De repente, sem que tivesse planejado, acabei ouvindo, agora há pouco, várias versões de “Send in the Clowns”. A da Judy Collins, fabulosa, que ela gravou no Fifth Album, de 1965. Uma que eu jamais tinha ouvido na vida, um dueto de Judy Collins e Don McLean – nunca soube que os dois haviam gravado juntos. Pulei a da Barbra Streisand, que seguramente também é linda, e ouvi a do Frank Sinatra, que, diacho, tem a qualidade Frank Sinatra.
Mas aí botei a do Renato Russo – e, diabo, ela é a mais maravilhosa de todas.
Ahnnn…
A gente não deveria nunca jamais em tempo algum esquecer a grande lição de Geraldo Vandré, no seu discurso na final do Festival Internacional da Canção, no Maracanãzinho, no dia 29 de setembro de 1968, dois meses e meio antes da promulgação do AI-5, o golpe dentro do golpe. À imensa maior parte das milhares de pessoas que protestavam contra o fato de sua canção “Caminhando” ter ficado em segundo lugar, perdendo para “Sabiá”, de Tom Jobim e Chico Buarque, ele explicou:
– “A vida não se resume a festivais.”
Para mim, essa frase maravilhosa, definitiva, pode também ser compreendida como:
“No que se refere a obras de arte, não existe essa coisa de gradação, alguns indicados, um premiado, um primeiro lugar, um segundo lugar, um terceiro lugar; arte não tem nada a ver com campeonato, olimpíada, pódio”.
Por exemplo: como é possível dizer – como decidiu a douta Academia de Artes e Ciências Cinematográficas de Hollywood – que Anora é melhor que Conclave, que Como Era Verde o Meu Vale é melhor que Cidadão Kane, que Shakespeare Apaixonado é melhor que O Resgate do Soldado Ryan,?
Voltando às canções: como é possível dizer que “A Banda” é melhor que “Disparada”? Bem, nesse caso específico aí o júri do II Festival de Música Popular Brasileira da TV Record, de 1966, até que acertou, ao dar empate. Mas, no ano seguinte, será que “Ponteio” era mesmo melhor do que “Domingo no Parque”, que por sua vez era melhor que “Roda Viva”, que por sua vez era melhor que “Alegria, Alegria”, conforme definiu o júri?
A vida não se resume a festivais. Os livros, os filmes, as canções – eles não disputam troféus. Não existe isso de uma música ser melhor que a outra, versão de uma música ser melhor que a outra.
Existe o gosto pessoal. Ah, eu gosto mais de Anora do que de Conclave, meu – historinha de amor gostosinha, com uma atriz que também é bem gostosinha. Conclave é uma chatice atroz, uma falação danada, meu. Como falam aqueles caras lá – e só tem homem, não tem uma gatinha gostosa, só tem aquela velha lá, aquela freira, troço chato…
Gosto pessoal, opinião. Só isso.
Livros, filmes, canções não disputam troféus.
***
Então refaço minha frase anterior, com a maior alegria:
Das belas gravações de “Send in the clowns” que eu conheço, a de que eu mais gosto é a do Renato Russo.
Diabo, como canta bem o sujeito! Como canta especialmente bem naquele seu disco solo maravilhoso, The Stonewall Celebration Concert.
***
Isto aqui é um suelto, mas não custa registrar algumas informações básicas. “Send In the Clowns” é de Stephen Sondheim (1930-2021), provavelmente o último dos autores da Grande Música Americana. Ele a compôs para o musical da Broadway A Little Night Music, uma adaptação do filme Sorrisos de uma Noite de Amor, no original Sommarnattens Leende, de 1955, de um então quase jovem Ingmar Bergman, aos 37 anos de idade – o filme que, segundo os estudiosos, fez com que seu autor passasse a ser reconhecido internacionalmente.
Tá legal, tudo bem, maravilha, mas…
O que exatamente este texto quer dizer?
Ora, direis, ouvir estrelas… Isto aqui é só um suelto – e um suelto não quer dizer porra nenhuma. Ah, perdão, coisa alguma.
1º e 2/4/2025
Muito bom, Servaz delicioso de ler, com fecho bem divertido. Animou o meu pós jantar, ótima sobremesa.
Na minha lista do Spotify tenho uma pasta para “Especiais” – umas 20. ( nacionais e internacionais)
Outra para “Prediletas” – umas 100. ( nacionais e internacionais).
Não sei de qual gosto mais.