico a infecções de todo tipo. Implica arrecadação mirrada, portanto, problemas para a execução do Orçamento. Quando conjugada com expansão forte das despesas, como ocorre agora, leva à expansão da dívida pública. Deixa a economia mais propensa à inflação, aos desequilíbrios no balanço de pagamentos e a distorções, como o desânimo e a queda dos investimentos.
“A insistência do governo, ontem (7/10) repetida, de que a frustração do PIB se deve unicamente à crise externa não tem cabimento. Se esse diagnóstico tivesse consistência, o desempenho da economia brasileira não ficaria assim muito abaixo da média dos demais países da América Latina (de 1,3%) e da média dos países emergentes (4,4%).
“Mesmo se fosse aceitável a explicação oficial para esse resultado medíocre, ficaria fácil de comprovar que o governo errou, quando não por outra razão, ao menos por não ter levado em consideração o impacto do mau desempenho mundial sobre a economia interna.
“Foram inúmeras as vezes, nos últimos três anos, em que a presidente Dilma e as autoridades da área econômica vieram a público para dizer que não havia nada de especialmente errado com a economia. E que, apesar da crise externa e graças à excelência da política econômica, vinham sendo incorporados cerca de 40 milhões de brasileiros ao mercado de consumo.
“Ao longo desta campanha eleitoral, a presidente Dilma insistiu em afirmar que a inflação está, sim, um pouco fora do ponto, mas, em compensação, a economia vive dias nunca vistos de pleno-emprego e a recessão foi evitada – como se um crescimento de apenas 0,3% neste ano fosse muito diferente da recessão.
“O governo Dilma chega ao fim do seu primeiro mandato com esse crescimento econômico aí, com uma inflação acima do teto da meta e com o nível de confiança mais baixo dos últimos cinco anos. Decididamente, não são boas credenciais para apresentar ao eleitor.” (Celso Ming, Estadão, 8/10/2014.)
* Dize-me com quem andas: Brasil, Argentina e Venezuela arruínam as projeções de crescimento e inflação da América do Sul
“Sair mal na foto é uma tristeza, mas estragar a foto da classe é um vexame. Brasil, Argentina e Venezuela cometeram esse papelão, ao arruinar as projeções de crescimento e de inflação da América do Sul publicadas pelo Fundo Monetário Internacional (FMI). A economia da região deve crescer apenas 0,7% neste ano, muito menos que a média dos países emergentes, com expansão estimada em 4,4%, segundo o Panorama Econômico Mundial divulgado ontem.
“O desempenho dos sul-americanos deve ser mais modesto do que tem sido desde antes da crise. Mas a perda de impulso está longe de ser, na maior parte da região, tão desastrosa quanto parecem indicar as médias de crescimento de 0,7% em 2014 e de 1,6% em 2015.
“O pior resultado, entre as economias mais dinâmicas da região, deve ser o do Chile, com 2% de aumento do Produto Interno Bruto (PIB). Taxas melhores são estimadas para Colômbia (4,8%), Peru (5,1%), Equador (4%), Bolívia (5,2%) e Paraguai (4%).
“Com esses componentes, a foto seria razoável. Mas o quadro geral ficou feio por causa de três das economias de maior peso na região. A maior de todas, a brasileira, deve expandir-se em 2014 apenas 0,3%, segundo estimam os economistas do FMI. É número pouco melhor que a mediana das projeções do mercado financeiro, de 0,24%, recolhidas na última pesquisa Focus do Banco Central. Para o PIB argentino, os técnicos do FMI calculam uma retração de 1,7% neste ano, seguida de mais um resultado negativo de 1,5% em 2015. Para a produção venezuelana, são apontadas duas contrações – de 3% em 2014 e de 1% em 2015.
“Brasil, Argentina e Venezuela formam uma espécie de triângulo das Bermudas na economia da América do Sul. A coincidência desses países no mau desempenho é perfeitamente natural e facilmente explicável. Não se trata de casualidade.
