O bolsonarismo luta para desestabilizar as polícias

Jair Bolsonaro e seus seguidores lutam incessantemente contra os princípios e as instituições democráticas nas mais diversas frentes. Tentam abalar o respeito das Forças Armadas pela Constituição, procuram dinamitar a imprensa livre, incitam a população contra o Legislativo e o Judiciário.

A extensão de suas ações é gigantesca, abrangente.

Mas uma das mais fortes, mais visíveis e mais perigosas das ações do bolsonarismo para minar a democracia é a luta para insuflar as polícias estaduais contra as leis, a autoridade dos governos estaduais, a hierarquia.

Felizmente, o jornalismo profissional tem acompanhado de perto essa tentativa de aliciamento das polícias, especialmente as militares, pelo bolsonarismo. E tem denunciado as manobras claramente antidemocráticas, golpistas.

Neste domingo, dois dos três maiores e mais importantes jornais brasileiros, O Globo e O Estado de S. Paulo, publicaram reportagens sobre o avanço do bolsonarismo sobre as policiais estaduais.

Faço questão de deixar registrados aqui os dois textos.

É preciso que a Câmara dos Deputados abra um dos mais de 50 pedidos de processo de impeachment de Jair Bolsonaro, o quanto antes.

Enquanto isso não acontece, é preciso que a sociedade se mantenha atenta, vigilante.

Como bem lembrou O Estado de S. Paulo em editorial da quinta-feira agora, 1º/4, “para liberticidas contumazes, leis nada dizem. Por isso, mais do que nunca , o preço da liberdade segue sendo a eterna vigilância”. (Sérgio Vaz)

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Lideranças de baixa patente das PMs tentam incitar tropa contra governadores adversários do  Planalto

Por Bernardo Mello, Filipe Vidon e Rayanderson Guerra, O Globo, 4/4/2021

RIO – Lideranças policiais alinhadas ao discurso do presidente Jair Bolsonaro vêm confrontando medidas de combate à Covid-19 determinadas por governadores que fazem oposição ao governo federal. A tentativa de incitar setores das polícias contra o Executivo estadual, pano de fundo dos protestos após a morte na Bahia do soldado Wesley Santos, no último domingo, também aparece em estados como Ceará, Paraíba, Pernambuco e Espírito Santo.

Segundo analistas e até membros da bancada da bala, há uma tentativa de “politizar” queixas históricas da Polícia Militar, ligadas a questões salariais e estrutura de trabalho, para conservar o apoio ao presidente. O discurso encontra mais eco nas patentes mais baixas e resiste mesmo diante de insatisfações com a PEC Emergencial, que prevê congelamento de salários.

Na Bahia, o deputado estadual Capitão Alden (PSL) liderou uma manifestação de policiais na quarta-feira que, embora negasse “partidarismo político”, conclamava os agentes a “lutar contra governos que tentam impor medidas inconstitucionais”. A fala é um ataque a ações como lockdown, toque de recolher e fechamento do comércio, atribuições conferidas a governadores e prefeitos na pandemia, segundo decisão do Supremo Tribunal Federal (STF).

Outro deputado baiano, Soldado Prisco (PSC), que chegou a ser expulso da PM por participar de motins, tentou associar decretos do governador Rui Costa (PT) à morte do soldado Wesley — antes de atirar na direção de agentes do Bope e ser neutralizado, o policial gritou não querer “prender trabalhador”. O discurso foi amplificado por aliados de Bolsonaro. Mesmo sem evidências, a presidente da Comissão de Constituição e Justiça da Câmara, Bia Kicis (PSL-DF), ligou a morte do PM a uma resistência a “ordens ilegais”. Criticada nas redes e por colegas, ela apagou a publicação.

Em pronunciamento, Rui Costa lamentou as “mentiras e ameaças” contra ele e outros governadores. O Ministério Público acompanha as investigações que apuram as circunstâncias do aparente surto psicótico do PM e da reação do Bope.

