Sem bala de prata

Quando lançou seu plano econômico, o então presidente Fernando Collor justificou o confisco da poupança com a necessidade de dar um tiro certeiro no tigre da inflação. Só lhe restava o último cartucho, a bala de prata, dizia ele. Onde foi parar essa história, todos nós sabemos.

É preciso ter cuidado com arroubos. Nada é mais temerário do que achar que problemas acumulados por um longo período de irresponsabilidade e mal feitos podem ser corrigidos no voluntarismo e esperteza.

Emparedada pelas multidões que coloriram as ruas das principais cidades do país no último dia 13, e pela corrosão de sua base parlamentar, a presidente Dilma Rousseff repete o gesto desesperado de Collor e apela para a sua bala de prata: fazer de Lula seu superministro. Tem tudo para ser um tiro na água.

Com a nomeação, a presidente apega-se a Lula como os mariscos encrustam-se nas pedras. Vislumbra aí o único caminho: reorganizar tropas no Parlamento para evitar seu impeachment. Paga qualquer preço para evitá-lo. Dá as costas ao povo, submete-se ao vexame de uma “renúncia branca” e à condição de uma “rainha da Inglaterra” sem qualquer glamour.  Mesmo assim, é duvidoso que consiga seus objetivos.

Dilma dá demonstrações de não ter entendido absolutamente nada do que os atos contra ela disseram. A assunção do ex ao posto de homem forte do governo, em vez de reconciliar o Planalto com as ruas, é um tapa na cara dos manifestantes. Beira ao escárnio.

A leitura de que Lula foi se acoitar no ministério de Dilma para ter foro privilegiado é combustível puro para a indignação nacional. Por mais que os petistas jurem de pés juntos que o caudilho vai para o Ministério por ser um Pelé da política, ninguém crê um milímetro nesta versão. O senso comum levará à mesma conclusão exposta por Lula em 1988: “aqui no Brasil é assim: quando um pobre rouba, vai para a cadeia; quando um rico rouba, vira ministro”.

O temor explica-se pelo histórico de impunidade, mas não se justifica diante da postura positiva das instituições republicanas, – entre as quais o STF- com relação à Operação Lava-Jato.
Diante da enxurrada de delações e denúncias envolvendo seu nome, é quase impossível o ex-presidente escapar de uma investigação comandada pela Suprema Corte.

Teremos, nesse caso, uma situação vexatória. O novo homem forte do governo estará na mesma condição do presidente da Câmara, Eduardo Cunha. Um investigado no STF sentando praça no bunker de Dilma, na sua antessala. Só falta chegar à cadeira presidencial…

É uma situação esdrúxula. Nunca antes neste país um ex-presidente virou ministro de outro presidente. Mas o desrespeito à liturgia é o menor dos males. O maior deles é colocar a presidente na condição de cúmplice, de alguém que age para blindar seu criador, para obstaculizar a Justiça.

Essas suspeitas assumem proporções bombásticas diante das gravações apresentadas pelo senador Delcídio Amaral, como prova de que Aloísio Mercadante, na condição de ministro da Casa-Civil, ofereceu ajuda financeira para evitar a delação premiada de Delcídio.

Ao nomear Lula, Dilma imagina agradar as “bases populares”, para ter alguma tropa em sua defesa, ainda que seja um exército sem poder de fogo e sem bandeira.
E as imposições do ex são altíssimas. Quer proteção para ele e para a sua família. E quer mudar tudo na economia.

Com isso, descarta-se, de vez, qualquer possibilidade de ajuste econômico. O abrandamento do rigor fiscal, a utilização das reservas do país para inflar artificialmente o consumo e a adoção de medidas heterodoxas terão efeitos deletérios na já combalida economia e na vida dos cidadãos.

Diante do eventual cavalo de pau imposto por Lula, qual será a postura de Nelson Barbosa. Avalizará a aventura? E qual será a reação dos empresários? Investirão seu capital neste mar de instabilidade? O mundo produtivo já deu o recado: também quer “Fora Lula”, “Fora Dilma”, “Fora o PT”.

Sem munição, Dilma não partiu para o tudo ou nada. Partiu para o nada ou nada.

Este artigo foi originalmente publicado no Blog do Noblat, em 16/3/2016. 

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