A política está nos reels e no TikTok

A política contemporânea já não é encenada apenas nos palanques, nos plenários ou nos telejornais. A proliferação dos vídeos curtos, em formato vertical, sinaliza uma transformação estrutural na mediação entre representantes e representados. É uma linguagem concebida para o celular — para ocupar a palma da mão e infiltrar-se na intimidade da nossa rotina. Assistimos ao político no ônibus, na fila do banco, durante as refeições — e, muitas vezes, no exato instante em que ele publica sua mensagem. Continue lendo “A política está nos reels e no TikTok”

Emanoel Araújo, o legado que resiste e inspira

Neste 7 de setembro, completam-se três anos da morte de Emanoel Araújo, artista, curador e fundador do Museu Afro Brasil. Sua ausência ainda ressoa, mas sua obra segue viva, inspirando novas gerações e lembrando-nos do poder transformador da cultura. Continue lendo “Emanoel Araújo, o legado que resiste e inspira”

Fim de um ciclo na esquerda latino-americana

Depois de 20 anos termina o poder do Movimento ao Socialismo (MAS) de Evo Morales. Pela primeira vez em duas décadas a esquerda ficará de fora da disputa da presidência da Bolívia, na qual o segundo turno será disputado entre um candidato de centro-direita e outro de direita. A simbologia da derrota transcende as fronteiras da Bolívia. Representa uma espécie de pá de cal em um projeto que galvanizou corações e mentes na América do Sul e levou a esquerda a subir no poder na Venezuela, Equador, Argentina, Bolívia e Brasil, conhecido como bolivarianismo e chamado por seu fundador, Hugo Chàvez, de “socialismo do século XXI”. Continue lendo “Fim de um ciclo na esquerda latino-americana”

A crise semiterminal do bolsonarismo

Até recentemente Jair Bolsonaro era a grande liderança do campo da direita e o bolsonarismo sua principal força orgânica, capaz de encher as ruas com multidões. Esse capital político é coisa do passado. Hoje, está encurralado em um labirinto de crises judiciais, fragmentação interna e rejeição popular. A imagem do mito — como seus seguidores o aclamavam — foi substituída pela de um político que só pensa em seus interesses pessoais e nos de seu clã. Os brasileiros percebem isso, como revelou a última pesquisa Quaest, na qual sete em cada dez entrevistados avaliam que Eduardo Bolsonaro defende os interesses do pai e da família, e não os do Brasil. Continue lendo “A crise semiterminal do bolsonarismo”

Brasil e Estados Unidos: dois séculos de aproximação e o risco de ruptura

As relações entre Brasil e Estados Unidos atravessaram mais de dois séculos, combinando afinidades ideológicas, interesses estratégicos, trocas econômicas e culturais — mas também períodos de distanciamento, desconfiança e, mais recentemente, choques abertos. Desde o século XIX, a convivência entre as duas maiores potências do continente oscilou entre o pragmatismo diplomático e o idealismo político, sem nunca romper de modo irreversível. A história, no entanto, mostra que essa durabilidade não é garantida: parcerias sólidas também se corroem quando faltam previsibilidade, reciprocidade e visão estratégica. Continue lendo “Brasil e Estados Unidos: dois séculos de aproximação e o risco de ruptura”

O Brasil em um mundo em transição

Ao longo do século XX os Estados Unidos foram o principal parceiro do Brasil, do ponto de vista comercial e geopolítico. Essa relação se acentuou após a II Guerra Mundial, da qual os EUA saíram como a principal potência econômica e militar do planeta. Nossas relações, apesar da assimetria de poder entre as duas nações, foi por décadas funcional: o Brasil buscava desenvolvimento econômico, segurança e inserção internacional; os EUA queriam estabilidade política e aliados firmes. Continue lendo “O Brasil em um mundo em transição”

Trump e a transição geopolítica

Desde o fim da II Guerra Mundial, os Estados Unidos assumiram um papel sem paralelo na história contemporânea: o de arquitetos e garantidores de uma ordem internacional baseada em instituições multilaterais, economia de mercado, segurança coletiva e valores liberais. Não se tratava apenas de poder militar ou hegemonia econômica — embora ambos fossem expressivos. Tratava-se, sobretudo, da capacidade de oferecer ao mundo um projeto, uma promessa de estabilidade e progresso. Continue lendo “Trump e a transição geopolítica”

