Apenas um envelope

Dois dias em São Paulo para participar de um seminário sobre propriedade intelectual. Nenhuma chuva enquanto lá estive, mas foi inevitável enfrentar o lento trânsito da cidade. Gastei quase duas horas para me encontrar com meu amigo-irmão Pelão, que me esperava com muitos chopes de vantagem.

Mas isso foi à noite, quando eu já cumprira o meu compromisso em terras da paulicéia. O tamanho da metrópole, as distâncias e o vagaroso deslocar-se por suas ruas e avenidas ainda me assustam. Gosto muito das pessoas de lá, mas aquele lugar não foi feito para eu levar o meu dia a dia. Vou e volto.

No encontro, patrocinado pelo Instituto Evaldo Lodi e pelo INPI, ouvi coisas de admirar. O extraordinário trabalho da Petrobrás, ao longo dos anos, em busca de inovações em seu campo de atuação. Gostei de perceber o que faz a criatividade dos brasileiros. Do sul, tomei conhecimento do esforço de produtores de vinho gaúchos em estabelecer uma região demarcada para que o produto da região seja mais valorizado. Sempre a busca da qualidade.

O comitê olímpico fez uma explanação sobre os desafios de se realizar um evento de tal grandeza no país. A atenção para que o compromisso assumido de não permitir que anunciantes que não são patrocinadores se aproveitem e criem brechas para expor seus produtos. Foi lembrado o exemplo do Banco do Brasil, que vestiu a torcida brasileira com sua publicidade, na China, e teve divulgação indevida em todos os cantos do mundo. Ou o fato de que o patrocinador da Copa do Mundo era uma marca de cerveja e Romário e Bebeto comemorarem os gols da Seleção mostrando o dedo indicador, o fura-bolo, símbolo de outra cervejaria.

Eu iria falar, e falei, sobre os direitos autorais no Brasil e no mundo. Uma conquista da civilização contra a barbárie, esse direito, inscrito na Declaração Universal dos Direitos Humanos e em nossa Constituição, vem sofrendo um ataque incompreensível por parte do Ministério da Cultura, que nos ameaça com intervenções inconstitucionais, enfraquecimento do que conquistamos através dos tempos. Uma agressão injustificada vinda de quem deveria cuidar da cultura e, logo, dos autores.

Eu resolvera falar um texto escrito por mim. Quando me disseram que eu teria cerca de vinte minutos para a exposição, peguei minhas anotações e me pus a ordená-las. Corta daqui, acrescenta ali, rabisca acolá, achei que estava pronto.

Mas pelo desarranjo da papelada, achei de bom tom comprar um envelope para agasalhar os meus rascunhos. Por indicação do porteiro do hotel, atravessei a rua e entrei num shopping, essa modernidade. Andei por todos os andares, acabei fazendo caminhada debaixo de ar condicionado, e não encontrei nenhuma papelaria do jeito que eu queria. Queria apenas um humilde envelope para os meus escritos. Impossível. Tive que me contentar em adquirir uma pasta de couro, muito mais cara. Shopping não substitui o velho armazém.

Esta crônica foi originalmente publicada no Estado de Minas

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