É, Lula não é mais o mesmo. O presidente que garanteava ter tirado milhões de pessoas da miséria, transformado o Brasil num país maravilhoso, em que a saúde pública é excelente (lembram-se disso?); que libertou o país das garras do FMI, que deu ao país a auto-suficiência em petróleo; que prometeu que o pré-sal faria a felicidade geral de todos os brasileiros…
O presidente que merecia o Nobel, a secretaria-geral da ONU – e por que não também o papado? Um lugar à direita de Deus Pai?
Pois é. Hoje é um homem sob seriíssimas suspeitas de enriquecimento ilícito, assim como dois de seus filhos. Até a nora é suspeita de ter levado uns milhõezinhos.
A Petrobrás definhou em 13 anos de governo petista, virou o epicentro do maior caso de corrupção da história do Brasil. Nisso, sim, ele estava certo quando perdigotava ad nauseam a expressão “nunca antes na história deste país”.
De fato: nunca antes na história deste país houve tanta corrupção, tanta ladroagem, tanta lassidão moral como nos governos dele e do poste que ele inventou.
O poste, este conseguiu a proeza de enfiar o país no buraco sem saída de uma recessão profunda, com dívida pública altíssima, inflação beirando os dois dígitos e desemprego crescente. Dias atrás chegou-se ao número absurdo de 1.240.000 de postos de empregos fechados no período de um ano. Um milhão e duzentos e quarenta mil empregos perdidos!
Na véspera de o ex-Deus de Garanhuns completar 70 anos, a Polícia Federal, em uma operação anticorrupção, fez buscas no escritório de um dos Lulinhas.
E, na mesma semana dos 70 anos do presidente mais importante que este país ou qualquer outro pais já teve, eram divulgadas pesquisas de opinião público mostrando que
- 55% dos brasileiros ouvidos pelo Ibope dizem que não votariam de jeito nenhum em Lula para presidente da República; a rejeição a todos os políticos mais conhecidos nacionalmente é grande, mas a rejeição a Lula é a maior de todas; e
- Lula não ganharia a eleição para presidente da República hoje; segundo levantamento MDA/CNT, ele não fica na frente nem na intenção de voto espontânea, nem em qualquer um dos cenários na pesquisa estimulada.
Mas o pior de tudo – é o que eu fico imaginando aqui do meu cantinho –, o horrorosamente pior de tudo, na cabeça de Lula, é que esse inferno astral dele ocorre justamente num momento em que Fernando Henrique Cardoso brilha.
Lula já demonstrou centenas de vezes, talvez milhares, que tem um problema seriíssimo com FHC. É um antagonismo visceral, figadal, profundíssimo, doentio.
Tudo o que FHC faz, Lula faz questão de menosprezar, desdenhar, e garantir que ele faz muito melhor.
É de fato um ciúme descontrolado, uma inveja patológica, coisa para ser encarada em cinco sessões de análise por semana durante uns 15 anos seguidos.
É uma coisa tão gigantesca que passou, como se por osmose, para o lulo-petismo como um todo. O PT não consegue fazer absolutamente nada sem comparar o que foi feito com algo do PSDB.
E então os deuses – esses safados, Lula deve estar pensando – resolveram que, além do inferno astral todo, ainda por cima é preciso ver FHC dando entrevista nos principais jornais, sendo capa da Veja, matéria farta lá dentro – e ainda por cima bonitão, bem vestido, elegante, sorriso aberto na cara! -, e entrevista no Roda Viva, e dá-lhe repercute da entrevista no Roda Viva em tudo que é jornal.
Afe! Que horror, que horror, que horror. Valham ao Lula o Fidel, o Chávez, o Che, a companheirada toda!
***
Há uns dois dias eu vinha pensando em cometer um texto sobre essa coincidência do inferno astral de Lula com toda a badalação em torno de Fernando Henrique por causa do lançamento do primeiro volume dos Diários da Presidência.
Eliane Cantanhede escreveu antes de mim – e num texto, evidentemente, muitíssimo elegante, charmoso, qualidades que o meu definitivamente não tem. Meu texto jus sperneandi, perto do de Eliane, é quase como o Lula ao lado de Fernando Henrique. Digo quase por nada, absolutamente nada, nem sequer o meu texto, se compara à comparação entre os dois.
E Carlinhos Brickman também falou do inferno astral de Lula, em outro texto elegante;
Transcrevo:
Fim de festa
Artigo de Eliane Cantanhede no Estadão de 28/10/2015.
Luiz Inácio Lula da Silva completou 70 anos ontem sem festa, sem choro nem vela, vendo seu legado ir para o ralo pela enxurrada da Lava Jato e pelo desastre do governo Dilma Rousseff e, não bastasse, esperneando e se rebelando contra a primeira batida policial nas empresas de um dos filhos. Podem vir outras. E podem atingir outros filhos. Não haveria um presente mais amargo de aniversário.
Quanto mais Lula afunda nos próprios erros, mais o antecessor Fernando Henrique Cardoso emerge e se livra do carimbo da “herança maldita”, sem esconder a mágoa nem demonstrar clemência contra o antigo algoz.
