Voto útil ou voto no melhor? (1)

O grande problema de milhões de brasileiros bem intencionados, que querem o bem do país e não são bolsonaristas nem lulistas, é ver que a boca do jacaré está se fechando. A distância nas pesquisas entre os dois candidatos que estão à frente vai se encurtando a cada nova rodada – e, a apenas três semanas do dia 2 de outubro, dá para perceber com clareza que nenhum dos demais candidatos tem condições de chegar ao segundo turno.

E aí? Fazer o quê?

Muito provavelmente essa pergunta está sendo feita por milhões de pessoas que até agora estavam decididas a votar em Ciro Gomes (PDT), Simone Tebet (MDB e PSDB-Cidadania), Soraya Thronicke (União Brasil), Felipe d’Avila (NOVO): Pablo Marçal (PROS), Vera (PSTU), Sofia Manzano (PCB)…

E aí? Diante desse quadro, fazer o quê?

Como certamente muita, muita gente, eu venho me fazendo essa pergunta.

Algumas semanas atrás eu não tinha a mais leve sombra de dúvida: iria votar em Simone Tebet. Com absoluta certeza.

Diante da boca do jacaré se fechando, com o monstro, o adorador da morte, da ditadura e da tortura subindo nas pesquisas – ainda que pouco a pouco –, já não tenho mais tanta certeza assim.

Fazer o quê? Continuar fiel ao princípio básico, fundamental, de que primeiro turno é para a gente votar no melhor, no preferido, e, no segundo turno, se não houver outro jeito, votar no menos pior?

E com isso ajudar a levar a decisão para o segundo turno? Com todos os riscos que representa dar mais tempo para que a boca do jacaré continue se fechando?

Mas, por outro lado – há sempre dois lados em cada história, como diz a bela canção country –, ajudar a eleger Lula em primeiro turno, e com isso dar ao PT um cheque em branco que ele não teve em nenhuma das quatro eleições presidenciais que venceu? Um cheque em branco ao partido de várias alas que flertam abertamente com os regimes ditatoriais ditos de esquerda?

Diacho! Fazer o quê?

Neste domingo, 11/9, Merval Pereira dedicou seu artigo no Globo exatamente a esta questão, a boca do jacaré.

Transcrevo abaixo o artigo dele. E pretendo colocar aqui, nos 21 dias que faltam para o primeiro turno, artigos, editoriais, reportagens que falem sobre esse problema.

Argumentos pró e contra o voto útil para barrar o mal maior.

“Não é possível convencer um fanático de coisa alguma, pois suas crenças não se baseiam em evidências, baseiam-se numa profunda necessidade de acreditar.”

Essa bela verdade expressa pelo astrônomo Carl Sagan vem sendo reproduzida nas redes. Tem tudo a ver com o momento atual: são os não fanáticos que vão decidir no dia 2 de outubro se o Brasil vai se livrar do monstro golpísta, machista, misógino, indecente e  corrupto de uma vez – ou se vai dar a ele a chance de continuar sua luta contra a democracia nas três semanas entre os dois turnos das eleições.

Esses textos, com os argumentos pró e contra, vão me ajudar a decidir. Quem sabe possam ajudar também a alguns eventuais leitores deste site.

***

A boca do jacaré

Por Merval Pereira, O Globo, 11/9/2022

Do jeito que as coisas vão, tudo indica que o eleitor que não é fanático por Lula nem Bolsonaro terá que enfrentar dilemas éticos e políticos na escolha de seu voto, até mesmo na decisão de anular ou votar em branco. Como o que conta para definir a vitória é ter 50% mais um dos votos válidos, o eleitor que invalidar seu voto estará permitindo que o vencedor precise de menos votos para se eleger.

Como diz o jargão das pesquisas eleitorais, a “boca do jacaré está fechando”, isto é, a diferença entre Lula e Bolsonaro está diminuindo desde o início da campanha, é possível que a reta final desencadeie nos eleitores um dilema que será explorado pelos candidatos. Dar uma vitória ao ex-presidente no primeiro turno seria uma resposta contundente contra Bolsonaro, mas também dar um cheque em branco a Lula.

