Como são ruins os dois primeiros colocados nas pesquisas de intenção de voto!
A frase acima – firme, clara, definitiva – está na cabeça de muita gente boa há meses. Comprovou-se absolutamente verdadeira mais uma vez no primeiro debate entre os candidatos à Presidência, realizado no domingo agora, 28 de agosto, por um pool que reuniu as TVs Bandeirantes e Cultura, a Folha de S. Paulo e o UOL.
Está no editorial de O Estado de S. Paulo desta terça-feira, 30/8. Só o ponto de exclamação foi acrescentado por mim. Sou um sujeito dado ao ponto de exclamação. Como são ruins os dois primeiros colocados nas pesquisas de intenção de voto, meu Deus do céu e também da Terra! – é o que eu diria.
Mas esse meu acréscimo não é mesmo necessário. Como afirma o jornal O Estado de S. Paulo, do alto de seus 146 anos de existência:
Como são ruins os dois primeiros colocados nas pesquisas de intenção de voto.
Em seu editorial desta terça-feira, O Globo diz a mesma coisa que o Estado, embora com frases menos cortantes:
“O primeiro debate entre os presidenciáveis na noite de domingo deixou claros os limites dos dois líderes nas pesquisas de intenção de voto, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e o presidente Jair Bolsonaro (PL).”
É uma forma elegante esta do Globo. Mas, a rigor, o editorial demonstra basicamente a mesma coisa que eu disse pouco depois do fim do debate, em texto aqui neste site: “Lula é o horror. Bolsonaro é o maior horror que pode haver. Ciro, Simone, D’Ávila, até mesmo aquela Soraya são melhores que o ex e o atual.”
O que não está longe, de forma alguma, do que escreveu Mary Zaidan no Blog do Noblat, e repliquei aqui: “Os líderes nas pesquisas, Luiz Inácio Lula da Silva e Jair Bolsonaro, não foram as estrelas da noite, e as mulheres – candidatas, jornalistas e a própria temática feminina – dominaram. Elas deram um banho.”
Aqui vão as íntegras dos dois editoriais.
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Um debate muito útil
Editorial, O Estado de S. Paulo, 30/8/2022
O debate entre os candidatos a presidente na TV Band, na noite de anteontem, escancarou uma realidade há muito denunciada neste espaço: como são ruins os dois primeiros colocados nas pesquisas de intenção de voto.
De forma incontestável, o petista Lula da Silva e o presidente Jair Bolsonaro foram os piores no primeiro embate na televisão. O País entendeu perfeitamente por que os dois precisam tanto do cercadinho da polarização: sem propostas para os problemas do País e sem respostas para as acusações que pesam contra ambos, Lula e Bolsonaro limitaram-se a mentir e trocar acusações. Graças a essa miséria, os demais candidatos, com destaque para Ciro Gomes e Simone Tebet, pareciam estadistas.
O debate demonstrou a exata dimensão de Lula e Bolsonaro nesta eleição. Eles podem ser bastante conhecidos e contar com o apoio das respectivas militâncias, mas na realidade têm se mostrado nanicos em ideias e campeões de desrespeito ao voto e à inteligência do eleitor.
Sobre sua trajetória penal, o candidato petista distorceu uma vez mais a realidade. Tendo deixado a prisão e se tornado elegível em razão de nulidades processuais causadas por erros do Ministério Público e da Justiça, postulou o reconhecimento de uma inocência que nunca houve. Lula disse ter sido inocentado até pela ONU. Faltou só citar o Tribunal do Santo Ofício. E tudo isso quando foi questionado sobre a inegável corrupção do PT e o rombo das estatais.
É realmente assustador. Depois de tudo o que foi revelado, depois dos bilhões de reais desviados, Lula é incapaz de reconhecer o problema e de dizer o que fará de diferente para evitar, em um eventual futuro governo, a reedição dos escândalos de corrupção que marcaram para sempre as gestões petistas.
Ao longo do debate, viu-se que Lula não mudou nada. Não pediu desculpas ao País pelo desastre econômico causado pelo PT, tampouco pelo mensalão e pelo petrolão. Repetiu a cantilena petista de que é perseguido injustamente e de que Dilma Rousseff sofreu um golpe.
O País também viu que Jair Bolsonaro não mudou nada. Foi grosseiro com as mulheres, lavou as mãos sobre a articulação política de sua base que resultou no escandaloso orçamento secreto, deu desculpas esfarrapadas sobre a decretação de sigilo de 100 anos até para informações triviais de sua administração, não esclareceu as denúncias de corrupção envolvendo a compra da vacina Covaxin, negou o vergonhoso escândalo do Ministério da Educação e, no geral, reafirmou seu profundo desconhecimento sobre os problemas nacionais. Isso ficou particularmente claro no bloco final, concedido ao candidato para dizer o que pretende fazer se for eleito: quando tomou a palavra, usou-a para falar exclusivamente dos riscos representados pela esquerda na América Latina. A mensagem foi cristalina: o candidato à reeleição não tem rigorosamente nada a propor ao eleitor.
