Ano novo, desafios antigos

O Brasil ingressa no ano do seu bicentenário carregando o fardo de mais uma década perdida e atormentado por dois binômios perversos: estagnação-inflação e fome-desemprego. Nossa economia anda de lado, crescendo em média 0,3% ao ano entre 2011 e 2021. O ufanismo do ministro da Economia, Paulo Guedes, quanto a um PIB turbinado em 2022 não é compartilhado pelo mercado ou especialistas, cujas projeções apontam para mais um ano de economia estagnada, beirando a recessão.

Há causas estruturais impeditivas da conquista do crescimento sustentado, condição imprescindível para termos uma nação moderna e sem miséria. Entre elas, o baixíssimo investimento na inovação e a não realização das reformas que eram necessárias para a continuidade do ciclo modernizante que se iniciou nos anos 90 com FHC e até hoje não se completou.

Esses problemas antecedem ao governo Bolsonaro, mas não se pode isentar o presidente pelo agravamento da situação. A “revolução liberal” prometida por Guedes foi um grande blefe. No último ano do atual mandato, a prioridade do presidente não são as reformas, mas sim a sua reeleição às custas da gastança pública. Quanto mais as pesquisas apontarem dificuldades de Jair Bolsonaro para se reeleger, maior será o apelo a medidas populistas.

O Auxílio Brasil, subsidiado pelo calote dos precatórios e pela irresponsabilidade fiscal, é uma clara evidência de que, em aliança com o Centrão, os bons fundamentos econômicos serão mandado às favas em nome da reeleição. Quando Bolsonaro disse que gastaria este ano para se eleger mas fecharia as torneiras em 2023, o ministro da Economia respondeu “estamos juntos”

O Brasil se perdeu da trajetória iniciada no final do século 20, quando conquistou a estabilidade da economia, modernizou o estado e adotou fundamentos econômicos como meta para a inflação, superávit primário, câmbio flutuante e responsabilidade fiscal.

Em 2021, voltamos aos tempos dos juros altos, da desvalorização da moeda, da escalada inflacionária, do avanço do patrimonialismo na esfera pública e do aparelhamento do Estado. E não custa lembrar que o lulo-petismo também foi pródigo em diversos pontos desta seara.

Parte significativa do Orçamento da União foi capturada pelo Centrão por meio das emendas secretas. E o financiamento público de campanhas e dos partidos, teoricamente uma medida positiva, na verdade está a serviço da perpetuação das oligarquias partidárias, se transformando num fator que restringe a alternância do poder ou a renovação partidária.

Deter essa marcha da insensatez é o grande desafio para nos reconectarmos com o futuro. A deterioração do quadro social torna premente a retomada do fio da meada para chegarmos a um Brasil justo e moderno.

A Educação é uma das áreas estratégicas neste objetivo. É fundamental que ela retome a trajetória interrompida por concepções ideológicas ou, mais recentemente, religiosas. É preciso acabar com a guerra cultural. Desde 1995 tivemos governos e parlamentares que contribuíram para a construção de um arcabouço institucional de financiamento do ensino público e para a criação do um moderno sistema de avaliação que possibilitou ao país formular políticas de Estado, como a reforma do ensino médio e a definição da Base Nacional Comum Curricular. Criminosamente tudo isto foi deixado de lado.

Saúde, segurança, habitação, transporte público, matriz energética, meio ambiente…. O ano é novo, mas os desafios são antigos.

E o andar da carruagem não nos autoriza a imaginar que seja possível uma reviravolta ainda neste governo. Tudo indica que o Brasil só irá se conectar com o futuro a médio prazo, a depender do resultado da disputa presidencial. Os candidatos estão na obrigação de apresentar o seu projeto de nação, que seja capaz de unir os brasileiros num horizonte comum. Por enquanto, não é o que vislumbramos.

Este artigo foi originalmente publicado no Blog do Noblat, no dia 5/1/2022.

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