Só não sabe que Jair Bolsonaro é uma ameaça real à democracia quem não quer ver. O sujeito passou quatro anos pregando contra as instituições democráticas. Cientistas políticos não se cansam de apontar que é no segundo mandato que políticos autoritários e autocráticos usam todos os instrumentos disponíveis para acabar de vez com o estado de Direito.
Foi assim na Venezuela, tem sido assim na Rússia, na Hungria, na Polônia, seguramente será assim se os brasileiros fizerem a loucura suicida de dar mais quatro anos no poder a esse monstro fanático pela morte, pela tortura e pela ditadura.
Mas isso – por pior, por mais apavorante que seja – não é o maior problema.
Mais ainda do que uma ameaça à democracia brasileira, Jair Bolsonaro é uma ameaça ao planeta Terra.
Não é figura de linguagem, exagero, hipérbole. Infelizmente, é apenas e tão somente a verdade dos fatos.
Porque o problema quanto a Jair Bolsonaro e o meio ambiente não é apenas que ele seja um negacionista.
Negar que estamos diante de um gravíssimo quadro de mudanças climáticas, não fazer nada diante dele, isso já é grave – como foi grave o negacionismo diante da pandemia de coronavírus. Isso ficou demonstrado por uma imensidão de estatísticas. Os países cujos governantes negaram as evidências da pandemia tiveram mais mortes, demoraram mais a diminuir o número de casos. A demora absurda do desgoverno Bolsonaro em comprar vacinas fez com que o país tivesse esse pavoroso número de mais de 680 mil mortos pela doença.
Negar que haja problema já é muito ruim – mas Bolsonaro faz muito mais que negar que haja problemas com o meio-ambiente, que haja desmatamento da Amazônia, a maior floresta tropical do mundo.
Antes fosse.
Bolsonaro e seu desgoverno atuam de todas as maneiras possíveis e impossíveis para ampliar a destruição da floresta. O ex-ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, falou a frase agora famosa: era para o governo aproveitar que as atenções estavam voltadas para a pandemia e passar a boiada.
É bom lembrar a frase completa: “Precisa ter um esforço nosso aqui, enquanto estamos nesse momento de tranquilidade no aspecto de cobertura de imprensa, porque só se fala de covid, e ir passando a boiada, e mudando todo o regramento (ambiental), e simplificando normas”.
O desgoverno tem passado a boiada com uma eficiência que não demonstra em qualquer outra área. Os órgãos encarregados de combater o desmatamento foram sucateados, a fiscalização deixou de existir; a ação dos madeireiros, grileiros e garimpeiros não apenas é tolerada como também incentivada.
Como disse O Globo em editorial na segunda-feira, 10/10: “Certamente será lembrado que Salles cumpriu com eficiência a determinação do Planalto para desmontar o arcabouço de fiscalização ambiental, assentado no Ibama e no ICMBio. Está aí a maior causa do crescimento recorde da devastação na Amazônia e da invasão de terras públicas e indígenas por garimpeiros.” (A íntegra do editorial vai mais abaixo.)
Bolsonaro e seu desgoverno não têm nada de positivo a apresentar. Não obtiveram vitória, avanço algum, em qualquer área.
Agora, na destruição da floresta, os números que eles conseguiram são fantásticos. Inigualáveis.
Nunca nenhum governo de país algum acelerou tanto em tão pouco tempo as mudanças climáticas que ameaçam o planeta.
Daqui a pouco, quando se completarem os quatro anos de Bolsonaro, o país terá perdido um total de 47 mil km² de florestas na Amazônia, segundo as estimativas do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe). A devastação entre 2019 e 2022 foi 60% maior do que o registrado nos quatro anos anteriores nos governos Dilma Rousseff (PT) e Michel Temer (MDB).
“A área desmatada na gestão Bolsonaro é maior do que todo o Estado do Rio de Janeiro, por exemplo, com seus 43 mil km²”, explicitou reportagem de André Borges no Estado de S. Paulo. “Se esse estrago for comparado com a extensão da cidade de São Paulo, equivale a dizer que, durante o governo do atual presidente, uma área de floresta equivalente à capital paulista foi desmatada a cada 45 dias.”
“Segundo o Inpe, o volume de desmatamento já consolidado de 2019, 2020 e 2021 soma 34 mil km² de vegetação perdida. Neste ano, segundo os especialistas, uma projeção extremamente conservadora indica, pelo menos, mais 12 mil km² de derrubadas, mas os indicativos são de que esse volume de 2022 deve ficar próximo de 15 mil km².
“Esses números estão fora da curva histórica. Os dados do Inpe indicam que, nos quatro anos anteriores, de 2015 a 2018, o volume total de desmatamento da Amazônia chegou a 28.583 km².”
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A reportagem citada acima foi publicada na quinta-feira dia 6/10. No dia seguinte, sexta, 7/10, saíram os números referentes ao mês de setembro – e eles são apavorantes. Eis o que mostra reportagem do portal G1, assinada por Roberto Peixoto:
“O acumulado de alertas de desmatamento em setembro de 2022 na Amazônia foi de 1.455 km², segundo dados divulgados nesta sexta-feira (7) pelo Instituto de Pesquisas Espaciais (Inpe). É o pior setembro da série histórica do Deter, que começou em 2015.
“O número representa um crescimento de 47,7% em relação a setembro do ano passado e equivale ao tamanho da cidade de São Paulo em área. O segundo pior número da série foi registrado em 2019, no primeiro ano do governo Bolsonaro (PL). Na época, os alertas para setembro chegaram a 1.454 km².
“No acumulado de 2022, as áreas de alerta de desmatamento já somam 8.590 km², um número 4,5% maior do que todos os alertas do ano passado.
