A Terra plana de Lula

Adélio Bispo, o que deu a facada, estava a serviço do PT, é claro. As urnas eletrônicas não são confiáveis – são manipuladas pela Justiça Eleitoral para dar vitória ao PT. Ministros do STF trabalham pelos interesses do PT. Governadores e prefeitos mandaram as pessoas ficar em casa por causa daquela gripezinha porque queriam mesmo era ferrar a economia, ferrar o governo dele.

Saem essas loucuras, essas presepadas sem nenhum contato com a realidade, essas teorias conspiratórias… E entram novas loucuras, presepadas sem nenhum contato com a realidade, teorias conspiratórias:

Os Estados Unidos se uniram à Lava-Jato para ferrar a economia brasileira, que estava deslanchando durante o governo dele. Os Estados Unidos trabalharam para ferrar a Petrobrás. Não teve facada nenhuma, foi tudo uma encenação. E esse troço de facção criminosa ter plano para matar autoridades, ah, isso aí é armação do Moro.

Que tristeza, meu Deus do céu e também da Terra…

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Ainda bem que existe a imprensa livre, independente, para expor os absurdos todos – tanto os do grupo que saiu quanto do que entrou no poder em Brasília.

Já na sexta-feira, 24/3, editoriais e artigos expuseram a insensatez, a irresponsabilidade, a insanidade da fala do presidente Lula na manhã anterior. E prosseguiram no sábado.

“Sem provas, Lula diz que investigação da Polícia Federal foi ‘armação’ de Moro”.

“Sem provas, Lula afirma que vê ‘armação’ de Moro no caso PCC”.

A primeira das duas frases acima foi a manchete do Globo na sexta; a segunda foi a manchete da Folha de S. Paulo. Achei interessantíssima a coincidência de os dois jornais começarem a manchete com “sem provas”. A expressão “sem provas” foi usada exaustivamente pelos jornais, ao longo dos quatro trágicos anos do desgoverno Jair Bolsonaro, nos títulos que apresentavam a mais nova idiotice dita pelo então presidente.

Qualquer semelhança não é, de forma alguma, mera coincidência.

“A partir do momento em que adere sem titubear à propagação de fake news com tons de teoria da conspiração, Lula se iguala ao pior do bolsonarismo, que na véspera havia feito o mesmo com sinal trocado”, escreveu Vera Magalhães no Globo de sexta-feira. “É ao cultivar essa polarização odienta, achando que terá ganhos com isso, que o presidente corre o risco de cometer seu erro capital já na largada do governo. Quem vence a eleição e toma posse precisa dizer ao país a que veio, qual o projeto, o rumo, a agenda. Até aqui não se viu isso nesta gestão, pelo contrário. Na economia, na ausência de norte, o Banco Central foi escolhido como Judas a malhar, numa estratégia que lembra a de Bolsonaro contra o Supremo Tribunal Federal, como disse o economista Marcos Mendes em entrevista ao podcast 2+1 ontem.”

No editorial “O rancor de Lula desrespeita o país”, O Estado de S. Paulo afirmou:

“Tudo considerado, o discurso de Lula da Silva é um acinte. Lança aleivosias como se estivesse no botequim, como se não fosse o chefe de Estado, a quem cabe a responsabilidade de liderar a ofensiva contra o crime organizado. Em lugar de assumir a condição de presidente da República e, assim, dar apoio a um senador ameaçado por perigosíssimos delinquentes, Lula se comportou de modo irresponsável e primário. Não foi Moro, apenas, o desrespeitado pelo presidente: foi a República. Porque não é republicano deixar que malquerenças pessoais contaminem o discurso e a prática presidenciais.”

O artigo “As teorias conspiratórias Lula”, de Pablo Ortellado, no Globo deste sábado, é arrasador, devastador. Ele não fica apenas na idiotice dita por Lula na quinta-feira – “é visível que é uma armação do Moro”. Ele dá um zoom para trás, para mostrar o quadro maior – e expõe, com clareza absoluta, que as teorias conspiratórias são a essência da forma de Lula ver o mundo:

“Infelizmente Lula não deu apenas uma declaração infeliz, motivada pelo ressentimento contra o juiz que o colocou na cadeia. Ele tem sistematicamente feito uso de um modo de pensar conspiratório e tomado decisões políticas importantes com base nestes entendimentos. (…) As teorias são especulativas, inverossímeis e sem provas. Muitas vezes alucinadas, como supor que os jovens nas ruas em 2013 eram marionetes dos Estados Unidos ou que os médicos da Santa Casa de Juiz de Fora e do Hospital Albert Einstein em São Paulo se uniram para acobertar uma facada encenada. Quase sempre são adotadas para escapar de explicações mais razoáveis e verossímeis, que evidenciariam os muitos erros de Lula e do PT. Esse modo de pensar conspiratório poderia ser apenas uma idiossincrasia, uma característica folclórica e até simpática do presidente, se não orientasse suas ações políticas e se não influísse nas decisões de governo.

