Inflação e desemprego crescentes, recessão estarrecedora, roubalheira sem fim. Como se não bastasse o caos econômico, político e ético, 2016 é ano eleitoral, quando, tradicionalmente, tudo se agudiza. Na política e na economia.
Época em que, costumeiramente, se gasta algum verbo e muita verba a mais, lícitas e não contabilizadas, termo imortalizado pelo gênio da arrecadação petista, o ex-tesoureiro e mensaleiro condenado Delúbio Soares.
Na campanha deste ano os problemas serão ainda maiores. Não há dinheiro nem financiadores. Empresários escaldados por mensalões e petrolões, que já ficariam ressabiados em apoiar partidos e políticos, estão impedidos de qualquer doação. Pelo menos às claras.
O dinheiro oficial para as campanhas terá de vir de três fontes: público, via fundo partidário, de promoções dos partidos e de pessoas físicas, que não têm tradição de custear campanhas. E não será agora, quando o descrédito nos políticos atinge os píncaros, que elas começarão a fazê-lo.
A fórmula é sopa no mel para os campeões de audiência, gente de mídia, comunicadores, comediantes, pastores, ases do esporte e todo tipo de celebridade que conta com exposição maciça. Até porque é difícil imaginar que alguns jantares, leilões, vendas de camisetas, shows e doações de militantes conseguirão fazer frente aos gastos milionários que as campanhas impõem.
Segundo o TSE, em 2012, últimas eleições municipais, só em São Paulo os candidatos a prefeito e a vereadores consumiram a bagatela de R$ 907 milhões, R$ 726 milhões bancados por doações empresariais. Em todo o país, os 15.100 candidatos a prefeito e os 419.900 a vereador queimaram mais de R$ 4,5 bilhões, 80% deles oriundos de CNPJs, proibidos de vez pelo Supremo e pela sanção da presidente Dilma Rousseff à minirreforma eleitoral, aprovada no Parlamento em 2015.
E de onde então virá o dinheiro? Dos impostos? Do caixa falido da presidente Dilma, que torrou tanto na campanha de sua reeleição que não tem de onde tirar nem mesmo para programas básicos de saúde e educação?
Ainda que o fim do financiamento privado seja defensável, por mais uma vez aprovou-se um dispositivo sem ter o que colocar no lugar.
Ninguém perguntou ao cidadão se ele está disposto a custear campanhas políticas com o dinheiro de seus impostos. Até porque a resposta seria um sonoro e taxativo não.
Agora, o monstro está aí. E ele ruge.
Mostrou o afio das unhas nos R$ 819 milhões fincados no Orçamento da União, quase três vezes mais do que a proposta do governo. E que Dilma sancionou, temendo agredir sua fragilíssima base e, consequentemente, fermentar o impeachment.
Sem forças para encarar um rato, quanto mais uma fera, a presidente despejou dinheiro que o país não tem nos partidos políticos. E, se necessário, derramará mais para eleger os seus.
Somados ao gasto obrigatório do TSE para realizar o pleito, algo que ultrapassa R$ 400 milhões, e ao ressarcimento da União em favor das emissoras de rádio e TV que transmitem o horário eleitoral falsamente dito gratuito – outros R$ 576 milhões -, o aporte de dinheiro público já dobrou a casa dos R$ 2 bilhões. E ainda assim será insuficiente.
Pior. Os que defenderam a mudança do financiamento, seja por razão, convicção, ideologia, credo ou oportunismo, sabem que criaram um monstrengo impossível de ser domado com o palavreado fácil de que a campanha será mais curta e mais barata, que as redes sociais serão definitivas, que o verbo será mais forte que a verba.
Criou-se a justa causa do dinheiro não contabilizado. Algo em que todos são responsáveis. Executivo, Judiciário, Legislativo. Governo e oposição.
Se a lama depositada no fim do túnel pelo PT e aliados prende a besta do lado de cá e bloqueia a entrada de qualquer feixe de luz, não há, entre os opositores, nada que resplandeça. Nem idéias, muito menos saída.
Este artigo foi originalmente publicado no Blog do Noblat, em 24/1/2015.
