Más notícias do país de Dilma (64). E também uma boa

Eles afinal decidiram privatizar. Com uma má vontade danada, com vergonha, brigando contra o dicionário, as palavras, a lógica, mas decidiram privatizar. Demoraram um bocado – patinaram durante nove anos e meio de ineficiência e corrupção, mas afinal começaram a cair na real, e decidiram privatizar.

Mesmo assim, mesmo com a presidente se remexendo em raciocínios tortuosos para dizer que está “tentando consertar alguns equívocos cometidos na privatização das ferrovias”, é uma boa notícia, afinal.

Mesmo sendo assim como a periguete envergonhada, que “veste o tubinho, mas fica o tempo todo puxando para cima e para baixo para tentar esconder o que a roupa quer exibir”, como diz, bem-humoradamente, Carlos Alberto Sardenberg; mesmo sendo assim, no caso das ferrovias, uma privatização que socializa o o risco, como diz, séria, Míriam Leitão, os dois no Globo, é uma boa notícia, afinal.

Começam, aos trancos e barrancos, a fazer o que o governo Fernando Henrique Cardoso fez a partir de 1995, oito anos antes de eles assumirem dizendo que iriam mudar tudo o que estava aí e depois irem se desmentindo a cada dia.

Então esta 64ª compilação de notícias e análises que comprovam a incompetência do governo Dilma Rousseff começa com a boa notícia. Logo em seguida vêm as más. Foram publicadas nos jornais entre os dias 10 e 16 de agosto.

Gostaria de chamar especial atenção para o artigo do professor Roberto Romano, publicado no Estadão, que mostra como o lulo-petismo transformou os reitores das universidades federais em mendigadores de favores – ou, de uma forma mais direta de se dizer, em puxa-sacos dos poderosos de plantão.

Enfim, o PT se rende à privatização

* Não basta dizer que vai fazer concessões. Tem que fazer direito, bem feito

“Se quer investir na infra-estrutura, como aconselha até o Fundo Monetário Internacional (FMI), tem de se aproveitar do sistema de concessões e de Parceria Público-Privada (PPP).

“O governo anunciou essa intenção sem, porém, concretizá-la e uma medida provisória acaba de ser aprovada para estimular as PPPs. Falta apenas uma atitude positiva do governo para alavancar essas intenções. O risco é de imaginar que se podem fazer essas operações de qualquer modo.

“No caso das concessões, o governo pensa especialmente na construção de rodovias. Já temos boa experiência nisso, mas devemos tirar dessa experiência a lição de algumas falhas que poderiam levar a condenar o sistema de concessões.

“A escolha dos vencedores se decide por meio de leilões. Até agora, a oferta do mais baixo preço ou tarifa é o fator mais importante para a outorga da concessão. Outro, a oferta de pagamento pela outorga, que apresenta um atrativo para o governo, sempre está atrás de receitas suplementares. Os dois sistemas devem ser analisados com cuidado. Para ganhar nos leilões, os participantes procuram oferecer a mais baixa tarifa de pedágio. Mas, neste caso, podem logo encontrar dificuldades para realizar os investimentos. Parece-nos que um primeiro critério deveria ser o fato de o participante já ter realizado investimento da mesma categoria, com verificação do histórico do seu desempenho. Um outro seria o montante dos investimentos que se pretende realizar. O valor do pedágio chegaria só em terceiro plano.

“O sistema de classificação pela oferta em dinheiro pela outorga deveria ser eliminado. De fato, ele só contribui para aumentar o custo do investimento. As concessões não são feitas para aumentar as receitas do Tesouro, mas, sim, para economizar nas despesas e participar da política de aumento da Formação Bruta de Capital Fixo, que constitui a base do crescimento econômico.

“Ao realizar PPPs, o governo deve dar prioridade à capacidade tecnológica do parceiro e, na medida do possível, dar-lhe a responsabilidade da administração e fiscalização financeira do projeto. A experiência mostrou que o poder público é um péssimo administrador dos projetos e um pior fiscalizador das despesas realizadas. Sob a condução do parceiro privado, pode-se esperar não apenas gastar menos, como realizar o projeto no menor prazo. (Editorial, Estadão, 10/8/2012.)

* “Governo muda de rota com plano bilionário de privatização”

“Sem capacidade para tocar investimentos ambiciosos, o governo abraçou a iniciativa privada e anunciou ontem o maior pacote de concessões em rodovias e ferrovias já feito no País, no valor de R$ 133 bilhões, com a expectativa de impulsionar a economia depois de 2013.

“O choque na infra-estrutura foi comparado a um modelo de privatização até por empresários presentes à cerimônia no Palácio do Planalto, mas a presidente Dilma Rousseff não só rejeitou o termo como criticou a venda de estatais ocorrida na gestão do PSDB. ‘Nós, aqui, não estamos desfazendo de patrimônio público para acumular caixa ou reduzir dívida’, disse Dilma, numa referência à privatização de empresas no governo Fernando Henrique Cardoso (1995-2002). ‘Estamos fazendo parceria para ampliar a infra-estrutura do País, beneficiar sua população e seu setor privado, saldar uma dívida de décadas de atraso em investimentos em logística e, sobretudo, para assegurar o menor custo logístico possível, sem monopólios.’

“Na avaliação do governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, o programa lembra o ‘choque de gestão’ adotado por administrações do PSDB e criticado por petistas. ‘O governo não deve ser executor de tudo, nem financiar tudo. O governo tem papel de planejador. Essa é a visão moderna, que já fizemos em São Paulo há 15 anos. Vai dar certo.’

As medidas divulgadas ontem integram a primeira etapa do Programa de Investimentos em Logística (PIL), que também contempla portos, aeroportos e energia e passa para o setor privado a responsabilidade por obras de infra-estrutura nos próximos 30 anos. Mas o efeito sobre o desempenho da economia – que neste ano poderá crescer menos de 2% – somente deverá ser sentido de forma plena a partir de 2014, ano de eleição presidencial. Dilma quer um crescimento na faixa de 5%. Dos R$ 133 bilhões previstos para estradas e ferrovias, mais da metade (R$ 79,5 bilhões) serão aplicados nos cinco primeiros anos.

“Ao abrir um volume colossal de concessões à iniciativa privada, Dilma mudou a rota adotada até agora por governos petistas. Defensora de um Estado forte, a presidente tinha, até então, concedido apenas a administração de três aeroportos (Guarulhos, Viracopos e Brasília) e uma rodovia, no Espírito Santo, à iniciativa privada.

“Diante de uma plateia formada por dez governadores, ministros, parlamentares e pesos pesados da indústria, Dilma também anunciou a criação da Empresa de Planejamento e Logística. ‘O nosso propósito é nos unir para obter o melhor que a iniciativa privada pode oferecer em eficiência e o melhor que o Estado pode e deve oferecer em planejamento, gestão de recursos públicos e mediação de interesses legítimos.’

“Em geral, especialistas elogiaram o pacote, mas levantaram dúvidas sobre sua execução. Uma delas diz respeito ao cronograma, considerado muito otimista se for levado em conta o histórico de concessões. O governo quer licitar as rodovias em abril do ano que vem e as ferrovias em junho. Espera, ainda, fazer o leilão do trem-bala em maio. ‘São prazos ambiciosos’, admitiu o ministro dos Transportes, Paulo Sérgio Passos.

O presidente da Associação Brasileira de Infra-estrutura e Indústrias de Base (Abdib), Paulo Godoy, acredita ser possível reduzir prazos de execução das obras. De qualquer forma, ele se mostrou cauteloso quanto às condições de risco, rentabilidade e estabilidade jurídica dos novos negócios.” (Vera Rosa e Lu Aiko Otta, Estadão, 16/8/2012.)

* Privatização à moda Dilma socializa o risco

“O governo vai privatizar rodovias e ferrovias e vai estatizar o risco nas ferrovias. Vai privatizar, estatizando. Serão licitadas a construção e operação de estradas de ferro a empresas privadas, mas o setor público comprará toda a capacidade de transporte pelos novos trens. A estatal do trem-bala terá novas funções ao virar a Empresa de Planejamento e Logística (EPL).