Aí vão as íntegras dos textos.

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O erro de apostar tudo na polarização

Por Vera Magalhães, O Globo, 24/3/2023

Lula decidiu enveredar por um caminho perigoso, passado o momento de união de esforços dos Poderes e das demais instituições em reação ao 8 de Janeiro. Em vez de investir em distensionar o ambiente político e isolar o extremismo, achou por bem reforçar, a cada declaração, a polarização, mantendo o fantasma de Jair Bolsonaro vivo, por entender que ele lhe é favorável na comparação, e trazendo Sergio Moro para a ribalta enquanto o ex-juiz andava bastante apagado, tentando ainda se ambientar ao Senado.

O contraste com Bolsonaro funcionou por um tempo, porque começaram a sair do armário esqueletos ainda mais bizarros que os conhecidos nos últimos quatro anos. Mas não é um supertrunfo que se possa usar a cada rodada ao longo do tempo de um mandato presidencial.

A segunda decisão — evocar Moro e o período em que ficou preso — já começou torta, se mostrou um erro de timing quando, no dia seguinte, foi deflagrada uma operação da Polícia Federal para prender acusados de tramar a morte do senador e, por fim, descambou para o desastre ontem com a declaração leviana do presidente de que o adversário haveria tramado a história toda.

É de extrema gravidade que uma facção criminosa que comanda o narcotráfico, os presídios e tem conexões financeiras internacionais trame ataques simultâneos contra autoridades e figuras públicas como forma de mostrar força e afrontar o Estado Democrático de Direito.

Se essa autoridade é Moro ou alguém da esquerda, não importa. Ao chefe de Estado, cabe delegar a investigação a quem de direito: Ministério da Justiça, Polícia Federal, Ministério Público. A partir do momento em que adere sem titubear à propagação de fake news com tons de teoria da conspiração, Lula se iguala ao pior do bolsonarismo, que na véspera havia feito o mesmo com sinal trocado.

É ao cultivar essa polarização odienta, achando que terá ganhos com isso, que o presidente corre o risco de cometer seu erro capital já na largada do governo. Quem vence a eleição e toma posse precisa dizer ao país a que veio, qual o projeto, o rumo, a agenda. Até aqui não se viu isso nesta gestão, pelo contrário.

Na economia, na ausência de norte, o Banco Central foi escolhido como Judas a malhar, numa estratégia que lembra a de Bolsonaro contra o Supremo Tribunal Federal, como disse o economista Marcos Mendes em entrevista ao podcast 2+1 ontem.

Na política, o governo está sem eira nem beira no Congresso, à deriva diante da interdição da pauta promovida por Arthur Lira, a que Lula não consegue se contrapor porque não dispõe de base parlamentar sólida. Daí vem o questionamento óbvio: se não consegue sequer colocar as medidas provisórias para ser analisadas, como o governo conseguirá rever a autonomia do Banco Central ou aprovar o marco fiscal?

De nada adiantará a ala política do governo gastar munição e saliva atirando contra o BC ou, pior, contra o próprio Fernando Haddad, se esse pecado original não for sanado. Alexandre Padilha, que vem tendo atuação bastante moderada, agindo como algodão entre cristais nas brigas entre a ala política e a econômica e entre Lira e Rodrigo Pacheco, precisa mostrar que tem garrafas para vender, sob pena de ser a próxima vítima na fritura em óleo quente.

Diante de tantas arestas a aparar, Lula ficar no palanque chamando ora Bolsonaro, ora Campos Neto, ora Moro (para que mesmo?) para o ringue não parece ser algo com potencial de agradar nem a seu próprio cercadinho. Para o governo dar certo, precisa haver normalidade institucional, até para blindar o país contra a volta do bolsonarismo, e prosperidade econômica. As duas coisas são o oposto do que a retórica presidencial que parece contaminada pela polarização promove.

