Os filmes só amam os livros quando os amam com segredo e reserva. Não me venham falar do Clube dos Poetas Mortos, execrável exibição circense do acto e do prazer da leitura. Confesso que tenho uma aversão parecida às sessões de leitura de poesia. Continue lendo “O vício é que educa”
Esta mãe morta parece apenas que dorme
Quando vemos, num filme, uma personagem que dorme, sabemos que estamos a ver um actor a fingir que dorme. Em A Palavra, de Dreyer, há uma mãe morta, num caixão aberto. Está morta, dizem, mas para a filha, criança inocente, e para o tio louco, esta mãe morta parece apenas que dorme. Continue lendo “Esta mãe morta parece apenas que dorme”
O homem que vai morrer
Toda a morte no cinema tem os paroxismos do “Adagio” de Albinoni. Um aviso: estou a pensar na morte dos actores, na verdadeira morte de cada um deles, que é o último filme que fazem. Continue lendo “O homem que vai morrer”
Um bocado bruto de realidade
Ainda hoje, a meio de um filme, quando acordo sobressaltado do delicioso embalo de sono de um minuto, fico ali a pensar que estou a ver no ecrã a mais pura realidade, que aquelas sombras não são actores, mas sim pessoas a viver mesmo o que, por isso, tão bem representam. Continue lendo “Um bocado bruto de realidade”
Não era rico, era monopolista
O cinema não me deu tudo. O tempo que julgo ver nos filmes talvez seja a ideia de tempo que lhes dou eu por já a levar da vida. Dos 10 aos 15 anos, no liceu, com excepção das aulas, todo o tempo foi meu. De um total anual de 8.760 horas, 7.880 gozei-as como e quando quis, senhor e dono de 90% do meu tempo. Não era rico, era monopolista. Continue lendo “Não era rico, era monopolista”
Os tiros fizeram do carro um passador
Quando a conheci, já ela morrera há sessenta anos. Conheci a Bonnie que Clyde amou, em 1994, na mansão de um big shot do cinema, em Beverly Hills. Sábado e sol de Maio, duas bandas de jazz, vastos relvados, as mesas sob toldos protectores. Podia ser a festa do crisma do filho de Michael Corleone, no Godfather part II. Continue lendo “Os tiros fizeram do carro um passador”
O Al Capone que Brian De Palma não filmou
Entrou em Alcatraz e o director da prisão não voltou a ter sossego. Choviam telefonemas e visitas. Al Capone era, em 1934, o que ontem foi um O. J. Simpson e hoje é o caso BES. Continue lendo “O Al Capone que Brian De Palma não filmou”
O charlatão gentil
Foi um charlatão, ápodo que se dá a certos homens de talento. Orson Welles, deslumbrado, filmou-o em F for Fake. Chamemos-lhe, como ele se auto-baptizou, Elmyr de Hory. Continue lendo “O charlatão gentil”
Ninguém é profeta na sua terra
Fui um libertário. Não era só pôr flores na cabeça como vinha nas fotografias autorizadas de Woodstock. Despi-me, como ainda não sabíamos que se tinham despido em Woodstock, para irmos, boys and girls, tomar banho nus e de meia-noite, mais ou menos por ali onde agora José Eduardo dos Santos tem o seu Futungo. Continue lendo “Ninguém é profeta na sua terra”
Na beleza de um, a beleza do outro
Ela meteu-lhe os dedos à boca e salvou-lhe a vida. É bom que se saiba que eles se amaram. Podem não se ter amado em géneros, mas fosse qual fosse o amor que se tiveram, Elizabeth Taylor e Montgomery Clift amaram-se. O coup de foudre aconteceu-lhes em A Place in the Sun, filme encandeado pela beleza dos rostos deles. Continue lendo “Na beleza de um, a beleza do outro”
Locke é cinema em alta voz
Se nunca viram um filme em alta-voz, experimentem. Esqueçam o 3D, o Imax e corram a ver Locke, pequena, monótona e exaltante obra-prima. Em Under the Skin e Blue Ruin, os mais belos filmes de estreia do ano, os carros eram protagonistas, uma operária Ford Transit com a que já sabem Scarlett ao volante, um arruinado Pontiac que ter volante já era uma sorte. Continue lendo “Locke é cinema em alta voz”
James Dean vem aÍ
O Porsche Spyder 550 prateado, o número 130 pintado nas portas e no capô, estava ali. Os dois homens entraram prontos para uma viagem de sete horas. Estavam em Los Angeles, Califórnia, EUA, e partiriam para Salinas, no mesmo estado, para uma corrida de automóvel – era o dia 30 de setembro de 1955. Continue lendo “James Dean vem aÍ”
Dobrou-se para pintar as unhas dos pés
É nela que deve pensar toda a mulher que hoje pinta as unhas dos pés. Ninguém se dera ao trabalho de se dobrar. Pola Negri dobrou-se, pintou essas unhas térreas e lançou uma moda que persiste. Continue lendo “Dobrou-se para pintar as unhas dos pés”
O ouvido fino do meu pai
Sean Connery pai ou Harrison Ford filho guiam com estilo a moto e sidecar de Indiana Jones. Deviam ver-te, pai, a rasgares, na tua BSA, ao sol e à brisa dessa Angola que era e não era nossa. Levavas-me ao Liceu, ao Morro da Lua, à pesca ao Cacuaco. E agora? Não sei por onde andas, pai. Continue lendo “O ouvido fino do meu pai”
Stravinsky e os pássaros-lira
Se eu já estivesse vivo e me tivessem convidado, daria logo, de caras, com Katharine Hepburn e Igor Stravinsky em amena cavaqueira na sala. Continue lendo “Stravinsky e os pássaros-lira”














