A morte, o destino, tudo

John Kennedy morreu com um tiro na cabeça.

Em novembro de 1963 a notícia chocava o mundo e vi a primeira demonstração de pragmatismo vinda de um vizinho da mesa do banco onde eu trabalhava.

– Quero saber quem é o vice.

O charmoso e jovem presidente, sua glamorosa mulher Jacqueline, o pequeno e saltitante John-John, que comoveria o mundo com a sua continência ao pai na cerimônia fúnebre do cemitério de Arlington, pouco interessavam como pessoas ao pragmático. Estava mais interessado no que o determinismo histórico estava destinando para o futuro da luta de classes.

A opinião pública naqueles dias pulsava nos bares, nos ambientes profissionais, nas rádios, nas conversas familiares, nos jornais, e se movia com lentidão.

Hoje existem as redes sociais, com sua velocidade incrível para despejar sua torrente de achismos, de preconceitos, de teorias conspiratórias, de estupidez, de mesquinharias, de maniqueísmos partidários. Uma grande ferramenta transformada numa versão moderna da janela de onde eram disparados os mexericos da Candinha.

Confirmada a notícia da morte do candidato Eduardo Campos em um acidente aéreo na quarta-feira, o coquetel de alucinações começou a ser servido nas redes sociais.

Desde a teoria conspiratória de que o avião foi derrubado até um “já vai tarde”, assinado por um “coletivo” de imbecis que se propõe a democratizar a sua imbecilidade semeando-a pelo universo.

Morreu um candidato a presidente de 49 anos, dissidente do governismo, pai de cinco lindos filhos, neto de um lendário político de esquerda, um homem jovial e sorridente, um das poucas caras novas da política pós-ditadura.

O destino o colocava como uma espécie de fiel da balança de um eventual segundo turno na eleição que se apresenta como a mais equilibrada e a mais divisora de águas dos últimos anos. Com ele, morreram outras seis pessoas e outras seis famílias ficaram destruídas.

Um dia antes, o candidato teve gloriosos 15 minutos de exposição no Jornal Nacional (um tesouro para um candidato que lutava contra o quase anonimato no Sul e Sudeste do País), disse que a atual presidente será a primeira “a deixar o País pior do que encontrou” e conclamou as pessoas a “não abandonarem o Brasil”.

Considerado por Lula “um filho adotivo”, sua dissidência não foi perdoada pela máquina partidária do PT, que antes da morte o chamou de “tolo”, “playboy mimado” e “beneficiário preferencial da boa vontade dos governos do PT” no site oficial.

O “pai adotivo” chorou ao falar no telefone com a viúva, embora dias atrás o tivesse comparado a “um novo Collor”.

Quem divide o mundo entre “nós” e “eles”, fará o possível para que a rebeldia política de Campos se torne uma nebulosa vagando no sistema solar de seus dogmas.

Este artigo foi originalmente publicado no Blog do Noblat, em 15/8/2014.

3 Comentários para “A morte, o destino, tudo”

  1. A vergonha na cara do PT, esta morreu faz tempo, né, Miltinho?
    Um abraço!
    Sérgio

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