“Embora em graus diferentes, os governos dos três países têm-se mostrado estatizantes, intervencionistas, inclinados a disfarçar os desarranjos econômicos e, é claro, a atribuir a outros as consequências de seus erros. Se a economia perde vigor, é porque há uma crise internacional. Se a moeda se valoriza ou desvaloriza perigosamente, é por causa da política monetária de alguma potência. Se a dívida externa se transforma em pesadelo, é por culpa de fundos abutres ou de banqueiros gananciosos (nunca se discute como a dívida se formou, cresceu e se tornou insustentável).
“A cura da inflação nunca passa pelo controle do gasto público. Às vezes, nem o aperto monetário é admitido. Juros altos atrapalham e, portanto, é perfeitamente justificável diminuir de forma voluntarista o custo do dinheiro. Depois, é mais simpático e revolucionário combater a inflação por meio do controle de preços.
“Se, apesar disso, a inflação sai dos trilhos, a culpa é dos especuladores e exploradores do povo. Entre esses exploradores se incluem, naturalmente, os banqueiros. Isso rende até propaganda eleitoral. Se um banco central autônomo eleva os juros com o pretexto de combater a inflação, ninguém deve iludir-se. Os banqueiros serão os únicos beneficiários e usarão essa política para tirar a comida do prato do trabalhador.
“O bolivarianismo, bandeira e doutrina do governo venezuelano, é apenas a expressão mais completa, mais acabada e mais desastrosa desse tipo de política. A presidente Cristina Kirchner tem-se esforçado para chegar lá. É preciso reconhecer seus méritos. Não é fácil de criar problemas de abastecimento de comida num país com a tradição agropecuária da Argentina, mas ela, como alguns ilustres antecessores, conseguiu.
“Como os Kirchners, a presidente Dilma Rousseff tem-se mostrado simpática ao bolivarianismo e adepta de seus métodos econômicos e políticos. Tem sido fiel, nesse ponto, a seu criador e guru, o ex-presidente Lula. O mal planejado e mal executado projeto da caríssima Refinaria Abreu e Lima, em Pernambuco, é um dos produtos dessa simpatia. As consequências econômicas do bolivarianismo e de suas imitações estão resumidas nos fracassos de três governos dos mais desastrosos da América Latina contemporânea.” (Editorial, Estadão, 8/10/2014.)
As contas públicas desarranjadas
* Triangulação com empréstimo da Caixa Econômica alivia as contas do Tesouro
“O governo autorizou a Caixa Econômica Federal a emprestar R$ 1,9 bilhão à estatal goiana Celg, mas o Tesouro acabou recebendo de volta R$ 1,221 bilhão dessa operação – quase 65% do total. Os recursos serviram para quitar dívidas da companhia elétrica de Goiás, recentemente encampada pela Eletrobrás, com o próprio governo federal.
“A operação de triangulação financeira aliviou o caixa do governo em um momento de piora nas contas públicas. Com o empréstimo da Caixa, a Celg pagou dívidas com o fundo setorial que banca o programa de redução da tarifa de luz, a Conta de Desenvolvimento Energético (CDE). Sem o pagamento da Celg, a CDE teria de receber aporte do Tesouro.
“Além disso, o fim da inadimplência da Celg permitiu à Eletrobrás assumir o controle da companhia goiana. O Broadcast, serviço em tempo real da Agência Estado, teve acesso ao contrato do empréstimo.
“O pagamento das dívidas aumentou as receitas da CDE e ajudou o governo a reduzir despesas com o fundo. O governo tinha previsto repassar R$ 13 bilhões neste ano à CDE, mas reduziu a conta para R$ 9 bilhões.
“Do total de R$ 1,9 bilhão emprestado pela Caixa à Celg, R$ 1,221 bilhão foi destinado para quitar dívidas acumuladas pela estatal com os fundos do setor elétrico, principalmente a CDE. O Tesouro Nacional, atual gestor desse fundo, é responsável por abastecer a conta com recursos orçamentários para bancar a tarifa social da baixa renda, o custo das térmicas e o Luz para Todos.
“Do resto do empréstimo da Celg, R$ 238,8 milhões pagaram uma despesa com a Usina de Itaipu e outros R$ 200 milhões foram pagos em débitos de ICMS. Somente R$ 240 milhões serão usados para capital de giro e investimentos da empresa.
