Eles não querem que eu vote, como não queriam que o personagem do “Viva o Gordo” voltasse para o Brasil. Será que já não bastam a ação dos corruptos, a omissão dos irresponsáveis e os malfeitos e a inoperância dos incompetentes?
Não é suficiente a ignorância que fecha as portas da consciência para uma grande parte da população, incapaz de discernir o que é bom ou ruim de fato para si e para o país? Não se contentam com os maus exemplos que muitos da classe política (há, graças, muitas exceções) revelam para o público que os elegeu? Até quando apostarão em nossa letargia, nossa insensibilidade?
Muitos são os motivos que levam os brasileiros a pensar em anular ou se abster no dia das eleições. Reclamam da obrigação, que é discutível, e se esquecem de que se trata de um direito. Não devemos abrir mãos de nossos direitos. Um voto é apenas um voto, alguns dizem. O voto é mais que isso, é a voz de cada um de nós, é a fala do cidadão. Não podemos renunciar a esse espaço que temos.
O que cada vez mais nos traz desassossego é o movimento constante e
consistente de alienação e despolitização que visa a desanimar os eleitores, para conservar o poder um dia conquistado nas urnas. Não dirijo a carapuça para ninguém em especial, pois ela caberia em cabeças de todo tipo.
As campanhas, e isso já vem de longe, estão dominadas por marqueteiros, que enjaulam, embonecam, pasteurizam os candidatos e criam uma atmosfera simulada, uma ficção medíocre e cara que nada tem a ver com a realidade do Brasil. Eu sei que os exemplos vieram de fora e são macaqueados aqui.
O que importa é vencer, mesmo que o produto seja falsificado. As idéias políticas passam longe desses profissionais que ganham muito dinheiro para enganar o povo. E que se danem o Brasil, as cidades e os brasileiros.
Essas eleições ocorridas no domingo trouxeram um outro fato desagregador da democracia. Isso também vem ocorrendo há anos, mas dessa vez passaram do limite. Falo das pesquisas e dos institutos que as realizam e divulgam.
Pelas palavras dos senhores dos levantamentos estatísticos da vontade popular, tudo já estava resolvido, os ganhadores e perdedores já estavam definidos.
Eles sempre erraram e, infelizmente, continuarão errando, com a complacência da maioria. Mas agora foram longe demais. O dia da eleição e o voto de cada um de nós não tinham a menor importância. Era dispensável o nosso ato cívico. Não contentes em comunicar o que a realidade desmentiria no dia 3 de outubro, eles se arvoraram em sábios conhecedores do pensamento de todos. Para eles, que até escreveram artigos defendendo sua torcida, os brasileiros somos inúteis.
O cidadão eleitor amanheceu no dia 3 disposto a fazer política e desmascarar os farsantes. Independente da alegria e da tristeza dos candidatos dos vários partidos, que faz parte do jogo democrático, a grande vitória do último domingo foi nossa, dos cidadãos brasileiros que reconduziram o voto ao lugar que lhe é devido.
Esta crônica foi originalmente publicada no Estado de Minas