“Segundo o Observatório do Clima, o índice preocupa porque pode igualar ou até mesmo superar nos próximos três meses que restam do ano o recorde histórico de 2019 (9.178 km²).
“Tudo isso num contexto de altos índices no começo do ano. Janeiro e fevereiro de 2022 acumularam recordes de desmatamento no Brasil, algo incomum, visto que estes são meses chuvosos na maioria dos estados que englobam o bioma, e as taxas de desmatamento são tipicamente menores durante esse período.
“’Bolsonaro foi, afinal, o presidente que até hoje se orgulha em dizer que desmontou a fiscalização ambiental e que não demarcou nenhum centímetro de terra indígena’, avalia o Observatório do Clima.”
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Pode-se criticar os governos de Luiz Inácio Lula da Silva por uma série de motivos – mas não na questão do respeito ao meio-ambiente e à luta pela preservação da Floresta Amazônica. Em especial durante o período em que Marina Silva foi a ministra do Meio Ambiente.
Quando Marina Silva anunciou o apoio à candidatura de Lula, no dia 12 de setembro, o site da Deutsche Welle publicou um bom artigo, assinado por Thomas Milz, lembrando que a ambientalista, “companheira de luta do líder seringueiro Chico Mendes”, “comandou a pasta ambiental entre 2003 e 2008 e foi responsável por melhorarias significativas nos índices de desmatamento”:
“Com o aumento da fiscalização das áreas de proteção, a taxa de desmatamento encolheu de quase 28 mil quilômetros quadrados em 2004 para menos de 5 mil quilômetros quadrados em 2012. Ficou claro pelas falas de Lula e Marina nesta segunda-feira (12/09) que, caso Lula seja eleito, os dois querem voltar a impor uma fiscalização rígida na Amazônia, com tolerância zero para garimpeiros e madeireiros.
“Isso é um sinal forte para antigos parceiros internacionais que se afastaram do Brasil por causa da política ambiental de Jair Bolsonaro (PL), como os governos da Alemanha e da Noruega, que financiaram o Fundo Amazônia para combater a destruição da floresta. Também é um sinal positivo para uma reaproximação com a União Europeia e os Estados Unidos de Joe Biden, depois do afastamento durante o governo Bolsonaro também devido à política ambiental.”
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Em ótimo e necessário editorial na segunda-feira, 10/10, O Globo afirmou que “o retrocesso do governo Bolsonaro impõe urgência na revisão de projetos nocivos ao meio ambiente”. Aqui vai a íntegra:
Agenda ambiental desafiará novos congressistas
Marcado pela polarização entre a direita bolsonarista e a esquerda liderada pelo PT, o Congresso que assume em 1º de fevereiro de 2023 será acompanhado com especial atenção pelos ambientalistas. Espera-se uma relação tensa entre os dois blocos em torno de projetos-chave para o meio ambiente, já bastante castigado nos quase quatro anos do governo Bolsonaro.
A eleição para a Câmara da ex-ministra do Meio Ambiente Marina Silva (Rede-SP) e de seu sucessor na gestão Bolsonaro, Ricardo Salles (PL-SP), é garantia de duros embates no plenário. Certamente será lembrado que Salles cumpriu com eficiência a determinação do Planalto para desmontar o arcabouço de fiscalização ambiental, assentado no Ibama e no ICMBio. Está aí a maior causa do crescimento recorde da devastação na Amazônia e da invasão de terras públicas e indígenas por garimpeiros. Marina, que se demitiu no segundo governo Lula por não sentir apoio para endurecer as medidas de proteção, reconciliou-se com o ex-presidente e será ardorosa defensora de seu trabalho. Seu período na pasta marca a maior queda do desmatamento na região.
Caso o ex-presidente Lula vença Bolsonaro no segundo turno, ambientalistas estão convencidos de que haverá uma corrida no Congresso para aprovar em regime de urgência projetos nocivos. Um deles foi apelidado PL da Grilagem, já aprovado na Câmara e remetido ao Senado. Originado de uma Medida Provisória assinada por Bolsonaro, visa a facilitar a regularização de propriedades em terras da União. Em outras palavras, legaliza invasões. Levantamento do Núcleo de Altos Estudos Amazônicos, da Universidade Federal do Pará, e do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (Ipam) estima que mais de 14 milhões de hectares dos 50 milhões de hectares de terras públicas na região estão registrados como propriedades particulares. Uma votação em rolo compressor no Senado poderá subtrair da União quase 30% das reservas.
Outra preocupação, além de mudanças que enfraqueçam o Código Florestal, é o projeto que regulamenta o uso de defensivos agrícolas ou pesticidas, alcunhado Lei dos Agrotóxicos. Aprovado no Senado e alterado na Câmara, ele precisa voltar aos senadores. Eles serão pressionados a reinstaurar no texto da lei o Ibama e a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) como órgãos fiscalizadores desses produtos, omitidos por uma barbeiragem. É o que precisa ser feito, em defesa da saúde da população.
Uma terceira proposta no radar das entidades de defesa do meio ambiente é a Lei Geral de Licenciamento Ambiental, aprovada na Câmara e em tramitação no Senado. O texto derruba várias exigências para atividades sensíveis, como mineração ou exploração de atividades às margens de rios. Cria a figura da “mineração artesanal”, capaz de legalizar qualquer garimpo. A liberação de estudos e relatórios de impactos ambientais para uma série de obras, prevista no texto, precisa ser revista. Não dá para aceitar projetos como a Rodovia Manaus-Porto Velho, asfaltada sem nenhum cuidado e transformada numa ponta de lança aguda para mais desmatamento na Amazônia.
9 e 10/10/2022
Este post pertence à série de textos e compilações “Ou Lula ou o horror”.
A série não tem periodicidade fixa.
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