Além de Alden e Prisco, que se apresentaram como apoiadores de Bolsonaro na última eleição, outras lideranças alinhadas ao presidente usaram o episódio para fustigar governadores de seus estados. No Espírito Santo, o deputado Capitão Assumção (Patriota), que liderou uma paralisação da PM em 2017, alegou que o governador Renato Casagrande (PSB) também tenta “jogar a polícia contra o trabalhador” com medidas restritivas. O deputado paraibano Cabo Gilberto Silva (PSL) acusou governadores de tentarem “rasgar a Constituição”.

— O que aconteceu na Bahia não é caso isolado. Os governadores, especialmente no Nordeste, querem desgastar o presidente — disse.

Segundo um ex-comandante-geral da PM ouvido pelo GLOBO, a base bolsonarista tenta “transformar uma onda em tempestade” e instrumentalizar a ação das polícias, em um “ciclo vicioso” de uso da força e desobediência. Ele afirma, porém, que a recusa da polícia baiana em ceder a apelos de paralisação mostra “resistência” à politização. A autorização do Ministério da Saúde para que integrantes das forças de segurança sejam vacinados também é vista por governadores como um fator que pode reduzir tensões.

Para o presidente do Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP), Renato Sérgio Lima, Bolsonaro vem combinando o apoio de lideranças policiais a tentativas de expandir, via legislação, sua influência sobre as corporações. Segundo Lima, o projeto de lei apresentado pelo líder do PSL, Major Vitor Hugo (GO), para ampliar poderes do presidente numa “mobilização nacional” durante a pandemia se dirigia tanto às Forças Armadas — cuja base também é alvo de apelos de radicalização feitos pelo bolsonarismo —, quanto à PM. Um decreto baixado na ditadura, e que segue em vigor, subordina PMs ao governo federal em caso de mobilização.

Segundo o presidente da Associação dos Cabos e Soldados de Pernambuco, Alberisson Carlos, há uma “revolta nos quartéis” contra “medidas absurdas” na pandemia. No entanto, o fato de as PMs estarem sob guarda-chuva dos governos estaduais e de as medidas restritivas terem aval do STF, como reconhece Alberisson, desencoraja paralisações.

— Ao mesmo tempo em que há a revolta, há o medo de perder o emprego — afirmou.

No ano passado, mais de cem policiais do Ceará foram afastados da corporação após uma paralisação em fevereiro. Uma das lideranças que atuou no motim, o deputado Soldado Noélio (PROS), membro da base bolsonarista local, vem criticando o lockdown do governador Camilo Santana (PT).

Embora movimentos de paralisação da PM tenham se tornado recorrentes — houve cerca de 50 nas últimas duas décadas —, parte dos representantes de policiais adotaram cautela diante dos apelos bolsonaristas de embate contra governadores neste ano. Líder da bancada da bala na Câmara, o deputado Capitão Augusto (PL-SP) disse não ver motivo para paralisações na Bahia ou em outros estados.

O deputado e ex-policial baiano Pastor Sargento Isidório (Avante), que esteve à frente de um motim no início dos anos 2000, associou ataques ao governador Rui Costa, de quem é aliado, à proximidade das eleições de 2022:

— Quem tenta usar o caixão de um PM como palanque eleitoral não quer resolver nada, e sim exaltar os ânimos.

Prisco, um dos cabeças do protesto na Bahia, nega a associação eleitoral e se diz indignado com governadores “que querem um exército particular para cumprir suas ordens”.

Na avaliação de Renato Sérgio Lima, do FBSP, a narrativa alimentada por Bolsonaro empurra lideranças da polícia a um discurso radicalizado, para que se mantenham em sintonia com as bases.

— Bolsonaro não fez nada para resolver problemas concretos das polícias. Só que ele joga esta insatisfação toda nos governadores, criando uma narrativa que desencoraja líderes de associações de fazerem críticas a ele, sob risco de perderem apoio.

