Céu sem brigadeiro

Um velho bordão muito popular nas redações de antigamente era “há algo no ar e não são aviões de carreira”.

Isso era vaticínio ou prenúncio, ou puro palpite, quando não teoria conspiratória, indicando a iminência de um fato não corriqueiro que estaria prestes a ocorrer.

Era uma senha para manter as redações em estado de alerta — ou de orelha em pé, em jargão mais popular.

Naqueles idos tempos, os aviões se moviam entre Jacareacanga e Aragarças transportando oficiais golpistas que sonhavam em derrubar governos constitucionais, e muitas vezes terminavam em rendições patéticas, sem apoio nem dos mecânicos das aeronaves, quanto mais de seus superiores, e que dirá então da sociedade, que praticamente ignorava esses lunáticos de plantão.

Se alguém disser hoje que há algo no ar e não são aviões de carreira, pode ser apenas sinônimo de novidade, de alguma coisa que parece estar andando fora do trilho da lógica pré-estalecebida ou do senso comum.

Podem ser sintomas disso a fenomenal confusão que o governo armou em torno das explicações a respeito do estranhíssimo negócio da compra da refinaria de Pasadena pela Petrobras, a respeito do qual já ouvimos de tudo, em todos os momentos, em todos os fóruns, e em mais de 50 tons de cinza.

Um mau negócio, que poderia ter sido um bom negócio, mas que não chegou a ser propriamente bom, embora parecesse e pudesse ser bom, naquela época, ainda que não tenha sido totalmente ruim, no qual o dinheiro investido não está de todo perdido, porque ainda pode ser recuperado, desde que apareça uma alma generosa que esteja disposta a pagar 1,3 bi por algo que vale uns 180 milhões. Claro que você não entendeu, e quem tentou explicar entendeu menos ainda.

Uma CPI para esclarecer isso, segundo a base governista, seria aceitável — mesmo porque tem o apoio regimental para isso — desde que se investigue junto tudo o que se relacione a qualquer dúvida que persista desde a criação do Universo. O STF mandou restabelecer a chamada regra constitucional, mas nem por isso o avião pousou tranquilamente.

O fato é que em consequência de todos esses imbróglios, somados ao desequilíbrio das contas públicas, ao controle descontrolado da inflação e a toda a desordem administrativa que se acumula, o balão da presidente perde gás.

Alguns aliados pedem socorro ao Criador em suas duas versões: a divina e a terrena, cuja rempli-de-soi-même, como um clássico ponta direita ciscador, faz que vai mas não vai.

No pronunciamento republicano em rede nacional em comemoração ao Dia do Trabalho e à sua candidatura, a presidente abriu seu saco de bondades — aumentou a Bolsa Família em 10% e corrigiu a tabela do Imposto de Renda para o ano que vem — com a mesma expressão de alegria com que alguém toma uma injeção contra a gripe.

Há algo no ar e não é céu de brigadeiro.

Este artigo foi originalmente publicado no Blog do Noblat, em 2/5/2014.

Um comentário para “Céu sem brigadeiro”

  1. O Vaia é craque, não é ponta direita ciscador, e centro avante matador.

    A compra da usina parece a história da compra da vaca leiteira, que dava 15 litros dia, pelo preço pago a vaca não viveria tempo suficiente para se pagar, mas que dava leite dava. Um mau negócio. Vender a vaca será outro mau negócio.

    O discurso da Dilma foi significativo, mostrou sua insegurança e timidez. Não é aquela que pediu a reforma política por uma constituinte plebicitária. Quando age por sua cabeça é povo, quando age pela cabeça dos aspones politiqueiros claudica.

    Vaia tem razão, há algo no ar e não é só aeroLula, é o próprio Lula.

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