A melhor forma de não baixar os juros

A maneira mais eficiente de não baixar os juros é uma autoridade do governo dizer que os juros estão altos e precisam baixar.

O recado foi dado com absoluta clareza – e com imensa elegância, educação, polidez – justamente pelo economista que foi presidente do Banco Central durante o governo Lula 1, Henrique Meirelles. Em artigo publicado nesta segunda-feira, 6/2, no jornal O Estado de S. Paulo Meirelles lembrou essas verdades fundamentais.

É até compreensível, do ponto de vista político – escreveu ele –, que dias antes da reunião do Comitê de Política Monetário do Banco Central, o Copom, o presidente Lula tivesse criticado os juros altos, e que o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, também tivesse falado indiretamente sobre os juros. “É compreensível do ponto de vista político, mas tem efeito contrário, causando aumento das expectativas de inflação e dificultando a queda dos juros.”

E esmiuçou ainda mais: “Caso atendesse a vontades de governantes, o BC deixaria de ser autoridade diante dos agentes e colocaria em risco toda a economia brasileira.”

Só faltou desenhar.

Mas não adianta. Algumas horas depois que a edição desta segunda-feira do Estadão chegou às bancas – e seguramente às mesas próximas ao gabinete de Lula no Palácio do Planalto –. o presidente da República repetiu as mesmas imbecilidades que vem repetindo desde sempre, ad nauseam:

– “Não existe justificativa para que a taxa de juros esteja a 13,75%”, boquirrotou ele durante a cerimônia de posse do novo presidente do BNDES, Aloízio Mercadante.

– “É só ver a carta do Copom, que é uma vergonha para o povo brasileiro.”

E dá-lhe pau no Banco Central, na independência do Banco Central…

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O sujeito insiste e não desiste nunca: quase todos os dias fala asneiras sobre economia. Não mede as palavras, não pensa antes de falar. Não: boquirrota. Como se estivesse num botequim, jogando papo fora com os amigos.

Como escreveu O Estado de S. Paulo na linha fina abaixo do título de seu editorial de sábado, 4/2: “Em entrevista, Lula lançou mão de generalizações, simplismos e inferências levianas como se estivesse sentado numa mesa de bar, e não na cadeira mais relevante para os destinos do País”.

É triste fazer a comparação, mas infelizmente é isto: Lula fala como se estivesse no boteco – exatamente como o seu contrário, o seu antípoda, que às vezes mais parece um irmão siamês, aquele Capitão da Morte ora homiziado perto da Disneylândia.

“Um chefe de Estado precisa medir suas palavras, sob o risco de precipitar agitações no mínimo contraproducentes nos mercados, nas arenas políticas e no debate público”, disse o Estadão no editorial. “Mas o presidente Lula não tem pruridos em colocar seu ego acima do cargo que ocupa. Em entrevista à RedeTV!, Lula especulou sobre política como se estivesse numa bancada de oposição; sobre economia como se estivesse numa assembleia sindical; sobre geopolítica como se estivesse numa conversa de bar; e, claro, sobre eleições como se estivesse no palanque.”

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O presidente fala – como perfeitamente colocou o editorial do Estadão – como um político de oposição, como um líder sindical em assembléia, como se estivesse no palanque.

Sem medir as palavras. Sem o mínimo de respeito à tal da liturgia do cargo.

Adora falar mal do mercado. Fala mal do mercado como estudante secundário em assembléia para agradar a moçada – exatamente com a mesma seriedade, o mesmo conhecimento de causa e a mesma sensatez de um candidato à presidência da Ubes na cidade de São José do Periquito Acesso. Na entrevista da semana passada à Rede TV, tratou “o mercado” como se o conjunto dos agentes econômicos do país e do mundo fosse um moleque travesso: “O mercado fica irritado”.

Também de forma muito educada – porém firme, dura –, o jornalista especializado em economia Carlos Alberto Sardenberg deu um belíssimo chega-prá-lá no presidente Lula, em artigo no Globo de sábado, 4/2. Contestou – com dados claros, evidentes – as críticas que Lula havia feito ao empresário Jorge Paulo Lemman, contestou as críticas de Lula à independência do Banco Central, à taxa Selic, ao teto de gastos. E concluiu assim:

“O teto de gastos, adotado no governo Temer, funcionou, sim. No seu período, a taxa de juros (Selic) caiu de 14,25% ao ano (herança Dilma) para 6,40%. O PIB voltou a crescer, depois de dois anos de recessão. E a inflação caiu de 9,3% para 2,7%. Hoje, o dólar continua caro, e os juros seguem elevados por causa da lambança anunciada nas contas públicas e pelo festival de declarações equivocadas. Como esta, presidente: primeiro ataca a independência do BC, depois diz que o “seu” BC foi bem porque atuou com… independência.

