A turma da carroceria

Leonel Brizola costumava dividir seus aliados entre os que iam na carroceria do seu caminhão e os privilegiados que tinham direito de ir na boléia. Esses eram os aliados históricos com os quais dizia ter afinidade ideológica. Os outros eram companheiros de viagem que poderiam ser espirrados do caminhão quando essa aliança fosse um estorvo.

Ciro Gomes adaptou a frase do velho caudilho. No seu guarda-chuva teriam lugar especial o PC do B e o PSB, para assegurar a “hegemonia moral e intelectual” da esquerda, tanto de sua campanha como em um eventual governo. No segundo momento, buscaria se compor com a turma da carroceria – DEM, PP, PR, entre outros – rebaixados pelo presidenciável a aliados de segunda categoria.

Não se sabe se a estratégia de Ciro repetirá o que aconteceu nos governos lulo-petistas. À época, em vez de assegurarem a “hegemonia intelectual e moral”, os partidos de esquerda renderam-se ao fisiologismo e ao patrimonialismo. Mas isto é uma questão a ser esclarecida a longo prazo, na hipótese de uma vitória do pedetista, o que está longe de se confirmar.

De imediato há um início de namoro entre o DEM, o PP e Ciro, apesar do incômodo provocado pela frase desastrosa do pedetista. Em política não vale muito esse negócio de que água e óleo não se misturam.

As posições do DEM sobre previdência, privatização, ajuste fiscal, reforma trabalhista são inteiramente antagônicas ao “nacional-estatismo” de Ciro, mas o oportunismo eleitoral anima a hipótese de um casamento de conveniência.

Desde que Maia foi alçado ao status de novo Rei do “Centrão”, o bloco tem atuado no sentido de assegurar sua fatia no poder e de manter o controle da Câmara de Deputados. Por outro lado, a coerência nunca foi o forte de Ciro. Hoje defende uma coisa, amanhã outra, como se sempre tivesse a mesma posição. A aliança com o DEM, a quem sempre demonizou, sem nenhum trocadilho, tornaria o pedetista mais palatável ao mercado que tanto abominou em passado recente.

Como a candidatura de Rodrigo Maia não alçou vôo e se mantém com índice baixíssimo nas pesquisas, o presidente da Câmara redirecionou sua estratégia. Ao lado do PP, Solidariedade e PR, está à cata de outro eixo gravitacional. A hipótese da candidatura de Josué Alencar é uma operação de alto risco, com poucas chances de se materializar. Teria de ser testada em pesquisas e ainda verificada quanto ao tempo hábil de vir a preencher o vácuo dos 34% dos entrevistados do Datafolha: sem candidato ou dispostos a se abster ou anular o voto.

O namoro da turma da carroceria com o pedetista se dá também pela situação aflitiva da candidatura de Geraldo Alckmin, que a cada pesquisa se complica um pouco mais. Sem oferecer perspectiva de poder, o tucano tem a sua margem de manobra reduzida e será quem mais perderá na hipótese de se concretizar a aliança entre o DEM e o candidato do PDT.

Não há coerência nesse casamento, mas quem disse que Ciro e o Centrão primam pela coerência?

Este artigo foi originalmente publicado no Blog do Noblat, na Veja, em 13/6/2018. 

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