“A nova estatal, EPL, será uma espécie de Geipot, mas com mais poderes. O Geipot foi esvaziado no governo Collor e, depois, extinto. Era o órgão que fazia o planejamento dos transportes no país. Fez falta nas últimas duas décadas. As agências são apenas setoriais, e o Ministério dos Transportes nunca conseguiu planejar.

“Uma novidade será a forma de operação das ferrovias. O governo fará licitações para construir e operar 10 mil quilômetros de trilhos, e ganhará quem oferecer o menor preço. Quando a obra estiver pronta, o operador terá um comprador garantido: o governo. Não correrá risco algum. O Estado garantirá a demanda e depois revenderá esse serviço a quem precisar de transporte ferroviário. Terá monopólio de compra e venda.

“Isso socializa o risco. O maior medo de quem constrói uma rodovia é a capacidade ociosa, principalmente nos primeiros anos. As empresas que entrarem na licitação terão financiamento estatal a juros negativos (TJLP mais 1%) e terão comprador garantido. Se houver prejuízo, ele será público.

“O governo está assumindo esse papel de intermediário para, como explicou a presidente Dilma, garantir o direito de passagem. Ou seja, evita-se o risco de que uma empresa negue o serviço a um concorrente. Isso poderia ter sido resolvido por uma correta regulação.

“O atual governo está investindo quase nada. O investimento despencou tanto no Dnit quanto na Valec (a estatal do setor ferroviário). Segundo dados do site Contas Abertas, o investimento da Valec foi de R$ 999 milhões no primeiro semestre de 2010; R$ 719 milhões no primeiro semestre de 2011; e R$ 451 milhões de janeiro a junho deste ano.

No caso do Dnit, o investimento cresceu de R$ 5 bilhões no primeiro semestre de 2010 para R$ 6,1 bilhões no primeiro semestre de 2011, mas caiu para R$ 4 bilhões de janeiro a junho de 2012.

“O pacote de ontem abre a chance de outro tipo de solução, e esse caminho foi adiado por temor da palavra ‘privatização’. A presidente continuou brigando com a palavra e prefere ‘concessão’.

“Quando é serviço público que está sendo transferido para o setor privado a palavra é mesmo ‘concessão’; seja na distribuição de energia, como houve no governo Fernando Henrique; seja na administração de estradas, como nos dois últimos governos, ou nos aeroportos licitados na atual administração. É uma questão semântica.

“A privatização das ferrovias não levou a um aumento da malha, mas alcançou resultados importantes. O PIB brasileiro cresceu 54% de 1997 a 2011, mas o transporte de cargas aumentou 117%. Nesse período, a União arrecadou R$ 15 bilhões em impostos e concessões. Quase R$ 30 bilhões foram investidos pela iniciativa privada.

“Esse pacote é melhor que os outros. Os últimos dez foram setoriais. Ajudavam setores específicos, por tempo determinado. Foram medidas de renúncia fiscal para beneficiar empresas que supostamente manteriam o ritmo do crescimento econômico. O Tesouro perdeu muita arrecadação, e o ritmo do crescimento encolheu.

“Ontem foi anunciado o primeiro de vários planos cujo objetivo é melhorar a competitividade da economia brasileira como um todo. Esses podem ter efeitos mais permanentes. Precisam sair do papel.” (Míriam Leitão, O Globo, 16/8/2012.)

* Como uma periguete envergonhada, que usa o tubinho mas fica puxando pra baixo pra esconder o que o tubinho mostra

“Sabe a periguete sem convicção? Ela veste o tubinho, mas fica o tempo todo puxando para cima e para baixo para tentar esconder o que a roupa quer exibir. A exibição envergonhada.

“Mal comparando, é como o pessoal do governo lida com a privatização de rodovias e ferrovias. Vestiu a ideia, vai aplicá-la, mas não admite sequer o nome. Privatização? Isso é imoral.

“Se fosse apenas pelo nome, não haveria problema algum. Pode-se chamar a coisa de concessão de serviço público. É sempre concessão a uma empresa privada, mas deixemos de lado esse detalhe. A China vendeu milhares de estatais e até hoje chama o programa de reestruturação.

“O problema, no governo Dilma, é que a bronca com o nome esconde uma bronca com a própria política. Não é que eles, do governo, aderiram à ideia de que o setor público é ineficiente e gasta mal ─ ou, pelo inverso, que o privado faz melhor ─ mas aceitaram privatizar porque não tinham outra saída. (…)

“Não tinha como turbinar as obras sem entregar às companhias privadas. Mas em vez de admitir isso, relaxar e aproveitar, o pessoal do governo resolveu vender caro. OK, vamos conceder, mas vocês vão ver como os concessionários serão tratados a pão e água. É óbvio, mas convém repetir: a empresa privada entra no negócio para ganhar dinheiro. A lógica da concessão é da economia de mercado. O empreendedor, ao buscar seu lucro, dentro de um marco legal, precisa entregar o serviço ou a mercadoria. Não obterá lucro se não o fizer, mas também não fará nada se não tiver confiança no retorno do investimento. As regras do negócio não podem garantir o lucro, mas devem garantir que, fazendo-se a coisa certa, haverá um bom lucro e o acionista poderá embolsá-lo.

“Pois parece que o PAC da privatização, digo, da concessão, faz o possível para limitar e restringir o retorno das concessionárias. O risco é claro: o cidadão fica sem a estrada boa, o empreendedor não ganha dinheiro e o governo perde, por não recuperar subsídios e empréstimos.

“Nas concessões de rodovias, por exemplo, optou-se pelo sistema que entrega obra e serviço para a companhia que oferecer a menor tarifa. Ao mesmo tempo, se exige que a concessionária faça um monte de coisas antes de cobrar o pedágio. Parece bom, pró-consumidor, mas traz um risco enorme: com mais obrigações e menos receita, a concessionária entrega um serviço de segunda. Está acontecendo nas estradas licitadas no governo Lula. Aconteceu em outros países.

“A arte do negócio é uma difícil combinação entre custo, eficiência e rentabilidade. Colocar restrição à rentabilidade não é um bom começo.

“Assessores da presidente Dilma têm dito que grandes companhias internacionais não se importarão em ganhar pouco aqui, pois não há bons negócios no resto do mundo. Parecem esquecer que o Brasil também desacelerou e que, entre os emergentes mais importantes, é o que cresce menos, com mais inflação e cada vez mais interferência do governo na economia. A insegurança pode fazer com que a estrada caia em mãos de companhias da segunda divisão, que encontram aí um meio de acesso. Se não der certo? Bom, conversa-se com o governo, que, aliás, é o financiador.

“A concessão de ferrovias é ainda mais complexa. Para privatizar, o governo resolveu reforçar a ação estatal. O governo não vai conceder, mas vai contratar empresas privadas para construir e operar as ferrovias. Além disso, o governo comprará toda a capacidade de transporte de carga, pelo menor preço de pedágio, e vai revender para empresas interessadas em usar os trilhos.

“Diz o governo que isso evita o monopólio, ou seja, que a concessionária da ferrovia não venda direito de passagem para outras. Ora, de onde tiraram que precisa de uma estatal para contratar, comprar e revender todo o transporte? Basta fazer uma regulamentação, estabelecer as regras no edital. Mas não. Acham que a Valec, aquela mesma, vai funcionar muito bem nesse complexo sistema de Parceria Público-Privada. Reparem: a lei que criou a PPP é de 2004. Não se fez quase nada até aqui. Agora vai?” (Carlos Alberto Sardenberg, O Globo, 16/8/2012.)

Mas a doença infantil do estatismo é difícil de curar

* Governo cria a 126ª estatal, a Amazul. Mais boquinhas para a companheirada

“Um dia após criar oficialmente a empresa que será responsável pelo trem-bala, a Etav, o governo criou sua estatal de número 126. O Diário Oficial de ontem trouxe a previsão de instituição da Amazônia Azul Tecnologias de Defesa (Amazul), empresa que será responsável pelo Programa Nuclear da Marinha Brasileira, que inclui a construção do primeiro submarino à propulsão atômica do país.

