A sarna revolucionária pequeno-burguesa, a que se referia o líder comunista Luís Carlos Prestes, está de volta. Após a condenação do ex-presidente Lula, o PT ensaia uma estratégia de ruptura institucional. Quer o nome do caudilho na urna eletrônica na lei ou na marra. A opção pela via extra institucional visa ainda a emparedar o Judiciário para Lula não ser preso.
O instrumento dessa ruptura seria uma frente de esquerda em torno de Lula. Para consolidá-la, uma nova versão da Carta aos Brasileiros de 2002 propugnará a quebra de contratos constitucionais – como a “regulamentação” dos meios de comunicação e referendos – e retorno às velhas concepções cepalinas do nacional-estatismo.
Lula e o PT repetem dois erros históricos da esquerda: a crença messiânica de que as massas virão em seu socorro e a superestimação de suas forças. As mobilizações do último dia 24 não autorizam leituras triunfalistas.
A esquerda sempre se deu mal quando optou pela ruptura institucional. A Aliança Nacional Libertadora se isolou quando pregou “todo poder à ANL”, uma cópia dogmática do “todo poder aos sovietes”. As massas não acompanharam Prestes na quartelada de 1935.
Em 1964 voltou a pesar a mão com “Reforma agrária na lei ou na marra”, “grupos dos 11”, emparedamento do Congresso Nacional, insubordinação no quarteis. Às vésperas do movimento militar combatia a “conciliação do governo Jango”! A “resistência popular” ao golpe foi uma quimera.
Setores da esquerda não extraíram as lições da derrota de 1964, e enveredaram pela aventura armada. Foram derrotados política e militarmente. Prestes chamou esse voluntarismo de “sarna do revolucionarismo pequeno-burguês”.
A esquerda só se deu bem quando se integrou a movimentos amplos da sociedade, em marcos da legalidade, como na campanha do Petróleo é Nosso, Reformas de Base, Diretas Já, Tancredo Neves. O próprio PT só chegou ao poder quando abandonou o radicalismo.
Hoje é impossível enfrentar os problemas nacionais por meio de uma “frente de esquerda” e de um programa rupturista. O discurso do sangue nos olhos afugentará o eleitorado refratário ao radicalismo, que é a maioria. A chamada “rebelião cidadã” cairá no vazio.
Os partidos de esquerda não estão dispostos a avalizar a aventura do “Lula até o fim”. Com razão, desconfiam que o caudilho quer brincar de Tiradentes com o pescoço alheio. Vão cuidar da eleição dos seus.
Lula e seu partido podem estar blefando. Mais cedo do que pensam terão de retificar a estratégia, operação sempre delicada quando efetivada em meio da batalha. Haverá sempre petistas a dizer “recuar, jamais!”
Mas a alternativa ao recuo é o gueto.
Este artigo foi originalmente publicado no Blog do Noblat, na Veja, em 31/1/2018.