Pô, presidente!”

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Com seus discursos e entrevistas despropositados, com sua linguagem palanqueira, Lula torna mais difícil o controle da inflação e a própria queda dos juros – e atrapalha o trabalho de sua própria equipe econômica.

No final da tarde desta segunda-feira, 6/2, poucas após a fala destrambelhada de Lula na posse do novo presidente do BNDES, a colunista Bela Megale publicou no portal do jornal O Globo:

“O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, e integrantes da equipe econômica mostram, nos bastidores, certa irritação com as frequentes críticas do presidente Lula à alta taxa de juros e ao Banco Central. (…)

“As críticas de Lula na seara econômica têm se intensificado. Na avaliação da equipe econômica do governo, elas geram ruídos e dificultam o trabalho. Por se tratar de falas de Lula, é consenso que não há espaço para que essas manifestações sejam rebatidas publicamente.

“A leitura do time de Haddad e do próprio ministro é que hoje a energia precisa estar concentrada na reforma tributária e na medida provisória que retoma o voto de desempate a favor do governo nos julgamentos do Conselho de Administração de Recursos Fiscais (Carf). As falas de Lula, no entanto, têm tornado esse caminho mais difícil.”

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Mas não é só o que Lula fala sobre economia que faz mal ao país – há também o que Lula faz.

Durante a recente visita do chanceler alemão Olaf Scholz à América Latina, Lula anunciou a reabertura das negociações entre o Mercosul e a União Européia para se chegar a um acordo comercial. Ora, diabo, o acordo já foi firmado em 2019, depois de ser negociado ao longo de 20 anos! O acordo foi paralisado em função da devastação da Amazônia durante o desgoverno do Capitão das Trevas; esperava-se que, com Lula, os países europeus aprovassem a implementação do acordo já assinado.

Mas o presidente brasileiro fala agora em reabrir as negociações! O que pode servir aos interesses dos protecionistas europeus, temerosos da concorrência de dois dos maiores exportadores de grãos e carnes do mundo, Brasil e Argentina – como alertou importante editorial do Globo do último dia 1°.

Abaixo vão as íntegras dos quatro textos citados: os artigos de Henrique Meirelles e Carlos Alberto Sardenberg e os editoriais do Estadão e do Globo. Esta é a segunda do que certamente serão dezenas e dezenas de compilações de textos sobre Lula 3. Faço isso com a tranquilidade de quem passou quatro longos, tristíssimos anos tecendo compilações de textos que mostravam e demonstravam o horror, o pavor, o desastre do desgoverno do Capitão das Trevas. De quem passou as semanas anteriores às eleições de outubro DER 2022 costurando compilações de textos em favor do voto em Lula no primeiro e no segundo turnos.

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Como não baixar os juros

Por Henrique Meirelles, O Estado de S. Paulo, 6/2/2023

Vez ou outra, integrantes do governo fazem pressão para que o Banco Central baixe juros. O desejo é natural. Em tese, juros mais baixos fazem bem à popularidade dos governos. Durante minha gestão de oito anos no BC, fazia parte da rotina a pressão para reduzir a taxa Selic. Por conta desta longa experiência, eu digo: não há nada mais ineficiente para reduzir juros do que fazer pressão sobre a autoridade monetária – ainda mais quando ela é autônoma, inclusive com garantia em lei.

O Copom decidiu na semana passada manter a taxa de juros em 13,75% ao ano, por enxergar incertezas no campo fiscal e expectativas de inflação em alta. É uma decisão acertada diante do cenário atual, no qual ainda há dúvidas sobre como será a política fiscal do governo e com as projeções de inflação para 2023 e 2024 se distanciando das metas.

Dias antes da reunião, o governo fez pressão sobre o BC. O presidente Lula questionou a eficiência da independência do BC, criticou os juros altos e falou sobre metas de inflação mais altas. O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, também falou indiretamente sobre os juros. É compreensível do ponto de vista político, mas tem efeito contrário, causando aumento das expectativas de inflação e dificultando a queda dos juros. O Banco Central, que já atua com independência desde a minha gestão (2003 a 2011), agora tem autonomia garantida em lei. Caso atendesse a vontades de governantes, o BC deixaria de ser autoridade diante dos agentes e colocaria em risco toda a economia brasileira.

