Essa é a vida que eu quis

Entre 13 e 22 de setembro de 2024 o Rio de Janeiro sedia o Rock in Rio, cuja primeira edição começou em 11 de janeiro de 1985, quando o Brasil passava por um momento histórico de transição política.

Na noite do 15 de janeiro, 200 mil jovens se reuniram na Cidade do Rock, em Jacarepaguá, para assistir à apresentação do Barão Vermelho. Muitos vestiam verde e amarelo ou seguravam bandeiras do Brasil, em um clima de intensa brasilidade. Cazuza, após cantar “Pro Dia Nascer Feliz”, emocionou a multidão ao dizer: “Que o dia nasça feliz para todo mundo amanhã. Em um Brasil novo, uma rapaziada esperta.”

Esse momento coincidiu com a eleição indireta de Tancredo Neves como presidente da República, marcando o início da transição para a democracia. O regime militar estava sendo deixado para trás, não por meio de revoluções violentas, como imaginavam os movimentos radicais dos anos 70, mas através de um processo de negociação e luta política gradual.

A ditadura não caiu de forma abrupta. Ela foi desmantelada pela pressão popular, especialmente pela campanha das Diretas Já e pela articulação dentro dos limites legais do regime. Após a derrota da Emenda Dante de Oliveira, que propunha eleições diretas, foi necessário buscar novas formas de seguir adiante. A vitória de Tancredo no colégio eleitoral foi uma ponte entre o passado e o futuro, entre o Brasil militar e o Brasil democrático de hoje.

Apesar de obstáculos, como a ausência do PT no colégio eleitoral, que se recusou a participar e puniu parlamentares que votaram em Tancredo, a transição seguiu.

Embora Tancredo tenha morrido antes de assumir a presidência, sua eleição foi um marco, e a democracia continuou a se fortalecer, culminando na Constituinte de 1988, nas eleições diretas – finalmente – em 1989 e na estabilização econômica dentro do Estado de Direito.

O Rock in Rio capturou esse espírito de renovação. Cazuza e sua geração acreditavam em um Brasil novo, um país que buscava deixar para trás a repressão e a censura. A mensagem de Cazuza naquele 15 de janeiro de 1985, “Pro dia nascer feliz”, ainda ressoa. O Brasil se reencontrava consigo mesmo, em um momento de coesão e esperança no futuro. Naquela noite, o país acordava para uma nova era.

O desafio de hoje é manter vivo o espírito de transformação e reencontro com nossos valores democráticos. Assim como em 1985, quando a juventude sonhava com um Brasil melhor, é com mais democracia que vamos superar as crises políticas atuais e construir um futuro mais justo. A mensagem de Cazuza segue atual: “Pro dia nascer feliz / Essa é a vida que eu quis / O mundo inteiro acordar / E a gente dormir”.

Este artigo foi originalmente publicado no Blog do Noblat, em 18/9/2024. 

 

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