Ou Lula ou o horror (1)

Personalidades importantes, respeitáveis, admiráveis têm vindo a público nos últimos dias declarar seu apoio a Luiz Inácio Lula da Silva no segundo turno das eleições presidenciais. Tão importantes quanto elas têm sido as argumentações que essas personalidades apresentam.

Vou registrar várias aqui, juntamente com trechos de análises de articulistas, políticos e cientistas sociais sobre o momento que o Brasil está vivendo. Mais uma das tantas séries de compilações que faço, minha humildérrima ferramenta para defender o que acho certo, para tentar atender a essa necessidade tão premente quanto maluca de “fazer alguma coisa”.

Começo com Fernando Henrique Cardoso.

Com a elegância de sempre, o ex-presidente da República publicou uma declaração no Twitter embaixo das duas fotos que ilustram esta anotação:

“Neste segundo turno voto por uma história de luta pela democracia e inclusão social. Voto em Luiz Inácio Lula da Silva.”

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No mesmo dia da declaração de FHC, a quarta-feira, 5/10, a senadora Simone Tebet (MDB, com PSDB-Cidadania), com a responsabilidade dos 4.915.423 votos recebidos no domingo passado, afirmou, em gravação divulgada nas redes sociais, que não anulará seu voto nem votará em branco. “Não cabe a omissão da neutralidade”, lembrou.

“Ainda que mantenha as críticas que fiz ao candidato Luiz Inácio Lula da Silva, em especial nos últimos dias de campanha, quando cometeu o erro de chamar para si o voto útil, o que é legítimo, mas sem apresentar suas propostas para os reais problemas do Brasil, depositarei nele o meu voto porque reconheço seu compromisso com a democracia e a constituição, o que desconheço no atual presidente.”

Pela importância do apoio da terceira colocada na votação do primeiro turno, pela bela campanha da senadora Simone Tebet, faço questão de registrar a íntegra da declaração mais adiante.

Grande Simone Tebet!

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Na manhã desta quinta-feira, 6/10, quatro dos mais importantes e reconhecidos economistas brasileiros, que participaram da elaboração do Plano Real e do governo Fernando Henrique Cardoso, divulgaram uma nota em apoio a Lula que é tão curta, sucinta, breve, quanto valiosa:

“Votaremos em Lula no 2º turno; nossa expectativa é de condução responsável da economia”, afirmaram, em conjunto, o ex-ministro da Fazenda Pedro Malan, o economista Edmar Bacha, ex-presidente do BNDES, e os ex-presidentes do Banco Central Arminio Fraga e Persio Arida.

A declaração de apoio dos quatro respeitados economistas tem imenso significado, já que é uma forte sinalização para o mercado, para os empresários, para o capital. E é preciso lembrar que Lula e o lulo-petismo sempre criticaram duramente os governos de Fernando Henrique Cardoso, para o qual todos eles – Malan, Bacha, Fraga e Arida – trabalharam. O PT foi crítico virulento do Plano Real, e, ao final do segundo governo do PSDB, queixou-se, em trocentas ocasiões, de ter recebido uma “herança maldita” – embora, na prática, o ministro da Fazenda de Lula, Antonio Palocci, tivesse mantido durante o primeiro governo Lula as diretrizes da política daqueles economistas.

A nota conjunta divulgada nesta quinta-feira foi a primeira manifestação pública de apoio a Lula feita por Malan e Bacha. Armínio Fraga já havia dito, em entrevista esta semana ao jornal Valor, que está preocupado com “a qualidade da democracia” num eventual novo mandato do presidente Bolsonaro.

E Persio Arida já havia dito que sua preocupação com a democracia vem em primeiro lugar. “Eu não quero que a nossa democracia morra.” Ele também citou, como motivo para votar em Lula, o fracasso da política econômica do governo Bolsonaro e a preocupação com “destruição” do meio ambiente no atual governo.

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A tradicionalíssima revista britânica The Economist, essa espécie de Bíblia do capitalismo das nações mais ricas do mundo, afirmou na terça-feira, 4/10, em sua seção de opinião, que “mais um mandato para o populista Jair Bolsonaro seria ruim para o Brasil e o mundo”.

O artigo – com o título de “Para ganhar a presidência do Brasil, Lula deve passar para o centro” – lembra que o candidato à reeleição Bolsonaro não “fez esforços para parar a destruição da Amazônia”, teve uma atuação “desastrosa” na pandemia de covid-19, tem um “círculo que se sobrepõe ao crime organizado”, enquanto mina “as instituições, da Suprema Corte à própria democracia”.

Bolsonaro, diz a revista, é um “ populista trumpiano, que mente tão facilmente quanto respira e imagina conspirações em todos os lugares”, que “incita abertamente a violência”.