Uma autoridade monetária sem autoridade sobre a política monetária gera danos severos ao país. Um exemplo basta: por anos, o Fed, banco central americano, fez as vontades do presidente Richard Nixon e manteve os juros baixos artificialmente. A inflação americana atingiu patamares inaceitáveis, e foi necessário que outro chairman do Fed, Paul Volker, levasse os juros à casa dos 20% e gerasse uma recessão na década de 1980 para domar a inflação e reequilibrar a economia.

Os juros não são altos por vontade do Banco Central, mas para controlar a inflação. O caminho para a redução dos juros não passa por desejos ou pressões, mas por trabalho duro. É preciso cortar gastos para interromper a desconfiança em relação à capacidade de pagamento do País e parar de alimentar a inflação. O governo precisa apresentar uma nova regra fiscal objetiva e efetiva. Se o trabalho for bem feito, o resultado é garantido. Implantado na minha gestão no Ministério da Fazenda em 2016, o teto de gastos criou condições para a Selic atingir os níveis mais baixos da história.

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Lula não mede palavras, mas deveria

Editorial, O Estado de S. Paulo, 4/2/2023

Sem incorrer em crime, um cidadão comum pode falar o que bem entender sobre o que bem entender, um militante pode lançar acusações hiperbólicas, um político de oposição pode propor medidas das mais extravagantes. Já um chefe de Estado precisa medir suas palavras, sob o risco de precipitar agitações no mínimo contraproducentes nos mercados, nas arenas políticas e no debate público. Mas o presidente Lula não tem pruridos em colocar seu ego acima do cargo que ocupa. Em entrevista à RedeTV!, Lula especulou sobre política como se estivesse numa bancada de oposição; sobre economia como se estivesse numa assembleia sindical; sobre geopolítica como se estivesse numa conversa de bar; e, claro, sobre eleições como se estivesse no palanque.

Para não perder a viagem, começou repetindo vacuidades sobre a “paz” na Ucrânia, insinuando mais uma vez uma equiparação torpe entre a vítima e seu algoz. Sobre Cuba e Venezuela, tudo se passa como se a única causa da miséria e da opressão que fustigam seus povos fossem os embargos dos EUA. Não é que Lula critique esses bloqueios por serem ineficazes para debilitar ditaduras. Para ele, simplesmente não há ditaduras: “O Fidel Castro já morreu, Raúl Castro já fez a transição tranquilamente para o civil”.

A propósito, Lula desmereceu, como ignorância ou má-fé, a desconfiança em relação à retomada dos empréstimos do BNDES para obras em países companheiros. Recentemente, a propaganda governista veio a público dizer que o BNDES não financia outros países e que não há risco de prejuízo. De fato, os contratos são celebrados com empresas brasileiras e o banco tem garantias. Mas, como os produtos são entregues a outros países e as garantias, ao menos nos projetos encampados pela gestão petista, ficaram todas na conta do Tesouro, quando há calote, como houve de Cuba ou Venezuela, o banco é ressarcido com dinheiro do contribuinte.

Lula não só voltou a falar em termos maniqueístas da relação entre Estado e mercado, como usou o caso das Americanas para maldizer investidores que, com razão, manifestam apreensão com o futuro ante a perspectiva de gastança lulopetista. Depois de acusar um dos sócios das Americanas de fraude, algo que ainda é objeto de investigação, Lula disse que esse empresário “jogou fora R$ 40 bilhões de uma empresa” ao mesmo tempo que o mercado “fica muito nervoso” quando se fala em “melhorar a vida dos pobres”. É impressionante a capacidade de Lula de juntar alhos e bugalhos para justificar sua demagogia.

Como se suas palavras não afetassem as expectativas de todo o País, Lula voltou a atacar o Banco Central por ter mantido a taxa de juros em 13,75% e, cúmulo da irresponsabilidade, tornou a questionar a autonomia do BC. Disse que vai esperar o fim do mandato “desse cidadão”, referindo-se ao presidente do BC, Roberto Campos Neto, para “fazer uma avaliação do que significou o Banco Central independente”.