Hoje Sampa faz aniversário, felicidades para a maior e mais importante cidade do hemisfério sul. Desejamos que o candidato a prefeito pela oposição do PSDB seja Andrea Matarazzo e que este saia vencedor das prévias no partido tucano, apesar do texto acima indicar certo favoritismo de João Dória mais familiarizado com a mídia e com caixa dois.
O monstro ruge, de onde sairá a grana para a campanha da oposição para a prefeitura de SP. Bom lembrar que tradicionalmente os paulistas nunca acreditaram em candidatos do PSDB, vide as prefeituras de Erundina, Maluf, Pitta, Marta, Kassab, Haddad. O único tucano eleito, Serra renunciou ao mandato vergonhosamente.
São Paulo não merece Dória como candidato.
O Brasil está de olho em sampa.
TRANSPORTE COLETIVO
TARIFA CUSTO DE 8 BILHÕES
Tarifa zero: Haddad evoca fantasmas da direita!
Olhar mais atento à planilha de custos desmente conta que prefeito usa para desqualificar movimento. Se quer cidade aberta, como a av. Paulista, deveria ter se empenhado no transporte coletivo livre.
Por Mauro Lopes.
Uma das estratégias mais usadas pela direita para vetar direitos sociais é alardear números tão enormes que as pessoas ficam paralisadas. Milhões! Bilhões! Trilhões! Com este grito, como o pobre cidadão poderá se contrapor? É tanto dinheiro que nem conseguimos mensurar, ter ideia de sua grandeza real e relativa. Foi assim, por exemplo, quando os trabalhadores arrancaram o 13º salário em 1962. O presidente era João Goulart e a direita enlouqueceu dizendo que as empresas iam quebrar uma atrás da outra. A manchete de O Globo na época foi: “Considerado desastroso para o país um 13º mês de salário”. Hoje a gente ri disso, mas na época foi uma pedreira. Com o Bolsa Família não foi diferente, lembram-se?
Pois agora o prefeito de São Paulo, Fernando Haddad resolveu tomar emprestada a tática da direita para vetar a discussão sobre a Tarifa Zero. Hadadd fez mais que isso: resolveu aliar-se ao governador neofascista Geraldo Alckmin na questão dos aumentos dos transportes, tem sido conivente com a repressão criminosa ao Movimento Passe Livre e às manifestações de rua e, se não bastasse, partiu para ridicularizar um movimento social. Para desqualificar o direito social reivindicado, ele afirmou recentemente numa agressão sem precedentes aos movimentos sociais partida de alguém de esquerda: “Tem tanta coisa que podia vir na frente, podia ser almoço grátis, jantar grátis, ida pra Disney grátis.” – veja aqui a entrevista.
Qual o fantasma que Haddad agita, ao estilo da direita, para tentar bloquear o diálogo sobre o direito à mobilidade urbana? R$ 8 bilhões – veja aqui. O prefeito diz que esse seria o custo para implantar a tarifa zero. Para bloquear o debate de vez ele lança quase que uma ameaça à cidade: seria necessário colocar todo o dinheiro do IPTU para bancar a “farra” (é mais ou menos isso que ele considera o passe livre, uma farra, uma viagem pra Disney). Quem, em sã consciência, considera que dá pra pegar todo o dinheiro do IPTU e “torrar” na tarifa zero? Essa é a farsa da racionalidade que a direita sempre usou para agitar seus fantasmas.
Mas é isso mesmo. Os tais $ 8 bi são uma farsa.
Vejamos.
Em primeiro lugar, este número de $ 8 bilhões de subsídio, que segundo o prefeito é o custo anual do transporte. Creio que não dá pra começar a conversa assim. Vamos usar números consolidados da Prefeitura, pois senão ficamos sujeitos a números-coelho que saem da cartola a qualquer tempo. O custo total do transporte coletivo municipal de São Paulo, segundo as planilhas da Prefeitura que serviram de base para a tarifa de R$ 3,50 foi de R$ 7,17 bilhões (clique em Tarifa R$ 3,50 no link aqui).
