As lições do Ideb

Muito se falou sobre o resultado frustrante do Índice de Desenvolvimento do Ensino Básico – Ideb – de 2023, revelado recentemente. De fato, os números falam por si. Temos um quadro crítico nas etapas finais do ensino fundamental e médio, especialmente no ensino médio, tão decisivo para o futuro de nossos jovens. Atingimos a meta apenas nos anos iniciais do ensino fundamental.

É preciso ir além de manifestar nosso inconformismo com esse quadro, cuja dimensão adquire visibilidade a cada rodada do sistema de avaliação da educação. Impõe-se adotar um sentido de urgência em generalizar, em escala nacional, experiências bem sucedidas, comprovadas por evidências científicas. Esse é o grande desafio do MEC. Dar dimensão e escala a políticas públicas vitoriosas adotadas por governos estaduais e municipais.

Em outras palavras, compete ao Ministério da Educação o esforço nacional para levar adiante reformas estruturais, muitas já praticadas a décadas por países mais bem colocados no sistema internacional de avaliação – PISA. Em seu livro “Pontos fora da curva”, Olavo Nogueira, diretor executivo do Todos pela Educação chama a atenção para duas políticas educacionais exitosas que fizeram a diferença nos estados nos quais foram levadas a prática.

São elas o Programa de Alfabetização na Idade Certa, adotada de forma pioneira pelo Ceará a partir da generalização da experiência bem sucedida do município de Sobral e o Programa de Ensino Integral, pioneiramente implementado pelo Estado de Pernambuco. Essas duas políticas públicas foram assumidas por outros estados, com impacto positivo no seu desempenho no sistema de avaliação da educação.

Não gratuitamente, no Ideb de 2023, 68 escolas das cem mais bem colocadas dos anos iniciais do ensino fundamental são do Ceará. Também existem fartas evidências de que as escolas de tempo integral têm um desempenho melhor do que as escolas tradicionais. O próprio Ideb e pesquisas anteriores comprovam isso. Também já demonstravam os benefícios para o aprendizado dos alunos e para o futuro de nossos jovens, seja para seu ingresso no mercado de trabalho, seja para ingressar no ensino superior.

A grande diferença desta política educacional é, de fato, na aprendizagem do aluno. Estima-se que um ano de Português e Matemática em ensino integral equivale a três anos de uma escola com carga de cinco horas de aula. Isso tem impacto direto no acesso ao ensino superior e ao mercado de trabalho.

Como demonstrou o Ideb, o ensino médio é hoje a etapa mais crítica do nosso sistema educacional, para os quais o MEC deveria voltar suas atenções. Nele os problemas da evasão escolar, repetência e defasagem idade-série se manifestam com maior ênfase. Isto tem muito a ver com o modelo adotado no Brasil inteiramente descolado da realidade dos alunos e enfadonho, que não os prepara para a vida.

A reforma do ensino médio de 2017 veio para corrigir esse problema, ofertando uma grade curricular flexível, com a combinação de uma formação educacional básica e itinerários formativos para os alunos se aprofundar em áreas de seu interesse. Sua implementação gerou novos problemas, muitos deles decorrentes de ter acontecido em meio da pandemia e, especialmente, pela omissão do MEC no governo Bolsonaro.

Era necessário seu aperfeiçoamento, mas, em função de um viés ideológico, no governo Lula 3, isso se deu por meio de um processo arrastado, assembleísta, que durou mais de um ano até chegar ao Congresso Nacional onde teve novos avanços e recuos. Em grande medida, esses problemas explicam por que no último ano do ensino médio os alunos tiveram a pior performance no Ideb de 2023

Tudo é urgente na educação, mas fazer acontecer a reforma do ensino médio com foco no aprendizado dos alunos de forma estimulante, não é urgente, é urgentíssimo. Essa deveria ser a maior prioridade do MEC, no momento atual. Do contrário, o Ideb de 2025 mostrará o mesmo quadro de hoje. O risco é real.

São sobejamente conhecidas as reformas estruturais necessárias para o salto de qualidade da educação básica. Não há uma reforma mágica, uma bala de prata da Educação. Para lograrem êxitos as reformas devem ter medidas articuladas dentro de uma visão sistêmica.

O caminho das pedras existe. Experiências exitosas, muitas delas por iniciativas de estados e municípios, tem em comum a priorização do ensino integral, formação adequada dos professores, material didático estruturado, avaliações periódicas da aprendizagem, reforço escolar, gestão escolar baseada em critérios técnicos e, sobretudo, um efetivo sistema de colaboração e coordenação entre os entes federativos que envolva gestores, professores, alunos, famílias e comunidade.

Essas são as lições do último Ideb. Cabe ao MEC entender o seu recado e assumir seu papel de liderança na mudança necessária.

Hubert Alquéres é presidente da Academia Paulista de Educação. Foi Secretário de Educação do estado de São Paulo e professor na Escola Politécnica da USP.

Este artigo foi originalmente publicado no Blog do Noblat, em 12/9/2024. 

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