“A Amazul, cujo nome sugere que a costa brasileira possui biodiversidade similar à da Amazônia, será criada a partir de uma cisão da Empresa Gerencial de Projetos Navais (Emgepron), também ligada à Marinha. Neste ano, a Emgepron tem dotação orçamentária de R$ 7,17 milhões, mas só conseguiu investir, de fato, R$ 1,05 milhão até junho.

“Segundo a Lei 12.706, sancionada pela presidente Dilma Rousseff, a Amazul terá como objetivo ‘promover, desenvolver, absorver, transferir e manter tecnologias necessárias às atividades nucleares da Marinha do Brasil e do Programa Nuclear Brasileiro PNB’, além de lidar diretamente com os submarinos. O submarino nuclear brasileiro, no entanto, está atualmente em construção em Itaguaí (RJ), e a Amazul terá sede em São Paulo (SP).

“Para Carlos Campos, especialista em infra-estrutura do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), a curto prazo, parece exagerado criar estatais para cuidar de projetos específicos, mas, se capacitadas do ponto de vista tecnológico, elas podem ser uma boa saída no longo prazo. Ele destaca que, nos últimos anos, o governo fez ‘ressurgir’ a Telebrás, mas sua execução ainda é pouco expressiva.” (Danilo Fariello e Gabriela Valente, O Globo, 10/8/2012.)

De magníficos reitores a puxa-sacos do governo

* Os reitores das universidades federais foram transformados em lacaios do governo

“Pouco é comentado, nas análises sobre a greve dos professores federais, sobre o conúbio entre reitores e governo. É preciso examinar tal elo para entender os entraves institucionais e financeiros que originaram o movimento grevista.

“A autonomia universitária não vai além da letra, na Constituição de 1988. Fora as universidades paulistas – cuja base autônoma é um decreto do Executivo estadual -, no Brasil os câmpus sofrem rígido controle do Ministério da Educação (MEC) e os reitores são escolhidos de modo plebiscitário. As lutas pelos cargos fazem com que na eleição reitoral impere o ‘é dando que se recebe’. Como os municípios, as formas acadêmicas dependem de tratos oligárquicos e acertos com ministérios. Em eleições presidenciais essa anomalia se confirma no apoio ilegal de reitores aos palacianos. Em 27/10/2004 Luiz Inácio da Silva recebeu apoio de 55 instituições de ensino superior. Na audiência ilegal estavam os ministros da Educação, da Previdência e da Casa Civil. O encontro de 2004 foi o segundo entre reitores e Presidência. Em 5/8/2003, segundo importante dirigente universitária, ‘pela primeira vez tivemos uma reunião de caráter político entre o nosso sistema e o presidente da República’ (fonte: MEC, no site Universia Brasil, http://www.universia.com.br). O procedimento foi repetido na escolha da atual presidente.

“Ilegalidade para apoiar candidatos oficiais, subserviência diante do governo, uso de cargos para fins político-eleitorais. Os monopólios da ordem pública pelo Executivo trazem ineficácia ao câmpus, entravam iniciativas de pesquisadores e docentes. Os responsáveis pelo ministério confessam que sem os municípios e as universidades nada pode ser feito para melhoria administrativa e pedagógica no plano federal. Quando ministro, Fernando Haddad admitiu que o Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE) não trouxe reflexos significativos ao ensino superior: ‘O governo federal sozinho não conseguiria enfrentar os entraves educacionais do País. Era preciso o envolvimento de todos os Estados, municípios e universidades’ (Haddad admite que PDE ainda não mudou ensino superior, Universia, 19/5/2008).

“Quando notamos o comportamento dos reitores citados acima, podemo-nos inquietar com os frutos do comércio entre eles e os palácios. Ao contrário das universidades europeias ou norte-americanas, onde a guerra para conseguir recursos ocorre entre grupos acadêmicos (quem vence consegue verbas do Estado ou das empresas), nas universidades federais, como nos municípios, a passagem das verbas aos benefícios segue a via oligárquica e partidária. O reitor deve atrair deputados federais e senadores, obtendo o favor político a ser pago com fidelidade ao governo. Cada recurso novo é negociado na boca do Orçamento. As oposições consentidas podem ajudar na bacia das almas. O prestígio reitoral, no Executivo e no Congresso, nos últimos tempos tem sido raro. O dinheiro não está garantido. O que explica, em parte, as greves.

“Interessa aos dirigentes o jogo dos oligarcas nos gabinetes ministeriais. Ali se determina o prestígio do reitor ou do seu grupo. Prefeitos em plano micrológico, eles buscam verbas. No itinerário dos recursos vêm o favor e as ‘conversas políticas’. Ao se prenderem no xadrez burocrático e partidário, os reitores são obrigados a aceitar a lentidão e as regras que amesquinham ensino e pesquisa, começando com os baixos salários. A rede cortesã tolhe iniciativas dos câmpus, mas gera no seu interior a ilusão da democracia eletiva, com abstração dos fins científicos e pedagógicos.

“O dogma das eleições que assegurariam legitimidade às Reitorias trouxe resultados desastrosos. A experiência da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) é importante, pois ela se repete a cada nova eleição nos câmpus federais. Nas eleições ‘todos os nomes sufragados pelas urnas pertenciam às forças políticas que vinham dirigindo a UFSC desde a sua criação e que mantinham com os governos militares uma convivência pacífica ou um apoio entusiasta. (…) O processo eleitoral não possibilitou, portanto, como esperavam ou aspiravam as forças de oposição ao regime militar, neste caso as organizações dos docentes, servidores técnico-administrativos e estudantes, que grupos políticos não alinhados com as elites locais e nacionais pudessem ocupar os mais altos cargos da universidade’ (Waldir José Rampinelli, O Preço do Voto – Os Bastidores de uma Eleição para Reitor).

“Na universidade, nenhum mandato popular ou divino legitima o exercício do pesquisador/docente ou pesquisador/estudante. Só a retidão ética e o saber fornecem autoridade acadêmica. Se um reitor se mostra alheio à produção da ciência e do ensino e age servilmente perante o governo, temos apenas um embaixador do poder no câmpus. Se, além disso, ele traz para o interior da instituição universitária os interesses dos partidos políticos, surge algo manifestamente nocivo à universidade.

“Nos últimos tempos, Reitorias que assumem semelhante lógica surgem em colunas políticas e de polícia, ligadas ao uso errôneo de recursos públicos. Para entender o fato importa examinar a estrutura do Estado brasileiro e os costumes que ela ocasiona. Sem autonomia, governadores, prefeitos, reitores são elos de uma cadeia (a da lisonja servil) que rege a vida política brasileira. É quase impossível mudar a forma de poder que centraliza as políticas públicas no Executivo federal. Mas nas universidades vivem intelectuais que dominam saberes e práticas as mais sofisticadas. Eles poderiam elaborar planos de autonomia compatíveis com os padrões da pesquisa científica, humanística e de ensino. Se não o fizeram e não o fazem, é por cumplicidade. Aí, nada mais pode ser dito, porque entramos no terreno do realismo míope e oportunista, fonte de muitos risos e de muitas lágrimas para a cidadania brasileira.” (Roberto Romano, professor da Unicamp, Estadão, 14/8/2012.)

As prioridades equivocadas na educação

* Escolas técnicas de menos, universidades desnecessárias demais

“Em resposta a um dossiê preparado por professores da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), propondo a transferência da Escola de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (EFLCH) da periferia de Guarulhos para São Paulo, o Conselho de Assuntos Estudantis da instituição aprovou moção favorável à permanência da unidade no local onde está instalada – o Bairro dos Pimentas, uma região pobre, violenta e com problemas de acesso por transporte público.