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O rancor de Lula desrespeita o país

Editorial, O Estado de S. Paulo, 24/3/2023

O presidente Lula da Silva, aquele que se elegeu pregando o diálogo e que se acha capaz de dobrar até a Rússia de Putin só no papo, está se deixando levar pelo rancor, que não costuma ser bom conselheiro. No momento em que os brasileiros tomaram conhecimento, chocados, de um plano do PCC para assassinar autoridades País afora, o presidente, em vez de elogiar o aparato de segurança federal que foi capaz de frustrar os intentos criminosos daquela organização, preferiu pôr em dúvida a própria existência do plano. O que motivou Lula da Silva a desmoralizar a Polícia Federal (PF) e o Ministério da Justiça de seu próprio governo foi a revelação de que um dos alvos do PCC era o senador Sérgio Moro, que foi seu algoz na Operação Lava Jato.

Depois de dizer que pretende ser “cauteloso” e “descobrir o que aconteceu”, declarou, sem deixar dúvidas, que, para ele, “é visível que é uma armação do Moro”. Se Lula é “cauteloso” assim, Deus livre o País quando ele não for.

Até aquele momento, a operação contra o PCC era motivo de orgulho no governo, por razões óbvias: além da vitória contra um dos mais insidiosos grupos criminosos do mundo, fruto de cuidadoso trabalho de inteligência, a ação impediu um atentado contra um dos principais opositores do governo, o senador Moro, mostrando que a máquina do Estado, neste caso, funcionou de maneira apartidária. Não demorou para que o ministro da Justiça, Flávio Dino, celebrasse essa conquista como um contraste evidente em relação ao governo anterior, de Jair Bolsonaro, que tudo fez para transformar a PF em polícia a seu serviço e contra desafetos. Lula poderia ter seguido o exemplo de Dino, mas escolheu a leviandade, mostrando que teorias da conspiração estapafúrdias não são monopólio do extremismo bolsonarista.

Lula da Silva deve ter lá suas razões para não gostar de Sérgio Moro. Afinal, passou mais de 500 dias na cadeia depois de condenado pelo então magistrado. Não se espera, portanto, que o petista perdoe Moro, mas um estadista, como o que Lula da Silva pretende ser, é justamente aquele que é capaz de deixar de lado suas eventuais mágoas pessoais em nome dos interesses nacionais. E é também aquele capaz de demonstrar empatia com a aflição alheia, mesmo que seja a de seu maior adversário. Se Moro e sua família estavam sob ameaça, como mostraram as investigações, então o presidente da República tinha o dever de respeitá-los. Sendo incapaz de dirigir uma palavra de solidariedade a Moro, que então se calasse.

No afã de atacar Moro, Lula acabou desprestigiando seu ministro da Justiça, Flávio Dino, que passou os últimos dois dias dando inúmeros detalhes sobre a operação contra o PCC e festejando o fato de que a investigação “é tão séria que foi feita em defesa da vida e da integridade de um senador de oposição ao nosso governo”. Ora, se o presidente da República desconfia que tudo isso não passa de “armação de Moro”, das duas, uma: ou Flávio Dino pede demissão por ter sido feito de bobo pelo senador ou é demitido por Lula, pois o presidente acha que ele foi feito de bobo.

Tudo considerado, o discurso de Lula da Silva é um acinte. Lança aleivosias como se estivesse no botequim, como se não fosse o chefe de Estado, a quem cabe a responsabilidade de liderar a ofensiva contra o crime organizado. Em lugar de assumir a condição de presidente da República e, assim, dar apoio a um senador ameaçado por perigosíssimos delinquentes, Lula se comportou de modo irresponsável e primário. Não foi Moro, apenas, o desrespeitado pelo presidente: foi a República. Porque não é republicano deixar que malquerenças pessoais contaminem o discurso e a prática presidenciais.

É, ademais, o tipo da reação que alimenta o ódio que tanto mobiliza os radicais no País há tempo demais. Lula precisa sair da cadeia de uma vez por todas, parar de ruminar vingança contra seus carrascos reais e imaginários e assumir, com espírito conciliador, a Presidência da República, para a qual foi eleito com a promessa de pacificar o Brasil.

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As teorias conspiratórias de Lula

Por Pablo Ortellado, O Globo, 25/3/2023

Nas eleições presidenciais, o candidato Lula se apresentou aos eleitores como contraponto à insensatez bolsonarista, antidemocrática, anticientífica, mentirosa e conspiracionista. Mas uma declaração sobre a ação da Polícia Federal (PF) para prender integrantes do PCC que tramavam o sequestro de Sergio Moro mostrou, mais uma vez, como Lula também é seduzido pelo modo de pensar conspiratório.

A operação da PF prendeu nove integrantes da facção criminosa que planejavam sequestrar Sergio Moro e assassinar outras autoridades. A operação foi anunciada pelo próprio ministro da Justiça de Lula, Flávio Dino. Em entrevista em Itaguaí, na quinta-feira, Lula afirmou:

— É visível que [a operação] é uma armação do Moro.

