Apesar dos esforços em provar que no ditado “de médico e de louco, todo mundo tem um pouco” há um fundo de verdade, até agora o presidente Jair Bolsonaro só conseguiu provar que, em relação a ele, apenas a segunda parte da frase é verdadeira.
Nadando contra a corrente científica, Bolsonaro insiste em espalhar seus “conhecimentos médicos” quando sai por aí dizendo que não vai se vacinar porque está com a sua “imunização lá em cima”. Deu essa declaração na última quarta quebrando a promessa que havia feito de tomar a vacina assim que todos os brasileiros já estivessem vacinados.
Para a Ciência, isso não é verdade. Como o vírus é mutante, a mesma pessoa pode ser recontaminada várias vezes. Eu mesma conheço casos assim.
Disse também que se (hipótese remota, para ele) for contaminado, vai tomar cloroquina, ivermectina, azitromicina, tudo o que não manda o figurino médico. (Ele não mencionou, mas como é devoto de tratamentos ineficazes, provavelmente receberá aplicação de ozônio, se suas hemorroidas permitirem.)
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Por falar em hemorroidas, o presidente declarou nesta última quinta-feira, durante um evento evangélico organizado pela igreja Comunidade das Nações, que “chora sozinho no banheiro de casa” mas que sua esposa Michelle nunca assistiu e que ela o considera machão.
Segundo ele, chora porque tem muita responsabilidade nas suas costas e que uma decisão “mal tomada” pode repercutir negativamente na sociedade.
Supondo que isso seja verdade, será que neste momento reflete sobre seus atos? Será que rolam pensamentos tipo, eu aqui cagando num banheiro luxuoso tive a coragem de cortar a distribuição de absorvente pras meninas que nem podem ir à escola quando estão menstruadas?
Ou: se eu não fosse tão imbecil em ter negado vacina para a população no início da pandemia, teria evitado essas 600 mil mortes?
Se eu não tivesse torrado milhões com a fabricação de hidroxicloroquina, que não serve pra tratamento de Covid, e tivesse comprado respiradores para a população que morreu de falta de ar, não teria sido mais humano?
Se eu não influenciasse as pessoas e alguns hospitais a usarem medicamentos ineficazes, a contaminação e, consequentemente, as mortes teriam sido menos numerosas?
Se eu não estivesse tão preocupado com a reeleição, não deveria estar distribuindo dinheiro para a população que está roendo osso em vez de botar tudo na mão do Centrão?
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Honestamente, não acredito que Bolsonaro chore no banheiro. Pelo menos, não por esses motivos, apesar de ser esse um local adequado para refletir sobre as cagadas. Mas, para isso, primeiro teria de admitir que as comete.
Não é o caso. Na cabeça dele, faz tudo certo, a ponto de se irritar quando questionado sobre o absurdo número de 600 mil mortes pela Covid, como na semana passada, quando foi curtir feriadão no Guarujá: “não vim aqui me aborrecer”.
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“Chorar sozinho no banheiro” e citar a tão conveniente facada são só tentativas de provocar comoção num momento em que as pesquisas apontam que está chegando a hora em que só terá um tipo de trono pra se sentar.
E quando isso acontecer, aí sim vou acreditar que o “machão” da dona Michelle vai chorar no banheiro. E muito!
Esta crônica foi originalmente publicada em O Boletim, em 15/10/2021.