Creio que esta planilha, que consolida os dados do sistema é o que há de mais confiável para abrir um diálogo efetivo, que objetive encontrar soluções e não impasses.
Desse total, as empresas enviam à SPTrans anualmente R$ 873 milhões – este montante, portanto, sai do custo a ser subsidiado pois já está pago.
O custo cai para R$ 6,3 bilhões
Se observarmos na linha “outras fontes” do sistema, que inclui multas de trânsito, publicidade e outras, veremos que o montante é de R$ 147 milhões. Ora, só em 2014 a Prefeitura arrecadou R$ 899 milhões em multas de trânsito! Não parece razoável que esta arrecadação fique no sistema de transporte? Vamos dizer que 80% dela seja destinada ao sistema. Estas “outras fontes” poderiam subir para algo como R$ 1 bilhão.
O custo cai para R$ 5,3 bilhões
O lucro das empresas de ônibus é da ordem de R$ 645 milhões anuais, segundo a mesma planilha. Não é razoável pensar numa redução desta margem? Em 1/3? Seriam R$ 215 milhões anuais a menos para o bolso dos empresários.
O custo cai para R$ 5,08 bilhões.
Mas há mais. Segundo o professor Paulo Sandroni, presidente da CMTC na gestão de Luiza Erundina e um dos articuladores da proposta de Tarifa Zero à época, “o custo das estruturas necessárias para cobrar as tarifas de ônibus – cobrador, sistema de recarregamento de bilhetes e etc. – corresponde a algo entre 20% e 22% do total, por exemplo, então se você acaba com a cobrança já tem uma redução de custo que não está sendo considerada (pelo prefeito)” – veja reportagem sobre o tema aqui.
Ora, o custo das empresas com funcionários, combustível, renovação da frota, manutenção, despesas administrativas e outras alcança R$ 4,7 bilhões. Com 22% de economia alcançaríamos R$ 1 bilhão.
O custo do sistema cai para R$ 4,05 bilhões.
Vamos considerar as gratuidades da época da planilha (R$ 1,18 bilhão) posto que o recurso já está incorporado ao orçamento municipal.
O custo cai para R$ 2,87bilhões.
Pronto. Um exercício simples, feito por um leigo. O que eram fantasmagóricos R$ 8 bilhões reduziram-se a R$ 2,87 bilhões. Não é pouco. Mas é evidentemente possível. Aqui não estão consideradas alternativas como implantação de pedágio urbano para carros, aumento do IPTU para os muito ricos da cidade, repasses, outras economias, aumento de contribuição das empresas no sistema do vale transporte…
Há um rico universo de possibilidades. O tema da mobilidade urbana é central em São Paulo e em todas as metrópoles do planeta. Haddad tomou algumas iniciativas, como a implantação das ciclovias e expansão das gratuidades.
A abertura da Paulista às pessoas aos domingos é outra iniciativa bonita de Haddad – mas que fica restrita à classe média se não houver tarifa zero: uma conta simples demonstra que se três amigxs resolverem deslocar-se da Zona Leste para a Paulista num domingo tomando dois ônibus na ida e na volta gastariam, pela tarifa atual, R$ 45,60. Quem pode pagar?
Tarifa zero é uma cidade aberta às pessoas. O oposto da tarifa zero é a cidade fechada às pessoas e aberta às máquinas e aos que têm dinheiro – não é à toa que José Serra e a direita são opositores viscerais da abertura da Paulista e das ciclovias.
Qual a razão de Hadadd não haver convocado um comitê que deveria estar trabalhando desde 2013 a encontrar soluções para a tarifa zero? Tanta gente boa e conhecedora do assunto: Paulo Sandroni, Lúcio Gregori, Raquel Rolnik, funcionários da Prefeitura, o pessoal do MPL e de outros movimentos sociais. Colocar essa gente toda em volta da mesa teria feito São Paulo encontrar boa luz. É isso que a rua pede. Mas o prefeito não escuta.
Hadadd perde, com sua estratégia midiática de agitar o fantasma dos R$ 8 bi gracejos de direita; assim como a cidade perde. Perdem sobretudo os pobres, que arcam com a conta do transporte.