Ouvi hoje pela primeira vez, ainda bem rapidamente, Roberta cantando Gil e Diana cantando Neil, e me peguei fazendo duas perguntas:
– Como é possível, como é humanamente possível que um senhor de mais de 70 anos de idade resolva compor 11 novas músicas, só por que uma cantora linda, charmosa, maravilhosa, pediu para gravar um disco com canções dele – e consiga compor?
– Como é possível que só agora eu tenha ficado sabendo que Diana Krall gravou em 2014 “Heart of Gold”, a linda canção de Neil Young do álbum Harvest, de 1972? A gravação da moça é um espanto, uma coisa fora de jeito – fiquei com a sensação de que perdi cinco anos.
Ainda vou me debruçar sobre Giro, o novo disco de Roberta Sá com 11 músicas inéditas de Gilberto Gil, uma delas, “Ela diz que me ama”, em parceria com Jorge Ben, e também sobre Wallflower, o disco que a jazzística Diana Krall gravou em 2014 só com canções que não são da sua praia, pérolas do pop e do rock. Mas já fiquei zonzo só nas primeiras audições, ainda rápidas.
E aí, por causa de Roberta, Gil, Diana e Neil, me lembrei do Geraldo. Não o meu irmão, nem paraibano Vandré, nem o pernambucano Azevedo, mas o paulistaníssimo Geraldo que saiu da cabeça fervilhante de Luiz Tatit para ser cantada pelo Geraldo Leite.
O Geraldo da canção “Carnaval do Geraldo” dizia que não queria entrar na farra.
Os outros cantavam:
Gente, olha o Geraldo, está chegando,
está morrendo de vontade de
entrar no carnaval.
Diz: “carnaval não é pra homem”
Você está louco, Geraldo?
Carnaval vai todo mundo
Veja o o Paulo, veja o Pedro,
Todo mundo dando força
pra você entrar também
e você não vai.
E o Geraldo garantia:
Não vou…
O grupo cantava, o ritmo gostoso envolvendo mais e mais:
Olha o Geraldo, pessoal!
Ele já está dentro e não percebe,
olha ele sambando lá na porta,
ah… ah… ah… ah…
tangtchikatangtchikatangtchika…
E o Geraldo Leite então falava, com um vozeirão grave de quem não está cantando, de quem não é propriamente cantor profissional, mas já cantando, já entrando na dança, na festa, na farra, na ginga:
Não vou, não quero,
eu fico envergonhado
Fica todo mundo olhando
Todo mundo reparando
Todo mundo me secando.
***
Tô me sentindo feito o Geraldo. Jurei de pé junto que não ia abrir mão nunca jamais em tempo algum dos suportes físicos… E olha ele, pessoal… Ele já tá dentro da modernidade e não percebe… Tá ouvindo a Roberta Sá e a Diana Krall sem segurar a capa do disco nas mãos, sem ficar observando o encarte…
Que vergonha…
E no entanto…
Diacho, vou ouvir melhor os raios dos discos novos!
Para ouvir “Carnaval do Geraldo”.
Para ouvir “Ela diz que me ama”.
1º/5/2019