A divulgação do desempenho negativo do PIB do terceiro trimestre se encarregou de triturar mais uma das afirmações triunfalistas de Paulo Guedes. Poucos dias antes o ministro alardeava que a economia se recuperava em forma de V.
Repetindo sua postura de animador de auditório, Guedes tem insistido em acenar com um bom desempenho econômico em 2022. Seu otimismo exagerado não tem respaldo na realidade e já existem vários sinais da deterioração do ambiente econômico, com o pessimismo se espraiando no mundo da produção e financeiro.
De fato, é impossível ser otimista diante de uma inflação próxima de 8%, por mais que Guedes diga que, mesmo com esse índice, “o Brasil está no jogo”. A inércia inflacionária está de volta, com a inflação passada influenciando a inflação futura. Nessa toada, poderá chegar à casa de dois dígitos em 2022. Para contê-la, o Banco Central terá de continuar elevando a taxa de juros e, assim, inibindo a atividade econômica.
Os juros futuros da dívida pública já estão na casa de 10%. A projeção do PIB de 2022 vem sendo puxada para baixo, situando-se entre 1% a 1,5%, bem inferior aos 2,5% projetados no orçamento encaminhado pelo governo ao Congresso Nacional. A deterioração da situação fiscal, com o risco de o governo apelar para a “contabilidade criativa”, tipo a PEC dos precatórios, adiciona mais incertezas e temores.
Desemprego alto, escalada inflacionária, desvalorização do real, crise energética, instabilidade política e estagnação econômica criam um clima de insegurança e impedem a retomada dos investimentos. Todos esses ingredientes estiveram presentes na crise que levou ao impeachment de Dilma Rousseff e a continuidade de seu governo ficou insustentável quando a inflação chegou à casa de dois dígitos.
Seu impacto na vida das pessoas, sobretudo nas camadas de menor poder aquisitivo, é dramático. A sensação de mal-estar dos brasileiros fica refletida na baixa aprovação do presidente.
Em vez de ascender socialmente, as pessoas descem degraus da escala social. Quem era classe B virou classe C e quem era C virou D ou E. O brasileiro tem na memória o estrago que a inflação causou no passado em suas vidas. A volta dela é intolerável.
A crise reduziu a pó o capital político do ministro da Economia. A afirmação mais generosa do PIB sobre sua gestão é de que “Guedes é bom na teoria e no slogan, mas ruim na execução.” Os mais cáusticos dizem que trocou a função de ministro para ser mais um bajulador de Bolsonaro.
Do alto de sua empáfia, Paulo Guedes assumiu o Ministério no início do governo menosprezando os 30 anos anteriores de condução da economia, como se nada de positivo tivesse sido construído antes dele e como se houvesse uma política econômica única pós democratização do país. Prometia uma “revolução liberal” com crescimento sustentado.
Não entregou nada. Delfim Neto, liberal de raiz, tem um diagnóstico devastador sobre o desempenho do governo na economia: “É desanimador, uma coisa inconcebível! Um estado caótico, sem programa, sem projeto”.
Grande parte da culpa, senão a principal, é da radicalização do presidente. A crise política incide profundamente na crise econômica, afugenta a atração de investidores e paralisa a máquina pública. Com um agravante: o presidente é absolutamente inepto para governar. Aliás, tem ojeriza a essa arte. Acha que governar é tuitar agressões, ir a solenidades, fazer motociatas.
A pressão pela reeleição de Bolsonaro pode levar o governo, com a aquiescência de Guedes, a adotar medidas populistas sem sustentação fiscal. O cabo de guerra entre a equipe econômica e o “Centrão” tende a se acentuar, com o bloco avançando em áreas econômicas e a provável recriação do Ministério do Planejamento.
O que está ruim pode piorar. Vide a aprovação da reforma do Imposto de Renda. A Câmara dos Deputados conseguiu a proeza de tornar pior o projeto encaminhado pela equipe econômica, que já era bastante ruim.
Nos tempos do “milagre econômico” do regime militar, o presidente Emílio Garrastazu Médici dizia que “a economia vai bem, mas o povo vai mal”. Com Jair Bolsonaro, a economia e o povo vão mal.
Em tempo: As manifestações deste 7 de setembro devem aprofundar o isolamento de Bolsonaro e o coro pelo impeachment vai crescer com a possível adesão anunciada pelo PSDB e também pelo PSD do Gilberto Kassab. Os atos aconteceram com a participação exclusiva do núcleo duro de Bolsonaro, que hoje representa apenas 12% do eleitorado. Manifestações são feitas para ampliar o apoio a determinada bandeira. A de Bolsonaro não agregou, espantou!
Este artigo foi originalmente publicado no Blog do Noblat, em 8/9/2021.