Apesar dessa miséria, o debate não foi em vão. Ficou evidente que há outros candidatos à Presidência da República sérios, com propostas e com experiência. É absolutamente falsa a ideia de que o eleitor neste ano terá de decidir apenas entre Lula e Bolsonaro. O voto não é uma escolha, sob coação, entre dois destinos infelizes. É um exercício consciente e maduro de liberdade.
Em meio ao tumulto protagonizado por Lula e Bolsonaro, Ciro Gomes, por exemplo, encontrou maneiras de expor suas ideias e, de quebra, mostrar as contradições do PT. O candidato do PDT deixou claro que a pretensão de hegemonia de Lula sobre todo o campo da esquerda é antidemocrática, ainda mais quando o PT não quer real debate de ideias e propostas: exige um cheque em branco do eleitor para seu demiurgo.
Outra candidata que se destacou foi Simone Tebet. A senadora do MDB enfrentou com altivez os arreganhos desrespeitosos de Bolsonaro e rebateu com segurança as fabulações de Lula, apresentando-se ao País como alternativa racional e pacífica.
Se o alarido do debate teve alguma utilidade, foi a de mostrar que o País, se quiser, pode deixar de ser prisioneiro do passado corrupto e incompetente do lulopetismo e do presente indecoroso e reacionário do bolsonarismo.
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Debate evidencia limite de Bolsonaro no público feminino
Editorial, O Globo, 30/8/2022
O primeiro debate entre os presidenciáveis na noite de domingo deixou claros os limites dos dois líderes nas pesquisas de intenção de voto, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e o presidente Jair Bolsonaro (PL). Lula teve dificuldades para dar explicações convincentes sobre os escândalos de corrupção nos governos petistas. Quanto a Bolsonaro, desferiu um ataque gratuito e abjeto à jornalista Vera Magalhães, colunista do GLOBO e âncora do programa “Roda Viva”, da TV Cultura, que na certa lhe cobrará um preço num público decisivo nesta eleição: o eleitorado feminino.
Desde o início do debate, promovido por um pool de veículos de imprensa liderado pela Band, Lula tentou desviar do tema mais incômodo para sua campanha, os escândalos na Petrobras. Em resposta à primeira pergunta, feita por Bolsonaro, reivindicou para o próprio governo leis de combate à corrupção e à lavagem de dinheiro aprovadas antes ou depois de sua gestão, para logo em seguida mudar de assunto e elencar conquistas sociais que atribuiu às gestões petistas. Como sempre faz quando o tema vem à baila, driblou a questão. A hesitação permitiu a Bolsonaro reivindicar a paternidade do Auxílio Brasil — de valor, segundo ele, maior que programas sociais do PT — e deixou-o em vantagem. Não durou muito.
Bolsonaro foi pouco depois instado por Vera a comentar uma pergunta ao candidato Ciro Gomes (PDT) a respeito da desinformação sobre vacinas que espalhou na pandemia. Em vez de responder, agrediu com acusações descabidas quem perguntava. Dificilmente teria a mesma atitude se estivesse diante do questionamento de um homem.
O comportamento machista de Bolsonaro foi atacado nas redes sociais e voltou ao foco no debate. “Quando homens são ‘tchutchuca’ com outros homens, mas vêm para cima da gente como tigrão, eu fico extremamente incomodada”, afirmou a candidata Soraya Thronicke (União Brasil). “Quero dizer ao presidente que fabrica fake news e diz inverdades: não tenho medo de você, dos seus robôs ou dos seus ministros”, disse a também candidata Simone Tebet (MDB). Bolsonaro tentou consertar, citou políticas de seu governo em favor das mulheres, desculpou-se por uma declaração desastrada sobre a única filha (a que chamara de “fraquejada”) — mas de nada adiantou. Por mais que tentasse se emendar, o que dizia soava artificial, quando o machismo trouxe de volta a autenticidade rústica que o projetou à vitória em 2018.
A campanha de Bolsonaro tem tentado ampliar sua votação entre as mulheres de todas as formas, lançando mão até da primeira-dama, Michelle Bolsonaro. Os 82,4 milhões de eleitoras, 53% do total, são um dos grupos demográficos em que Bolsonaro enfrenta maior rejeição e mais dificuldade para alcançar Lula. Mais de metade das mulheres afirma que não votaria em Bolsonaro de jeito nenhum. A distância dele para Lula no segmento chega a 20 pontos percentuais, ante menos de 15 no eleitorado como um todo.
As próximas pesquisas dirão se sua estratégia para o público feminino convenceu e se alguma outra candidata ou candidato se projetará depois do debate. Por ora, o fundamental é registrar um desagravo em solidariedade a Vera e a todas as demais profissionais agredidas na cobertura da campanha apenas em razão de sua condição feminina. É simplesmente inaceitável que o presidente da República se comporte assim.
30/8/2022