“No dossiê, os professores afirmam que o câmpus da EFLCH é geográfica e culturalmente isolado, não trazendo perspectiva de progresso para a região. Além disso, dizem eles, a má localização prejudica a integração dos cursos de graduação e é um dos fatores responsáveis pela alta evasão de alunos, o que compromete os esforços da Unifesp para atingir as metas de produtividade e os padrões de excelência estabelecidos por seus órgãos colegiados. Ao refutar esses argumentos, o Conselho de Assuntos Estudantis alegou que ‘o bairro lutou pela universidade’. Afirmou, ainda, que a região está progredindo graças à EFLCH. E lembrou que outras universidades públicas instalaram unidades distantes de equipamentos culturais – como cinemas e teatros.

“‘A EFLCH já está enraizada. O que fazer com o dinheiro que foi gasto com a viabilização do câmpus?’, pergunta o diretor acadêmico da escola, Marcos Cezar de Freitas, que é favorável à sua permanência no Bairro dos Pimentas. ‘A EFLCH foi fundada para cumprir um projeto acadêmico, não para atender às urgências do bairro. A escola, como foi concebida, não cabe lá. A Unifesp não faz nada especificamente para a população local’, afirma o professor Juvenal Savian, que defende a transferência de alguns cursos para São Paulo.

“Por trás dessa polêmica, há uma questão de fundo, que é saber se a missão de uma universidade é instruir as novas gerações ou funcionar como instrumento de desenvolvimento urbano. Esse tipo de questão surgiu há quase dez anos com o lançamento, pelo governo Lula, do Programa de Apoio a Planos de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais (Reuni). Trata-se de uma política de expansão acelerada do ensino superior. Concebida sem uma avaliação cuidadosa do setor, essa política levou à abertura de campi onde não havia demanda e à admissão de alunos antes de existirem instalações adequadas.

“A crise da EFLCH é consequência dessa estratégia açodada, que levou o governo a gastar cerca de R$ 4 bilhões com o Reuni, quando a prioridade da educação deve ser o ensino técnico e, não, o ensino superior. Esse equívoco do governo Lula fica perfeitamente claro em pesquisa feita pelo Senai, mostrando que os certificados de conclusão de nível técnico hoje garantem salários mais altos do que os pagos a quem tem diploma universitário. Segundo o levantamento, realizado em 18 Estados, a remuneração média na admissão dos trabalhadores das 21 ocupações técnicas mais demandadas pela indústria é de R$ 2.085,57 – valor superior ao salário médio de advogados, dentistas e engenheiros em início de carreira.

“Em São Paulo, os salários iniciais mais elevados – entre R$ 3,5 mil e R$ 4,1 mil – são pagos a técnicos em manutenção de aeronaves e projetistas. No Rio de Janeiro, os salários iniciais mais altos são pagos a técnicos em mineração e em mecatrônica – em média R$ 8,6 mil e R$ 4 mil, respectivamente. Nos últimos 12 meses, o mercado de trabalho gerou 1,04 milhão de empregos para pessoas com diploma de nível técnico. Há, em todo o País, 2,4 milhões de trabalhadores que estudaram em cursos técnicos, segundo o levantamento, enquanto o mercado profissional para portadores de diploma superior está saturado.

“Por diversas vezes Lula afirmou ter sido o presidente que mais criou universidades e mais inaugurou escolas técnicas – cerca de 214. O problema é que ele construiu menos escolas técnicas do que o necessário e universidades demais – e estas, além de enfrentarem graves crises, como a da EFLCH, consomem recursos escassos que poderiam ser mais bem aplicados em favor das novas gerações.” (Editorial, Estadão, 13/8/2012.)

* Falta de tudo nas novas universidades federais

“Lançado pelo governo federal em 2007 com a missão de reestruturar universidades e ampliar o acesso dos brasileiros ao ensino público superior, o Programa de Apoio a Planos de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais (Reuni) cumpriu a segunda parte das promessas.

“O número de vagas oferecidas anualmente aumentou 63%, passando de 148.796, em 2006, para 242.893, em 2010 – dado mais recente do Ministério da Educação (MEC). Os investimentos em infra-estrutura, porém, não chegaram junto com os alunos. As primeiras turmas dessa expansão estão deixando as universidades depois de atravessarem o curso com bibliotecas desabastecidas, sem aulas em laboratórios, salas superlotadas e professores assoberbados. O MEC admite problemas, mas alega que eles ocorrem por causa do pioneirismo do Reuni, ‘um dos programas de maior sucesso da história da educação do País’ (mais informações nesta pág.).

“Os problemas se multiplicam pelo País. São aulas em contêineres, em porões, laboratórios improvisados em banheiros, falta de restaurantes universitários. A estudante de terapia ocupacional, Larissa Reis, de 19 anos, conta que está no terceiro semestre da faculdade e tem aulas em laboratório a cada 15 dias. ‘É muita gente e o professor divide a turma em duas. Ele dá a mesma aula duas vezes’, conta. Larissa é estudante do câmpus de Ceilândia da Universidade de Brasília (UnB), que funciona provisoriamente em 13 salas de uma escola de ensino médio. O barulho dos adolescentes atrapalha as aulas. ‘Não é o que eu esperava. É tudo muito precário.’ (Clarissa Thomé, Estadão, 14/8/2012.)

Muito marketing, pouca obra

* Que tal uma comissão da verdade para investigar a construção de lorotas?

“A doutora Dilma faria um bem ao país se nomeasse uma Comissão da Verdade 2.0, destinada a investigar a construção de lorotas do governo.

“Ela ficaria encarregada de explicar ao país como um trem-bala que foi anunciado em 2007 ao preço de US$ 9 bilhões hoje está estimado em US$ 16,5 bilhões.

“Felizmente, as tentativas de atropelamento fracassaram, a ideia continua no papel e o Doutor Juquinha, primeiro tocador do projeto, passou algumas noites na cadeia.

“Noutro caso, a Comissão 2.0 estudaria uma obra mais cabeluda, a da refinaria Abreu e Lima, da Petrobrás.

“Ela foi anunciada em 2005 por US$ 2,3 bilhões e agora estima-se que custe US$ 20,1 bilhões. Deveria operar em 2010 e ficou para 2014.

“Como no caso da Comissão da Verdade 1.0, a 2.0 não buscaria punições, apenas o metabolismo das mentiras que impulsionam projetos e ruínas.” (Elio Gaspari, O Globo e Folha de S. Paulo, 12/8/2012.)

Incompetência, inépcia

* Programa “Minha Casa, Minha Vida” não entregou metade das casas prometidas

“No vigésimo mês após o encerramento do governo de Luiz Inácio Lula da Silva, quase metade das casas contratadas na primeira versão do programa Minha Casa, Minha Vida ainda não foi entregue. Trata-se de mais de 400 mil do total de um milhão de novas habitações. Essa situação é crítica, principalmente para os mais pobres. Do total de 483 mil residências prometidas para essa população que ganha até R$ 1,6 mil, apenas 208 mil estão ocupadas, ou seja, 57% ainda estão à espera dos novos moradores.

“Dados obtidos pelo Globo com os números das primeira e segunda fases nunca haviam sido divulgados em separado, ocultando a lentidão nas entregas contratadas na era Lula. A maior celeridade da segunda fase do programa acaba por tornar o desempenho geral mais positivo, levando a 856 mil o número de residências já entregues ao todo.

O problema é que o governo tem metas para as contratações do programa, mas não para a entrega das casas aos moradores. ‘Acho que o governo iludiu o povo, porque a maioria não consegue (a casa), e tem muita casa pronta, mas não tem como chegar até lá, cadastrar-se e ser aprovado para morar’, disse Rita de Cássia Guimarães, que fundou a ONG Mami, no Distrito Federal, com a qual auxilia famílias da região de Riacho Fundo a preencherem os cadastros dos programas governamentais de moradia.

“Do programa do governo Lula, há ainda 80 mil imóveis que sequer atingiram 50% de seu estágio de execução, de acordo com dados do governo federal organizados até o dia 24 de julho deste ano. Contudo, em nota enviada ao Globo, a Caixa Econômica Federal, responsável pelo programa, prevê que, até o fim deste ano, será entregue o restante das casas prometidas no Minha Casa, Minha Vida.” (Danilo Fariello e Junia Gama, O Globo, 12/8/2012.)

