Tenho pensado em meus amigos de origem japonesa.
Alguns, de longa, longa data, como Jiro Takahashi, autor do mais belo depoimento que já ouvi sobre o ofício de editor. Anos oitenta, Bienal Nestlé de Literatura, coordenação de Ricardo e Iraty Ramos, amigos de adolescência e de sobrenome, sem parentesco algum.
Pode ser que, modesto, Jiro não se lembre – ou nem saiba –, mas houve quem, libertando a emoção, chorasse. Não pouca gente.
Também de longa data, Eiko, Lídia, Reiko, Zuleika. Em épocas e lugares diferentes, foram me conquistando em momentos simples, cotidianos, aparentemente sem importância. Aparentemente. Afinal, a conversa rápida antes da aula de natação, a decisão na hora de cortar o cabelo, a emoção do nascimento do primeiro neto, o cuidado das mãos durante a massagem semanal, quem inventou que isso não tem importância? A maior importância.
De curta data, que – felizmente – se alonga dia a dia, Jorge Nagao, sorriso manso e olhar mais ainda, companheiro dessas crônicas.
Tenho pensado nesses meus amigos desde o primeiro espanto com a visão da onda gigantesca que arrastava carros e casas, “como se fossem brinquedos” (a expressão não é minha, muitos disseram o mesmo).
Enquanto me pergunto se terão familiares e/ou amigos nas cenas das tragédias, tento reconhecer, nas faces expostas na tevê, nos jornais e na Internet, algum traço, alguma expressão que me lembre o carinho e a solidariedade que, aqui e ali, vi cada um deles demonstrar diante de perdas alheias. De minhas perdas.
Tarefa fácil. Basta descansar o olhar em quem anda por aqueles cenários de completa desolação. Descansar o olhar em soldados, bombeiros, civis. Idosos, jovens, voluntários. Seres impregnados de esperança e de coragem, vindas sei lá de onde.
Sem desespero, sem gritos, transmitem força e confiança. E vivem uma felicidade incontida quando, após dias e dias de procura, enganando a morte, encontram a vida.
Sempre senti que – às vezes –, os olhos amendoados e serenos de meus amigos de origens tão longínquas me diziam coisas que eu não entendia muito bem. Coisas misteriosas, além de mim. Coisas que me enlevavam, como o depoimento do Jiro, tão emocionado e emocionante que, durante algum tempo, pensei que a felicidade suprema seria ser editor e viver cada uma daquelas palavras, considerações, leituras.
Felicidade suprema, se existir, deve ser aprender a viver os momentos mais trágicos, os mistérios mais insondáveis, como se a vida continuasse. E continua. Além da compreensão, além de nós. Ao alcance do sonho e da fantasia, partes, pedaços de nós.
Esta crônica foi originalmente publicada no primeiroprograma, em março de 2011.
Belo tributo, Vivina! Saí te procurando pela internet e me deparei com a ele.
Estou relendo a coleção de contos da Atual e senti uma enorme saudade de vc. Por isso, a busca.
Um grande abraço,
Wanda Brant
Wanda!
Pode ter certeza de que empatamos na saudade.
Até hoje, quando passo pelo seu prédio da Peixoto Gomide, fico imaginando que você vai surgir por lá, juro!
Me escreva! vivinaviana@yahoo.com
Beijo
Vivina