No tempo das redações com bom humor

Flash: O JORNALISMO VEIO A FALECER.

(não segue ampliação)

Quando Sandro Vaia escreveu isso, no dia 9 de julho de 1991, às 17h33, num formato que imitava os flashes da Broadcast, o serviço em tempo real da Agência Estado para o mercado financeiro, era um chiste, uma brincadeira, uma boutade, uma gozação. Um bom exemplo do humor que havia nas redações, de uma maneira geral, e em especial nas redações que tinham a felicidade de contar com o talento de Sandro Vaia.

Hoje, passados céleres, rapidíssimos 26 anos, a boutade de Sandro parece uma triste, apocalíptica profecia.

Mas isto aqui não é, de forma algum, um texto para lamentações. Muito contrário. É mais um capítulo das aventuras de Indiana Jones e o Reino dos Suportes Físicos – as minhas descobertas de coisas esquecidas, ou quase, na selva da papelada do apartamento, que tive que revirar todinha primeiro para a descupinização, e depois para a pintura que a Mary aproveitou para mandar fazer.

Das profundezas das gavetas, das pastas suspensas, dos buracões do escritório, das caixas no alto dos armários embutidos surgiram coisas absolutamente fantásticas – em meio à areia do tempo, é claro, em meio a coleções de velhas revistas, contas pagas entre 1991 e 1997, extratos bancários das últimas três décadas, teias de aranha, ninhos de rato, escorpiões, etc, etc, etc…

O print com o flash do Sandro estava numa pasta chamada “O que vai ficar da nossa passagem pela Agência Estado”. Numa outra gaveta, distante, havia uma pasta com a anotação: “Piadas, folclore, vida, lembranças” – tudo de coisas relacionadas ao trabalho, coisas das redações.

Por que raios havia duas pastas diferentes contendo coisas similares não vou saber jamais explicar – mas é necessário dizer que sou um sujeito extremamente organizado para guardar papéis. Quando Mary quer guardar um documento importante, me entrega, deixa nas minhas mãos.

***

Perto do flash do Sandro encontrei um texto mais longo, um notícia  assinada por Eduardo Castor, Eduardo Borgonovi e Silva, o grande Castor, uma das inteligências mais brilhantes que já passaram pelas redações que conheci, amigo de sempre do Sandro, de Jundiaí como ele. O título é

Infocast: Atex acaba de cair. Mas está passando bem.

Como é uma piada interna, private joke, é preciso explicar: Infocast era um produto que a Agência Estado estava desenvolvendo em 1995, voltado para o mercado empresarial como um todo. Eu chefiava uma equipe que trabalhava como se o produto já estivesse no ar, mas havia sérios problemas de tecnologia. o sistema caía a toda hora – o sistema era o Atex, uma coisa que já era velha quando o Grupo Estado o comprou para começar a se informatizar, ali por 1988, 1989.

Eis a matéria do Castor. É fundamental lembrar que ela foi escrita no governo FHC.

São Paulo, 6 – Servaz, Rô, Cláudia, Lúcia e o interino Castor decidiram há poucos minutos encerrar o expediente. Isso se deve, segundo o ministro das Comunicações, Lauro de Lauro (este era de fato o nome do sujeito que cuidada da área de tecnologia da Agência), a uma queda no sistema Atex.

Apesar da séria queda, o sistema Atex passa bem, não tendo sido registrada nenhuma fratura mais séria. (…)

“O problema é o governo”, denunciou Lula, ao saber da queda do Atex. “Se estivéssemos em plena democracia, como prometeu o Fernando Henrique na campanha, isso não teria acontecido e seriam respeitados os direitos dos trabalhadores.

José Genoino, por sua vez, disse estar preocupado com os reflexos da queda do Atex, pois ela afeta a plena cidadania defendida pela Democracia Radical.

O presidente Fernando Henrique fez apenas ligeiros comentários: “O importante é defender os princípios democráticos. Isso é o que eu sempre digo. Vamos resolver a quedas do Atex com calma e tranquilidade, fazendo tudo certinho, sem violar o direito de ninguém. (Eduardo Castor).

***

Muitos anos depois da brincadeira do Castor escrita aí em 1995 ou 1996, no triste dia de outubro de 2006 em que Lula foi reeleito presidente, um bando de colegas se deu ao trabalho de fazer uma capa do Estadão de brincadeirinha só para encher meu saco.

Toda a arte é bem feita – creio que tem os dedos do grande Arnaldo Afonso aí.

A maior sacanagem de todas vai lá no pé da página:

“Lula promete CD com seus melhores discursos para Servaz ouvir sua voz maviosa durante as férias.”

***

Muitos anos antes da brincadeira do Castor de 1995, 1996, antes mesmo de sairmos todos do Jornal da Tarde para a revista Afinal, em 1984, a dupla Gepp & Maia tinha feito um precioso desenho da dupla Sandro Vaia e Anélio Barreto, com narigões à la Paulo Maluf, dizendo que iriam me pagar uma grana que me deviam. (O Jornal da Tarde publicava na capa o desenho de Maluf com o nariz grande e o título: “Faltam tantos dias para a Paulipetro descobrir petróleo…”)

O fato de o copydesk Sérgio Vaz ter tido dinheiro para emprestar para os editores Sandro e Anélio, que ganhavam duas vezes mais, é de difícil explicação, e portanto nem vou entrar nessa seara.

Apenas acho o desenho uma maravilha.

E ainda tem muito, mas muito texto e imagem de bom humor de redação que Indiana Jones descobriu no meio das areias que guardam tanto suporte físico neste apartamento… Virão em outros capítulos.

26/12/2017. 

Para ler o capítulo 1.
Para ler o capítulo seguinte.

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