Dois países e uma escolha

Ganhe ou perca as eleições o PT já cumpriu a sua missão: dividiu o Brasil em dois e institucionalizou o maniqueísmo como política de Estado.

Conseguiu industrializar o “nós” a ponto de transformá-lo em símbolo da vontade, da virtude, da generosidade, da luta contra o preconceito, da compaixão pelos pobres, da igualdade – cujo corolário definitivo não é nenhuma mudança de fundo na sociedade mas apenas executar um projeto de poder. Um aprendiz de PRI, a versão mexicana do poder pelo poder.

Conseguiu cravar no fantasmagórico adversário -“eles”- o exato oposto do que ele diz representar: a maldade, o egoísmo, o ódio, a luta de classes, o racismo, a homofobia e tudo que o imaginário possa estruturar como resumo do mal.

O PSDB, numa análise atilada do filósofo José Arthur Gianotti, simplesmente perdeu a identidade como partido, por não ter conseguido se articular como oposição.

O PT conseguiu, através de seu agressivo discurso maniqueísta, empurrar para uma frente oposicionista informal setores dispersos da sociedade descontentes com a amoralidade difusa e macunaímica que marca o seu período de 12 anos no governo.

O Brasil foi levado a dividir-se politicamente e eleitoralmente não mais em PT e PSDB mas em PT e anti-PT.

À informal frente oposicionista juntaram-se setores da direita ideológica mas inorgânica, alguns direitistas caricaturais, os marinistas, defensores da sustentabilidade ambiental, e até mesmo uma Frente de Esquerda Democrática, formada por intelectuais gramscianos, esquerdistas desiludidos com o fisiologismo e jogo sujo do PT, que declararam em manifesto:

( “) Nas eleições de 2014, nos decepcionamos com o PT. A campanha petista no primeiro turno valeu-se de táticas e subterfúgios que desonram o bom debate. Caluniou, difamou e agrediu moralmente a candidatura de Marina Silva, sob o pretexto de que seria preciso fazer um “aguerrido” confronto político. Atropelou regras procedimentais e parâmetros éticos preciosos para a esquerda e a democracia. ( “)

E considere-se que quando os esquerdistas democráticos escreveram esse manifesto, Lula ainda não havia comparado o adversário aos nazistas e ao rei Herodes, em alguns de seus surtos de alucinação onde combate, como dom Quixote, os moinhos de vento que ele mesmo criou – aplicando provavelmente por instinto e não por conhecimento o princípio leninista de “acusar os outros daquilo que você faz”.

O mais nocivo populismo caracteriza-se exatamente por interditar o debate substituindo-o, sempre que possível, por uma chuva de calúnias na cabeça do adversário, que passa a ser tratado não como um defensor de propostas diferentes, mas como um criminoso a ser eliminado.

Seja como for, o País que emergirá das urnas domingo será outro. Ou melhor, será um dos dois: ou aquele que procurará a modernidade livrando-se da canga do atraso e da mistificação ou aquele que fará das ilhas de atraso, da pobreza e do assistencialismo a reserva de mercado para garantir sua perpetuação no poder. Aos populistas e demagogos, nunca convém que os descamisados possam comprar suas próprias camisas.

Este artigo foi originalmente publicado no Blog do Noblat, em 24/10/2014.

2 Comentários para “Dois países e uma escolha”

  1. A Dilma só perderia para o PT. O PT é hoje fardo difícil de carregar. Mas é PSDB é um fantasma que fez a militância petista sair as ruas. Não conseguiram ser oposição e não conseguiram canalizar a insatisfação de desiludidos com o PT. Os outrora descamisados queren mais que um trapo, não conseguem deslumbrar em Aécio uma melhor opção, preferem o assistencialismo e a demagogia de uma coração valente. Vamos às urnas: uma ex-guerrilheira contra um eterno playboy.

  2. Novamente, o Sr. Vaia não explica melhor o que diz: falou em “princípio leninista”, como se o Collor fosse leninista. O tal princípio é bem mais típico da “realpolitik” do que leninista.

    Depois disse:
    “Aos populistas e demagogos, nunca convém que os descamisados possam comprar suas próprias camisas”

    Sem, NUNCA, ter citado o coronelismo.
    Não convém aos CORONÉIS que o pobre ande com as próprias pernas.

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