* Irregularidade até em obra tocada pelo Exército

“O padrão de incompetência do governo federal na gestão do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) tem na transposição do Rio São Francisco talvez sua face mais dramática. Financiado inteiramente com recursos públicos, o projeto, que é o mais caro do PAC, foi alardeado como a salvação dos nordestinos acossados pela seca, mas tornou-se um manancial de irregularidades – das quais agora nem o Exército parece ter escapado.

“A idéia da transposição é desviar parte das águas do rio, por meio de canais de concreto, para irrigar o semiárido de Pernambuco, Paraíba, Ceará e Rio Grande do Norte. O projeto está dividido em dois eixos, o Norte e o Leste. Na semana passada, como mostra o jornal Valor, o TCU concluiu uma auditoria no Eixo Norte e constatou que houve superfaturamento na parte desse trecho que estava entregue ao 2.º Batalhão de Engenharia do Exército, num montante estimado em mais de R$ 7 milhões. A auditoria sustenta que a irregularidade, em Cabrobó (PE), ocorreu em razão da ‘fiscalização inadequada por parte do Exército’. (…)

“Não é à toa que a previsão de custo da transposição tenha saltado de R$ 4,7 bilhões para R$ 8,2 bilhões, e fica difícil acreditar na presidente Dilma Rousseff quando ela diz, como fez em fevereiro passado, que o governo tem ‘uma clara perspectiva de fazer com que essa obra entre em regime de cruzeiro e não tenha nenhum problema de continuidade’.

“Causa espécie, porém, a notícia de que pode ter havido irregularidades até em obra tocada pelo Exército, instituição que costuma estar acima de qualquer suspeita. Os militares têm sido uma espécie de esteio dos programas de infra-estrutura do governo federal, porque cumprem prazos e economizam recursos. O Exército está hoje em 25 obras do PAC. Atua na terraplenagem do novo terminal do Aeroporto de Guarulhos, além de ter oferecido à Infraero projetos de engenharia para a expansão dos aeroportos de Vitória, Goiânia e Porto Alegre.

“No caso do Aeroporto de Guarulhos, a competência da ‘empreiteira militar’ foi amplamente comprovada: o prazo para a entrega da terraplenagem foi antecipado em 15 meses, e o custo, antes orçado em R$ 417 milhões, caiu 25%. É o exato oposto do que acontece na maioria das obras do PAC – inclusive, agora se sabe, em uma das que estavam sob incumbência do Exército.

“O próprio TCU acaba de constatar que houve desvio de pelo menos R$ 36,4 milhões na obra da Ferrovia Norte-Sul entre Palmas (TO) e Uruaçu (GO), como mostrou a Folha (4/8). Entre outras irregularidades, foram comprados trilhos e dormentes que acabaram não sendo usados. Além disso, o empreendimento tem erros de execução que geraram superfaturamento de R$ 20,7 milhões e que podem comprometer a própria segurança da operação ferroviária.

“Em outro caso exemplar do descalabro do PAC, revelado pelo Estado (5/8), as obras de construção da refinaria cearense Premium 2, tida como prioritária pela Petrobrás, não foram nem sequer iniciadas, por problemas fundiários. O lugar é apenas mato, nada menos que 18 meses depois do lançamento da pedra fundamental por um orgulhoso presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que logo em seguida passaria a faixa a Dilma Rousseff, a quem apelidou de ‘mãe do PAC’. Há apenas restos do palanque ali montado para mais uma sessão do prometido ‘espetáculo do crescimento’. (Editorial, Estadão, 11/8/2012.)

A economia que cresce apesar do governo

* Embora sem as benesses do governo, apesar do PT, o agronegócio tem bons resultados

“Depois de tanta decepção com o setor produtivo, especialmente com a indústria, o ministro da Agricultura, Mendes Ribeiro Filho, orgulhosamente apresentou nesta quinta-feira ‘a maior safra agrícola de todos os tempos’. (…)

“As administrações do PT mantêm em relação à agropecuária uma visão carregada de ambiguidades até agora não resolvidas. O partido chegou ao governo com a visão enviesada de que esse é um setor dominado pelo agronegócio (visto como predador), pela bancada ruralista do Congresso (sempre retrógrada), pelos usineiros exploradores dos boias-frias, pelos fundiários avessos à reforma agrária e às reivindicações do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra (MST).

“Os líderes do MST, que contam com uma boa retaguarda dos governos desde 2003, não se cansaram de denunciar os responsáveis pelo que chamam de destruição da agricultura familiar, à medida que grandes empresas se empenham em espalhar monoculturas de laranja, soja, cana-de-açúcar e florestas de árvores exóticas, como de eucalipto e pinus.

“Essa visão ideológica foi complementada pelo diagnóstico distorcido de alguns economistas, para os quais esse modelo agrícola tende a reconduzir o Brasil à produção de bens primários, que incorporam baixo índice de tecnologia e não se preocupam com agregar valor. Mais do que isso, entendem que o setor pretende reduzir o Brasil a um fazendão e gerar a doença holandesa que contribui para uma superoferta de dólares, que manteria o real excessivamente valorizado, e para a desindustrialização.

“Em contrapartida, embora sigam contaminados por pontos de vista desse tipo, os governos do PT vêm sendo obrigados a reconhecer enormes avanços tecnológicos da agricultura brasileira moderna, a imprescindível fonte de receitas em moeda estrangeira proporcionada pelas exportações de grãos, e a importância estratégica da bioenergia, sobretudo programas do biodiesel e da produção de etanol, e o enriquecimento do interior do País.

“Mas não dá para falar que a agricultura venha contando com apoio firme do governo, tal qual dado a determinados setores da indústria, premiados com isenção tributária e créditos favorecidos do BNDES. Além disso, a atual política populista de achatamento de preços concorre para desestimular a produção de cana-de-açúcar. A agropecuária brasileira continua escrevendo uma história de sucessos, apesar do jogo contra. (Celso Ming, Estadão, 10/8/2012.)

As más notícias na área da energia

* “O prejuízo bilionário mostra as dificuldades que a Petrobrás tem para investir de maneira eficiente”

“Uma parte do prejuízo bilionário contabilizado pela Petrobrás no segundo trimestre é atribuído, por exemplo, ao insucesso na exploração, decorrente de vários poços secos ou sem valor comercial. E isso mesmo considerando-se um expressivo índice de acertos, passando de 80% em algumas áreas, bem acima da média da própria indústria. Parceiros da Petrobrás em campos no pré-sal, como a BG e a Galp, também registraram prejuízo.

“O elevado risco na exploração de petróleo justificou plenamente a abertura do mercado brasileiro em meados dos anos 90. A Petrobrás hoje detém mais da metade dos blocos concedidos à exploração, porém, agora, disputa a atividade com cerca de outras 70 empresas, entre as quais dezenas delas com maioria de capital brasileiro.

“Este modelo adequado para o Brasil sofreu um retrocesso quando o governo Lula se convenceu que havia encontrado ‘uma Venezuela’ na camada do pré-sal. Sem dúvida houve descobertas animadoras, sendo a mais importante a do campo de Lula, já em produção, com reservas estimadas entre seis e nove bilhões de barris. No entanto, blocos vizinhos foram devolvidos por absoluto insucesso. Outros campos indicados como promissores foram cedidos à Petrobrás, pela União, a título de integralização do aumento de capital da companhia.

“Os investimentos que terão de ser feitos nas áreas concedidas e cedidas exigirão esforço hercúleo da Petrobrás. Espera-se que sejam exitosos, mas não se pode desconsiderar a possibilidade de insucesso.

“Não faz, então, o menor sentido que, diante de tamanho desafio, o governo tenha adotado um modelo para exploração de futuras áreas da camada do pré-sal que obriga a Petrobrás a participar com pelo menos 30% dos consórcios concorrentes e ainda ser obrigatoriamente a companhia operadora do que que sair vencedor da licitação.

