coloquei o menino sobre as almofadas do grande banco de cimento e o cobri. sentei meu pai no canto e fiz com que se cobrisse com seu enorme casaco preto.
vou fazer um chá.
e já trouxe uma xícara quente para meu pai e uma morna pro menino.
capim-limão! está bom! e sorrindo: a festa acabou.
nunca vou esquecê-la, pai. eu disse. e você, garoto, não quer um banho? logo logo vai ser meia-noite.
falta muito ainda, pai. mas eu quero um banho. e vou vestir uma roupa branca. vovô!
meu pai o olhou, agora já completamente calmo, apesar de eu perceber que ainda tremia de leve.
oi!
você fica bravo se eu tomar o último banho a álcool?
claro que não! um sorriso devolveu meu pai a meu pai.
preparei o banho do menino e ele entrou no banheiro.
quer mais um chá?, pai.
vou pegar.
nada disso! eu pego. e logo a seguir:
é preciso trazer o aparelho e as caixas.
está frio, pai. eu cuido disso.
coloque tudo aqui em baixo, por favor. quero ouvir umas músicas antes de ir.
trouxe tudo. armei improvisadamente o aparelho e as caixas. o menino saiu todo de branco do banheiro.
você botou mais álcool, né?, pai
botei. sorrindo. deite-se aqui. vou cobri-lo. está com fome?
não. e eu:
pai, agora vou ao banho. depois vemos as músicas.
e já saí, também todo de branco. agora era eu, quem perguntava rindo:
pai! e se eu acender velas, você fica bravo?
vai ficar bonito.
vou arrumar seu banho, pai.
não precisa. meu último banho vai ser frio.
uau!, vovô.
risos.
enquanto meu pai esteve no banheiro, o menino:
pai, semana que vem a gente podia ficar uns dias no apartamentinho.
quer passear pelo Centro?
quero. quero jogar vídeo-game.
semana que vem a tia chega com as meninas.
jóia.
e virou-se e dormiu num relance.
meu pai sentou-se todo dentro do largo banco, de modo que seus pés tocavam os pés do menino. atrás de sua cabeça, ao alto, o enorme poster que eu fizera de Joan Baez.
que músicas?, senhor.
veja estas fitas que eu separei.
muito bem. Mors et vita, de Charles Gounod. isto é maravilhoso! são duas fitas. depois, o Réquiem de Dvořak, nossa! e as Vespro della Beata Vergine, de Monteverdi, pai, assim você acaba comigo.
risos. preparo-me pra minha volta.
A Espécie Humana, romance de Jorge Teles, está sendo publicado em capítulos.
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