O que vejo todas as noites, a partir do sofá onde sento. Primeiro plano, a mesinha de centro com o copo de bebida e o pratinho com tira-gosto. Ao fundo, encostados na parede, a velha (antiga) cristaleira com seus copos, e o etager, peça menor, de quatro gavetas.
São móveis de estimação, tão bom vê-los… Mas, espere. Por que não mudar tudo? Sentir-me em um hotel, à frente de belíssima paisagem? Se alguém pensou em papel de parede, errou feio.
Ora, concluí, seguramente os equipamentos de geração de imagens por computação gráfica podem resolver isso. Minha sala vai “abrir-se” para magníficos cenários marítimos, ou de montanhas, lagos canadenses, a Baía da Guanabara…
Sim! Talvez. Quanto vai custar um bagulho desses? Valeria a pena sacrificar o Mustang de estimação, na garagem há tantos anos? Liguei para o Celsinho, um amigo da área. No dia seguinte (essas coisas são assim, pegar ou largar) estava na frente de um cobra no assunto.
Nem precisei me dar ao trabalho de vender o Mustang. O cobra ficou com ele, em troca do equipamento e da instalação. Pensei em convidar uns amigos para a estréia, mas desisti. Muita bagunça, queria paz.
À noite, sentei no sofá com uma garrafa de bom scotch, balde de gelo e tira-gostos especiais. Só, na sala escura e vazia (os velhos móveis que me desculpem, mas foram para um orfanato), comandei o primeiro cenário. Meu Deus, estou à frente dos Alpes!
Estive no Tejo e no Amazonas, em lugares indescritíveis, a bebida descendo bem. Lá pelas tantas, fiquei diante de um bosque lindíssimo, com o vento roçando a copa das árvores. Na sala, estava muito calor. Levantei, peguei o copo e resolvi sair ao terraço para tomar ar. Atravessei a sala e quebrei a cara na parede. O copo se estilhaçou, feriu minha mão. Escorreguei no gelo esparramado e fui para o chão.
Amanhã vou ao amigo do Celsinho pedir meu Mustang de volta.
Janeiro de 2018