Não, essa não é nenhuma manchete policial, e o seu Manuel da padaria passa bem, graças a Deus.
Estamos falando do assassinato da língua portuguesa que o nosso presidente, seus filhos e alguns dos seus “acepipes” costumam cometer. E olha que nem precisam de armas de fogo pra conseguirem isso. Basta que abram suas bocas.
Nessa semana, Jair Bolsonaro foi à Câmara dos Deputados e participou de um culto evangélico lá dentro, na casa do Poder Legislativo (é comum isso? Nunca soube), e no entusiasmo do encontro prometeu que ia indicar um juiz “terrivelmente evangélico” para o cargo de ministro da Supremo.
Oi, seu Jair? Quer dizer que poderemos ter um ministro horripilantemente, apavorantemente, assustadoramente, horrivelmente, pavorosamente, medonhamente, evangélico influenciando os destinos da nação? Já não bastam os lewandowskis e os gilmares da vida carregarem esses advérbios todos nas costas?
E, para que essa indicação aconteça, imagino que os candidatos serão sabatinados pelo próprio presidente, em entrevista que deverá ser mais ou menos nestes moldes:
- O senhor tem experiência?
- Sim! Trabalho já há mais de 30 anos como juiz.
- Alguma mácula na sua carreira, pra que depois a imprensa não caia de pau sobre minha escolha?
- Não, senhor! Nunca troquei mensagens com nenhum procurador sobre sentenças a serem dadas, nunca manipulei provas, nunca influenciei testemunhas, enfim, sempre fui corretíssimo, agindo dentro da lei.
- O senhor é homosexual?
- Não, senhor! Sou casado, pai de três filhos, nunca traí minha esposa nem em pensamento, amo minha sogra, meus cachorros e moro num condomínio só de gente de bem.
- Qual a sua religião?
- Sou terrivelmente católico.
- Ah, então desculpe aí, cara, mas você não preenche os requisitos. Próximo!
LITERALMENTE!
Em 26 de abril passado, seu filho Carlos Bolsonaro – pra provar que filho de peixe peixinho é – publicou no Twitter a seguinte frase: “Vejo uma comunicação falha há meses da equipe do Presidente. Tenho literalmente (sic) me matado para tentar melhorar…”
Já passados alguns meses podemos concluir que não era verdadeiro esse “bilete”. Carlos Bolsonaro – que não acredita no aquecimento do globo terrestre – continua vivo, firme e forte, usando seu espaço no Twitter para tentar desvendar, entre outras coisas, os mistérios climáticos que ocorrem na natureza: “Só por curiosidade: quando está quente, a culpa é sempre do possível aquecimento global e quando está frio fora do normal como é que se chama”?
Isso me faz lembrar de uma historieta antiga sobre o imigrante italiano que deu duro na lavoura brasileira pra poder juntar um dinheiro e mandar seu filho estudar na Itália. Anos se passaram, quando o rapazote finalmente formado volta para o Brasil e seu pai todo orgulhoso vai buscá-lo no aeroporto, numa linda noite de lua cheia. A primeira coisa que ouve do filho, que extasiado olhava para o céu, foi: “Papá, questa luna é la stessa di quella d’Italia”? (Essa lua é a mesma daquela da Itália)?
O pobre imigrante chorou pelo desperdício do seu suado dinheirinho.
Esta crônica foi originalmente publicada em O Boletim, em 12/7/2019.