Cerca de 70 milhões de brasileiros serão lesados caso Jair Bolsonaro seja reeleito e se implantr o plano do ministro Paulo Guedes de parar de corrigir o salário mínimo pela inflação registrada no ano anterior. A revelação de que há esse estudo foi feita na quarta-feira, 19/10, em reportagem da Folha de S. Paulo assinada por Idiana Tomazelli e Julianna Sofia.
Nesta terça-feira, 25/10, reportagem de Adriana Fernandes no Estado de S. Paulo mostrou que a equipe econômica do atual desgoverno estuda acabar com a dedução dos gastos com saúde e educação
Nos dias entre a divulgação do plano de tirar dinheiro de 70 milhões de brasileiros que vivem do salário-mínimo e a do plano de tirar ainda mais dinheiro da classe média, houve os episódios Roberto Jefferson: primeiro, os insultos absurdos proferidos contra a ministra Carmen Lúcia – algo tipo “vamos lá, mandem me prender” –, e em seguida os tiros e as granadas contra os policiais federais que foram à sua casa levá-lo preso.
“O ex-deputado Roberto Jefferson mostrou do que o bolsonarismo é capaz”, disse o Estadão, em editorial, na terça-feira, 25/10. “Seu ataque a policiais federais que foram a sua casa para prendê-lo, anteontem, não foi um ato isolado nem fruto de loucura: foi a consequência natural da escalada retórica violenta e golpista do presidente Jair Bolsonaro contra as instituições democráticas.”
E mais adiante o jornal cravou: “Não há como ignorar. Na Presidência da República, Jair Bolsonaro é um altíssimo risco para o respeito à lei, para a integridade das instituições, para a liberdade política e para a paz social. Se alguém ainda tinha dúvidas, Roberto Jefferson desenhou para o País.”
Na mesma terça-feira dessa maravilha de editorial, a apresentadora Xuxa Meneghel publicou na Folha de S. Paulo, juntamente com o empresário João Paulo Pacífico, um artigo que dá a palavra final sobre outro episódio tão recente quanto grotesco do bolsonarismo, o do “pintou um clima” com as refugiadas venezuelanas de 14, 15 anos:
“Sou filha, sou mãe e fui abusada por velhos babões que se sentem machos quando chegam perto de uma menina ou menino “bonitinho” e se acham no direito de ‘pintar um clima’. (…)
Você, homem, qual a sua posição? Você se enxerga nesse comportamento de Bolsonaro? Você, mulher, vai compactuar com isso? Com que cara vai olhar para as suas filhas e filhos quando crescerem e descobrirem que votou em alguém com tal conduta? Por que deixará o país nas mãos de alguém com quem você jamais deixaria a sua filha? Nossa sociedade está doente. Precisamos curá-la.
“Se você se calar, o crime vai se banalizar. Até quando deixaremos nossas crianças na mão desses monstros? Nem nosso país nem nossas crianças merecem o seu silêncio e seu voto a favor dele. Tire sua imunidade: vote contra ele.” (A íntegra do artigo está aqui.)
Ainda nesta terça-feira, a Nature, uma das revistas científicas mais respeitadas do mundo, publicou um editorial sobre as eleições presidenciais do país em que afirmou que Jair Bolsonaro é uma ameaça à ciência, à democracia e ao meio-ambiente. E, portanto, só há uma opção nas eleições brasileiras – para o país e para o mundo: tirar Bolsonaro do governo.
“Populista e ex-capitão do Exército, Bolsonaro assumiu o cargo negando a ciência, ameaçando os direitos dos povos indígenas, promovendo armas como solução para problemas de segurança e promovendo uma abordagem de desenvolvimento a todo custo para a economia. Bolsonaro foi fiel à sua palavra. Seu mandato foi desastroso para a ciência, o meio ambiente, o povo do Brasil – e do mundo”, disse a Nature.
A revista comparou Bolsonaro ao ex-presidente americano Donald Trump por sua atuação na pandemia: “Assim como seu ex-colega populista dos EUA, Donald Trump, Bolsonaro ignorou os alertas dos cientistas sobre a Covid-19 e negou os perigos da doença”.
A revista citou os cortes nos investimentos na educação e na ciência, que têm trazido dificuldades para as universidades públicas brasileiras. “Por um tempo, o Brasil quebrou o vínculo entre o desmatamento e a produção de commodities como carne bovina e soja. Parecia que o país poderia ser pioneiro em sua própria marca de desenvolvimento sustentável. Muito desse progresso já foi desfeito.”
A Nature chamou atenção para as promessas do petista Luiz Inácio Lula da Silva de redução do desmatamento e proteção das terras indígenas. E afirmou que os anos do PT no poder foram caracterizados por investimentos em ciência, meio ambiente e educação.