“Além do dinheiro da Celg, o governo espera a redução do preço da energia no curto prazo para evitar um gasto maior que os R$ 9 bilhões previsto para a CDE até dezembro. Fontes do governo informaram que o Tesouro pagou as despesas do fundo até maio. Quatro meses estão atrasados. A promessa é quitar os débitos após as eleições ou no início de 2015.
“Ao Broadcast, o Tesouro informou que a operação entre a Celg e a Caixa é um procedimento bancário normal. Em nota, afirmou que o empréstimo pedido pelo Estado de Goiás teve por objetivo a transferência de controle da Celg. ‘Caso contrário, a Celg teria patrimônio negativo e não poderia ser adquirida pela Eletrobrás’, diz a nota.
“Nesta semana, o secretário do Tesouro, Arno Augustin, disse que a queda na previsão de aportes à CDE estava relacionada a um ingresso de receitas para pagamento de dívidas. Ele afirmou, ainda, que a ‘normalidade’ é não haver repasse algum do Tesouro à CDE.” (Anne Warth e Adriana Fernandes, Estadão, 4/10/2014.)
* Brasil não cumprirá meta fiscal este ano e terá o pior superávit primário em 12 anos, diz Fundo Monetário
“A forte desaceleração econômica brasileira em 2014 impede que o governo entregue este ano a meta oficial de superávit primário (economia para pagamento de juros da dívida) de 1,9% do Produto Interno Bruto (PIB), segundo o Fundo Monetário Internacional (FMI). As projeções do FMI apontam para resultado de 1,3%, o menor em pelo menos 12 anos. Uma recuperação do quadro é possível a partir de 2015, desde que o governo retome a política fiscal antes em vigor, sem manobras fiscais, sugeriu a economista Martine Guerguil, do Departamento de Assuntos Fiscais do FMI, ao divulgar o Monitor Fiscal.
“No atual encontro, o Fundo tem sido muito cauteloso nas avaliações sobre o Brasil, devido às eleições. Nos últimos dois anos, vinha sendo explícito a respeito do enfraquecimento das contas públicas brasileiras. Mas o Monitor Fiscal só cita a previsão de descumprimento da meta e a atribui à frustração com o crescimento. Perguntada se havia necessidade de o Brasil desmantelar a contabilidade criativa para reconstruir a solidez fiscal, Martine respondeu:
“— Seria importante usar o arcabouço (fiscal) como ele foi desenhado. É o que nós temos dito. Isso não significa grandes mudanças em muitos pontos. O projeto para o Orçamento (de 2015) que foi apresentado basicamente segue essa regra. As autoridades expressaram o seu compromisso com a disciplina fiscal. Nós confiamos que esse arranjo será mantido e fortalecido quando for necessário.
“A economista disse que ainda é cedo para avaliar o impacto dos bancos públicos — BNDES, Banco do Brasil e Caixa Econômica Federal — na política fiscal. A expansão direcionada do crédito é alvo de críticas de analistas e do FMI porque foi “excluída” da contabilidade.
— Entendo que (o impacto) foi reduzido, mas obviamente o arranjo da nova política será desenhado quando houver um novo governo.
Ela não fez menção a governos ou períodos específicos. Mas a contabilidade criativa (exclusão de empresas públicas do ajuste fiscal, manejo contábil de receitas e despesas no Orçamento) começou a ser usada em meio à crise global, notadamente no primeiro ano de mandato de Dilma Rousseff, em 2011. O objetivo era abrir espaço para gastos e reativar a economia.
“A projeção de crescimento do FMI para a economia brasileira este ano despencou: era de 2,3% em janeiro e, na última terça-feira, foi revisada para 0,3%. Para 2015, a projeção também foi fortemente reduzida, de 2% para 1,4%.” (Flávia Barbosa, O Globo, 9/10/2014.)
A miséria persiste
* Desemprego e inflação levam 400 mil brasileiros para a extrema pobreza
“O Brasil conseguiu acabar com a fome, mas ainda precisa lutar contra a miséria. Pouco depois de o Fundo das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO) informar que o percentual de pessoas com insegurança alimentar aguda chegou a 1,7%, percentual considerado erradicação, a miséria parou de cair no país. Após uma década de queda sistemática da pobreza extrema, os dados da última Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) mostraram que ela passou de 6,1% para 6,2% da população no último ano. Em que pese ser considerada estabilidade estatística pelos pesquisadores, 422 mil pessoas foram empurradas para a miséria e passaram a integrar um grupo que hoje soma 12,531 milhões.