“As dificuldades que a Petrobrás vem enfrentando para executar seu ambicioso plano de negócios mostram a necessidade de se rever essa tentativa de restabelecer um monopólio estatal ultrapassado e infrutífero. Para a própria Petrobrás, o modelo instituído para exploração de novas áreas do pré-sal ainda não concedidas poderá se tornar um pesadelo.” (Editorial, O Globo, 12/8/2012.)

* Burocracia e alto custo afastam empresas estrangeiras

“A burocracia e o elevado custo de produção são os principais entraves para o desenvolvimento da cadeia de fornecedores de óleo e gás no Brasil. Nos últimos anos, várias empresas estrangeiras tentaram se instalar no País para aproveitar as oportunidades de negócios oferecidas ao setor. Algumas desistiram. Outras entraram no mercado, mas com estruturas mais tímidas, afirmam especialistas.

“O advogado João Luis Ribeiro de Almeida, sócio da Demarest & Almeida, conta que já foi procurado por vários estrangeiros para se instalar no Brasil. ‘Eles reclamam da burocracia tributária e dos custos elevados. Alguns preferiram operar com uma estrutura menor enquanto não têm certeza de demanda.’

“A intenção do governo ao criar a política de conteúdo local era exatamente atrair esses investidores, como ocorreu na Noruega. O país nórdico conseguiu sair do zero e desenvolver uma indústria de petróleo que hoje oferece tecnologia para o mundo inteiro. ‘O ambiente macroeconômico é muito diferente. Lá, quando conseguiam atrair uma nova indústria, havia condições mais alinhadas com os competidores mundiais. Essa é a dificuldade no Brasil’, explica o superintendente da Organização Nacional da Indústria do Petróleo (Onip), Bruno Musso. (Renée Pereira, Estadão, 12/8/2012.)

* Empresas adiam investimentos de US$ 95 bilhões

“Nos últimos dois meses, pelo menos US$ 95 bilhões em investimentos no Brasil foram suspensos ou tiveram seus cronogramas de entrada em operação postergados. A lista inclui companhias como Anglo American, Vale, Braskem, JAC Motors e, principalmente, a Petrobrás.

“Apenas a estatal do petróleo revisou projetos orçados em quase US$ 70 bilhões. A siderurgia também foi muito afetada por essa pisada no freio. O setor trabalhava com um plano de investimentos de US$ 17,4 bilhões até 2017, adiado sem previsão de retomada.

“Além dos projetos que estão na geladeira, outros empreendimentos dados como certos agora enfrentam muita dificuldade para sair do papel. É o caso da construção de fábricas ainda em estudo por Volkswagen, Volvo, BMW e Land Rover, no Rio. Juntos, esse projetos estão orçados em cerca de US$ 4 bilhões.

“A interrupção reflete a cautela das companhias diante da desaceleração da economia brasileira e da crise na Europa e nos Estados Unidos, que reduz a demanda externa por seus produtos. ‘Nesse contexto, é natural as empresas adiarem investimentos para privilegiar a geração de caixa’, diz o professor de economia da PUC-SP, Antonio Corrêa de Lacerda. Ele calcula que o Produto Interno Bruto (PIB) acumulado de julho de 2011 a junho de 2012 esteja próximo de zero, o que significa estagnação.

“Lacerda classifica o quadro como um ‘efeito cautela’ de grandes grupos, que não veem urgência em ampliar sua capacidade de produção. O lado positivo, diz, é que não houve projetos cancelados. O problema é que o adiamento de planos por empresas âncoras do País gera uma reação em cadeia. ‘Quando uma Vale ou uma Petrobrás adiam ou reduzem investimentos, isso se multiplica. Há um efeito manada entre fornecedores e concorrentes’, acredita.” (Mariana Durão e Mônica Ciarelli, Estadão, 13/8/2012.)

As outras más notícias da Economia

* PIB fraco e ações do governo afastam investidores estrangeiros do Brasil

“O crescimento do Brasil em ritmo mais lento e as intervenções do governo na economia – como nas margens dos bancos, na valorização do câmbio e na taxação da renda fixa – foram um balde de água fria na euforia dos investidores estrangeiros. Com uma contribuição da crise europeia, o dinheiro trazido por esses investidores – de fundos de investimento e fundos de pensão até fortunas de famílias e de empresas – para a compra de ações e títulos de renda fixa no país encolheu 40% no primeiro semestre, frente ao mesmo período de 2011: de US$ 12,4 bilhões para US$ 7,5 bilhões, segundo dados do Banco Central (BC). Para os grandes bancos de investimento, o Brasil que ilustrou a capa da revista inglesa The Economist, em novembro de 2009, com o Cristo Redentor literalmente decolando, ficou sem combustível. Ou ‘Lento e sem medalhas’, como classificou o banco americano Morgan Stanley em relatório na semana passada.

Se havia euforia demais, o pessimismo agora se tornou extremo. ‘O investidor está sempre de olho nas regras do jogo. E houve mudança de regra, como na atuação do governo no câmbio, o que corroeu o ganho dos estrangeiros. Isso afeta o humor do mercado’, afirma o americano Alexander Gorra, estrategista-chefe do BNY Mellon ARX, a gestora do banco de Nova York. ‘Quando o estrangeiro olha o Brasil, ele olha de maneira relativa. A curto prazo, o país cresce menos.’

E assim, os fundos globais de ações dedicados ao Brasil sofreram saques de US$ 1,5 bilhão neste ano por seus cotistas. Os fundos de ações tiveram resgates de US$ 1,4 bilhão, e os de títulos, de US$ 100 milhões. Os dados são da consultoria americana EPFR Global. Cameron Brandt, analista da consultoria, diz que os investidores têm ‘agressivamente’ sacado do Brasil.” (Bruno Villas Boas e Gabriela Valente, O Globo, 12/8/2012.)

* Preço de geladeiras e máquinas de lavar sobem, apesar do corte do IPI

“Quem acreditou na promessa do ministro da Fazenda, Guido Mantega, de que os eletrodomésticos ficariam mais baratos com o corte de IPI percebeu que, em vez de cair, alguns preços subiram. Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), geladeiras e máquinas de lavar tiveram os preços reajustados para cima em julho. A nota fiscal de fogões e móveis também mostrou aumento nos primeiros sete meses do ano, de acordo com o IBGE.

“A inflação de eletrodomésticos e equipamentos calculada pelo instituto subiu 0,22% em julho sobre o mês anterior, ajudando a pressionar o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA). Após o corte de IPI, as lavadoras ficaram 0,29% mais caras, com reajuste de 0,64% somente em julho. Já o preço dos fogões cresceu 0,42% de abril a julho e dos móveis, 0,13%. Em sentido oposto, o preço das geladeiras caiu 3,09% depois do pacote, mas registrou leve aumento de 0,09% no mês passado.

“Os cortes de imposto para móveis e eletrodomésticos da linha branca foram anunciados no dia 26 de março deste ano. Ao custo de mais de meio bilhão de reais, o governo baixou o tributo industrial de lavadoras à metade, zerou o tributo sobre fogões e móveis e eliminou dois terços do IPI de geladeiras. A lógica por trás da medida era reduzir os preços para estimular o consumidor a ir às lojas, turbinando as vendas e a produção destes produtos. Com isso, a roda da economia acelera, impedindo demissões de trabalhadores.” (Iuri Dantas, Estadão, 11/8/2012.)

Um centro de excelência que se perdeu

* Em crise, a Embrapa deixa sem resposta problemas graves da agricultura brasileira

“A Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) tornou produtiva a terra ácida e arenosa do cerrado brasileiro. Esse milagre tem grandes chances de se repetir na África, com seus quase 400 milhões de hectares de savana. (…) Mas essa admiração conquistada pela Embrapa, aqui e no exterior, está em risco. A empresa perdeu foco e orientação estratégica nos últimos anos. A Embrapa está em crise, deixando sem resposta problemas graves da agricultura brasileira.

