Crime em nome de Deus

No Rio de Janeiro, destruído em diversas frentes, a roubalheira irrigou as terras do aliado Sérgio Cabral, condenado a mais de 100 anos de prisão. E de 2017 para cá, o dinheiro dos impostos dos cariocas aduba a igreja do prefeito da capital, Marcelo Crivella, do PRB de José de Alencar, vice de Lula.

Sobrinho do arquimilionário Edir Macedo, o bispo licenciado Crivella, ex-ministro da Pesca de Dilma Rousseff, anunciou a um seleto grupo de pastores e líderes religiosos que tem de “aproveitar a oportunidade” que Deus deu a ele para resolver questões pendentes das igrejas evangélicas. Isso vale desde a isenção de pagamento de IPTU e fixação de pontos de ônibus perto das casas de culto até para o atendimento privilegiado a fiéis na sucateada rede de saúde pública do Rio. Basta que os líderes dos crentes entrem em contato com uma tal de Márcia, assessora do prefeito, para marcar cirurgias de cataratas ou de varizes.

No encontro realizado no Palácio da Cidade, sede da Prefeitura do Rio, Crivella escancarou que a religião o pauta muito além dos temas confessionais, como a negação do Carnaval ou a Parada Gay, para os quais reduziu subsídios. Está se lixando para o Rio que lhe confiou 1,7 milhão de votos.

Deixou claro que seu mandato tem como fim cumprir a pregação do tio de multiplicar a participação de evangélicos na política. Na eleição de 2014, eles cravaram 90 deputados e dois senadores entre os 594 congressistas. Só a Universal do Reino de Deus elegeu mais de 100 prefeitos em 2016, incluindo o da segunda maior cidade brasileira.

Com mais de 50 milhões de fiéis, os evangélicos são cobiçados por candidatos de todos os partidos, independentemente da matiz partidária. Todos querem ser ungidos por pastores.

Gente que condena a dobradinha política-religião, mas usa e abusa da fé na busca de votos. Que contribui para a perniciosa intromissão da Igreja – evangélica ou não, diga-se – na coisa pública.

Exaurido econômica e moralmente pela ganância petista, o combalido Estado brasileiro não aguenta um baque desse tipo.

Mas como o que está ruim pode sempre piorar, é conveniente estar atento ao sinal intermitente de alerta. O que Crivella expôs – e o Ministério Público promete apurar – não são planos para o futuro. São ações em curso, privilégios já assegurados para os que confessam a mesma fé do prefeito. Um risco não só para o Rio, mas que pode se espalhar – se é que ainda não se esparramou – para todo o país.

Esse Deus de Crivella é um cara esquisito, que oferece oportunidades a aproveitadores. O maior pecado será não combatê-lo.

Este artigo foi originalmente publicado no Blog do Noblat, na Veja, em 8/7/2018. 

Um comentário para “Crime em nome de Deus”

  1. O Rio de Janeiro não merece Marcelo Crivella. Não merece!

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