Como escreveu nossa querida Rita Lee: “um belo dia decidi mudar”.
Suponho que irei me arrepender, mas hoje, como exercício, não ficarei descendo a lenha nas coisas. Não vou salvar o mundo, nem quero que concordem comigo. Seria pedir demais. Afinal, não estou aqui para esclarecer, eu quero é confundir.
Irei me limitar apenas a relatar alguns fatos pela minha ótica que foca o desfocado e ainda assim espero que seja uma boa diversão.
Mudando o improviso, me perdoe quem ainda gosta, mas desisti de acompanhar a Fórmula 1 atual.
Estava ficando com zumbido nos ouvidos, virou baboseira de vez e pelo que eles recebem, deveriam correr ao redor de penhascos sem guard rail para dar um tiquinho de emoção.
Nem sei o por quê de ainda manterem pilotos.
Com tanta tecnologia envolvida o carro poderia ser pilotado por joystick direto da cabine da equipe.
Piloto está ficando obsoleto e fora de moda, afinal atualmente quem precisa de ídolos?
Basta um influencer lhe orientando como delinear as sobrancelhas ou como curar caxumba na air fryer e pronto.
O tempo do Charles Bronson e do Lázaro acabou. Lembro deles com aquele jeitinho sútil para resolver as pendências. Dá saudades!
Eu sempre fui mal interpretado.
Na copa de 70, juntando algumas tampinhas de refrigerante você trocava por uma miniatura dos jogadores nos bares participantes.
O português me via com as tampinhas nas mãos e já ia dizendo: não tem o Pelé, não tem o Rivelino, não tem o…. Amigo, eu não quero o que todo mundo quer, eu quero o Clodoaldo, Tostão, Jairzinho. Sai com um deles na hora.
Depois, colecionei um álbum de figurinhas que se eu tirasse “uma sorteada” podia trocar por um poster de algum personagem da novela das 8. Chamo isso de presente problema.
Cada vez que passava na banca o tiozinho dizia: não tem o Tarcísio Meira, não tem a Gloria Menezes, não tem… Calma, eu não quero os babacas da novela, aqueles que quando aparecem tocam aquelas musiquinhas fucking lullabies. Você tem o Lázaro? Sai com o poster na hora.
O Lázaro era o pior escroque, sempre suado, vivia com um palitinho entre os dentes, uma carabina no ombro e resolvia as paradas rapidinho. Colei o poster na garagem, assim que meu irmão entrou com o carro a noite, quase morreu de susto com a carinha bonitinha dele.
Poster sempre é problema, se for de mulher pelada não tem onde colocar, se for de carros, atletas ou artista vai expor o lado tolo do indivíduo.
Melhor é mantê-lo enrolado.
Voltando às corridas, quando criança eu queira mais emoção. Montava meu autorama sobre a mesa da sala de jantar que permitia aumentar e ficar enorme. Era do tipo que precisava um megafone para pedir o azeite do outro lado.
Minha mãe adorou, risquei a o tampo inteiro da mesa com essa invenção.
Pilotávamos ouvindo Genesis ou Emerson, Lake & Palmer.
Esses discos sempre me acompanharam, já tive em vinil, k-7, VHS, laserdisc, DVD, bluray e, em breve, em pastilhas homeopáticas. Exceto ouço Spotify porque meus ouvidos regurgitam. Prefiro ruído de pastilhas de freios.
O som ligado mantinha nossa adrenalina e cada vez que eu errava a aceleração, o carrinho voava pro chão e quebrava os retrovisores, a cabeça do piloto, aerofólio, etc.. A gente continuava a sangria, sem essa de pit stop, com os carros aos pedaços. Isso sim é roots!
No desenho do Speed Racer já era assim, crescemos nessa vibe dos penhascos.
Éramos pirados por autorama, uma vez em um salão do automóvel recebi um panfleto para fazer parte do Clube do Autorama Fittipaldi e receber uma carteirinha assinada pelos pilotos.
Sonhamos alto, eu e minha tropa preenchemos os dados, colamos nossas fotos 3×4, incluímos dentro outro envelope já com selo para o retorno da carteirinha e camelamos até os correios para enviar num sol de cozinhar os miolos.
Gastei meia sola do Kichute nessa tarde e de lambuja, quase fomos atropelados na Rua Silva Bueno.
Essa foi a frustação de número 1847 que tive. E até então só tinha 11 anos.
Perdemos o panfleto, a foto, os envelopes, a grana do selo de ida e de volta e nunca recebemos picas.
