A síndrome de Maluf

Presença constante nas disputas eleitorais de São Paulo, Paulo Maluf era imbatível no primeiro turno, mas sempre perdia no segundo. Numa de suas derrotas não se conteve: “nadei, nadei e morri na praia”. Maluf era vítima de um mal, a sua rejeição estratosférica. A derrota na segunda rodada eleitoral era líquida e certa, pois naturalmente o eleitorado dos outros candidatos caia nos braços do seu adversário.

A síndrome de Maluf de nadar, nadar e morrer na praia paira sobre a cabeça de Jair Bolsonaro como uma espada de Dâmocles. Está para nascer o político capaz de ganhar uma eleição com uma rejeição de quase a metade do eleitorado. Superá-la passou a ser o grande desafio do ex-capitão. Se deixar para trabalhá-la apenas no segundo turno, quando terá dez minutos de TV, pode ser tarde demais.

Como Bolsonaro aparece perdendo para o candidato petista no segundo turno, o presidenciável tucano amplificará mais ainda o discurso de que o “mito” é o cavalo que o PT montará para voltar ao poder. Ainda que remota, não está descartada a possibilidade de uma desidratação mais acentuada ainda no primeiro turno. Isso ocorrerá se for inoculado no imaginário do eleitorado antipetista que, de fato, ele é o caminho mais rápido para a volta do PT ao governo.

Na outra ponta, a candidatura petista manipula habilmente a repulsa a Bolsonaro, observada em parte de segmentos significativos da sociedade. A estratégia é clara: fazer do segundo turno uma guerra santa entre o bem e o mal, com o PT representando o bem e Bolsonaro o Satanás. Nessa lógica, a disputa seria entre o “fascismo e a democracia”, entre a “civilização e a barbárie”. Por aí, a esquerda, que tem know how de propor frentes conforme seus interesses de momento, dissimularia o fato de o PT representar um projeto tão autoritário e populista quanto o de seu principal concorrente.

Estas são as estratégias de seus adversários, mas Bolsonaro também tem a sua. Ao contrário do malufismo, o bolsonarismo é um fenômeno de massas. Há mais de meio século não víamos no Brasil a extrema-direita com base popular e com militância aguerrida. Isto dá a ele um núcleo duro que o coloca com um pé no segundo turno.

E a seu favor existe o antipetismo, que vai bem além dos 30% de rejeição a Fernando Haddad. O crescimento do petista pode levar o eleitorado antipetista a migrar com mais força para Bolsonaro, esvaziando assim as candidaturas de Geraldo Alckmin, Álvaro Dias, João Amoêdo e Henrique Meirelles. A esquerda pensa ter o monopólio do voto útil. A extrema-direita pode se beneficiar da mesma arma.

A migração será mais palatável para o eleitorado historicamente do centro se o presidenciável do PSL concretizar o movimento estratégico que está esboçando, por meio de sua “Carta à Nação”.  O “Bolsonarinho paz e amor” pode acenar para o mercado, assumindo compromissos com o ajuste fiscal e com um programa privatizante. Isto acompanhado de sua “conversão” aos valores democráticos e de “respeito à Constituição”.

Há vacina para tudo. Inclusive para a Síndrome de Maluf, mesmo que seja um estelionato eleitoral. Mas, nisso, o líder nas pesquisas tem a companhia de Haddad, cuja candidatura é o próprio 171.

Este artigo foi originalmente publicado no Blog do Noblat, na Veja, em 26/9/2013. 

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