Para a revista, Lula deve “nomear publicamente um economista moderado como sua escolha para ministro das Finanças”. O petista também deve garantir aos agricultores que não tolerará invasões de terras organizadas por movimentos sociais próximos ao seu partido. “Ele (Lula) deveria prometer não nacionalizar nenhuma indústria. Ele deveria parar de brincar com a ideia perigosa de interferir na liberdade de imprensa do Brasil”.

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Livrar-se de Jair Bolsonmaro serviria para o Brasil “economizar tempo, recursos e energia”, escreveu no Globo na segunda-feira, 3/10, o cientista político Alberto Carlos Almeida.

Eis um trecho do artigo:

“Independentemente das posições de cada um (dos dois candidatos que passaram para o segundo turno) sobre políticas públicas, entre as quais se destaca a divergência econômica entre esquerda intervencionista e direita liberal, livrar-se dele (Bolsonaro) significará economizar tempo, recursos e energia lutando contra quem ameaça continuamente a democracia. Todos os esforços para deter a sanha autoritária de Bolsonaro deixarão de existir e poderão ser dirigidos a uma agenda positiva, cujo principal objetivo será retomar o caminho do desenvolvimento. O Brasil precisa de paz e hoje, pelo visto, vê-la no horizonte é algo incomum e extraordinário.”

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A ótima newsletter Meio não esperou sequer um dia para tomar partido. Na manhãzinha da segunda-feira, 3/10, ela publicava em editorial:

“Prezadas leitoras, caros leitores, é fundamental que, no próximo dia 30 de outubro, o Brasil vá às urnas e eleja o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva para um terceiro mandato no Planalto.

O Brasil que foi às urnas ontem elegeu um Congresso mais bolsonarista do que o de 2018. Mais puro-sangue. Se eleito, Jair Bolsonaro terá nas mãos o poder de mexer com facilidade na Constituição. Alterar a estrutura do Supremo, aprovar o impeachment de ministros no Senado — o caminho para um regime autoritário estará aberto.

“O bolsonarismo se implantou no Brasil e tem uma força maior do que nossas ferramentas nos permitiam ver. Ele só tem como mostrar seus dentes, porém, se tiver também a presidência. Lula é o favorito. Com menos de três pontos percentuais a mais, se elege. O caminho para Bolsonaro é mais árduo — o presidente precisaria, inclusive, tirar votos que Lula teve no primeiro turno. E nunca, desde que foi implantada a reeleição, o candidato que chegou em segundo virou o jogo na disputa pelo Planalto.

Mas nunca, tampouco, o jogo foi tão apertado.

Não devemos achar que está ganho. Este mês de outubro será tenso, difícil, duro e sem quaisquer distrações. Todo o eleitor preocupado com a democracia deve ter um único objetivo.

Eleger o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva para um terceiro mandato no Planalto.”

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O tema do artigo de Miriam Leitão no Globo da mesma segunda, 3/10, foi bem parecido com o do editorial do Meio. Ela escreveu:

“O cenário de Jair Bolsonaro reeleito é o de um governo que terá mais força no Congresso para dobrar a aposta autoritária. Todos os autocratas esperaram o segundo mandato para realizar o seu verdadeiro projeto de solapar as bases da democracia e instalar o continuísmo com alguns dos ritos de um regime constitucional.”

E finalizou assim o artigo intitulado “O que está em jogo no segundo turno”:

“Não é apenas uma luta entre dois grupos políticos, um mais à esquerda, um mais à direita. Desta vez a clivagem é mais grave. Bolsonaro, fortalecido, com o mandato renovado e com um Congresso mais conservador, ficará livre para realizar seu projeto autoritário. A questão mais do que nunca é a democracia.”

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Sim, a questão é a democracia.

Mas eu diria que é ainda mais grave que a democracia, esse bem que só não é maior que a própria vida.

Tem a ver exatamente com a vida, com a sobrevivência do planeta, e portanto da humanidade.

Mais quatro de Bolsonaro poderão significar tamanho dano à Floresta Amazônica que a própria natureza não terá mais condições de se recuperar.

Gostaria de escrever sobre isso, num dos próximos textos desta série que está começando aqui.

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Eis a íntegra da declaração da candidata Simone Tebet:

“Apresentei minha candidatura à Presidência da República diante de um país dividido pelo discurso do ódio, da polarização ideológica e de uma disputa pelo poder que não apresentava soluções concretas para os problemas reais do povo brasileiro. Minha intenção foi construir uma alternativa a essa situação de confronto, que não reflete a alma e o caráter da nossa gente.

