Às 17h21, poucos minutos depois de sair do Grão, seguramente ainda na rua (ela caminha cerca de 1 km todos os dias entre a escola e a casa), e apenas dois dias depois de nos ter visto durante muitas horas, Marina mandou pelo telefone da Cau uma mensagem de voz:
– “Vovô, vovó, vocês podem vir aqui brincar comigo?”
Usava uma vozinha alegre-brincalhona de quem estava fazendo uma pequena manha, como se pedindo um chocolate em dia de semana que não é para ter chocolate – como se estivesse ironizando, com ótimo humor, o próprio pedido. E aí, depois de breve pausa, com voz em falsete, depressa: – “Por favor?” Isso seguido de uma risadinha marota, também em falsete.
Há no mundo algum vovô ou vovó que consiga dizer não a um pedido destes? Não importa o que eles estavam fazendo na hora, o que tivessem que fazer?
Mandamos mensagem de voz em resposta às 17h23 (está registrado no zapzap). E, graças à maravilha que é a distância entre a nossa casa e a dela, uns 40 minutos depois ela nos recebeu com um sorriso lindo e abraços – um longo e apertado na vovó, um rápido e não tão apertado no vovô. (Ainda que tivesse sido longuíssimo e apertadíssimo, eu estaria reclamando do mesmo jeito. Faz parte.)
Nos recebeu no parquinho, onde tem ficado pelo menos uma hora todo santo dia depois que chega da escola, fazendo exercícios, acrobacias, ginástica, pendurada nos canos do brinquedão. Está numa fase de se exercitar nisso. Bem, a rigor sempre gostou desse tipo de coisa, mas, nas últimas semanas, últimos meses, está especialmente empenhada nesses exercícios.
Uma meia hora depois que chegamos, ela tendo nos mostrado um monte de coisas que sabe fazer e cada vez domina mais, tentou um exercício que já fez muitas vezes, que consiste em passar de um brinquedo para outro, segurando-se nos canos do alto – e não conseguiu. Tentou novamente, percebeu que não iria conseguir, desistiu. Me ocorreu o óbvio: a criaturinha estava fazendo esforços físicos já havia uma hora – estava agora cansada, por isso não conseguia fazer aquele determinado exercício.
Mas Marina, com seus parcos 6 anos e um monte de meses, ainda não consegue admitir algumas obviedades, tipo estar cansada, estar precisando dar um tempinho nas brincadeiras que exigem esforço físico, estar com sono… Se eu tento dizer a ela que ela está cansada, ou com sono, replica com um “Não!” absolutamente peremptório, que me joga nas cordas.
(É verdade que, do alto do monte de seus 6 anos e muitos meses – tudo é relativo –, já avançou bastante, e admite a verdade até sem muitos protestos quando eu digo que ela está com vontade de fazer xixi. Desde que Marina era bem pequena digo pra ela que eu sempre soube a hora em que a mamãe, quando era pequenininha, queria fazer xixi, antes de ela mesma admitir. Agora já nem preciso mais usar esse argumento.)
***
A verdade dos fatos é que, nesta coisa recente de se dedicar com muita paixão aos exercícios físicos, como se fosse uma ginasta romena, ela tem ficado cansadinha mesmo. Nesta terça-feira, depois do banho e de quase uma hora de brincadeira dentro de casa (coroação de rainha, para variar, com muito mais tempo na preparação do que propriamente na coroação em si), Marina estava visivelmente, obviamente cansadinha. Sentou-se no trono pós coroação e lá ficou. Mary e eu inventamos umas coisinhas adicionais, como servir objetos a ela sempre sobre uma almofada, e, ao nos distanciarmos dela, andarmos para trás, sem dar as costas, como Harold Wilson ao sair das audiências semanais com a colega de Marina no quesito rainhice, Elizabeth II. (Ela adorou isso.)
A mamãe deu uma pequena atrasadinha de pouco minutos – aproveitou que a gente estava lá e foi fazer uma coisa que precisava fazer antes de voltar para casa do trabalho. Sentada no trono, por absoluto cansaço que não admitiria jamais, a criaturinha confessou que estava com fome – e aceitou nossa oferta de um biscoitinho salgado como esperinha antes do jantar. Mas com manteiga, exigiu.
Recebeu o biscoitinho salgado com manteiga em um pratinho em cima da almofada logo depois que a mamãe chegou em casa. E não saiu do trono enquanto vovô e vovó se despediam e se retiravam – andando para trás, de fasto, para não dar as costas para ela.
Figurinha, meu Deus!
4 e 6/12/2019
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