“Em 1973, quando foi criada a Embrapa, o País vivia a década do milagre econômico, mas era importador de alimentos. Os investimentos feitos na época em infra-estrutura de transportes, comunicações e armazenamento pelo governo federal começaram a promover uma mudança na exploração agrícola. Com estrutura física modesta, alguns veículos, poucos implementos e muita vontade, os pioneiros da empresa que nascia formaram as equipes de trabalho. Mais de mil jovens pesquisadores foram enviados às melhores universidades da Europa e dos EUA para mestrados e doutorados, num dos maiores programas de capacitação em pesquisa já realizados no Brasil.

“Do nascimento da Embrapa aos dias de hoje, tornamo-nos uma potência agrícola. A sexta economia do mundo tem no agronegócio 25% de toda a riqueza gerada no País. Somos os maiores produtores mundiais de soja, milho, café, suco de laranja e etanol. E os maiores exportadores de carne bovina. A tecnologia da Embrapa e parceiros tropicalizou a produção de soja e levou o grão do Sul para o Nordeste, o Centro-Oeste e até para os Estados do Maranhão, Piauí e Tocantins, a novíssima fronteira agrícola brasileira. Uma reinvenção da agricultura tropical, com formidáveis conquistas em produtividade e conservação de solos.

“Hoje, nos 47 centros de pesquisa em todo o Brasil, que contribuíram para esse processo, aparecem sinais de fadiga. Muitos não acompanham o desenvolvimento tecnológico de produtos aos quais estão ligados. A contribuição para as sementes melhoradas caiu vertiginosamente. Cerca de 70% a 80% da soja, 60% do milho e 80% do algodão vêm de programas de melhoramento genético privado. Empresários do meio rural cada vez mais buscam soluções e inovações em outros países. Na outra ponta, a Embrapa parece abandonar seus programas voltados para a pequena agricultura e o combate à miséria no campo. (…)

“A falta de transparência da atual gestão é mais um problema. Nos últimos três anos criou-se na Embrapa uma nova estrutura para gestão de projetos internacionais de cooperação, as plataformas Africa-Brazil Marketplace e Latin America-Caribe Marketplace, com recursos do Banco Mundial, do Fórum para Pesquisa Agrícola na África e da Fundação Bill & Melinda Gates, entre outras instituições. O Departamento de Pesquisa e Desenvolvimento, que centraliza os programas e projetos da Embrapa, não participa diretamente da coordenação. O montante exato de recursos captados até o momento é desconhecido e não há clareza sobre quem audita tais plataformas.

“A crise na direção da empresa, debatida pelo setor agrícola, chegou à mídia com artigos neste jornal (“Os problemas da Embrapa”, em 22 de março; “A Embrapa perdeu o bonde”, em 1.º de abril; “O bonde da Embrapa”, em 17 de abril) e no jornal Valor Econômico (“Embrapa perde terreno na pesquisa agrícola”, em 21 de março), entre outros, sem que sua diretoria apresentasse um contraponto ou sua visão sobre os problemas levantados.” (Rodrigo Lara Mesquita, Estadão, 11/8/2012.)

A suspeita de tenebrosas transações

* Enxerto em MP pode deixar negócio de R$ 2 bilhões/ano nas mãos dos comissários do governo

“Está na mesa da doutora Dilma, esperando sua assinatura, a medida provisória 563. É uma daquelas MPs do tipo “aterro sanitário”, pois tem de tudo. Em tese, destina-se a estimular a indústria nacional. Na prática, distribui favores.

“Chegou ao Congresso com uma lista de benefícios que ocupava duas páginas, e ficou com 14. Um dos enxertos, patrocinado pelo senador Romero Jucá por inspiração do Ministério da Saúde, dispensa de licitação a compra de ‘produtos estratégicos’ para o SUS quando houver ‘transferência de tecnologia’. Em bom português: dá ao comissariado o poder de atropelar o processo de transparência das compras.

“O doutor Alexandre Padilha já se encrencou com contrato de compra de softwares portugueses que, entre outras coisas, serviriam ao gerenciamento do Cartão SUS. Vinha embrulhado na parolagem do ‘estratégico’ e da ‘transferência de tecnologia’. Exposto à luz do sol, o contrato foi suspenso e, logo depois, cancelado.

“O artigo 73 da MP permitirá que o comissariado compre mercadorias para o SUS sem avisar ao público e sem explicar por que escolheu esta ou aquela empresa. Num exemplo hipotético, acontecerá o seguinte:

“Admita-se que o SUS quer trazer uma nova tecnologia de remédio para hipertensão. Um laboratório sérvio desenvolveu um novo ingrediente, o ‘padilhol’, capaz de melhorar o desempenho de um anti-hipertensivo. Já um concorrente croata produz o ‘padilhil’ e diz que tem as mesmas qualidades.

“O comissariado escolhe uma empresa de Ribeirão Preto que contratou a transferência da tecnologia do ‘padilhol’ para vendê-lo ao SUS. Pela lei, o governo deve abrir uma licitação. Graças à MP 563, fica dispensado até mesmo de avisar a quem tem interesse no negócio, no exemplo, os croatas do ‘padilhil’. Licitá-la, nem pensar. Se isso fosse pouco, enquanto durar o que se entende como ‘etapas de absorção tecnológica’ (algo como um par de anos), a empresa de Ribeirão Preto ganhará o monopólio de fornecimento de um ‘padilhol’ comprado na Índia. Algo como remunerar o pai porque o filho está na escola absorvendo conhecimento.

“O que há de mais esquisito nessa operação é seu caráter secreto. Num negócio que, no futuro, poderá chegar a R$ 2 bilhões anuais, o comissariado decidirá, e está acabado. No mundo dos medicamentos conhece-se a formação de monopólios por meio do jogo de patentes. É um processo odioso, mas, bem ou mal, na sua origem houve algum tipo de pesquisa. O que se quer agora é a formação de um cartório de monopólios no qual se pesquisará apenas quem é amigo de quem.” (Elio Gaspari, O Globo e Folha de S. Paulo, 12/8/2012.)

Cria cuervos. Ou: quem pariu Mateus que o embale

* Os servidores se acostumaram, durante o governo Lula, a ser tratados como privilegiados

“O Brasil é refém dos funcionários empenhados em arrancar do governo federal novos aumentos salariais e a continuação das benesses criadas pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Mais de 300 mil grevistas – 350 mil, segundo a confederação dos servidores – estão envolvidos numa indisfarçável tentativa de extorsão, praticada por meio de ameaças e de abusos contra os pagadores de impostos. Enormes congestionamentos já foram provocados em estradas de sete Estados e do Distrito Federal pela ação truculenta de policiais. O tráfego foi quase paralisado por nove horas na Ponte Rio-Niterói. O movimento de portos e aeroportos foi prejudicado e o movimento de exportação e importação de mercadorias, incluídos produtos com fins medicinais, vem sendo prejudicado há semanas. (…)

“Eles se acostumaram, durante os dois mandatos do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, a ser tratados como um grupo social privilegiado. Desde o começo da gestão petista, o custo per capita dos funcionários do Executivo cresceu 170% em termos n0minais, enquanto a média dos preços aumentou 70%. Empregados do setor público federal ganham hoje mais que os profissionais do setor privado e ainda têm vantagens quase sempre inacessíveis ao pessoal do setor privado, a começar pela estabilidade.

“Boa parte desses benefícios foi concedida quando a atual presidente comandava a Casa Civil. Integrou o núcleo do governo. Teve condições de interferir na política econômica e de aconselhar prudência gerencial. Não parece, no entanto, haver-se esforçado para promover a racionalidade e combater a politização evidente da administração do pessoal. Hoje colhe os resultados daquela política temerária.

“Nem mesmo seu partido, tradicionalmente ligado ao funcionalismo federal, parece em condições de oferecer à presidente a ajuda necessária para um entendimento razoável com os grevistas. Estes, sem regras e sem controle político ou institucional, pressionam o governo usando o País como refém. As limitações orçamentárias são apenas o segundo problema da presidente Dilma Rousseff, nesse caso. O primeiro – e muito mais complicado – é político.” (Editorial, Estadão, 10/8/2012.)

