O que não estava contabilizado era o estrago que seria feito nas planícies arborizadas do estado para abrir as plantações e criar o gado. A região da Serra estava razoavelmente segura da destruição, mas o pampa não. E a destruição foi total. Cortaram tudo que viam no horizonte, inclusive as beiras dos rios.
A produção, de fato, cresceu em níveis espantosos. Nos pampas, o estado agropastoril prosperou. Na Serra, sem muitas áreas para cultivo e criação em larga escala, a indústria floresceu a partir de pequenas fábricas de italianos e alemães, pequenas oficinas mecânicas para consertar caminhões que subiam e desciam a Serra.
No pé da Serra, São Leopoldo e Novo Hamburgo cresciam fortes e saudáveis, fabricando máquinas e sapatos. No alto, às uvas, vinhos, têxteis e confecções logo se juntaram indústrias de carrocerias para ônibus e caminhões e de utensílios domésticos em grande escala.
Tudo parecia bem até que os campos começaram a se exaurir. O celeiro do Brasil não produzia mais como antes e a população foi procurar em outros estados terras mais férteis e melhores oportunidades.
O êxodo dos gaúchos foi tal que vastas regiões do interior de Santa Catarina, Paraná, Mato Grosso e depois Goiás e Rondônia mudaram o sotaque.
O desmatamento era incentivado pelos governos militares que assumiram o poder no golpe de estado de 1964. E promoveram no Brasil a devastação ambiental que fazendeiros e pecuaristas já tinham executado no Rio Grande do Sul.
A natureza não aguenta desaforo. Hoje cobra seu preço, acrescido dos efeitos do aquecimento global negado pelos que mandam e aceito passivamente pelos que obedecem.
O enfrentamento dessas duas correntes definirá nosso futuro como estado, como país e como planeta. Passou da hora de resolver esse falso dilema entre a preservação da natureza e o enriquecimento que nunca é de todos, mas de poucos cada vez mais ricos às custas da vida dos outros e dos bens naturais.
A devastação no Rio Grande do Sul não é obra do acaso nem da natureza. É obra da atividade humana descontrolada, negacionista e fanática pela destruição a qualquer preço.
Nelson Merlin é jornalista aposentado e pensativo.
6/5/2024.
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