Tema de hoje: Sorte tem lugar certo!

Não me resta dúvida de que sou um cara de sorte, e sou agradecido por isso. Porém isso só vale para algumas coisas, pois para outras…. My God!

Capitulo 1: Aviões

Sempre fui do contra. Lembro que todo mundo idolatrava a TAM. O argumento é que eram pontuais. Eu sempre detestei, prefiro sair com uma hora de atraso em uma boa aeronave do que voar chacoalhando e rangendo no horário. Cada um faz suas escolhas.

Uma vez, naquela maquininha de moer gente que era o “Fucker 100″, precisei ir até o aeroporto de Navegantes segurando a trava da porta traseira que não fechava. Quando falei pro “aeromoço”, ele olhou e quase se borrou. Examinou e seguiu apertando o cóccix, pisando firme em uma frenética caminhada em direção à cabine. Pela sua determinação achei que fosse buscar uma embalagem de cera Dr. Lustosa para vedar a porta. Mas não voltou mais. Aliás, aquele assento que peguei nem deveria existir, acho que destina-se a acomodar condenados acorrentados, mas creio que foi Deus que me colocou ali.

Outro exemplo: sou craque em viajar em época de tragédias do cotidiano,  assassinato do John Lennon, da Daniela Perez, morte da Whitney Houston, e por ai vai… Ou ainda ser recrutado para ficar junto à porta de emergência e coordenar a missão de salvar vidas. Talvez pelo meu tamanho, assim que saio do finger e piso na aeronave ela inclina. Nesse momento sinto que já fui escaneado pela equipe.

Primeiro tem o intensivão. O comissário me ensina artes marciais, cortar e dar o morto e também a fazer fogo com gelo. Achei que no fim terminaria segurando ele no meu colo como noiva em noite de núpcias para conseguir o certificado.

Assim que o avião decola, sinto a presença de vários olhares em minha direção. Chego a ficar com os ombros tensos em pensar que eu seria a única esperança de todas aquelas vidas caso o pior acontecesse. Tanto que para o próximo vôo providenciarei dois cartazes.

Cartaz 1 – Quem prefere morrer dentro do avião, fila da esquerda.

Cartaz 2 – Quem prefere morrer fora do avião, por aqui, a alavanca da portinhola está comigo.

Em viagem sempre detestei o trajeto, não tenho paciência, infelizmente nasci sem esse órgão. Se eu pudesse piscar e surgir no local como a Feiticeira fazia, eu viajaria mais.

Quando surfava, as viagens para Ubachuva eram as mais chatas disparado. Parecia que levava um mês de Fusca 1300 cheio de desocupados, com pranchas na capota – e sempre chovia.

Florianópolis de carro, só volto se for de ambulância para ir deitado. Uma vez, voltando de Floripa com meu amigo Tomás no Karman Ghia TC dele, eu disse: “Tomás, não estou aguentando seu ritmo, vamos chegar daqui um ano em SP”. Ele falou: “Então dirige vc e pode meter o pé”!. O carrinho era divertido, lembrava um Porsche anêmico, saia de traseira nas curvas mais fortes. Resultado: eu fritei o motor dele na serra de Curitiba. Voltamos de carona e o carro de guincho. A pressa é inimiga da perfeição.

Em vôos internacionais eu costumo tomar um comprimido faixa preta 3° DAN para dormir. Quando o capitão começa o fatídico discurso – “aqui é o comandante Sanchez dando as boas-vindas à aeronave. Nosso tempo de vôo será de…” –, eu já estou anestesiado. “Agora estamos passando pela Terra do Fogo.” Olhei pra baixo, mas não vi ninguém de pileque. Fecha essa matraca, please.

No momento que atinjo o sono R.E.M., acendem as luzes novamente e recomeça o megafone da pamonha: “Por favor, algum médico a bordo?” Eu, não, sou surfista aposentado; por gentileza, apaga as luzes deste lado.

Tem um passageiro passando mal… Não quero parecer pessimista, mas se quiser adiantar as coisas e já ir colocando uma etiqueta no dedão do pé dele, eu tenho sobrando.

Que horas para passar mal? Também, com aquele jantar fedorento, aquele suco feito de 90% de cascas de laranja embalado no papelão, esperava o quê? Se sair vivo está no lucro.

Devo ter cara de tenente, bombeiro ou do saudoso cabo Bruno, quem lembra? Um gentleman aplicando seus corretivos com aquele cassetete!

Suponho que eu seja sempre confundido. Uma vez no aeroporto de LAX estava todo mundo se despindo e colocando os trajes e cintos naquela bandeja encardida, quando de repente dois seguranças me chamaram e falaram: “Sir, please, o senhor venha por aqui”. Eu nem precisei passar pela máquina de raios X. Deram tapinhas nas minhas costas e sorriram. Eu apenas balancei a cabeça como o Clint Eastwood faria e pensei: definitivamente acho que chegou a hora de eu ser canonizado ou lançar minha linha de bonequinhos do Fábio D.

Enquanto isso, minha esposa, sendo examinada por três agentes, inconformada me olhava de longe. Afinal eu não podia queimar cartucho dizendo que a conhecia. Quando liberada, ela me perguntou: “o que aconteceu ali?” Minha resposta padrão é que mais uma vez fui confundido com o Brad Pitt, mas dessa vez fiz questão de dizer que acharam que eu era o Clint. Clint? Sim, o da madeira do Leste. (Piadinha infame)

Apenas esclarecendo ao leitor, essa é a parte que tenho sorte, e claro, sobreviver ao jantar do avião sem sequelas.

Quanto ao passageiro enfermo, soube que enquanto eu dormia ele devolveu o jantar e ficou bem.

Vejo vocês no próximo vôo. Provavelmente estarei ao lado da alavanca!!

Julho de 2022

12 Comentários para “Tema de hoje: Sorte tem lugar certo!”

  1. Que tal senário. Foker 100.
    Felicitações para os próximos vôos.

  2. Só vc mesmo, Fábio. Prende a nossa atenção a cada linha da sua crônica e nos surpreende com sua versão dos fatos. Gostei muito. Parabéns!!!

  3. Ótimo texto meu amigo, como sempre .
    Agora só voltar de carro pra Floripa de ambulância pra ir deitado foi sensacional.
    Abraços

  4. Parabéns Fábio, mais uma belíssima crônica. Cada uma é uma nova aventura. Logo pode lançar um livro.

  5. Como parte integrante de muitas dessas histórias sinto necessidade de dar meu depoimento de que, sim, é tudo verdade e até hoje me questiono o que teria acontecido naquele aeroporto em que meu marido passava livremente enquanto eu estava sendo revistada. Brincadeiras à parte, é um orgulho tê-lo ao meu lado e um prazer fazer parte da sua vida!

  6. Muito bom como sempre…tô com o Caetano…livro de crônicas urgente…

  7. Me fez voltar ao passado…
    Para uma época em que pegar aviões era parte do meu trabalho. E o pior… sempre tive medo de avião. E a tensão era tão grande que nem a tarja preta resolvia…
    Parabéns pelo texto!

  8. Fabião.. show..Só quem te conhece entende que a realidade destas coisas..

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