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Bolsonarismo usa covid-19 para desestabilizar PMs e governos estaduais

Marcelo Godoy e Pedro Venceslau, O Estado de S.Paulo, 4/4/2021

Quando a Polícia Militar de São Paulo anunciou que a vacinação para seus integrantes ia começar no dia 12 de abril, no mesmo dia todos os posts publicados pela corporação em uma rede social foram atacados por bolsonaristas, que afirmaram: “Vocês são covardes! Estão batendo em trabalhadores, seus capachos do calcinha apertada”. Outro bolsonarista, crítico à vacina Coronavac, do Instituto Butantan, escreveu: “Fico em dúvida se comemoro. Orações para vocês”.

O ataque às polícias nas redes sociais com informações falsas se multiplicaram em 2021, transformando a atuação da extremadireita no principal fator de instabilidade política para as forças de Segurança. “Já faz algum tempo que estamos sofrendo estes ataques. Alguns perfis lançam vídeos de abusos policiais de outros contextos ou mais antigos e fazem parecer que são atuais e contra a população”, disse o coronel Robson Cabanas Duque diretor da Comunicação da PM.

O fenômeno não atinge apenas a polícia paulista e o governador João Doria (PSDB), mas também as polícias de outros Estados, em que os governadores adotaram medidas de restrição à circulação de pessoas para controlar a pandemia de covid-19, como a Bahia e o Rio Grande do Sul. Também são alvo os governadores adversários do presidente Jair Bolsonaro, como os do Piauí e do Maranhão.

“Tem digitais bolsonaristas em questões locais. Eles se aproveitam para uso politiqueiro. A raiva dele (Bolsonaro) é não poder demitir ou prender governadores. Então tenta sabotar”, disse o governador Flávio Dino (PCdoB), do Maranhão. De acordo com o coronel Lindomar Castilho, comandante da PM do Piauí, há pessoas que “tentam desinformar e fazer a cabeça dos policiais” sob seu comando.

Em São Paulo, a PM tenta identificar o centro difusor dos ataques à corporação que buscam minar a disciplina da tropa. Entre as postagens monitoradas pela polícia está uma do ex-deputado Roberto Jefferson, aliado de Bolsonaro, e outra do blogueiro Allan dos Santos, ligado ao deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP). “Somos fiéis à Constituição, à lei, não importam quais sejam as orientações políticas dos governos. Somos uma instituição de 189 anos. Se cumprir a lei desagradará a A ou a B, assim será”, afirmou o coronel Cabanas.

Em carta divulgada dia 29, 16 governadores afirmaram que “os agentes públicos precisam de paz para prosseguir com o seu trabalho, salvando vidas e empregos”. “Estimular motins policiais, divulgar fake news, agredir governadores e adversários políticos, são procedimentos repugnantes, que não podem prosperar em um país livre e democrático”. O documento declarava ainda o apoio dos governados ao desejo das entidades de policiais de vacinação imediata de seus integrantes. A estratégia visava a retratar o bolsonarismo como responsável por opor a população aos PMs.

“A gente procura não entrar na questão política e se manter fiel ao regulamento e à nossa missão, contra esse jogo que pretende envolver as forças estaduais e federais”, afirmou o coronel Castilho. O Piauí, governado por Wellington Dias (PT) deve começar nesta segunda-feira a vacinar seus 6.140 PMs. A covid-19 havia matado 35 policiais militares e contaminado 1.283 no Estado até sexta-feira passada.

A reação dos governadores aconteceu após a ação coordenada do bolsonarismo de insuflar um motim na PM da Bahia em 28 de março. Naquele dia, o soldado Wesley Soares Góes teve um surto e, com um fuzil, foi ao Farol da Barra, em Salvador, onde passou a fazer disparos. Após atirar em direção aos colegas, acabou morto. De imediato, parlamentares bolsonaristas, como a deputada Bia Kicis (PSL-DF), passaram a tratá-lo como mártir por se recusar a cumprir as ordens do governador Rui Costa (PT). Mais tarde, ela removeu a publicação.

