Plim-Plim

Em um mundo dominado pela comunicação digital, com governantes que despacham por tuítes e políticos que fazem todo tipo de malabarismo por likes, esta semana eleitoral começa e termina diferente: será ocupada pela televisão. Odiada por petistas e bolsonaristas, a TV Globo reassume o protagonismo com as sabatinas do Jornal Nacional a partir de amanhã. E na sexta-feira, 26, inicia-se o programa obrigatório no rádio e na tevê.

Filhote da ditadura e das redes sociais, o presidente Jair Bolsonaro será o primeiro a ser entrevistado pelo JN, principal noticioso televisivo do país, que, mesmo longe dos tempos áureos de audiência, ainda é líder absoluto, chegando em média a 35% dos lares. Na ponta do lápis, cerca de 48 milhões de brasileiros de uma só vez. Mais do que o dobro do fabuloso número de 20,6 milhões de seguidores que o presidente tem no Instagram, o quádruplo dos 14 milhões do Facebook, e o quíntuplo dos 8,6 milhões do Twitter.

É claro que as mídias sociais têm peso na disputa, mas aquém do que os políticos imaginam. Ou seja, like é like, voto é voto. Pesquisa da Alfa Inteligência, publicada em junho pelo Valor Invest, aponta que apenas 2 em cada 10 brasileiros se informam sobre política pelas redes, e 61% preferem veículos tradicionais – sites de notícias (31%) e telejornais (30%). As redes aparecem com 19%, os impressos com 8% e o rádio com 3%.

Luiz Inácio Lula da Silva tem menos da metade dos seguidores do rival no Facebook e no Twitter – 5 milhões e 4 milhões respectivamente – e 5,8 milhões no Instagram, mas isso não tem tido impacto na sua liderança. Mantém-se  na casa dos 47 pontos na preferência do eleitor, 15 à frente de Bolsonaro segundo o último Datafolha.

O ex-presidente estará nos estúdios da Globo na quinta. Ciro Gomes será sabatinado na terça-feira e Simone Tebet fecha o ciclo, na sexta, mesmo dia em que candidatos a governador, a senador, a deputado federal e estadual inauguram o horário dito gratuito, que nas eleições municipais de 2020 custaram R$ 538 milhões em renúncia fiscal.

Metade do tempo do horário eleitoral para candidatos à Presidência da República será ocupada por Lula e Bolsonaro. Juntos, eles terão 188 minutos dos 375 previstos nos dois programas diários no rádio e na tevê, e 493 dos 977 minutos destinados às inserções veiculadas ao longo da programação, de 26 de agosto a 29 de setembro.

A coligação de Lula (PT. PCdoB, PV, PSOL, Rede, PSB, Pros, Solidariedade, Avante e Agir) tem direito a dois blocos de 3m39s e 289 inserções de 30s contra 2m38s e 207 inserções da de Bolsonaro (PL, PP, Republicanos). Simone Tebet (MDB, PSDB, Cidadania e Podemos) também terá tempo generoso, 2m20s e 184 inserções, aposta máxima de sua campanha. Sem coligações, Ciro Gomes (PDT) ficou à míngua, com apenas 52s em cada bloco e 68 comerciais em todo o período. Muito diferente da também solitária Soraya Thronicke, do União Brasil, com o quarto maior tempo: 2m10s e 170 inserções.

A propaganda no rádio e na televisão costuma ter poucas variantes. Entre os líderes nas pesquisas ela é, historicamente, um embate muito mais entre a genialidade ou imbecilidade dos marqueteiros do que dos candidatos. Tudo nela é perfumado para enfeitar o candidato e fedorento para execrar o oponente. Há medições diárias, testes prévios de comerciais com telespectadores, correção de rumo e adequação de promessas. Ou seja, uma publicidade pasteurizada, feita para agradar. Não à toa, vem perdendo terreno a cada eleição. Pesquisa Datafolha de 2020 apontou que 40% não consideram o horário eleitoral importante. Mais: em 59% dos casos, o voto se consolidou nas conversas com familiares, amigos e colegas.

Nos debates – que, segundo o ministro das Comunicações Fábio Faria, não contarão com Bolsonaro no primeiro turno – e nas entrevistas ao vivo, o papo é outro. Não dá para borrifar perfume. Muito menos se comparam às transmissões diárias e às lives semanais, nas quais Bolsonaro fala sozinho, sem contestação. Contrapontos, diga-se, o irritam profundamente. Basta ver a reação tresloucada que teve na quinta-feira diante de um youtuber provocador que lhe cobrava para ser mais à direita do que tem sido. Avançou para cima, puxou a camisa e tentou tomar-lhe o celular. Desequilíbrio puro.

Na sexta-feira, Bolsonaro topou se preparar para a entrevista de amanhã. Teria dispensado um treinamento de mídia, até porque, no caso dele, de nada serviria. Em seus mais de 30 anos de vida pública, quase 4 na Presidência, cultiva o ódio ao contraditório e, particularmente, aos jornalistas. Algo doentio. Não tem cura, quanto mais em um único final de semana. Mas se mentir direitinho, como de costume, pode até conseguir parecer bom moço na telinha.

Este artigo foi originalmente publicado no Blog do Noblat, em 21/8/2022. 

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