Enquanto a oposição ajeita as suas luvas de pelica e decide se será “construtiva”, “propositiva”, “firme”, “vigorosa”, “vigilante” ou simplesmente boa praça, o governo ensaia seu vigor no ringue terçando luvas com aquela parte incômoda de si mesmo, ou seja, aquela outra metade que não se contenta com as sinecuras que lhe couberam na partilha, e exige outras, mais fartas.
Por enquanto, a batalha entre PT e PMDB pela disputa de cargos é o único transtorno efetivo que embaça a perfeita “pax” em que o governo de Dilma Roussef tem navegado nessa sua etapa inicial.
Ninguém, a não ser as mentes mais transtornadas, quer que a oposição saia atirando pedras, dinamitando pontes, convocando CPIs ou demolindo todas as iniciativas do governo só para delimitar territórios. Mas a tomada clara de posições a respeito de questões vitais para o País é o mínimo que se espera de uma oposição legítima. Ela recebeu 44 milhões de votos exatamente para não deixar que a continuação de um governo montado em índices estratosféricos de popularidade use esse álibi para impor ao País uma agenda que não passe pela vigilância e pela avaliação crítica de uma parte da sociedade que ela foi escolhida para representar.
Se a oposição se esforça nos bons modos para não melindrar o governo (como se nas democracias não fosse exatamente essa a sua função constitucional), os aliados não têm papas na língua e nem estão preocupados com as aparências e a boa educação. No jogo da partilha do butim, não se poupam caneladas. O deputado carioca Eduardo Cunha, que, por alguma razão que escapa à compreensão do pobre e desamparado eleitor comum, controla – ou controlava – a sesmaria de Furnas, saiu a trocar tapas com o PT, em defesa de sua reserva de caça, que o aliado fraterno ameaçou tomar de volta.
Na sua batalha para recuperar Furnas, aparentemente os petistas fizeram vazar para a imprensa (o PIG às vezes serve para alguma coisa) dossiês apontando casos de corrupção da gestão peemedebista. Cunha, sem rodeios, atacou:
– Os petistas que plantaram isso são os mesmos que atacam a imprensa e já foram vítimas de difamações. É impressionante o espírito suicida desses caras. Quem não se lembra dos aloprados? Quem com ferro fere, com ferro será ferido.
Talvez incomodada com a falta de decoro da guerra aberta, a presidente resolveu trocar toda a diretoria de Furnas e nomeou para a presidência Flávio Decat, ex-diretor da Cemig, e tido como “quadro técnico”. (Decat, na verdade, já foi citado numa gravação da Polícia Federal como apadrinhado de Fernando Sarney, filho do morubixaba maranhense José, presidente do Senado. Fernando pedia ao pai, na gravação, que ajudasse a acomodar o amigo na Eletrobrás).
A guerra entre PT e PMDB promete lances mais sangrentos à frente. Afinal, não estão em jogo princípios éticos, nem valores e nem concepções de gestão ou projetos de país, como na suave escaramuça que se desenha entre oposição e governo.
O que está em jogo é a comida dos lobos.
Este artigo foi publicado originalmente no Blog do Noblat, em 4/2/2011.