à noite, deitados, pergunto a meu pai:
que música pra hoje?, pai. mas o menino é mais rápido:
pai, ponha uma música… que não seja clássica.
posso escolher?
pode.
vou colocar as canções infantis da França, que você chama de os francesinhos. depois eu coloco outro disco de adulto.
En passant par la Lorraine
avec mes sabots.
enquanto ouvimos as canções, fala o menino:
pai, a mãe disse que toda a família vai passar o natal com a tia Marina.
ótimo. eu te levo uns dois dias antes e volto. você sabe que pra mim não existe natal. você viria sozinho de avião?
claro! no ano novo quero estar aqui.
e meu pai:
gostaria de ficar sozinho do dia vinte e dois ou vinte e três até a véspera do ano novo.
está me expulsando?, pai.
sim. você podia ficar no apartamentinho.
tá. o apartamentinho está vazio. deve estar imundo. só vou alugá-lo de novo depois das férias. o quê vai ficar fazendo aqui sozinho?
nada de especial.
e, a seguir, no escuro, soa a voz de Violeta Parra. não temos coragem de conversar. sinto que não há diferença entre as canções de Violeta e os concertos de Brandemburgo, que adoro. estarei exagerando? para onde irão todas estas músicas depois que eu morrer?
quando se muere la carne
el alma busca su sitio.
o maior desespero e mais lírico e mais pungente…
prisionera en una tumba…
quando se muere la carne
el alma se queda oscura.
A Espécie Humana, romance de Jorge Teles, está sendo publicado em capítulos.
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