Mas depois do fatídico caso do Tigrinho da Esso, nada abala quem não tem mais coração.
Em uma tarde, 920 anos após, enquanto montava um belíssimo som na casa de um cliente, vejo o Emerson sentado na outra sala. Era vizinho e amigo dele.
Pensei: será que é o momento de perguntar, se por acaso, está com a minha carteirinha?
Hoje sei que com aquela carteirinha mais R$ 6,15 eu poderia andar de ônibus.
Na Fórmula 1, tivemos verdadeiras batalhas de gladiadores nos anos 80. Eu me diverti muito com o Damon Hill, parecia esses motoristas domingueiros no meio daquelas feras. Batia e enganchava em todo mundo sem dó. Tentava passar onde não cabia, ficava empatando os mais rápidos. Era um estorvo e eu rachava o bico pensando que o pai dele deve estar se revirando no caixão.
Mudavam as regras toda hora e o Senna quase tinha um AVC a cada reunião.
Eu esperava ansioso o dia em que o Balestre permitiria acoplar uma metralhadora com mira laser nos carros, como dos aviões de caça. Época boa…
Depois meu amigo, mergulhamos em anos de fogo brando com o Schumacher ganhando 150 corridas por ano. Eu assistia a corrida bocejando.
Me corrija se eu estiver exagerando com os números. Mas é a sensação que eu tinha.
Foi campeão mundial 289 vezes.
Quando eu acordava no domingo não sabia se o Padre Mário iria rezar a missa, mas uma coisa eu tinha certeza, quem iria ganhar a corrida.
Se ele não tivesse arrebentado uma pedra com a cabeça, suponho que estaria até hoje correndo sozinho.
Um belo domingo, para minha surpresa e para o resto da humanidade, ele estava em 2º lugar e imagino que a coisa se desenrolou assim:
Schumacher telefonou para a cabine:
– “Pessoal, clonaram meu carro, tem um vermelho igualzinho na minha frente, avisa correndo a portaria do meu prédio.”
A cabine liga pro Rubinho:
Ele atende: “Alô, fala logo que estou prestes a ganhar uma corrida e ainda tem um carro do CET ali na frente.”
O chefe da equipe fala cheio de sotaque:
– “LIL’ Rubens C’est a loko? Sai já da frente dele.”
– “Mas foi o destino que me colocou aqui hoje!”
– “Mio caro, o seu destino quem define soy yo.”
Schumacher passa, Vruummm.
– “Pô, não devia ter atendido essa ligação, pensei que era da Tim me oferecendo um plano mais barato…”
Daí veio a era Hamilton, foram mais 37 anos ganhando sem dó.
E agora prepare-se, chegou a era Red Bull. Suspeito que será mais longa que a era Chávez na Venezuela.
Agora triste mesmo é a missão dos comentaristas, tendo que apresentar poéticas histórias sobre as equipes perdedoras.
Os textos parecem extraídos do livro “Otimismo em pauladas”.
Tem aquele que aparenta se pentear com água e açúcar. Sinto que sua vontade é dizer:
– “Assim não dá, para tudo e vamos tentar o ano que vem. Aproveite seu domingo, vá jogar bocha ou acompanhe a série J do campeonato de várzea.”
Detalhe é que de quando escrevi esse texto até agora a Red Bull já ganhou mais umas 6 corridas pelo menos.
Como diz o ditado, saco vazio não para em pé, mas se quiser o saco cheio assista a essa temporada.
Bons sonhos!
Mensagem do Autor:
Nem tudo está perdido, aproveite para apreciar as sutilezas que a vida nos oferece e sempre escolha, em cada oportunidade, colher as flores da alegria.
30/5/2023
Amigo Fábio, os textos estão melhores a cada edição, parabéns! Nos transporta em segundos para uma época, com saudades, das trocas de tampinhas com o portugues da padaria, sensacional! Só te faço um pedido, continue. Abração
Maravilhoso Fábio!
Mal esperando por sua próximas reflexões
Bjs
Novamente se superando!! Um melhor que o outro. Obrigado
Parabéns Fábio, tem que reunir todas estas crônicas em um livro. Cada nova se supera. Continue com este projeto. Nos causa muito orgulho e alegrias
Fábio, ler seus textos é sempre uma alegria! Diversão garantida! Seu humor inteligente, sua tolerância zero digna de um italiano “roots” (hahahaha) são demais! Parabéns e obrigada por mais esse texto! Adorei!
Domenico, me diverti lendo seu seu texto!. Valeu! Obrigada por compartilhar!