Em entrevista ao Roda Viva, da TV Cultura, justamente no dia da busca e apreensão na empresa de Luís Cláudio Lula da Silva, FHC voltou a dizer que considera Dilma “pessoalmente honrada”, mas fez uma ressalva em relação a ela e lançou uma rede de suspeição em direção a Lula. Segundo ele, Dilma tem “responsabilidade política” por tudo isso. E ele negou-se a defender Lula: “Tenho de esperar para ver. Tem saído muita coisa que tem de ser passada a limpo”.
A entrevista foi a propósito do primeiro volume de Diários da Presidência, que reproduz o relato oral de Fernando Henrique sobre o seu dia a dia nos dois primeiros anos de governo, 1995 e 1996. Na página 502, de março de 1996, ele fala algo que continua extraordinariamente atual, quase vinte anos depois. Algo que tanto Dilma quanto o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, poderiam repetir quando “acusados” de lavar as mãos diante da pressão da PF sobre o filho (ou os filhos) de Lula.
Abordado pelos senadores aliados José Sarney, Gilberto Miranda e Jader Barbalho, incomodados por multas aplicadas a suas empresas por órgãos do governo, FHC dava de ombros: “Sei lá como foi…” E argumentava, como cabe hoje a Dilma e a Cardozo fazer, em defesa própria junto a Lula e ao PT: “O problema é que eles (parêntesis meus: os de ontem e os de hoje) não estão entendendo que o Brasil mudou mesmo e que, ainda que eu quisesse abafar esses casos, não conseguiria. E não quero. Não quero perseguir, mas também não quero encobrir”.
Sem defesa para esse monte de empresas e de histórias de seus filhos, Lula parte para o ataque. Não só contra a imprensa, também contra Dilma e contra Cardozo, que “não controlam a PF”. Como se fosse simples. E como se fosse certo.
Em entrevista ao Estado, depois de depor na PF sobre eventuais relações com lobistas, o ex-ministro e fiel lulista Gilberto Carvalho disse, em outras palavras, que “quem não deve não teme”: “Estou muito sereno. Deixei o governo com o mesmo patrimônio que tinha quando entrei”. Será que Lula está sereno? E será que seus filhos saíram do governo dele com o mesmo patrimônio que tinham quando o pai entrou?
Quem vai à minha casa encontra logo na sala um livro quadrado, com a foto de um garoto de olhar vivo, esperto. Trata-se de O menino Lula, escrito pelo jornalista Audálio Dantas, um dos mais respeitados do País, contando a história da criança pobre, nascida nos rincões do Nordeste, que cruzou o País num pau de arara, comeu o pão que o diabo amassou e virou tudo o que virou.
O livro está ali, à mão, para tentar um equilíbrio entre o homem público e a pessoa, o presidente endeusado e o ex-presidente demonizado. Talvez esteja em cada linha, em cada momento, em cada desgraça, uma explicação para tudo o que Lula fez, permitiu fazer e induziu os filhos a fazerem no usufruto do poder. Obviamente, explica, mas não justifica. Nada justifica que Lula tenha cedido a todas as tentações e arriscado o próprio legado (da inclusão social) pelo descaramento, megalomania, ambição. O menino Lula e o grande líder sindical Lula não mereciam que o presidente Lula fizesse isso com eles.
É sal, é sol, é sul.
Coluna de Carlos Brickman
O mais importante líder sindical que o Brasil já teve chegou a presidente da República, elegeu a sucessora, virou personagem internacional, viajou o mundo inteiro. Mas, ao completar 70 anos, ontem, tudo o que não queria de presente era mais uma viagem. E há chances – não muitas, diga-se – de que seja a Curitiba.
Data redonda e triste: até o frango com polenta marcado para seu restaurante preferido dos tempos antigos foi cancelado, diante dos problemas que o afligem. Só sobrou festa chique, com a presidente. A busca e apreensão nos escritórios do filho Luís Cláudio, na véspera do aniversário, foi um golpe tremendo. Amigos atingidos, tudo bem, deixa pra lá: Lula esqueceu companheiros próximos, a quem chamava de Guerreiros do Povo Brasileiro, e chegou a insinuar que o empresário José Carlos Bumlai, que tinha entrada livre no Palácio durante seu Governo, não era tão amigo assim. Mas filho é filho – e é o segundo a virar alvo de suspeitas.
É duro sentir que, exceto os alucinados do lulismo a todo custo (e, muitas vezes, a que custo!), até parceiros antigos, dos tempos anteriores ao Romanée-Conti e aos jatos executivos, hesitam em jurar por ele.
O jornalista Ricardo Kotscho, lulista da velhíssima guarda, amigo fiel e excelente assessor de imprensa de seu Governo, escreveu frases reveladoras (http://noticias.r7.com/blogs/ricardo-kotscho/): “Estou muito triste com tudo isso que está acontecendo, mas na vida a gente colhe o que plantou, de bom ou de ruim, de acordo com as escolhas que fazemos. De nada adianta colocar a culpa nos outros”.
28/10/2015
Tome!
Tome!