Entre o palanque e a diplomacia

À medida que se aproxima o prazo final para a entrada em vigor do tarifaço imposto por Donald Trump — 1º de agosto —, o governo brasileiro revela um descompasso interno que fragiliza sua atuação internacional. A crise provocada pelas medidas protecionistas dos EUA revelou uma divisão tática de papéis: o discurso de Lula mobiliza sua base, enquanto ações diplomáticas e gestos pragmáticos — compartilhados por Alckmin e outros atores institucionais — procuram preservar canais de negociação. Continue lendo “Entre o palanque e a diplomacia”

Entre o necessário e o possível

Nesta semana foram publicadas duas portarias pelo MEC que, mais do que medidas administrativas, representam intenções políticas de fundo. A primeira institui o Programa Escola Nacional Nêgo Bispo de Saberes Tradicionais, voltado à valorização dos saberes afro-brasileiros, indígenas e populares. A segunda cria a nova Política Nacional de Educação do Campo, das Águas e das Florestas, ampliando e redesenhando o escopo do antigo Pronacampo. Continue lendo “Entre o necessário e o possível”

Com que roupa vai a direita?

Desde que foi tornado inelegível, Jair Bolsonaro passou a vagar como uma espécie de “rei nu” da política brasileira. Mantém ainda poder simbólico sobre parte do eleitorado — especialmente nas redes sociais — mas já não comanda, de fato, nenhuma articulação relevante nem define os rumos do campo conservador. O bolsonarismo sobrevive como cultura política — ressentida, antissistema, agressiva —, mas começa a se tornar, cada vez mais, uma cultura sem centro. Continue lendo “Com que roupa vai a direita?”

A solidão do Brasil num mundo em realinhamento

O tarifaço imposto por Donald Trump às exportações brasileiras é mais um sintoma de um mundo em realinhamento. O que chama atenção e preocupa é a resposta frágil do Brasil. Não por falta de indignação inicial, mas pela ausência de uma estratégia compatível com a gravidade do momento — num cenário em que o país aparece isolado, vulnerável e cada vez mais irrelevante para os rumos da política internacional. Continue lendo “A solidão do Brasil num mundo em realinhamento”

Uma diplomacia fora de lugar

A revista The Economist foi certeira ao classificar o presidente Lula como “incoerente no exterior” e “impopular em casa”. Também destacou que, ao se alinhar a um Brics dominado por China e Rússia, o Brasil “parece cada vez mais hostil ao Ocidente”. Dias depois, a reunião do bloco no Rio de Janeiro confirmou o diagnóstico. O discurso do presidente e a declaração final do encontro evidenciaram que a política externa brasileira se deslocou do seu papel tradicional de equilíbrio e perdeu sintonia com o mundo real. Continue lendo “Uma diplomacia fora de lugar”

Lula à sombra do velho discurso

Lula e PT retiraram do fundo do baú a velha e descolorida roupa da luta de classes, agora travestida no confronto ricos contra pobres. Ou do “andar da cobertura com o andar de baixo”, na definição do ministro da Fazenda Fernando Haddad. Na retórica de classes contra classes, a turma da cobertura seria o mercado financeiro, as elites econômicas e, de maneira especial, o “Congresso Conservador”. Continue lendo “Lula à sombra do velho discurso”

O silêncio seletivo de Lula

Por dois anos consecutivos, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva travou uma cruzada contra o Banco Central e seu então presidente, Roberto Campos Neto. Os aumentos sucessivos da taxa Selic foram alvos de críticas contundentes por parte do chefe do Executivo, que via nas decisões do Copom um viés político, contrário aos interesses do país. Para Lula, a política monetária mantida sob Campos Neto não refletia os fundamentos da economia brasileira e estaria a serviço do governo anterior. Continue lendo “O silêncio seletivo de Lula”

Quando janeiro chegar

A base do governo esfarelou-se, virou peça de ficção. Exemplo disso foi sua humilhante derrota na Câmara dos Deputados, na noite de  segunda-feira. Sessenta por cento dos 346 votos favoráveis ao requerimento de urgência para o projeto de lei que derruba o novo decreto do IOF vieram de parlamentares da base aliada de Lula — inclusive de partidos com cargos ministeriais. Com apenas 96 votos contrários, o governo deu uma demonstração do seu real tamanho e do quanto está isolado no Parlamento. Continue lendo “Quando janeiro chegar”