Bem no momento de se comemorar com festança (virtual, porém) o dia de São João, o Brasil assiste de camarote ao desenrolar de mais uma lambança que a turminha lá do Ministério da Saúde andou promovendo, desta vez com a possível aquiescência do ilustre presidente da República. (Ainda a ser apurado, mas há indícios de que isso seja verdade verdadeira.)
E o que tem São João com o presidente? Vamos ver!
Do lado de lá:
Estudando a história do Santo, vamos encontrar vários pontos de convergência com a história do Diabo, digo, do presidente.
A princípio se pensava que João Zacarias – ele só passou a se chamar João Batista depois que cresceu e iniciou sua carreira de “batizador” dos que se diziam arrependidos de seus pecados nas águas do Rio Jordão – fosse ele próprio o Salvador.
João Zacarias também nasceu, assim como Jesus, de um milagre anunciado pelo anjo Gabriel, daí a confusão. Mas quando saiu pregando pelo mundo, ele mesmo desmentia essa versão e dizia que o verdadeiro Messias ainda estava para chegar. (Por favor, bolsominions, não usem essa informação para espalhar pelo WhatsApp que foi João Batista quem anunciou a chegada do Jair Messias.)
Em suas pregações, João não poupava o rei Herodes. Acusava-o de levar uma vida desregrada e que praticava adultério com sua própria cunhada, Herodíade, mãe de Salomé, a marvada que dançou pro rei e que pediu a cabeça do João Batista numa bandeja como forma de pagamento do cachê artístico.
Do lado de cá:
Jair Messias Bolsonaro, o que se dizia Salvador da Pátria, também foi batizado no Rio Jordão em 2016. Mas, diferentemente do verdadeiro Messias, que foi sagrado pelo pregador que virou Santo, Jair foi batizado pelo pastor Everaldo, que foi preso em agosto do ano passado, em operação da PF contra a corrupção que rolava nos contratos da Saúde no Estado do Rio.
Jair Bolsonaro, ao que se sabe, não nasceu de um milagre, mas milagrosamente conseguiu se manter como deputado por 28 longos anos, durante os quais conseguiu apresentar apenas dois projetos de lei que foram aprovados.
Bolsonaro também anunciava a chegada do Messias, mas a falta de modéstia fez com que ele se auto anunciasse como sendo ele próprio o Salvador. Muitos caíram nessa conversa e ele acabou chegando ao trono, mas em pouco tempo muitos dos que o elegeram já perceberam que de Messias ali só tinha mesmo o nome.
Em seus discursos, ele não poupava seu adversário político Luiz Inácio Lula da Silva. Dizia que em seu governo não haveria a corrupção que havia na gestão do petista. (Mudou o método. Os saques podem não estar sendo nas estatais, mas denúncias de corrupção das brabas estão pipocando por aí, fora as já manjadas rachadinhas praticadas por ele e pelo filho, que, queiram ou não os adoradores do mito, é corrupção, sim, senhor.)
Hoje, a Salomé da hora atende pelo nome de Luís Ricardo Fernandes Miranda, o servidor da Saúde que foi pessoalmente “dançar” para o presidente levando a suspeita de uma grande corrupção envolvendo a compra da vacina indiana Covaxin, superfaturada e sem aprovação da Anvisa.
Como o interlocutor não deu bola pra informação, Luís Ricardo resolveu pedir a Herodes (na versão atual ele se chama Omar Aziz) sua cabeça como prêmio por ter trazido o escândalo à tona.
Vamos aguardar pelo desfecho dessa história. A CPI promete cutucar essa ferida até sangrar. Se se confirmarem as suspeitas e se a cabeça do presidente realmente for servida numa bandeja, um terceiro testamento terá de ser escrito para contar que nem todo Messias é salvador. Muito menos o da Pátria.
Esta crônica foi originalmente publicada em O Boletim, em 25/6/2021.