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Um dia depois dos tiros de Roberto Jefferson e na véspera do editoriais do Estado e da Nature e do artigo de Xuxa e João Paulo Pacífico na Folha, Lula afirmou, em evento na PUC de São Paulo, que, se eleito, sua gestão não será “um governo do PT, será um governo do povo brasileiro”.
“Nosso governo não será um governo do PT. É importante, Gleisi [Hoffmann], você que é presidente, saiba: nós precisamos fazer um governo além do PT”, disse Lula.
O candidato que pode poupar o Brasil e o mundo de mais quatro anos de desgoverno de Bolsonaro estava acompanhado, no evento no Tuca, pelo economista Persio Arida, um dos pais do Plano Real, o ex-ministro da Fazenda e ex-presidente do Banco Central Henrique Meirelles, José Gregoria, ex-ministro da Justiça do governo Fernando Henrique Cardoso, a ex-senadora Marta Suplicy e a socióloga Neca Setúbal, herdeira do Banco Itaú, entre outras personalidades.
Uma multidão lotou a Rua Monte Alegre diante do teatro em que se realizou o ato, e assistiu aos discursos pelo telão. A foto é de Ricardo Stuckert.
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Diante das duas opções que temos diante de nós, é possível que algum brasileiro do bem tenha alguma dúvida?
Como escreveu Eliane Cantanhêde no Estadão de domingo, 23/10: “Não se trata só de eleger o futuro presidente, o PT ou o PL, mas de definir o destino do País pelas próximas décadas, num mundo açoitado por ventos, chuvas e trovoadas.”
Como tem sido repetido aqui: é entre a civilização e barbárie.
Seguem abaixo a íntegra do editorial do Estadão desta terça-feira e o do artigo de Eliane Cantanhêde.
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Do que o bolsonarismo é capaz
Editorial, O Estado de S.Paulo, 25/10/ 2022
O ex-deputado Roberto Jefferson mostrou do que o bolsonarismo é capaz. Seu ataque a policiais federais que foram a sua casa para prendê-lo, anteontem, não foi um ato isolado nem fruto de loucura: foi a consequência natural da escalada retórica violenta e golpista do presidente Jair Bolsonaro contra as instituições democráticas.
No 7 de Setembro do ano passado, convém recordar, Bolsonaro declarou que, “qualquer decisão do Alexandre de Moraes, este presidente não mais cumprirá”, referindo-se ao ministro do Supremo Tribunal Federal responsável pelo inquérito que apura o financiamento e a organização de atos bolsonaristas contra a democracia. E acrescentou, em seu dialeto bronco: “Dizer aos canalhas que eu nunca serei preso”, sugerindo que resistiria a uma eventual ordem de prisão.
Pois bem: em perfeita sintonia com seu líder, Roberto Jefferson, que estava em prisão domiciliar no âmbito da ação penal conduzida por Moraes, decidiu resistir a uma ordem de prisão emitida pelo ministro – e ainda avisou que o faria em vídeos que postou em redes sociais no momento em que a ordem estava para ser cumprida. “Eu não vou me entregar. Eu não vou me entregar porque acho um absurdo. Chega, me cansei de ser vítima de arbítrio, de abuso. Infelizmente, eu vou enfrentá-los”, declarou Jefferson enquanto se preparava para atacar os policiais. Ato contínuo, deu mais de 20 tiros nos policiais, ferindo dois deles, e ainda atirou granadas.
É improvável que isso tenha acontecido por acaso. Ao contrário: Jefferson, como bolsonarista exemplar, parecia ter um plano meticuloso. Primeiro, usou as redes sociais para violar, de modo deliberado, os termos de sua prisão domiciliar. Na ocasião, ofendeu a ministra Cármen Lúcia, do Supremo, porque ela votou no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) a favor de decisões que, no entendimento de bolsonaristas, configuram censura. A estratégia é óbvia: sabendo que a violação de sua prisão domiciliar, de forma reiterada e insolente, teria resposta da Justiça, Jefferson provavelmente pretendia caracterizar essa reação como perseguição política e cerceamento da liberdade de expressão. É o estado da arte do bolsonarismo.
Os acontecimentos de domingo são gravíssimos em si mesmos, e Jefferson deve ser punido com todo o rigor da lei, sem qualquer hesitação. Mas o caso não se encerra com o encaminhamento do sr. Jefferson para a cadeia. Se o aspecto jurídico se limita à punição do ex-parlamentar, o escândalo político vai muito além.