Antes Lula tivesse se limitado a reiterar que o impeachment constitucional de Dilma Rousseff foi um “golpe”, pois, a esta altura, os brasileiros já se acostumaram à tentativa lulopetista de reescrever a história, agora que Lula voltou ao poder. Mas Lula não resistiu, na entrevista, a flertar com a heterodoxia econômica em nome da salvação nacional – e isso sim preocupa.

Primeiro, Lula afetou escândalo com o fato de que um país que já foi a sexta economia do mundo tenha despencado para fora do grupo das dez, como se as políticas econômicas gestadas em seu governo e consumadas por sua criatura Dilma Rousseff não tivessem nada a ver com a pior recessão da história recente do Brasil. Depois, voltou a recorrer, sem matizes, ao expediente da herança maldita do governo anterior, apesar dos indicadores razoáveis.

Por fim, mas não menos significativo, Lula da Silva foi imprudente a ponto de, com menos de um mês no cargo, admitir que é candidato à reeleição. Lula parece gostar de ouvir a própria voz falando sobre sua suposta indispensabilidade e sugeriu que pode concorrer se a situação estiver “delicada”. Ou seja, Lula já se apresenta como salvador da pátria. Ora, se depois de quatro anos de Lula a pátria precisar ser salva, não será por Lula.

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Contraponto

Por Carlos Alberto Sardenberg, O Globo, 4/2/2023

Do presidente Lula, em entrevista à Rede TV!:

— Qualquer palavra que você fale na área social, “Vou aumentar o salário mínimo em R$ 0,10”, “Vamos corrigir o Imposto de Renda”, “Precisamos melhorar (a vida dos pobres)”, o mercado fica muito irritado.

E mais:

— Agora, um deles (Jorge Paulo Lemann, acionista principal das Lojas Americanas) joga fora R$ 40 bilhões de uma empresa que parecia ser a mais saudável do planeta Terra, e esse mercado não fala nada, ele fica em silêncio.

O mercado falou, presidente. E protestou do modo mais firme que conhece: derrubou o preço da ação de R$ 12 para perto de zero, o que impõe perda enorme aos acionistas, inclusive Lemann. Além disso, todos os grandes bancos privados, credores das Americanas, manifestaram claramente seu desagrado, acionando na Justiça a empresa e seus acionistas principais. Claro que há, digamos, acionistas inocentes — aqueles que não exercem controle sobre a empresa e compram o papel para poupança. Esses minoritários, parte do mercado, também estão na Justiça cobrando atitudes mais responsáveis dos controladores, inclusive aporte substancial de capital.

Lula também atacou no pessoal:

— Esse Lemann era vendido como o suprassumo do empresário bem-sucedido no planeta Terra, que financiava jovens para estudar em Harvard para formar um novo governo e falava contra a corrupção todo dia.

Presidente, é uma pena que o senhor não conheça o trabalho da Fundação Lemann. Aplica bastante dinheiro para financiar o desenvolvimento de projetos pedagógicos e de gestão no ensino público. Toma também iniciativas para instalar internet de alta velocidade nas escolas públicas. E, sim, manda estudantes para Harvard. O bilionário poderia abrir uma escola privada e se aproveitar dos financiamentos do governo, mas, em vez disso, coloca seu dinheiro para apoiar o ensino público. Ajuda a reduzir a desigualdade.

O cientista político Fernando Schüler escreveu um excelente artigo na revista Veja, “A lição de Tocqueville”, mostrando a importância das iniciativas dos ricos muito ricos. Certamente, o dinheiro que Lemann gasta na fundação rende mais benefícios à sociedade do que se todos esses recursos fossem para o governo na forma de impostos. Também duvido que o setor público fosse mais eficiente. Como mostra Schüler, o segundo maior orçamento do governo federal é da educação. E nossos alunos das escolas públicas vão para os últimos lugares nos testes internacionais. O fato de Lemann cometer um enorme erro na Americanas não tira o mérito de outras coisas que faz.

Lula também investiu contra a independência do Banco Central (BC), atacou a recente decisão do Copom — “não existe nenhuma razão para a taxa de juros estar em 13,75%” — e pediu meta de inflação maior. Também voltou a dizer que o teto de gastos é contra o povo e que não funciona. Na mesma semana, quando o dólar caiu abaixo de R$ 5, o Instituto Lula disse que isso resultava da confiança no governo.