“Para Andrezza Rosalém e Samuel Franco, pesquisadores do Instituto de Estudos do Trabalho e Sociedade (Iets), o que explica a interrupção da melhora para os mais excluídos da sociedade é o mercado de trabalho. Enquanto na média, as taxas de desemprego estão em mínimas históricas (em torno de 6%), para os mais vulneráveis, a estagnação da economia já pesou. A pedido do Globo, os pesquisadores traçaram um mapa de onde estão e quem são os miseráveis no país. A taxa de desemprego dos mais pobres subiu de 25,5%, em 2012, para 30,4%, em 2013. Enquanto 43,8% dos trabalhadores no país são informais, entre os miseráveis essa é a regra: 96% vivem sem proteção social.
“Outra diferença foi a renda, que, na média, ainda acumula crescimento real, mas recua entre aqueles em pobreza extrema. Entre os miseráveis que trabalhavam, o salário caiu de R$ 129,7 para R$ 123,9. Nessa parcela, o orçamento das famílias era composto sobretudo por outras rendas (transferências, como Bolsa Família), e o rendimento no domicílio dividido pelos moradores era de R$ 58,5, em 2013, abaixo dos R$ 62,2, de 2012. O grupo dos 5% de brasileiros mais pobres viu sua renda encolher 11%.
“— Para quem estava ocupado, houve perda de poder de compra afetada pela inflação. Essa população é mais vulnerável e sente de imediato o impacto da desaceleração econômica — diz Franco.
“Os pesquisadores consideram miserável quem tem renda de até R$ 123, um patamar acima daquele usado pelo governo, de R$ 70, em 2013. Cada pesquisador trabalha com uma linha de extrema pobreza. Segundo Andrezza e Franco, apesar de o Nordeste concentrar mais da metade da pobreza extrema de todo o país, 56,5%, houve queda da miséria na região. Em 2012, 59,2% estavam nessa condição. A Região Norte também teve recuo de 14,2% para 13,8% na participação de extremamente pobres no país.
“Segundo o trabalho de Andrezza e Franco, o maior aumento dos miseráveis ocorreu na Região Sudeste, que respondia por 18,3% dos extremamente pobres do país e, agora, concentra 20,6% do grupo. Das 422 mil pessoas que entraram na linha da miséria no ano passado, 282 mil estavam, sobretudo, na área urbana de São Paulo.
“Os miseráveis têm acesso precário a serviços, mas aumentaram a sua escolaridade. Ao contrário da mãe, Janecleide Fernandes, de 18 anos, sabe ler e estudou até a quinta série. Isso não impediu a moradia precária no Recife. Ela mora com o filho Leonardo, de 3 anos, numa comunidade quase invisível, fincada em pleno manguezal, entre duas pontes que dão acesso aos bairros do Pina e Boa Viagem, na Zona Sul da capital.
“As casas têm tábuas irregulares, que margeiam becos estreitos sobre pedaços velhos de madeira, sem direito a banheiro, água encanada nem ligação oficial de luz elétrica. Para se ter acesso à comunidade, é preciso escalar uma mureta da ponte e subir uma escada enterrada entre a lama e as ‘ruas’ de madeira que dão acesso às palafitas onde moram catadores de sururu, marisco disputado por restaurantes da capital. A casa de Janecleide tem dois pequenos cômodos, não possui latrina. Os moradores carregam baldes d’água tirada de uma mangueira comum.
“— Aqui é assim, cada um no seu chiqueiro. Quem tem filho, tem que ter o seu lugar para cuidar dele — diz ela, que trabalha desde os 12 anos de idade e ganha hoje menos de meio salário mínimo por mês para a família.
“O fato de a miséria ter parado de cair em 2013 não significa retrocesso. Ao longo dos últimos dez anos, a pobreza extrema caiu ano após ano. Em 2004, eram 15,4% de miseráveis. No ano passado, a taxa era de 6,2%. Para estudiosos, com um patamar menor de miseráveis, fica cada vez mais difícil encontrá-los. O governo estima que 150 mil famílias ainda precisam ser alcançadas pelos programas sociais e lançou uma busca ativa para tentar localizá-las.
