A estrepitosa, monumental, vexaminosa interferência do governo Lula na Petrobrás na questão dos dividendos extraordinários dos acionistas acabou ofuscando um outro escândalo. Mais um, entre tantos escândalos que ocorrem na maior empresa brasileira sempre que o lulopetismo está instalado no Palácio do Planalto.
O caso foi relatado por Malu Gaspar em sua coluna no Globo desta quinta-feira, e é assim:
Em dezembro do ano passado, após movimentos de gente ligada ao governo Lula 3, a Petrobrás e a Unigel, uma fabricante de fertilizantes, fecharam um acordo segundo o qual “a petroleira fornece gás à Unigel e recebe em pagamento o fertilizante para vender no mercado. Só que os preços do gás estão em alta e os do fertilizante em queda, o que fez os técnicos do Tribunal de Contas da União (TCU) calcularem que a Petrobras terá prejuízo de R$ 487 milhões”.
Meio bilhãozinho que sai do caixa da Petrobrás para ajudar a empresa tem bons amigos no governo Lula.
Não é exatamente uma boa forma de a estatal ajudar as criancinhas com fome.
É ladroagem, pura e simples. Ladroagem – isso que já é uma tradição que acontece na Petrobrás quando o PT está no governo.
Essa história de prejuízo de meio bilhão de reais precisa ser muito divulgada. Felizmente, os editores do Globo online puseram a chamada para o artigo da Malu Gaspar como manchete do portal do jornal na tarde desta quinta-feira. Quando mais os jornais cavarem, fuçarem para obter mais informações sobre esse caso, melhor para o país. (Sérgio Vaz)
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Crise da Petrobras desviou o foco de um negócio nebuloso e um prejuízo de meio bilhão
Por Malu Gaspar, O Globo, 14/3/2024
Quando se soube que o próprio presidente Lula arbitrou a disputa em torno dos dividendos extraordinários da Petrobras e mandou que seis conselheiros votassem contra o pagamento, o presidente da companhia, Jean Paul Prates, correu para negar:
— Não houve ordem do presidente Lula — afirmou ele, dizendo que as informações a respeito e o abalo na Bolsa em torno do tema eram “espuma”.
Horas depois, o próprio Lula desmentiu Prates. Numa entrevista ao SBT, admitiu que teve “uma conversa séria com a administração da Petrobras”, “porque é preciso a gente pensar no povo brasileiro”. O presidente foi direto:
— Se eu for atender apenas à choradeira do mercado, não faço nada — disse Lula. — O mercado é um rinoceronte, um dinossauro voraz, quer tudo para ele e nada para o povo. Será que o mercado não tem pena das pessoas que passam fome?
Na opinião do chefe do Executivo, a Petrobras bate recordes de produção, de exportação e de arrecadação, “e a gente não ganha nada com isso”. Seria importante que o presidente dissesse quem é “a gente”, porque 37% de tudo o que a empresa distribui vai para o caixa do Tesouro — R$ 20 bilhões só em 2023 e outros R$ 72 bilhões em 2022, que ajudaram a pagar gastos com Bolsa Família, educação e saúde.
Se há espuma nessa discussão, ela ofusca não o que aconteceu na semana passada, e sim quanto as coisas já mudaram na Petrobras neste terceiro mandato de Lula.
Quando a pendenga dos dividendos começou, as manchetes sobre a empresa estavam concentradas em outro assunto bem menos confortável de discutir diante dos microfones: um contrato em que a Petrobras se dispõe a perder meio bilhão de reais em oito meses para salvar da bancarrota a Unigel, uma fabricante de fertilizantes com bons amigos no governo.
Em 2019, ainda durante o governo Bolsonaro, a Unigel arrendou da Petrobras duas fábricas, uma na Bahia e outra em Sergipe, quando a companhia passou a se desfazer de negócios que considerava menos rentáveis. Nos primeiros anos, a guerra da Rússia contra a Ucrânia levou à escassez de matéria-prima e à alta no preço do fertilizante, e a Unigel teve lucro. Mas, em 2023, o quadro mudou, a empresa passou a ter prejuízo e parou as fábricas.
Entraram em campo, então, os contatos no governo Lula 3.0, e em 29 de dezembro de 2023 as duas empresas fecharam um acordo sui generis. Por ele, a petroleira fornece gás à Unigel e recebe em pagamento o fertilizante para vender no mercado. Só que os preços do gás estão em alta e os do fertilizante em queda, o que fez os técnicos do Tribunal de Contas da União (TCU) calcularem que a Petrobras terá prejuízo de R$ 487 milhões se levar o negócio adiante.
A diretoria justificou o contrato afirmando que o prejuízo em financiar a Unigel é menor que o de fechar definitivamente as unidades. A diferença, que seria de R$ 100 milhões, corresponde ao custo que a Petrobras teria caso seus funcionários fizessem uma greve em protesto contra a demissão dos funcionários da Unigel. O ministro do TCU Benjamin Zymler, relator do caso, está até agora sem entender como o fechamento de uma empresa privada com 255 funcionários poderia fazer parar toda a Petrobras — algo que não ocorreu nem quando a própria petroleira parou essas mesmas fábricas.
Depois que o TCU divulgou seu relatório, chegaram ao canal de denúncias da Petrobras alertas relatando pressões sobre técnicos para validar o contrato. Um deles dizia que funcionários do setor de recursos humanos tinham sido levados a endossar o cálculo do risco de greve para justificar o acordo. Iniciou-se, então, uma auditoria interna que coletou e-mails, apreendeu celulares e interrogou vários executivos. Ouvidos oficialmente, os empregados em questão negaram ter sido coagidos, e a auditoria concluiu que nada demais tinha ocorrido.
Mas a briga entre os conselheiros que são contra o negócio e a diretoria da Petrobras continua, e até agora não se sabe que fim levará o tal contrato, pendente de aprovação.
Perto dos R$ 43,9 bilhões de dividendos extras ou dos R$ 500 bilhões em investimentos previstos pela Petrobras para os próximos cinco anos, o dinheiro da Unigel é troco.
A questão é que, da mesma forma que a queda na Bolsa não foi provocada apenas pela retenção do dividendo extra, e sim pelo temor de uma volta ao intervencionismo do passado, o caso da Unigel também não preocupa apenas por causa do valor, e sim pelo que traz de volta. Diz a sabedoria popular que nenhum incêndio começa grande. E, para quem já foi todo chamuscado, qualquer faísca já provoca calafrios.
14/3/2024