Bolsonaro, depois de alguma vacilação, tratou de tentar se desvincular de Jefferson, ciente dos estragos potenciais em sua campanha, mas sua proximidade com o ex-deputado vai muito além de algumas fotos dos dois juntos, que o presidente jurava não existirem. Essa proximidade é a única explicação possível para o fato inaceitável de que Jefferson teve tratamento privilegiado da Polícia Federal mesmo depois do ataque a tiros e granadas do ex-deputado contra policiais. Está documentada, em vídeos e testemunhos, a cordialidade com que Jefferson foi tratado – nem algemas lhe puseram. Para culminar, a negociação para a rendição de Jefferson contou com a presença do ministro da Justiça em pessoa, despachado pelo presidente Bolsonaro para cuidar do caso, como se se tratasse de um preso especialíssimo – e não de um criminoso comum.
Seja como for, a tentativa de Bolsonaro de se afastar do caso é inútil. O episódio todo está prenhe de bolsonarismo, em suas múltiplas dimensões – das quais o uso de armamentos contra agentes da lei é apenas o mais vistoso. Enquanto o presidente da República, por mero cálculo político, aparentava abandonar seu aliado fiel, os fanáticos camisas pardas bolsonaristas nas redes sociais procuravam maneiras de justificar a barbárie, sempre em nome da defesa da “liberdade” e contra o que o próprio presidente chamou de “estado ditatorial” promovido pelo Supremo e pelo TSE.
Não há como ignorar. Na Presidência da República, Jair Bolsonaro é um altíssimo risco para o respeito à lei, para a integridade das instituições, para a liberdade política e para a paz social. Se alguém ainda tinha dúvidas, Roberto Jefferson desenhou para o País.
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Divisor de águas
Por Eliane Cantanhêde, O Estado de S. Paulo, 23/10/2022
É tenso, cansativo, às vezes irritante e até aterrorizante, mas é também um desafio fascinante acompanhar de perto as eleições de 2022, num grande momento histórico, um verdadeiro divisor de águas. Não se trata só de eleger o futuro presidente, o PT ou o PL, mas de definir o destino do País pelas próximas décadas, num mundo açoitado por ventos, chuvas e trovoadas.
Vivemos ditadura, Diretas Já, morte de Tancredo, Constituinte, ascensão, queda e retorno de Collor, transição segura de Itamar, estabilidade estruturante de Fernando Henrique, inclusão social e petrolão de Lula, desgoverno Dilma, instabilidade com Temer e concentração de poder e de absurdos de Bolsonaro. Em 2022, é diferente: um confronto de visões de mundo, de civilização.
Jair Bolsonaro, que descarta índios e divide o País entre pobres e ricos, brancos e pretos, Nordeste e Sul, urbanos e rurais, homens e mulheres, evangélicos e católicos, tem as corporações. Há, sim, corajosas dissidências, mas ele uniu as Forças Armadas, polícias, agronegócio e setor financeiro, além dos evangélicos.
É com essa base social, o uso escancarado do Estado e dos recursos públicos e uma sólida maioria bolsonarista na Câmara e, agora, também no Senado, que ele quer impor ao País e às novas gerações uma mistura de sua própria visão atabalhoada de mundo e a cartilha da extrema direita internacional.
Lula acertou muito, errou muito e criou o “nós contra eles” – os “cumpanheiros” contra todo o resto. Mas quem definiu bem a era Bolsonaro foram estudantes de medicina (de medicina?!), ao gritar: “Sou playboy, não tenho culpa se seu pai é motoboy”. Poderia ser “nós somos brancos, vocês são pretos”, ou “nós temos mansões, vocês vão parar na cadeia”. Fim da farra da empregada indo à Disney, do filho de porteiro na universidade, reajuste de salário mínimo e aposentadoria pela inflação…
Há uma licença para o mal. Roberto Jefferson ataca Carmen Lúcia de forma abjeta, empresários humilham Seu Jorge, um candidato a governador fala em “primeira dama de verdade” contra seu adversário gay, brasileiros comemoram chacinas em comunidades, um sujeito mata o aniversariante numa festa por política, um deputado defende que estudantes sejam queimados na cidade da Boate Kiss.
Os melhores economistas, ex-presidentes do STF, artistas, jogadores, intelectuais e tantos outros que eram “eles” nos governos do PT podem não ter voto, mas têm um alerta: que país, que futuro e que mundo queremos? Um mundo do “pintou um clima” com meninas de 14 anos?
25/10/2022
Este post pertence à série de textos e compilações “Ou Lula ou o horror”.
A série não tem periodicidade fixa.
Dezenas de especialistas no combate à corrupção anunciam o apoio a Lula no segundo turno. (6)
Para não trair os princípios democráticos, o fundador do Partido Novo votará em Lula. (5)
2 Comentários para “Ou Lula ou o horror (7)”