A estratégia de provocar um motim na Bahia só não foi para frente porque a ação foi filmada, confirmando que o soldado tentara matar os colegas. “A Bahia é o lugar mais frágil, em razão dos problemas enfrentados pelo governador na Segurança. Por isso foi atacada”, disse Renato Sérgio de Lima, presidente do Fórum Brasileiro de Segurança Pública. Entre os problemas de Costa, estaria a contestação feita por sua gestão no Supremo Tribunal Federal da lei que acabou com as prisões disciplinares dos PMs.

Se a ação do bolsonarismo incomoda as PMs, ela não seria, no entanto, suficiente para, segundo especialistas em Segurança Pública, provocar uma ruptura da ordem. “Não há possibilidade de se repetir no Brasil a situação da Bolívia (onde uma revolta policial levou à deposição de Evo Morales). Os policiais têm diversas vantagens que não vão colocar em risco por razões ideológicas”, disse Leandro Piquet Carneiro, professor do Instituto de Relações Internacionais da Universidade de São Paulo. Além disso, para Piquet, a aprovação do congelamento de salários na PEC Emergencial esvaziou o discurso sindicalista de Bolsonaro, diminuindo sua capacidade de mobilização. O Estadão não conseguiu contato com Santos e Jefferson.

Pedido de cautela

Os comandos das PMs estaduais estão recomendando o máximo de cautela aos seus homens no cumprimento de medidas de restrição à circulação de pessoas durante a pandemia. Temem que qualquer incidente seja usado politicamente contra as corporações. “Recomendamos aos nossos homens que tenham bom senso em todas as ações”, disse o subsecretário de Segurança Pública, coronel Alvaro Camilo. Para o coronel Lindomar Castilho Melo, comandante da PM do Piauí, “bom senso e conversa não podem faltar. O policial não pode cair em provocações. Tem de colocar como autoridade.”

Para o oficial da PM e deputado federal Paulo Ramos (PDT-RJ), repercutiu mal na categoria a ação de bolsonaristas após o incidente com o soldado Wesley Góes, em Salvador. “Tentaram jogar companheiros contra companheiros, dividir a tropa”, diz Ramos. “Mas não deu certo, a repercussão (das iniciativas dos aliados de Jair Bolsonaro) foi negativa, tanto na Bahia como nos outros Estados.” Segundo ele, a identificação ideológica entre Bolsonaro e muitos PMs permanece.

Mas as expectativas práticas se romperam. “No discurso, o presidente incentiva o confronto (entre policiais e criminosos), mas nunca esteve nessa situação ou correu riscos. Ele só empurra os outros, incentiva os outros a se expor.” Para o coronel Ubiratan Ângelo, ex-comandante da PM do Rio, o discurso de Bolsonaro está enfraquecido. “O que ele fez pelas polícias ou pelos policiais? É só discurso, e o discurso está enfraquecido.”

Outra aposta para a manutenção da disciplina diante das investidas do bolsonarismo nas corporações contra é sistema de liderança e a efetividade da Justiça Militar. Diretor do Fórum Brasileiro de Segurança, Renato Sérgio d e Lima lembra que na semana passada a Justiça Militar paulista condenou a 6 anos e meio de prisão um policial que sacou um arma e ameaçou matar seu sargento no centro de São Paulo, em 2020. “A sentença do juiz Ronaldo João Roth foi dura.” / Colaborou Fábio Grellet

4/4/2021

Este post pertence à série de textos e compilações “Fora, Bolsonaro”. 

A série não tem periodicidade fixa.

Não basta a História. O genocida golpista tem que ser condenado por tribunais que estipulam penas. (46)

Não se usa máscara no Ministério da Saúde! Achou esquisito? Não é. É coerente com o desgoverno do genocida. (45)

A cada dia editoriais e artigos demonstram como Bolsonaro faz imenso mal ao País. (44)

4 Comentários para “O bolsonarismo luta para desestabilizar as polícias”

  1. Caramba! O que mais Bolsonaro precisa fazer para ser impichado?Tocar fogo em Brasília acompanhado do Presidente da Embratur tocando sanfona?

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