“Para Sonia Rocha, especialista em desigualdade e pobreza do Iets, e que utiliza outra linha de pobreza extrema, a maior dificuldade está no combate à miséria na área rural. Pelos cálculos da economista, um quinto da população do Maranhão rural é miserável. Ela lembra que a proporção de pessoas vivendo na extrema pobreza na área rural do país é o dobro da média para todo o Brasil. Também pelos cálculos da economista, houve aumento do percentual de miseráveis de 4,1%, em 2012, para 4,7% (sem o Norte rural), no ano passado, a maior alta desde 2008. A pesquisadora lembra que a pobreza extrema está ligada à presença de crianças na família: em 2013, 40% dos miseráveis tinham até 14 anos.
“— As políticas de transferência do governo são boas, mas não são capazes de zerar a miséria. Quando chega nesse nível muito baixo, é preciso, além da política de renda, associar outras políticas — afirma ela, que defende um programa de creches nas áreas mais carentes.
“O economista Rafael Osório, assessor da Secretaria de Assuntos Estratégicos (SAE), chegou a antever a superação da miséria em 2013, com a complementação de renda para famílias assistidas pelo Bolsa Família. Em seus cálculos, Osório viu um aumento em 2013 no total de miseráveis. Para ele, o principal fator foi o maior número de pessoas que se declararam com ‘renda zero’. Este grupo inclui os que recebem pelo trabalho apenas moradia, alimentação, roupas, vales-refeição ou transporte e medicamentos. Não são consideradas as transferências de renda. Quando isso ocorre, a renda média de quem está abaixo da linha de pobreza é ‘puxada’ para baixo.
“— Estamos estudando a Pnad para entender o que aconteceu. O baixo crescimento e a inflação ajudaram (a aumentar o total de miseráveis), bem como o fato de que o salário mínimo, por estar em patamar já bastante elevado, só tem impacto para as linhas de pobreza mais altas — diz Osório.
“O Ministério do Desenvolvimento Social disse que não se pronunciaria sobre os dados do Iets porque não teve acesso à pesquisa completa.” (Clarice Spitz e Letícia Lins, O Globo, 5/10/2014.)
10 de outubro de 2014
Outras compilações de provas da incompetência de Dilma e do governo lulo-petista:
Volume 140: Notícias de 9 a 15/5/2014.
Volume 141: Notícias de 16 a 22/5/2014.
Volume 142: Notícias de 23 e 29/5/2014.
Volume 143: Notícias de 30/5 a 5/6/2014.
Volume 144: Notícias de 6 a 12/6/2014.
Volume 145: Notícias de 13 a 19/6/2014.
Volume 146: Notícias de 20 a 26/6/2014.
Volume 147: Notícias de 27/6 a 3/7/2014.
Volume 148: Notícias de 4 a 10/7/2014.
Volume 149: Notícias de 11 a 17/7/2014.
Volume 150: Notícias de 15 a 21/8/2014.
Volume 151: Notícias de 22 a 28/8/2014.
Volume 152: Notícias de 29/8 a 4/9/2014.
Volume 153: Notícias de 5 a 11/9/2014.
Volume 154: Notícias de 12 a 18/9/2014.
Estréiam em janeiro duas novas atrações do 50 anos de Textos: Más Notícias do País de Aécio e O Julgamento do Petrolão.
CONTAGEM REGRESSIVA.
FALTAM SÓ 80 DIAS PARA O FIM DAS MÁS NOTÍCIAS.
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FALTAM APENAS 80 DIAS PARA O FIM DAS MÁ NOTÍCIAS.
O compilador sabe o que REESTATIZAÇÃO?
Muito sensata a analise, outro fator que ninguém esta notando, um fenômeno que aconteceu com a Venezuela no incio do Chavismo, e o êxodo de pessoas e de Capital do Brasil indo residir e investir, desde Paraguai,Uruguai a Canada,EUA e Europa, reflexo do caos na QUALIDADE DE VIDA em geral que se transformou o Brasil de Dilma(PT).