A Espécie Humana. Capítulo 29

a arte é uma forma de fantasia controladaresolvo, como quero, cada detalhe e vou distribuindo as tarefas de meus personagens, sendo eu mesmo um delesestou pensando estas coisas.  resolvo falar do tempo para anunciar que meu pai não ficará para sempre, partirá; resolvo fazer com que saiam os dois a passeio para preparar o promissor encontro de meu filho com uma fugidia alegria e seu primeiro contacto com a morteporque preciso dessa morte para a posterior desesperação que será discutir como poderia ser a vida após a mortea minha possível vida após a minha morte certa 

meu filho e meu pai existem na minha imaginação como símbolos de filhos e pais que existemfilhos e pais são realidade e dela parte toda a fantasiasó pode existir fantasia após a experiência com o realmeu aniversário também é real, a três de julho, não tenho culpa, não cabe culpasão, todos os dias, dias iguais a dias iguaistoda a arte precisa do real e só nele pode existir mas a arte tem na fantasia a sua matéria-prima 

qual é o real que sustenta a música?  escala ascendente lembra escadafluxos que iriam do terrenal ao celeste?  e escalas descendentes lembram a escada descida por Orfeue o ritmo?  música alegre bate rápido como o coração humano quando alegre e é o mesmo coração que, lento e quase desmaiando, indica o ritmo da melodia que corta a alma em pedacinhosseriam os acordes simultaneidade de emoções que nos atropelam?  às vezes harmoniosas, às vezes dissonantes!  seriam os acordes simultaneidade de personalidades que se encontram?  às vezes harmoniosas, às vezes dissonantes!  e a polifonia?  a perturbadora simultaneidade de seqüências diferentes dentro de uma ordem que é cada alma humana pertencendo ao fruir de toda a experiência da humanidade?

estou com frioé hora de cuidar dos animais 

A Espécie Humana, romance de Jorge Teles, está sendo publicado em capítulos.

Leia o capítulo anterior.

Leia a partir do capítulo O.

Continua na semana que vem.

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