É o contrário, presidente. A moeda americana desvalorizou praticamente no mundo todo porque o mercado — sim, o mercado — entendeu que a taxa de juros nos Estados Unidos subirá menos do que se pensava. Com juros menores lá, investidores internacionais procuram mercados que oferecem taxas maiores. Vai daí que entram dólares aqui, são trocados por reais, isso provocando a valorização de nossa moeda. Na verdade, presidente, o dólar cairia mais se o senhor e seu pessoal deixassem esse tema por conta do BC.

E o teto de gastos, adotado no governo Temer, funcionou, sim. No seu período, a taxa de juros (Selic) caiu de 14,25% ao ano (herança Dilma) para 6,40%. O PIB voltou a crescer, depois de dois anos de recessão. E a inflação caiu de 9,3% para 2,7%. Hoje, o dólar continua caro, e os juros seguem elevados por causa da lambança anunciada nas contas públicas e pelo festival de declarações equivocadas. Como esta, presidente: primeiro ataca a independência do BC, depois diz que o “seu” BC foi bem porque atuou com… independência.

Pô, presidente!

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Não faz sentido reabrir negociações no acordo entre Mercosul e UE

Editorial, O Globo, 1º/2/2023

Um dos itens mais importantes na agenda da visita do chanceler alemão, Olaf Scholz, à América Latina é o acordo de livre-comércio entre Mercosul e União Europeia (UE), firmado em 2019 e paralisado em razão da alta na devastação da Amazônia no governo Jair Bolsonaro. Com a volta ao Planalto de Luiz Inácio Lula da Silva e de Marina Silva ao Ministério do Meio Ambiente, esperava-se que ele pudesse enfim entrar em vigor.

O próprio Scholz deixou isso claro em entrevista ao Grupo de Diários América (GDA), de que O Globo faz parte, e ao anunciar investimentos de € 200 milhões em projetos de preservação ambiental, com a reativação do Fundo Amazônia, também paralisado na gestão Bolsonaro. Lula, porém, aproveitou a passagem de Scholz por Brasília para anunciar a reabertura das tratativas entre os dois blocos.

Trata-se de uma temeridade, já que o acordo foi assinado há mais de três anos, depois de ter sido negociado e renegociado durante outros vinte. Para que entre em vigor, falta apenas a sanção dos parlamentos dos países-membros da UE e do Mercosul, além do próprio Parlamento Europeu. Com o anúncio de Lula, não é mais possível prever quando a economia brasileira poderá se beneficiar de um mercado de 780 milhões de consumidores, que representa quase 25% do PIB mundial.

Lula ainda tentou reduzir danos ao afirmar que tudo estará resolvido “até o fim deste semestre”. Mas os temas que mencionou são complexos: rever a participação de fornecedores europeus em licitações de compras governamentais (para favorecer pequenas empresas brasileiras) e evitar que o acordo impeça a reindustrialização do Brasil e da Argentina.

Ambas as preocupações são infundadas. Compras governamentais já estão contempladas satisfatoriamente no acordo. Além disso, ele prevê uma abertura comercial paulatina, entre 10 e 15 anos, período suficiente para que as empresas, submetidas à maior concorrência externa, se modernizem e se tornem competitivas. A reindustrialização não pode servir de pretexto para ressuscitar políticas antigas, fracassadas, de proteção de mercados para empresas nacionais, cujo resultado é ineficiência, baixa capacidade de criar empregos e gerar renda. A queda do peso da indústria na economia é uma tendência global. Não se trata de uma distorção brasileira ou argentina, a ser enfrentada com políticas protecionistas.

Ao anunciar que o Brasil deseja reabrir as negociações, Lula ajuda os protecionistas do setor agropecuário europeu, que temem a concorrência de dois dos maiores exportadores mundiais de grãos e carnes, Brasil e Argentina. E ainda cria tensões desnecessárias com o Uruguai, a menor economia do Mercosul, que deseja assinar um tratado bilateral com a China, em desafio à união aduaneira do Mercosul. Para convencer o presidente uruguaio, Lacalle Pou, a não firmar esse tratado, Lula argumentou que não demoraria a conclusão do acordo com a UE. Não é o que acontecerá se o Brasil insistir em reabrir negociações com os europeus.

6/2/2023

Esta é a segunda compilação da série “O maior inimigo do governo é Lula”.

“Luiz Inácio Lula da Silva (PT) continua a desafiar o bom senso em temas econômicos.”

Um comentário para “A melhor forma de não baixar os juros”

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