Nos meus treze, catorze anos, comprei madeira e construí um cavalete, com séria intenção de fazer desenhos a carvão. O cavalete sustentava uma prancha de uns setenta por sessenta centímetros, que recebia a folha de papel. Desenhos, mesmo, fiz poucos. Mas minha mãe, Elza, gostou muito da prancha.
Vinha sob medida para fazer macarrão. Trabalho artesanal. Abria a massa, enrolava cuidadosamente, depois vinha cortando, na vertical, as finas tiras do talharim. Para o Natal, principalmente, produzia quadradinhos que, com recheio em cima, recebiam uma dobra para virar chapeuzinhos. Estava pronto o capeletti para o brodo (sopa).
O artista não consumado casou com Haydèe, que manteve a tradição do capeletti. Haydèe foi chamada pelo Criador, e sua irmã Dena assumiu o posto e preservou a tradição e o sabor.
Havia um certo exagero nos nossos antigos Natais. Meu sogro, Oswaldo Brandão, trabalhou em restaurantes tradicionais de São Paulo (não na cozinha), aprendeu muito e cozinhava bem. Nas vésperas de Natal comprava um cabrito e um leitão. Uma mesa de Natal com capeletti, leitão e cabrito assados, mais as guarnições. Foi-se o tempo. Brandão faleceu e nos bastaram paleta, pernil. E o capeletti, insubstituível . Fim da história?
Não, meu filho Danilo casa-se com Elisângela, filha de um português, bom cozinheiro e amante da culinária, já falecido. Elisângela não conhecia o capeletti. Comeu e gostou – muito. Desde então, não passa semana sem o prato (feito por Danilo, agora com máquina manual). Por estes dias pediu a meu filho Paulo e ao primo Rafael que fizessem capeletti para o almoço de Natal. E eles fizeram.
Dois mil capelettis esperam os convidados. Seguramente até Brandão se espantaria com isso.
Dezembro de 2019