* Greve do funcionalismo é um tiro no pé do PT

“O ministro da Secretaria-Geral da Presidência, Gilberto Carvalho, errou de endereço ao apostar, há dias, que ficará decepcionado quem imagina que o julgamento do mensalão desestabiliza o governo Dilma. Se a sentença final do Supremo Tribunal Federal (STF) absolver os que passaram dois anos desviando dinheiro público para seus partidos, a decepção será muito mais da população do que da oposição. Decepção e desesperança de punição para futuros crimes de corrupção.

“A possibilidade de desestabilização política de Dilma Rousseff tem outra origem, endereço diferente da pacata oposição e ganhou musculatura nos últimos dias. Ela atende pelas siglas PT e CUT, que lideram os movimentos grevistas de funcionários públicos e que transformaram a vida da população num caótico inferno na última semana. Deixou de ser o fogo amigo da época de Lula, é fogo inimigo mirando Dilma, e com poder de produzir efeitos também no voto da classe média nas eleições. Como não há como separar o governo do partido que lhe dá sustentação política, é o PT atirando no próprio pé.

“O prejuízo de uma greve de 30 profissões públicas e 350 mil funcionários é financeiro, mas também político. De tão fragmentado, o prejuízo financeiro é difícil de calcular, pois a greve se estende pelo País todo. Certamente, ultrapassa a casa de muitos milhões de reais: navios e mercadorias parados nos portos, aviões decolando com enorme atraso, contratos de compra e venda desfeitos, multas por descumprimento de prazos. Perdas que abalam a economia do País e são distribuídas entre os setores público e privado. A cifra global é alta, mas não se compara ao drama vivido pelos milhares de brasileiros prejudicados pela paralisação de serviços públicos.

“O que pensam pais e alunos de mais de 50 universidades públicas sem aulas há três meses? Ou os milhares de motoristas e passageiros parados durante 9 horas na Ponte Rio-Niterói? Ou quem precisava viajar de avião ou ônibus e não chegou ao seu destino a tempo de cumprir inadiável compromisso? Ou ficou retido horas no engarrafamento da Via Dutra, com a carga do caminhão se deteriorando ou passageiros angustiados, cada um com seu drama pessoal, precisando abreviar a chegada? E quem teve aquela urgente cirurgia cancelada porque os médicos desapareceram do hospital? E os doentes sem atendimento?

“Enfim, são milhares e milhares de brasileiros que passaram a enfrentar o inferno com a multiplicação das greves. E, quanto mais pobre, mais penalizada é a população, porque é quem mais precisa e recorre aos serviços públicos. Em contraste com ela estão justamente os grevistas e suas lideranças com seus privilégios: nunca são demitidos, aposentam-se com o mesmo salário da vida ativa, têm prêmios, quinquênios, jornadas de trabalho encurtadas e salários elevados, quando comparados aos do setor privado. É o que faz de Brasília a cidade de maior renda per capita do País, o dobro da de São Paulo, a segunda colocada.

“Essa multidão de brasileiros prejudicados pelas greves certamente identifica no governo um dos causadores de suas mazelas. Mas não só. Passaram os tempos do maquiavelismo, do bem e do mal, do mocinho e do algoz. Não se iludam PT e CUT: o desgaste e a desestabilização política não se restringem a Dilma, mas também os contaminam. É o pai do aluno culpando os professores, o passageiro do avião e do ônibus responsabilizando os policiais federais e rodoviários, a mãe desesperada com o filho no colo xingando o médico. E todos identificando no PT e na CUT os incentivadores da eclosão e adesão às greves. (Suely Caldas, Estadão, 12/8/2012.)

* A presidente está colhendo o que o governo Lula e o dela semearam nos últimos nove anos

“Quem assiste ao desdobramento da greve nacional dos funcionários públicos desta república sindicalista e à reação do governo pode ter a impressão equivocada de que a presidente Dilma está na oposição. No entanto, ela não está fazendo outra coisa senão colher o que o governo Lula e o dela semearam nos últimos nove anos.

“Os levantamentos não são inteiramente confiáveis, mas dão conta de que estão em greve, total ou parcial, alguma coisa entre 300 mil e 350 mil servidores públicos, boa parte deles há mais de 50 dias, num total de 26 categorias. Algumas preferiram desencadear as chamadas operações-padrão, como é o caso dos servidores da Polícia Federal e dos auditores da Receita. Os enormes congestionamentos nas rodovias federais, as filas imensas nas áreas de embarque internacional nos aeroportos, o volume sem precedentes de carga amontoada nos postos alfandegários à espera de liberação e a perda do ano letivo em universidades federais são uma pálida amostra do estado caótico a que ficou reduzida boa parte dos serviços públicos.

“A reivindicação básica dos funcionários são reajustes salariais da ordem de 22%, num ano em que o Banco Central garante que conduzirá a inflação ao centro da meta de 4,5%. Mas os docentes das universidades federais já rejeitaram proposta apresentada pelo governo federal de correlação escalonada por três anos, de 25% a 40%.

“Os servidores públicos tiveram tratamento mais do que privilegiado durante a gestão Lula. O quadro do funcionalismo público federal saltou de 485 mil para 573 mil postos de ocupação. De acordo com levantamento realizado pelo jornal Folha de S.Paulo, a despesa mensal média com o salário de cada um dos funcionários públicos federais saltou de R$ 2.840, em 2003, para R$ 7.690, neste ano – um avanço superior a 170%, enquanto a inflação acumulada no período não passou dos 70%.

“A aceleração das despesas com a folha de pagamentos no governo Lula aconteceu, em grande parcela, quando a ministra chefe da Casa Civil era a presidente Dilma Rousseff. E ela foi também fortemente beneficiada por essa política, na medida em que garantiu grande número de votos nas eleições de 2010. (…)

“Por aí se vê que servidores públicos e governo disputam um cabo de guerra. Como sempre, a corda vai rebentar no ponto mais fraco. E este parece ser o do vacilante governo Dilma.” (Celso Ming, Estadão, 15/8/2012.)

* Comercio exterior enfrentou 2 anos de greves no período de oito anos

“Nos últimos oito anos, o setor produtivo brasileiro foi afetado pelo equivalente a quase dois anos de greve. Esta é a soma dos dias de paralisação nos diversos órgãos responsáveis pela liberação do comércio exterior do país, segundo levantamento da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB).. Ao todo, foram 659 dias de greve, sendo 92 este ano.

“As consequências vão além da dificuldade de embarcar ou liberar mercadorias nos portos e aeroportos. Segundo a AEB, isso traz insegurança tanto para exportadores como para seus clientes, que preferem comprar de fornecedores com os quais possam contar. ‘O atraso e cancelamento de embarques provocados pelas greves oferecem aos nossos concorrentes, especialmente de produtos manufaturados, a oportunidade de ocupar mercados duramente conquistados por empresas brasileiras’, disse o presidente da AEB, José Augusto de Castro.

“A Receita Federal está em greve há 57 dias e a Anvisa, há 29. Os fiscais agropecuários chegaram a parar por cinco dias, mas tiveram de voltar ao trabalho por determinação do Superior Tribunal de Justiça (STJ)..

Mas em alguns portos ainda há serviços represados..

Na lista dos problemas causados pelas greves ao setor produtivo estão desde multa contratual por descumprimento de prazos a cancelamento de contratos, passando por perda de receita cambial para o Brasil e menor geração de empregos. Isso só para as exportações. A AEB diz ainda que as paralisações seguram as importações nos portos, afetando a indústria nacional, com desabastecimento de matérias primas e até paralisação de linhas de produção.” (Vivian Oswald e Eliane Oliveira, O Globo, 15/8/2012.)

17 de agosto de 2012 

 

4 Comentários para “Más notícias do país de Dilma (64). E também uma boa”

  1. Os cães passam e a caravana ladra.As viúvas de FHC saltitam alegres com as privatizações da presidenta. A oposição se regogiza com o quanto pior melhor.

  2. Não, não, Milton. Eu não meu regogizo com o quanto pior melhor. Ao contrário. Fico contente com a decisão do governo de fazer o que deve ser feito: privatizar. Só espero que saiba privatizar bem.
    Um abraço!
    Sérgio

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