As urnas falaram. O povo brasileiro fez sua voz ser ouvida. Cumpriu-se o rito da Constituição, que hoje completa 34 anos. Venceu a democracia. Tive 4.915.423 votos, pelo que agradeço, do mais fundo do coração, por cada um deles.

Aprendi, ao longo de minha vida política, que não se luta apenas para vencer, mas para defender projetos, disseminar ideias, iluminar caminhos, plantar boas sementes para uma colheita coletiva.

O eleitor optou por dois turnos.

Em face de tudo o que testemunhamos no Brasil dos últimos tempos e do clima de polarização e de conflito que marcou o primeiro turno, não estou autorizada a abandonar as ruas e praças, enquanto a decisão soberana do eleitor não se concretizar.

A verdade sempre me foi companheira, não será agora que irei abandoná-la. Critiquei os dois candidatos que disputarão o segundo turno e continuo a reiterar as minhas críticas. Mas, pelo meu amor ao Brasil, à democracia e à Constituição, pela coragem que nunca me abandonou, peço desculpas aos amigos e companheiros que imploraram pela neutralidade neste segundo turno, preocupados que estão com a eventual perda de algum capital político, para dizer que o que está em jogo é muito maior que cada um de nós.

Votarei com minha razão de democrata e com minha consciência de brasileira. E a minha consciência me diz que, neste momento tão grave da nossa história, omitir-me seria trair minha trajetória de vida pública, desde quando, aos 14 anos, pedi autorização à minha mãe para ir às ruas lutar pelas Diretas Já. Seria desonrar a história de vida pública de meu pai e de homens históricos do meu partido e da minha coligação. Não anularei meu voto, não votarei em branco. Não cabe a omissão da neutralidade.

Há um Brasil a ser, imediatamente, reconstruído. Há um povo a ser, novamente, reunido. Reunido na diversidade, antes (e sempre) a nossa maior riqueza, agora esmigalhada por todos os tipos de discriminação.

Neste ponto, um desabafo: de que vale irmos às nossas igrejas, proclamar a nossa fé, se não somos capazes de pregar o evangelho e respeitar o nosso próximo nos nossos lares, no nosso trabalho, nas ruas de nossa pátria?

Nos últimos quatro anos, o Brasil foi abandonado na fogueira do ódio e das desavenças. A negação atrasou a vacina. A arma ocupou o lugar do livro. A iniquidade fez curvar a esperança. A mentira feriu a verdade. O ouvido conciliador deu lugar à voz esbravejada. O conceito de humanidade foi substituído pelo de desamor. O Brasil voltou ao mapa da fome. O orçamento, antes público, necessário para servir ao povo, tornou-se secreto e privado.

Por tudo isso, ainda que mantenha as críticas que fiz ao candidato Luiz Inácio Lula da Silva, em especial nos últimos dias de campanha, quando cometeu o erro de chamar para si o voto útil, o que é legítimo, mas sem apresentar suas propostas para os reais problemas do Brasil, depositarei nele o meu voto, porque reconheço seu compromisso com a Democracia e a Constituição, o que desconheço no atual presidente.

Meu apoio não é por adesão. Meu apoio é por um Brasil que sonho ser de todos, inclusivo, generoso, sem fome e sem miséria, com educação e saúde de qualidade, com desenvolvimento sustentável. Um Brasil com reformas estruturantes, que respeite a livre inciativa, o agronegócio e o meio ambiente, com comida mais barata, emprego e renda.

Meu apoio é por projetos que defendo e ideias que espero ver acolhidas. Dentre tantas que julgo importantes, destaco cinco, tendo sempre a responsabilidade fiscal (âncora fiscal) como meio para alcançar o social:

Educação: ajudar municípios a zerar filas na educação infantil para crianças de três a cinco anos e implantar, em parceria com os estados, o ensino médio técnico, com período integral e conectividade, garantindo uma poupança de R$ 5 mil ao jovem que concluir o ensino médio, como incentivo para que os nossos jovens voltem à escola;

Saúde: zerar as filas de cirurgias, consultas e exames não realizados no período da pandemia, com repasse de recursos ao SUS;

Resolver o problema do endividamento das famílias, em especial das que ganham até três salários mínimos mensais;

Sancionar lei que iguale salários entre homens e mulheres que desempenham, com currículo equivalente, as mesmas funções. Esse projeto já foi aprovado no Senado Federal e encontra-se parado na Câmara dos Deputados;

Um ministério plural, com homens, mulheres e negros, todos tendo como requisitos a competência, a ética e a vontade de servir ao povo brasileiro.

Até o dia 30 de outubro, estarei nas ruas, vigilante; meu grito será pela defesa da democracia e por justiça social; minhas preces, por uma campanha de paz.

Com os meus mais sinceros agradecimentos ao povo brasileiro,

Simone Tebet.”

6/10/2022

 

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