Ele insinuava que o plano de sequestro poderia ter sido forjado por Moro e seus aliados na Justiça (a juíza que determinou as prisões substituiu Moro na Lava-Jato) para apresentar o atual senador no papel de vítima. A especulação delirante, irresponsável e sem provas foi agravada por outra declaração, dada no dia anterior em entrevista ao site Brasil 247. Lula disse que, quando estava na prisão, acreditava que só ficaria bem “quando foder esse Moro”.

Infelizmente Lula não deu apenas uma declaração infeliz, motivada pelo ressentimento contra o juiz que o colocou na cadeia. Ele tem sistematicamente feito uso de um modo de pensar conspiratório e tomado decisões políticas importantes com base nestes entendimentos. Na mesma entrevista, apresentou outra leitura conspiratória sobre toda a Operação Lava-Jato:

— Tenho consciência de que a Lava-Jato fazia parte de uma mancomunação entre o Ministério Público brasileiro, a Polícia Federal brasileira e a Justiça americana, o Departamento de Justiça. Eu tenho certeza disso, porque foi uma coisa que envolveu toda a América Latina e era uma coisa para destruir mesmo. Porque as empresas da construção civil brasileira estavam conquistando espaço no mundo inteiro.

Ainda na prisão, em 2018, em entrevista ao jornal Folha de S.Paulo, Lula sugeriu que os Estados Unidos “estão por trás de tudo o que está acontecendo na Petrobras”. E continuou:

— Porque interessa para eles o fim da lei que regula o petróleo, o fim da lei que regula a partilha. O Brasil descobriu a maior reserva de petróleo do mundo do século XXI. E não se sabe se tem outra. Não sei se você já tem uma compreensão sociológica de junho de 2013. O Brasil virou protagonista demais. E ali eu acho que começava o processo de tentar dar um jeito no Brasil. Como diria meu amigo Celso Amorim, eu não acredito muito em conspiração. Mas também não desacredito.

De acordo com esse modo conspiratório de pensar, a investigação da Lava-Jato e os protestos de junho de 2013 foram orquestrados pelo governo de Barack Obama para prejudicar as empreiteiras brasileiras que atuavam na América Latina, para barrar a soberania da Petrobras e para afundar um Brasil que se erguia sob o governo do PT.

Lula também não parece persuadido de que a facada de que Bolsonaro foi vítima foi real. Em entrevista à TVT em 2019 considerou a facada “muito estranha”:

— Uma facada que não aparece sangue em nenhum momento, uma facada que o cara que dá a facada é protegido por segurança do Bolsonaro (sic), a faca que não aparece em nenhum momento.

Segundo essa teoria da conspiração, amplamente difundida na esquerda, a facada de Bolsonaro foi uma encenação para vitimizá-lo e extrair efeitos eleitorais. Seria a explicação —ou uma das explicações —para a vitória de Bolsonaro nas eleições.

Vou me limitar a esses exemplos, mas as declarações conspiratórias de Lula são abundantes. Quando perde, Lula tende a explicar o sucesso dos adversários pela orquestração de um pequeno grupo de agentes superpoderosos que agem em segredo —por uma teoria da conspiração.

As teorias são especulativas, inverossímeis e sem provas. Muitas vezes alucinadas, como supor que os jovens nas ruas em 2013 eram marionetes dos Estados Unidos ou que os médicos da Santa Casa de Juiz de Fora e do Hospital Albert Einstein em São Paulo se uniram para acobertar uma facada encenada. Quase sempre são adotadas para escapar de explicações mais razoáveis e verossímeis, que evidenciariam os muitos erros de Lula e do PT. Esse modo de pensar conspiratório poderia ser apenas uma idiossincrasia, uma característica folclórica e até simpática do presidente, se não orientasse suas ações políticas e se não influísse nas decisões de governo.

25/3/2023

Esta é a sexta compilação da série “O maior inimigo do governo é Lula”.

“É impressionante o quanto Lula tem trabalhado contra si mesmo e seu próprio governo.”

2 Comentários para “A Terra plana de Lula”

  1. Mas a verdade que seja dita. O Bolsonaro tinha razão quando falava dos ministros do STF. Hoje temos um STF que legisla, investiga, prende, são o poder moderador, mas não guarda a constituição brasileira que nem a capa existe mais da rasgação promovida pelos mesmos. E povo brasileiro em rede nacional ainda escuta um Benedito Gonçalves dizer: Missão dada missão cumprida.

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