Jornalistas… telefonistas… O que tinham a ver uns com as outras, nos tempos da pré-informática? Veja esta situação. Em certa madrugada de julho de 1979, este que vos escreve estava deitado na cama de um hotel de Manágua, na Nicarágua, olhando para o teto. Um tanto desolado. O dia anterior havia sido de grande agitação, diante da possibilidade de que o ditador Anastásio Somoza deixasse o poder. Os guerrilheiros sandinistas estavam cada vez mais próximos.
No meio da noite vem a bomba. Somoza passara o poder para o presidente da Câmara e deixara a Nicarágua. Os jornalistas correm para os telefones… e descobrem que o ditador fizera sua última patifaria. Mandara bloquear as comunicações.
No caso do Estado/ Jornal da Tarde, havíamos combinado que a telefonista ligaria em certa hora da noite para o meu quarto de hotel. Passaram-se as horas, e nada. De repente, o telefone toca! Atendo e ouço a voz nítida e animada da nossa telefonista. As comunicações haviam sido restabelecidas. Pedi à minha salvadora que me transferisse para o César Camarinha, na secretaria gráfica.
Ditei suscintas informações, Camarinha deu um “parem as máquinas” no pessoal da gráfica, e o JT saiu com o titulão “Caiu o ditador Somoza”, mais sete linhas de texto, no alto da primeira página. O Estado e outros jornais fechavam mais cedo, não deram a novidade, só o material enviado antes dela.
Por estes dias, lembrando casualmente destes fatos, me ocorreu: por que, naquela madrugada, não perguntei o nome da telefonista? Por que, quando voltei da viagem, não busquei por ela para agradecer? Ela foi determinada, ficou mais de duas horas tentando até conseguir. Fica, pelo menos, este registro.
Dez anos depois, 1989, Luíza Erundina, eleita prefeita de São Paulo, viaja para a cidade onde nasceu, Uiraúna, no sertão da Paraíba. Para passar seus textos, os repórteres que cobriam a viagem tinham que buscar a agência da Companhia Telefônica, em uma cidade vizinha. Levei comigo um colega do Diário Popular, tradicional jornal paulistano, hoje extinto. Na Telefônica pedi ligação a cobrar para o jornal. Entrei na cabine, a telefonista do Estado/JT atendeu e me transferiu para quem eu ditaria o texto. Perfeito.
Então, foi a vez do colega do DP. Nada feito, a telefonista não aceitou a ligação a cobrar (e a verba de viagem seria insuficiente para gastar com interurbanos).
Falei novamente com o Estado/JT, e expliquei à telefonista o problema do colega. Ela ligou para sua equivalente no DP, narrou a situação. Assim, o repórter que havia trabalhado o dia inteiro na cobertura dos fatos, e redigido seu texto, pôde passá-lo ao jornal. De tudo, só lamento um detalhe. Também não fiquei com o nome desta colega, se posso, com muito gosto, chamá-la assim.
Este texto foi originalmente publicado no blog Vivendo e Escrevendo, em 1/2024.