Se ele hoje se proclama inocentado pela Justiça sem que isso tenha acontecido, o que não poderá dizer depois de eleito num primeiro turno, o que nunca aconteceu desde que disputa eleições para presidente em 1989? Essa concessão popular poderá desencadear uma sensação de invencibilidade que leve a que um terceiro governo Lula possa ser mais marcado pelo autoritarismo de quem se verá como o salvador da pátria que volta nos braços do povo.

Diz-se que Lula é maior do que o PT, o que é verdade, mas só quando quer. A máquina petista é azeitada para boicotar os intrusos que entram em seus domínios, como aconteceu com Henrique Meirelles no Banco Central e diversos economistas ligados aos tucanos que Antonio Palocci foi buscar para dar consistência à política econômica do primeiro governo Lula. Levar a eleição para o segundo turno pode obrigar o PT a aceitar um acordo mais amplo. Um “estrangeiro” como Geraldo Alckmin não conseguiria fazer um movimento para o centro tão forte, e dificilmente terá uma função importante num eventual ministério.

Além do mais, Alckmin está exagerando tanto na sua conversão que, após ouvir a Internacional Socialista sem corar, foi para a televisão dizer que quando se referem às suas críticas anteriores à corrupção do governo petista, querem confundir o eleitorado. Ele hoje diz que foi enganado pela Lava Jato, e que ficou provado que Lula não tinha culpa de nada.

Não é verdade, os eventuais erros da Operação Lava Jato não invalidaram as acusações de corrupção no governo petista, como aliás Lula já admitiu, e também não inocentaram o ex-presidente de nada. Considerar o ex-juiz Moro parcial, e mudar o local do julgamento fez apenas com que os processos recomeçassem do zero, sem tratar do mérito. Muitos foram arquivados, por decurso de prazo, com base na decisão do STF, poucos por falta de provas.

A outra razão para votar em Lula logo no primeiro turno seria impedir que, indo para o segundo turno, Bolsonaro explicite uma realidade que as pesquisas estão mostrando: a extrema-direita brasileira pode chegar aos 40% dos votos, com a ajuda do centro, o que é muito. O PSDB passou anos, até 2014, representando esses 40% do eleitorado, e quase ganhou com Aécio Neves. Só não persistiu como uma segundo força política no país porque não tinha um grande líder para guiar o partido, como Lula faz com o PT e Brizola fazia com o PDT.

Fernando Henrique Cardoso, eleito duas vezes no primeiro turno derrotando Lula, não tinha esse talento, nem queria ter. Se políticos como Sérgio Motta ou Luiz Eduardo Magalhães não tivessem morrido, esse legado tucano poderia estar vivo até hoje. Um partido de muitos caciques acabou se desvirtuando e perdendo a força. Bolsonaro, apesar de inexplicavelmente não ter conseguido formar seu próprio partido – talvez porque não acredite em partidos, como bem lembrou o Demétrio Magnoli – continuará dominando esse eleitorado de centro-direita que se posiciona contra o petismo.

O Elio Gaspari já relembrou outro dia o sarcasmo de Marco Maciel ao receber a informação de seu marqueteiro de que a distância entre o seu candidato e o adversário estava se estreitando, e as linhas se cruzariam em algum ponto: “Antes ou depois da eleição?”. Bolsonaro está na mesma situação, e levar para o segundo turno é sua última chance de tentar uma reversão que a história mostra ser improvável. Fernando Henrique em 1998 dormiu na noite da reeleição preocupado com o crescimento de Lula, temia que um segundo turno pudesse mudar o quadro. Ganhou com 53% dos votos.

Nunca quem venceu o primeiro turno presidencial perdeu, garantem os pesquisadores. Mas há exemplos regionais, como a formidável reviravolta na campanha de 1995. O candidato Hélio Costa venceu o primeiro turno com 48,8% dos votos, e Eduardo Azeredo reverteu o resultado no segundo turno, tornando-se governador mineiro. Os eleitores decidirão.

11/9/2022

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